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PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. DESCONTINUIDADE DO LABOR RURAL. POSSIB...

Data da publicação: 20/07/2024, 07:01:13

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. DESCONTINUIDADE DO LABOR RURAL. POSSIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA. - O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado mediante início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. - Comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher), e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondente à carência, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, é devido o benefício de aposentadoria rural por idade, a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei nº 8.213/91. - Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5003591-66.2024.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 12/07/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51) 3213-3000 - www.trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5003591-66.2024.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

APELANTE: AROALDO VALDI NUNES DA SILVA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade do trabalhador rural, desde a data do requerimento administrativo, formulado em 21/09/2020 (evento 1, DOC8, p. 01), nos seguintes termos:

Ante o exposto, na forma do art. 487, inc. I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por AROALDO VALDI NUNES DA SILVA em face de INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS

Condeno a parte autora ao pagamento de Taxa Única dos Serviços Judiciais (TUSJ) e de honorários advocatícios em favor do patrono da parte contrária, que fixo em 15% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85 do CPC. Suspendo, todavia, sua exigibilidade, pela gratuidade de justiça deferida.

Em suas razões, o autor sustenta que, apesar de ter mantido alguns vínculos com o meio urbano, seu trabalho sempre foi realizado no campo o que torna possível a concessão do benefício da aposentadoria rural.

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

A controvérsia recursal diz respeito ao reconhecimento do exercício de atividade rural nos períodos de 13/10/1976 a 12/04/1977, 14/04/1977 a 06/08/1977, 18/08/1977 a 11/05/1982, 01/04/1995 a 12/07/1996, 01/09/1999 a 10/06/20002, e 01/03/2014 a 18/08/2019, com a subsequente concessão da aposentadoria por idade rural.

Da aposentadoria por idade do trabalhador rural

Dispõe o art 201, §7º, inciso II, da CF, que é assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal, aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher.

Os requisitos para a aposentadoria por idade rural, para os filiados ao RGPS à época da edição da Lei nº 8.213/91, estão dispostos nos §§ 1º e 2º do art. 48 e no art. 39, I, da LB, que exigem:

(a) idade mínima de 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher (art. 48, § 1.º ); e

(b) o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, independente do recolhimento de contribuições.

Para o segurado que implementar o requisito etário combinado com o tempo de serviço necessário após 2011, a teor do art. 25, II, 142 e 143 da LB, o tempo de serviço rural exigido será de 180 meses.

Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.

Desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento1.

Cumpre destacar que a reforma da Previdência Social (EC 103/2019) não alterou as regras para a concessão da aposentadoria por idade rural.

O cálculo do benefício será efetuado na forma do art. 26 da EC 103/2019, ou, se for computado unicamente tempo de serviço rural em regime de economia familiar, prevalecerá o disposto no art. 39, I, da Lei nº 8.213/91 (RMI de 01 salário mínimo).

Requisitos para a aposentadoria por idade rural
Idade Mínima60 anos para homem e 55 anos para mulher.
Efetivo exercício de atividade ruralAinda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, independente do recolhimento de contribuições.
Carência necessária(i) Se implementados os todos requisitos anteriores antes de 2011 - observar a tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91.
(ii) Se implementados os todos requisitos após 2011 - 180 contribuições
Categorias de seguradoEmpregado rural; Trabalhador eventual (boia-fria); Segurado especial; e Contribuinte individual rural ou garimpeiro, em regime de economia familiar.
Cálculo do valor do benefícioConforme art. 26 da EC 103/2019, ou, se for computado unicamente tempo de serviço rural em regime de economia familiar, RMI de 01 salário mínimo.

Da demonstração da atividade rural

De acordo com o art. 55, §3º da Lei n.º 8.213/91 a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea2.

A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos como início de prova material quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar3.

Para tanto, deve ser levado em consideração as particularidades do meio rural e a dificuldade do interessado, que não raras vezes é pessoa humilde de pouca instrução, em obter documentos para ver comprovado o tempo de labor rural controvertido.

No que toca à necessidade de início de prova material, pertinente referir os seguintes entendimentos sumulados:

Súmula n.º 73 deste Regional: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

Súmula n.º 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.

Também devem ser observados os precedentes vinculantes do STJ, nos temos das seguintes teses firmadas:

Tema 532: O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).

Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria". "O STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)

Tema 629: A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.

Tema 642: O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.

O §1.º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros.

Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, salvo quando o integrante passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana4.

Por outro lado, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afasta, necessariamente, a condição de segurado especial da parte interessada, desde que esta disponha de início de prova material independente do integrante, salvo se comprovada a prescindibilidade do labor rural.

Não há necessidade de que a prova material abarque todo o período de trabalho rural, uma vez que se deve presumir a continuidade do labor rural, sendo inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. As provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural5.

A partir da Lei nº 13.846/2019, o segurado especial comprovará o tempo de exercício de atividade rural por meio de autodeclaração ratificada por órgãos públicos e entidades públicas credenciadas, consoante art. 38-B, §2º, da LB. Na ausência da referida ratificação, deverá ser complementada com a apresentação de início de prova material, nos termos do §4º do referido dispositivo.

Fixados os parâmetros de valoração da prova, cumpre realizar o exame da situação específica dos autos.

Do caso concreto

Da idade e da carência

No caso em tela, observa-se que o autor preencheu o requisito etário (60 anos) em 08/09/2019, pois nascido em 08/09/1959 (evento 1, DOC2).

Uma vez que requereu o benefício na via administrativa em 21/09/2020 (evento 1, DOC8, p. 01), deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou à entrada do requerimento administrativo, ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.

Da comprovação do trabalho rural

Visando à demonstração do exercício da atividade rural, na condição de empregado rural, no intervalo de 13/10/1976 a 12/04/1977, 14/04/1977 a 06/08/1977, 18/08/1977 a 11/05/1982, 01/04/1995 a 12/07/1996, 01/09/1999 a 10/06/20002, e 01/03/2014 a 18/08/2019, foram juntados aos autos os seguintes documentos:

- Extrato de CNIS do autor, com vínculos empregatícios de 13/10/1976 a 12/04/1977, em RIO GRANDE COMPANHIA DE CELULOSE DO SUL; 14/04/1977 a 06/08/1977, em VIVEIROS AGRO FLORESTAL LTDA; 18/08/1977 a 11/05/1982, em RIO GRANDE COMPANHIA DE CELULOSE DO SUL; 01/10/1982 a 30/11/1982, em CHURRASCARIA E RESTAURANTE JAGUARUNENSE LTDA; 01/04/1995 a 12/07/1996, em SAUL OLAVO GROSS E OUTRO; 08/01/1997 a 23/03/1999, em PRESTADORA DE SERVICOS FLORESTAIS SBABO LTDA; 27/11/2006 a 28/09/2007, em TECNOPLANTA FLORESTAL LTDA; 01/06/2010 a 05/11/2010, em KEOMA CONSTRUCAO INCORPORACAO E PLANEJAMENTO LTDA; 04/02/2013 a 05/03/2013, para LAUDELINO G. FERREIRA; e 01/03/2014 a 18/08/2019, para IRENE LYDIA ARNDT FEIJO; assim como recolhimentos como empregado doméstico de 01/09/1999 a 31/10/1999, 01/12/1999 a 31/01/2001, 01/03/2001 a 31/03/2001, 01/05/2001 a 31/12/2001 e 01/02/2002 a 31/05/2002 - evento 1, DOC4;

- CTPS do autor com vínculos urbanos de 13/10/1976 a 12/04/1977, 14/04/1977 a 06/08/1977, 18/08/1977 a 11/05/1982, 01/10/1982 a 30/11/1982, 01/04/1995 a 12/07/1996, 01/09/1999 a 10/06/2002, 27/11/2006 a 28/09/2007, 01/06/2010 a 05/11/2010, 04/02/2013 a 05/03/2013 e 01/03/2014 a 18/08/2019 - evento 1, DOC6.

Os documentos juntados aos autos, porque contemporâneos aos períodos almejados, bem como por terem sido emitidos em nome próprio e de integrantes do seu grupo familiar, constituem início razoável de prova material quanto aos períodos de 13/10/1976 a 12/04/1977, 14/04/1977 a 06/08/1977, 18/08/1977 a 11/05/1982, 01/04/1995 a 12/07/1996, 01/09/1999 a 10/06/20002, e 01/03/2014 a 18/08/20196.

Em análise à CTPS acostada no evento 1, DOC8, observa-se o registro dos respectivos períodos como trabalhador rural e em estabelecimento rural, intervalos também registrados no extrato CNIS.

Cumpre salientar que, embora conste o último vínculo empregatício com a data fim de 18/08/2019, verifica-se nas anotações gerais da CTPS (Evento 1, OUT6, p. 21) que o segurado permaneceu no labor rurícola até 30/09/2019, data em que já havia preenchido o requisito etário.

A prova testemunhal é idônea a complementar o início de prova material do tempo de serviço rural, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente7.

Da prova testemunhal no caso concreto

Na audiência de instrução, a Srª Loraci de Fátima Bortolli afirma que conhece o autor desde criança e que ele sempre trabalhou na agricultura, alegando já ter visto o requerente trabalhando no plantio de aipim.

A prova testemunhal, portanto, é precisa e convincente quanto ao labor rural desempenhado pela demandante no período controverso.

Desta forma, resta comprovado o labor rurícola pelos períodos de 13/10/1976 a 12/04/1977, 14/04/1977 a 06/08/1977 e 18/08/1977 a 11/05/1982 (67 meses), 01/04/1995 a 12/07/1996 (16 meses), 01/09/1999 a 10/06/20002 (34 meses), e 01/03/2014 a 18/08/2019 (66 meses), pelo início de prova material corroborado pela prova testemunhal, resta preenchida a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria postulado, consoante art. 48, §§1º e 2º, e art. 55, §3º, ambos da Lei nº 8.213/91.

Descontinuidade do labor rural

Consoante redação do art. 143 da Lei n° 8213/91 e jurisprudência do STJ, o exercício da atividade rural, desde que imediatamente anterior ao requerimento administrativo, pode ser descontínua, de forma que o trabalho urbano intercalado ou concomitante ao trabalho campesino não retira, necessariamente, a condição de segurado especial.

De acordo com o art. 11, §9º, inciso III, da Lei de Benefícios, o exercício de atividade remunerada em período não superior a 120 (cento e vinte) dias não retira a condição de segurado especial do trabalhador rural. Neste sentido, é o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA. DESCARACTERIZAÇÃO. CARÊNCIA NO LABOR RURAL. PROVA. AUSÊNCIA. SÚMULA 7 DO STJ. INCIDÊNCIA.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça possui a compreensão de que o exercício de atividade urbana, por si só, não afasta a condição de segurado especial, que poderá fazer jus à aposentadoria por idade rural se demonstrar exercer a atividade rural, ainda que descontínua, nos moldes definidos no art. 143 da Lei n. 8.213/1991.
2. De acordo com o art. 11, § 9º, III, da Lei n. 8.213/1991, é possível o exercício de atividade remunerada pelo segurado especial em período de entressafra ou defeso não superior a 120 (cento e vinte) dias.
3. No caso, o Tribunal de origem considerou insubsistente a prova oral colhida em juízo para a comprovação de parte da carência, inexistindo, portanto, a alegada harmonia dos testemunhos com o acervo documental, de modo que a inversão do julgado demandaria o reexame de prova, inviável em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7 do STJ.
4. Agravo interno desprovido.
(AgInt no AREsp n. 389.443/PR, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 17/11/2016, DJe de 9/12/2016.)

De outra banda, mesmo o afastamento superior a 4 (quatro) meses do labor rurícola não afasta a possibilidade de concessão da aposentadoria por idade rural, sendo possível o cômputo de períodos remotos para o deferimento do benefício. Inclusive, neste sentido é a tese firmada no Tema nº 301 da Turma Nacional de Uniformização deste TRF4:

Cômputo do Tempo de Trabalho Rural

I. Para a aposentadoria por idade do trabalhador rural não será considerada a perda da qualidade de segurado nos intervalos entre as atividades rurícolas. Descaracterização da condição de segurado especial

II. A condição de segurado especial é descaracterizada a partir do 1º dia do mês seguinte ao da extrapolação dos 120 dias de atividade remunerada no ano civil (Lei 8.213/91, art. 11, § 9º, III);

III. Cessada a atividade remunerada referida no item II e comprovado o retorno ao trabalho de segurado especial, na forma do art. 55, parag. 3o, da Lei 8.213/91, o trabalhador volta a se inserir imediatamente no VII, do art. 11 da Lei 8.213/91, ainda que no mesmo ano civil.

A respeito da possibilidade de cômputo de períodos remotos, cumpre trazer à liça o voto vencedor do Juiz Federal Fábio Souza no Tema nº 301 da TNU:

13. A Lei 8.213/91, no § 2º, do art. 48, exige a imediatidade do trabalho rural em relação ao requerimento (ou à implementação da idade mínima) e autoriza que o tempo de trabalho rural seja descontínuo. O que se demonstra neste capítulo do voto é que as duas expressões se referem a elementos diferentes e não podem, em momento algum, ser confundidas. Ruptura da continuidade não afeta a imediatidade, assim como um período de trabalho rural contínuo, pode não ser imediato. Isto não é aquilo.

14. Ao exigir a comprovação da atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento, a lei indica que a aposentadoria prevista nos § § 1º e 2º, do art. 48 da Lei 8.213/91 é para as pessoas que conservam a condição de trabalhador rural, sendo insuficiente o fato de terem trabalhado no campo em período pretérito. Em palavras diretas: o benefício é para quem “é trabalhador rural” e não para quem “foi trabalhador rural”. [...]

16. Desse modo, não tem direito à aposentadoria por idade rural a pessoa que, mesmo tendo trabalhado no campo por mais de 180 meses, deixou a lide campesina antes de completar o requisito etário. Por exemplo, um homem que exerceu atividade rural dos 20 aos 40 anos de idade e, em seguida, passou a trabalhar em atividade urbana, sem retornar ao campo, não fará jus ao benefício rural, pois não tem trabalho campesino no período imediatamente anterior ao requerimento ou à data em que completou a idade. Esse, aliás, o sentido da tese firmada no Tema 642 do Superior Tribunal de Justiça. [...]

21. Porém, atendido o critério da imediatidade, a exigência dos 180 meses de trabalho rural pode ser preenchida de modo descontínuo, sendo irrelevante para o legislador o tempo decorrido entre os períodos de atividade rural, desde que, no momento do requerimento ou da implementação da idade, o segurado esteja trabalhando no campo.

Ou seja, havendo prova de desempenho de atividade rural em período anterior ao requerimento administrativo que se mostre significativo, suficiente para permitir a conclusão de que o segurado efetivamente passou a sobreviver de forma estável dos frutos de seu trabalho junto à terra, deve ser admitido o direito ao benefício com o cômputo de períodos anteriores descontínuos, mesmo que tenha havido a perda da condição de segurado, para fins de implemento de tempo equivalente à carência exigido pela legislação de regência.

No caso, admitida a descontinuidade, e tendo o autor já retornado ao efetivo desempenho do labor rural, não é possível que se adote entendimento restritivo quanto ao conceito de descontinuidade, o que acabaria por deixar ao desamparo segurados que desempenharam longos períodos de atividade rural, mas por terem intercalado períodos significativos de atividade urbana ou mesmo de inatividade, restam excluídos da proteção previdenciária.

Como se vê, restou comprovado o trabalho rural de longa data, inclusive no período imediatamente anterior ao implemento da idade mínima.

Desta feita, é possível o cômputo de períodos de labor rural descontínuos para fins de cumprimento da carência necessária para a concessão de aposentadoria por idade rural.

Dos Consectários

A correção monetária das parcelas vencidas e os juros de mora, contados desde a citação, deverão observar os seguintes critérios:

05/1996 a 03/2006

IGP-DI

(art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5.º e 6.º, da Lei 8.880/94);

JUROS DE MORA de 1% ao mês

(art. 3.º do Decreto-Lei 2.322/1987, jurisprudência do STJ e Súmula 75/TRF4).

a partir de 04/2006

INPC (nos benefícios previdenciários)

(art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11.08.2006, e art. 31 da Lei 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

IPCA-E (nos benefícios assistenciais)

REsp 1.495.146, Tema/STJ nº 905 representativo de controvérsia repetitiva, interpretando o RE 870.947, Tema/STF nº 810 - afastou a TR reconhecendo a inconstitucionalidade do art. 1º-F na Lei 9.494/1997.

JUROS DE MORA de 1% ao mês

(art. 3.º do Decreto-Lei 2.322/1987, jurisprudência do STJ e Súmula 75/TRF4).

a partir de 30/06/2009

INPC (nos benefícios previdenciários)

(art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11.08.2006, e art. 31 da Lei 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

IPCA-E (nos benefícios assistenciais)

REsp 1.495.146, Tema/STJ nº 905 representativo de controvérsia repetitiva, interpretando o RE 870.947, Tema/STF nº 810 - afastou a TR reconhecendo a inconstitucionalidade do art. 1º-F na Lei 9.494/1997.

JUROS DE MORA incidirão, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, SEM capitalização, diante da ausência de autorização legal (STJ, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP).

(art. 1º-F, da Lei 9.494/1997, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral)

a partir de 09/12/2021

TAXA SELIC, acumulada mensalmente

(artigo 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021 - Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente)

Da sucumbência

Alterado o provimento da ação, afastada a sucumbência da parte autora, incumbe ao INSS o pagamento dos ônus processuais, o qual é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei 9.289/96).

Ademais, tratando-se de feitos afetos à competência delegada, tramitados na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, a autarquia também é isenta do pagamento dessas custas (taxa única), de acordo com o disposto no art. 5.º, I, da Lei Estadual n.º 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não a exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5.º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único do art. 2.º da referida lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.

Nas ações previdenciárias os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".

No caso, não tendo sido concedido na sentença o benefício pretendido, a base de cálculo da verba honorária estende-se às parcelas vencidas até prolação do presente acórdão.

Conclusão

Apelação do INSS

INSS não interpôs recurso.

Apelação da parte autora


Provida para conceder o benefício da aposentadoria por idade rural.

Tutela específica

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC/2015, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo, o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício concedido em favor da parte autora.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB
ESPÉCIEAposentadoria por Idade
DIB21/09/2020
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.

Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

Dispositivo

Frente ao exposto, voto por dar provimento ao recurso e determinar a implantação do benefício via Central Especializada de Análise de Benefício.



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1. STF, RE 631.240, com repercussão geral, Plenário, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).
2. Recurso Especial Repetitivo n.º 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13-12-2010, DJe 15-04-2011
3. STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012
4. Tema 533: A extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. Tema 638/STJ - Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal.
6. De acordo com as diretrizes traçadas no REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia
7. Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos

5003591-66.2024.4.04.9999
40004475238.V33


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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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Apelação Cível Nº 5003591-66.2024.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

APELANTE: AROALDO VALDI NUNES DA SILVA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. DESCONTINUIDADE DO LABOR RURAL. POSSIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA.

- O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado mediante início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea.

- Comprovado o implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher), e o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondente à carência, ainda que a comprovação seja feita de forma descontínua, é devido o benefício de aposentadoria rural por idade, a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei nº 8.213/91.

- Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso e determinar a implantação do benefício via Central Especializada de Análise de Benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 10 de julho de 2024.



Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004525666v5 e do código CRC 407207d8.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/07/2024 A 10/07/2024

Apelação Cível Nº 5003591-66.2024.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PROCURADOR(A): ORLANDO MARTELLO JUNIOR

APELANTE: AROALDO VALDI NUNES DA SILVA

ADVOGADO(A): CAROLINE DE OLIVEIRA OJEDA (OAB RS110576)

ADVOGADO(A): VANESSA LA CRUZ BUENO (OAB RS075367)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/07/2024, às 00:00, a 10/07/2024, às 16:00, na sequência 64, disponibilizada no DE de 24/06/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO VIA CENTRAL ESPECIALIZADA DE ANÁLISE DE BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



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