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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO RURAL. BOIA-FRIA. FALTA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMA 629. TRF4. 5002753-31.2021.4.04.9999

Data da publicação: 18/04/2024, 07:01:06

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO RURAL. BOIA-FRIA. FALTA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMA 629. 1.Havendo demanda anterior que apreciou parte do período rural postulado, impõe-se o reconhecimento da coisa julgada parcial. 2. A aposentadoria por idade híbrida é uma subespécie da aposentadoria por idade rural. A partir da vigência da Lei 11.718/2008, com o acréscimo do § 3º no art. 48 da Lei 8.213/1991, ao trabalhador rural que tenha desempenhado atividade urbana por período inferior à carência para concessão de aposentadoria por idade urbana, foi permitido o cômputo para fins de carência tanto das contribuições vertidas em atividade urbana quanto do período em que exerceu atividades rurais sem contribuições diretas ao sistema. 3. Acerca do reconhecimento de tempo de serviço rural, o art. 55, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 13.846/2019, exige a apresentação de início de prova material, o qual não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. 4. Ainda que se possa abrandar a exigência de início de prova material em favor dos trabalhadores rurais chamados boias-frias, de qualquer forma para o reconhecimento de tempo rural faz-se necessária a presença de algum registro escrito contemporâneo ao exercício da atividade. 5. Ante a ausência de início de prova material do trabalho rural da autora, aplicável o Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça, em que firmada a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz para instruir o pedido implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários. (TRF4, AC 5002753-31.2021.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 10/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002753-31.2021.4.04.9999/PR

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: NEIDE COVRE FABRIN

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente o pedido, nos seguintes termos (evento 140, SENT1):

Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para o fim de CONDENAR o INSS a averbar o trabalho rural e a conceder em favor da autora o benefício de aposentadoria por idade híbrida, nos termos do §3º do art. 48 da Lei 8.213/91, bem como a lhe pagar as parcelas devidas mensalmente, a partir da data da DER (13.12.2016, seq. 1.11), acrescidas as parcelas vencidas de atualização monetária a partir do respectivo vencimento e juros a partir da citação, nos termos da Súmula n. 3 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região[3] e Súmula n. 204 do Superior Tribunal de Justiça[4], observando-se a prescrição quinquenal que antecede o ajuizamento da ação.

(...) Por conseguinte, CONDENO o INSS ao pagamento integral das custas judiciais, despesas processuais e honorários advocatícios, que serão arbitrados após a liquidação da sentença, conforme art. 85, § 4º, inciso II, do CPC.

Apela o INSS aduzindo, em síntese, que no período em que a autora pede reconhecimento de tempo rural (entre 01/06/2007 e 31/12/2009), o seu marido laborava em atividade urbana. Argumenta que "a autora e sua família migraram para a cidade há décadas, não tendo nenhuma razoabilidade a tese autoral, acolhida pelo Juízo a quo, de que a ora recorrida voltou a exercer labor rural nos anos de 2008/2009, quando já contava com idade avançada de 59/60 anos de idade". Por fim, requer a reforma da sentença e a improcedência do pedido (evento 145, PET1).

Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de Admissibilidade

O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.

Mérito

Aposentadoria por Idade Híbrida

O Regime Geral de Previdência Social Brasileiro, a partir da Lei 8.213/91 (cumprindo a nova ordem constitucional de 1988), prevê a possibilidade de concessão de duas espécies de aposentadoria por idade: a aposentadoria por idade urbana e a aposentadoria por idade rural.

Para concessão de aposentadoria por idade urbana (após a EC 103/2019 - nomeada aposentadoria voluntário por idade), a Lei 8.213/91 (artigo 48, caput) exige (a) idade [65 anos para homens e 60 anos para mulher, observada ainda a ampliação na idade conforme regra de transição da EC 103/2019, art. 18, § 1º] e (b) carência [contribuições vertidas ao sistema de previdência durante 180 meses] ou tempo mínimo de 15 anos/20 anos de contribuição como referido na EC 103/2019.

A concessão de aposentadoria por idade rural, pressupõe (art. 48, § 1º, Lei 8.213/2001) (a) idade [60 anos para homens e 55 anos para mulher] e (b) atividade desenvolvida exclusivamente como trabalhador rural [como segurado especial, empregado rural ou contribuinte individual rural], exigindo-se, tal qual para a aposentadoria por idade urbana anterior à EC 103/2019, período de carência de 180 meses, observada também a tabela do art. 142 da Lei 8213/1991. Para esta espécie de aposentadoria a carência deve ser cumprida no período imediatamente anterior ao preenchimento do requisito etário ou imediatamente anterior à DER.

A exigência do preenchimento do requisito carência imediatamente antes da idade/DER decorre de expressa previsão do § 2º do art. 48 da Lei 8.213/1991, assim como da lógica do sistema. A aposentadoria com redução etária [de no mínimo cinco anos] visa proteger o trabalhador rural que, em razão da idade, perde o vigor físico, dificultando a realização das atividades habituais que garantem a sua subsistência. Não se pode perder de vista, igualmente, que a benesse ao segurado especial [ausência de contribuição mensal] foi concebida pelo constituinte originário fulcrada na dificuldade de essa gama de segurados efetuarem contribuições diretas ao sistema, e, especialmente, na importância social e econômica da permanência desses trabalhadores no campo, não se podendo valer dessa regra especial quem frustrou o objetivo da norma constitucional e abandonou as atividades agrícolas no auge do potencial produtivo e passou exercer atividades urbanas (que exigem contribuições diretas ao sistema).

Por fim, com a vigência da Lei 11.718/2008, foi normatizada a concessão de aposentadoria por idade híbrida, que não é uma terceira espécie de benefício, mas sim subespécie da aposentadoria por idade rural, com o acréscimo do § 3º no art. 48 da Lei 8.213/1991:

§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.

Vê-se que o legislador, ao ampliar a cobertura securitária através da Lei 11.718/2008, referiu-se ao trabalhador rural que tenha desempenhado atividade urbana por período inferior à carência para concessão de aposentadoria por idade urbana, permitindo o cômputo para fins de carência tanto das contribuições vertidas em atividade urbana quanto do período em que exerceu atividades rurais sem contribuições diretas ao sistema.

Nesse passo, andou bem o legislador ao garantir proteção securitária ao trabalhador que, apesar da vocação agrícola, passa a exercer atividades urbanas, porém, com a perda da competitividade [seja decorrente da redução do vigor físico, seja por avanços tecnológicos ou ausência de instrução], vê-se compelido à retomada de atividades rurais para garantir a sua subsistência. Não fosse essa regra [cômputo do período laborado em atividade urbana para fins de carência], ficariam esses trabalhadores desprotegidos pelo seguro social durante a velhice, apesar de terem vertido contribuições diretas ao sistema por período razoável e também terem exercido atividades rurais no final de sua vida produtiva, implicando afronta ao princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais.

Pode-se denominar o benefício nos moldes acima referidos como aposentadoria por idade híbrida típica, por ser a extraída da leitura do § 3º do art. 48 da Lei 8.213/1991, pelo método de interpretação gramatical.

Por consequência, tendo em vista tratar-se de previsão legal de subespécie de aposentadoria por idade rural, a interpretação das normas atinentes à espécie impõe que o período de carência seja observado sob os mesmos critérios da aposentadoria por idade rural, ou seja, no período imediatamente anterior ao requisito etário ou à DER.

Do Tempo de Serviço Rural

Acerca do reconhecimento de tempo de serviço rural, o art. 55, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 13.846/2019, exige a apresentação de início de prova material (documental):

Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:

[...]

§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.

§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

A jurisprudência a respeito da matéria encontra-se pacificada, retratada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, que possui o seguinte enunciado: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de benefício previdenciário.

O reconhecimento do tempo de serviço rural exercido em regime de economia familiar aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da Lei 8.213/1991 (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU 10/11/2003).

A relação de documentos referida no art. 106 da Lei 8.213/1991 para comprovação do tempo rural é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar, em conformidade com o teor da Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental." (DJU, Seção 2, de 02/02/2006, p. 524).

Ainda sobre a extensão do início de prova material em nome de membro do mesmo grupo familiar, “o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar”, mas, “em exceção à regra geral (...) a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana” (Temas nº 532 e 533, respectivamente, do Superior Tribunal de Justiça, de 19/12/2012).

O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011; TRF4, EINF 0016396-93.2011.4.04.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).

No mesmo sentido, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".

De ressaltar que a ausência de notas fiscais de comercialização de gêneros agrícolas não impede o reconhecimento de atividade rural como segurado especial, não apenas porque a exigência de comercialização dos produtos não consta da legislação de regência, mas também porque, num sistema de produção voltado para a subsistência, é normal que a venda de eventuais excedentes aconteça de maneira informal (TRF4, 3ª Seção, EIAC 199804010247674, DJU 28/01/2004, p. 220).

Do Caso Concreto

Os pontos controvertidos cingem-se ao reconhecimento do tempo rural no intervalo de 01/06/2007 a 31/12/2009 e ao direito à concessão de aposentadoria por idade híbrida.

O INSS reconhece que a autora trabalhou para ANNA ESTEVES DOS REIS, entre 01/03/2006 e 05/07/2007, perfazendo 01 anos, 04 meses e 05 dias de trabalho urbano e completando 17 meses de carência (evento 1, OUT17, p.24).

Oportuno observar que a parte autora já obteve judicialmente o reconhecimento de labor rural no período de 20/06/1970 até 22/01/1982, conforme sentença prolatada nos autos do processo n.º 2009.70.51.006348-7, confirmada pela Turma Recursal (​evento 1, OUT15​ ,evento 1, OUT16) e transitada em julgado em 28/09/2010:

Fixadas estas premissas, no caso dos autos, verifica-se que a parte autora completou 55 anos de idade em 11/02/2004. Portanto, na época do requerimento administrativo (DER – 30/01/2008), já atendia ao primeiro requisito exigido por lei, o etário, sendo-lhe exigida a comprovação nos 138 meses imediatamente anteriores à data em que preenchido o requisito etário (2004), nos termos do disposto no artigo 142 da LBP, ou nos 162 meses anteriores à data em que entrou com o requerimento administrativo (2008).

(...) Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, tão-somente para o fim de determinar que o INSS proceda à averbação, em favor do autor, de 11 anos, 7 meses e 3 dias, como tempo de serviço rural, correspondente ao período de 20/06/1970 a 22/01/1982 (28/09/2010 10:18 TRÂNSITO EM JULGADO)

Como se percebe, a pretensão ao reconhecimento do exercício de atividade rural até o ano de 2008 já foi submetida ao Poder Judiciário, não sendo possível nova apreciação.

É dizer, há coisa julgada parcial no caso, que impede a análise do direito ao reconhecimento do exercício de atividade rural no intervalo anterior a 30/01/2008, data do primeiro requerimento administrativo.

Assim, passo à apreciação do pedido de reconhecimento de tempo rural entre 31/01/2008 e 31/12/2009.

O juízo a quo julgou procedentes os pedidos da parte autora pelas razões abaixo colacionadas (evento 140, SENT1):

(...) No caso em questão, a parte autora completou a idade mínima legalmente exigida para aposentadoria por idade híbrida (60 anos) em 12.02.2009, vez que nasceu em 12.02.1949 (seq. 1.4, fotocópia do RG).

Se ela completou 60 anos em 2009, deveria comprovar que trabalhou em atividade rurícola e urbana pelo período de 180 meses quando da DER, nos termos do artigo 142 da Lei 8.213/91.

Os documentos juntados com a inicial nas seqs. 1.12 constituem indícios de que a autora, antes de iniciar labor urbano, desenvolveu atividades rurais durante sua vida produtiva.

Tal constatação é consentânea com os depoimentos colhidos em audiência. As testemunhas foram categóricas ao confirmarem que a autora desenvolveu atividades rurais durante a maior parte da sua vida produtiva.

Em relação ao período urbano, a CTPS e guias de contribuição juntadas nas seqs. 1.8 demonstram que a autora passou a trabalhar em atividade urbana a partir de 2006, situação que perdurou até pelo menos a DER.

Portanto, a parte autora atende aos requisitos do §3º do art. 48 da Lei 8213/91, suficientes para a obtenção do benefício que almeja, pois soma aos períodos de contribuição o labor rural sem registro

Para comprovar o exercício de atividade rural no período em debate, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais cito:

a) Certidão de casamento, ocorrido em 20/06/1970, na qual o marido foi qualificado como lavrador e a autora como doméstica (evento 1, OUT7);

b) Carteira de Trabalho da autora, indicando vínculo de labor urbano entre 01/03/2006 e 05/07/2007, no cargo de serviços gerais rurais (evento 1, OUT8).

Em depoimento pessoal, a autora ratificou que, desde 2007 até 2009, trabalhou como boia-fria sem registro; os donos das fazendas levavam os boias-frias nos seus 'caminhõezinhos' para trabalhar. O marido trabalhou como pedreiro desde que foram para a cidade. Afirmou, ainda, que nunca trabalhou na cidade (evento 41, VIDEO2).

A testemunha MARCOS FERNANDO TOMAELLI afirmou que conhece a autora há uns dez, doze anos. A autora trabalhava como boia-fria lá por 2006 até 2009/2010. Trabalhou com a autora, com produtor. Narra que a autora trabalhou no seu sítio, carpia soja, catava milho; e como diarista, não sabe se a autora trabalhava em outra atividade nesse período (evento 41, VIDEO3).

Por sua vez, LINO LONGHI relatou que conheceu a autora em 2007 e que esta lhe prestou serviços como boia-fria. A autora parou de trabalhar no local em 2010. Não sabe se a autora teve outra atividade além da relatada (evento 41, VIDEO4).

Quanto ao trabalhador boia-fria

No julgamento do Tema 554, o Superior Tribunal de Justiça, fixou a seguinte tese:

Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

Ainda que se possa abrandar a exigência de início de prova material em favor dos trabalhadores rurais chamados boias-frias, de qualquer forma para a concessão da aposentadoria por idade híbrida, faz-se necessária a presença de algum registro escrito contemporâneo ao período de carência. Não foi o que se viu no processo.

Como visto, a fim de comprovar o labor rural a parte autora limitou-se a juntar aos autos a certidão de casamento, celebrado no ano de 1970, e cópia da CTPS, comprovando o tempo de atividade como trabalhadora rural empregada (de 01/03/2006 até 05/07/2007).

Não há documentos contemporâneos. Sequer existe a anotação de outros contratos de trabalho como empregada ou trabalhadora rural, a indicar a possível continuidade do labor rural na condição de boia-fria após o vínculo. Ainda, é certo que a família reside na cidade e que o esposo há muito exercia atividades urbanas.

Assim, conforme precedente abaixo colacionado, não há como reconhecer a atividade rural exercida no período de carência, ante a ausência de início de prova material suficiente para corroborar a prova testemunhal:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO DE SERVIÇO COMO BOIA-FRIA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMA 629 DO STJ. EXTINÇÃO DO FEITO SEM EXAME DO MÉRITO. INCIDÊNCIA. 1. Com o advento da Lei 11.718/08, a legislação previdenciária passou a dispor que os trabalhadores rurais que não consigam comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência da aposentadoria por idade, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher (Lei 8.213/91, art. 48, § 3º, com a redação dada pela Lei 11.718, de 2008). 2. Acerca do reconhecimento de tempo de serviço rural, o art. 55, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 13.846/2019, exige a apresentação de início de prova material, o qual não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental. 3. Em se tratando de trabalhador boia-fria, embora a aplicação da Súmula 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário) deva ser feita com parcimônia, em face das dificuldades probatórias inerentes à atividade dessa classe de segurado especial, na hipótese, os documentos apresentados não constituem início de prova material suficiente para, em conjunto com a prova testemunhal, comprovar o exercício da atividade rural no período de carência. 4. Incidência do Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça: A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 5. Sentença reformada para, de ofício, extinguir o feito sem resolução do mérito, forte no artigo 485, IV, do CPC. (TRF4, AC 5022436-54.2021.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator ANA CRISTINA FERRO BLASI, juntado aos autos em 12/07/2023)

Ante a ausência de início de prova material do trabalho rural, aplica-se a tese firmada no Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça, de que a ausência de conteúdo probatório eficaz para instruir o pedido implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem a resolução do mérito e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.

Desta forma, há que se acolher, em parte, a pretensão recursal ora analisada, a fim de reformar a sentença para julgar extinto o feito, sem resolução de mérito, no que concerne ao intervalo posterior a 31/01/2008, aplicando-se a tese firmada no Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça.

Ausente, por conseguinte, o direito ao benefício.

Honorários Sucumbenciais

Modificada a solução da lide, pagará a parte autora honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade por força da justiça gratuita deferida.

Prequestionamento

No que concerne ao prequestionamento, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.

Conclusão

Reconhecida de ofício a coisa julgada parcial no que tange ao período rural anterior a 31/01/2008.

Dado provimento parcial ao recurso do INSS, para:

a) julgar extinto o processo sem resolução do mérito no que concerne ao período rural posterior a 31/01/2008, de acordo com o Tema 629 do STJ;

b) julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade híbrida.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004372981v41 e do código CRC cbd24bd2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Data e Hora: 24/3/2024, às 18:53:9


5002753-31.2021.4.04.9999
40004372981.V41


Conferência de autenticidade emitida em 18/04/2024 04:01:05.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002753-31.2021.4.04.9999/PR

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: NEIDE COVRE FABRIN

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO RURAL. BOIA-FRIA. FALTA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMA 629.

1.Havendo demanda anterior que apreciou parte do período rural postulado, impõe-se o reconhecimento da coisa julgada parcial.

2. A aposentadoria por idade híbrida é uma subespécie da aposentadoria por idade rural. A partir da vigência da Lei 11.718/2008, com o acréscimo do § 3º no art. 48 da Lei 8.213/1991, ao trabalhador rural que tenha desempenhado atividade urbana por período inferior à carência para concessão de aposentadoria por idade urbana, foi permitido o cômputo para fins de carência tanto das contribuições vertidas em atividade urbana quanto do período em que exerceu atividades rurais sem contribuições diretas ao sistema.

3. Acerca do reconhecimento de tempo de serviço rural, o art. 55, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 13.846/2019, exige a apresentação de início de prova material, o qual não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados.

4. Ainda que se possa abrandar a exigência de início de prova material em favor dos trabalhadores rurais chamados boias-frias, de qualquer forma para o reconhecimento de tempo rural faz-se necessária a presença de algum registro escrito contemporâneo ao exercício da atividade.

5. Ante a ausência de início de prova material do trabalho rural da autora, aplicável o Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça, em que firmada a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz para instruir o pedido implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 10 de abril de 2024.



Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004372982v5 e do código CRC 68ebba86.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 10/4/2024, às 18:21:6


5002753-31.2021.4.04.9999
40004372982 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 18/04/2024 04:01:05.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/04/2024 A 10/04/2024

Apelação Cível Nº 5002753-31.2021.4.04.9999/PR

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: NEIDE COVRE FABRIN

ADVOGADO(A): ALEXANDRE TEIXEIRA (OAB PR044280)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/04/2024, às 00:00, a 10/04/2024, às 16:00, na sequência 699, disponibilizada no DE de 20/03/2024.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



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