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PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. SÚMULA 343 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. APLICABILIDADE. DESAPOSENTAÇÃO. TEMA 503 DA REPERCUSSÃO GERAL N...

Data da publicação: 07/07/2020, 05:43:44

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. SÚMULA 343 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. APLICABILIDADE. DESAPOSENTAÇÃO. TEMA 503 DA REPERCUSSÃO GERAL NO STF. SENTENÇA PROFERIDA EM DESACORDO COM O PRECEDENTE. PROCEDÊNCIA PARCIAL. EFEITOS EX TUNC. RESTRIÇÃO. PRESTAÇÕES RECEBIDAS POR FORÇA DE DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. A Corte Especial deste Regional, interpretando o julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 590.809/RS, compreendeu que a superveniente alteração da jurisprudência do STF não autoriza a rescisão de decisão judicial proferida à luz do anterior posicionamento da Corte, hipótese em que aplicável a Súmula 343 do STF. De outra parte, inexistindo posição do Supremo Tribunal sobre a questão constitucional debatida, é admissível a ação rescisória (TRF4 5027168-83.2013.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 16/11/2017). 2. Como à época da decisão rescindenda não havia posição firme e uniforme do Supremo Tribunal Federal acerca da desaposentação, é inaplicável a Súmula 343 do STF, admitindo-se, portanto, a rescisória. 3. No julgamento do RE 661.256/DF (Tema 503 da repercussão geral), finalizado na sessão de 27.10.2016, o STF reconheceu não existir direito dos segurados do RGPS à desaposentação. 4. Tendo a decisão rescindenda se fundado em interpretação da lei tida pelo STF como incompatível com a Constituição, tem lugar a rescisão do julgado. 5. Considerando o caráter alimentar do benefício e a boa-fé do segurado, a eficácia ex tunc da rescisão deve ser restringida de modo a não atingir as prestações efetivamente recebidas por força da decisão judicial transitada em julgado. 6. Ação rescisória julgada parcialmente procedente. (TRF4, ARS 5029546-36.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 26/06/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Ação Rescisória (Seção) Nº 5029546-36.2018.4.04.0000/

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RÉU: IVO MICHAILEV

RELATÓRIO

Trata-se de ação rescisória proposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social em face de Ivo Michailev visando à desconstituição do acórdão prolatado pela Sexta Turma deste Tribunal nos autos do processo 0015821-32.2009.404.7000.

A decisão rescindenda reconheceu o direito do segurado à desaposentação com efeitos ex tunc (com a devolução de valores recebidos).

Na presente rescisória, fundada no art. 966, V, do CPC/15, o INSS busca a desconstituição do julgado sustentando, preambularmente, que não se aplica a Súmula 343 do STF, e, quanto à questão de fundo, que a decisão rescindenda, ao reconhecer o direito à desaposentação, violou manifestamente o disposto no art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91, e o previsto nos arts. 5º, XXXVI, 194 e 195, da CF/88, os quais estabelecem, respectivamente, a proteção sobre o ato jurídico perfeito e o princípio da solidariedade na Previdência Social. Em rejulgamento, postula a improcedência da pretensão à desaposentação.

Citado, o réu apresentou contestação sustentando, em síntese, que ou o TRF/4ª Região é incompetente para o processo e julgamento da ação rescisória ou, se for o órgão competente, a demanda teria de ser considerada intempestiva, porque o capítulo impugnado foi publicado em 03.12.2010, formando coisa julgada muitos anos antes da propositura da presente rescisória. Ainda, argumentou o réu que a ação rescisória é desnecessária, pois considera o acórdão rescindendo praticamente inexequível: ainda que dispusesse do valor para devolver aos cofres da Previdência, não lhe seria vantajosa a desaposentação.

Em vista do desinteresse do réu quanto à execução do acórdão rescindendo, o INSS propôs que, se o réu reconhecesse a procedência do pedido rescisório, a autarquia renunciaria aos honorários de sucumbência, e o feito seria extinto com resolução de mérito (art. 487, III, a, do CPC/15).

O réu, com vista, aceitou a proposta.

A Procuradoria Regional da República da 4ª Região manifestou-se pela homologação do acordo.

É o relatório.

Peço a inclusão em pauta.

VOTO

Competência do TRF/4ª Região

Embora o último acórdão de mérito tenha sido prolatado pelo Superior Tribunal de Justiça, cabe destacar que o capítulo objeto de desconstituição na presente ação rescisória (direito à desaposentação) não foi impugnado no recurso especial. Com efeito, a questão decidida pelo STJ dizia respeito unicamente à necessidade ou não de devolução das prestações percebidas do primeiro benefício.

Portanto, este Regional é competente para o processo e julgamento da ação rescisória.

Tempestividade da ação

A tese da intempestividade da rescisória, levantada pelo réu em contestação, funda-se na coisa julgada progressiva.

O fenômeno da coisa julgada progressiva (ou parcial) tem íntima relação com a teoria dos capítulos da sentença, pela qual a decisão é decomponível em partes autônomas, representadas pela solução de cada questão objeto da prestação jurisdicional. Nesse sentido, o trânsito em julgado dar-se-ia em relação a cada item não impugnado por meio de recurso, e a coisa julgada, então, se formaria progressivamente.

A questão não é pacífica entre os Tribunais Superiores.

Embora a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, em matéria processual civil, já tenha admitido a formação progressiva da coisa julgada, com contagem autônoma do prazo para a propositura de ação rescisória (RE 666.589, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 25/03/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-106 DIVULG 02-06-2014 PUBLIC 03-06-2014), o Superior Tribunal de Justiça assentou seu entendimento sobre a questão envolvendo o início do prazo para a ação rescisória, no ano de 2009, por meio da edição da Súmula 401: 'O prazo da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial'.

Como alertam Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha (Curso de Direito Processual Civil: Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e Processo nos Tribunais. v. 3. 13ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 460), nem o Código de Processo Civil de 2015, apesar de encampar a teoria dos capítulos de sentença, foi capaz de adotar postura indubitável em relação ao início do prazo para a ação rescisória. Com efeito, dispõe o art. 975: "O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo". Como se pode notar, ainda permanece a dúvida sobre se o início do prazo conta-se da última decisão sobre a questão no processo ou se da última decisão (entre todas as outras decisões) proferida no processo.

Diante disso, sobretudo quando a decisão rescindenda foi proferida durante a vigência do CPC/73, deve-se adotar a interpretação que mais prestigia a segurança jurídica das partes, que é a consubstanciada no verbete da Súmula 401 do STJ.

No caso, o trânsito em julgado da última decisão proferida no processo operou-se em 19.04.2018, e a presente a ação foi proposta em 02.08.2018, dentro, portanto, do prazo legal.

Assim, não assiste razão ao réu.

Reconhecimento da procedência do pedido e transação em ação rescisória

Mesmo que o réu reconheça a procedência do pedido, não há permissão no ordenamento para se homologar transação acerca da existência de vício rescisório em sentença judicial. No máximo, porque dentro do campo de disponibilidade das partes, estas poderiam transacionar sobre os efeitos da decisão rescindenda, porém não sobre a sua validade ou rescindibilidade.

Por essa razão, deixo de homologar a transação entre as partes.

Súmula 343 do STF

O Supremo Tribunal Federal editou, ainda na década de 60 (a aprovação ocorreu na Sessão Plenária de 13 de dezembro de 1963), a Súmula 343, cujo teor é o seguinte:

Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.

O referido enunciado teve sua interpretação restringida (ou conformada constitucionalmente) pelo STF nos Embargos Declaratórios no Recurso Extraordinário 328.812-1, Rel. Ministro Gilmar Mendes, julgados em 06 de março de 2008.

Nessa importante assentada, levando em conta, entre outros valiosos argumentos, a força normativa da Constituição e a máxima efetividade de suas normas (da Constituição), consignou-se que "cabe ação rescisória por ofensa à literal disposição constitucional, ainda que a decisão rescindenda tenha se baseado em interpretação controvertida ou seja anterior à orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal".

Passou-se a admitir, então, o manejo de ações rescisórias quando as decisões se mostrassem contrárias à orientação do Pretório Excelso, entendimento esse que já era consagrado no âmbito deste Tribunal Regional, que, ainda no ano de 2002, editou a Súmula 63, verbis:

Não é aplicável a súmula 343 do Supremo Tribunal Federal nas ações rescisórias versando matéria constitucional.

Essa orientação - vertida, conforme visto, tanto nos Embargos Declaratórios no Recurso Extraordinário 328.812-1 quanto na Súmula 63 desta Corte - está sendo revista pelo próprio Supremo Tribunal Federal, revisão essa que teve início, ao que tudo indica, quando do julgamento do Recurso Extraordinário 590.809/RS, de 22 de outubro de 2014. Constou da ementa o quanto segue:

AÇÃO RESCISÓRIA VERSUS UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. O Direito possui princípios, institutos, expressões e vocábulos com sentido próprio, não cabendo colar a sinonímia às expressões "ação rescisória" e "uniformização da jurisprudência". AÇÃO RESCISÓRIA - VERBETE Nº 343 DA SÚMULA DO SUPREMO. O Verbete nº 343 da Súmula do Supremo deve de ser observado em situação jurídica na qual, inexistente controle concentrado de constitucionalidade, haja entendimentos diversos sobre o alcance da norma, mormente quando o Supremo tenha sinalizado, num primeiro passo, óptica coincidente com a revelada na decisão rescindenda. (STF, RE 590809, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 22/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL, grifei)

A partir de então, e muito embora, verdade seja dita, exista ainda certa controvérsia no âmbito do próprio Supremo Tribunal Federal acerca da exata extensão da tese estabelecida em repercussão geral - o mesmo é dizer: se aplicável apenas à alteração de posicionamento da Corte Suprema ou a toda controvérsia jurisprudencial -, o fato é que, inegavelmente, restou superado, ainda que parcialmente, aquilo que havia sido decidido nos Embargos Declaratórios no Recurso Extraordinário 328.812-1, não mais se revelando a questão constitucional óbice para a aplicação da Súmula 343 (sobre a controvérsia, conferir os seguintes julgados: STF, AR 1415 AgR-segundo, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 09/04/2015; AR 2236 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 09/04/2015; AR 2370 AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 22/10/2015).

No âmbito deste Tribunal Regional, a Corte Especial, recentemente, teve a oportunidade de debater a interpretação do julgamento do Supremo Tribunal Federal no RE 590.809/RS. Na sessão de 26.10.2017, ao julgar ação rescisória envolvendo o tema da desaposentação, por maioria de votos, o Colegiado do Regional compreendeu que o STF, na reinterpretação da extensão do enunciado da Súmula 343, estabelecera ser incabível a ação rescisória quando a decisão rescindenda tivesse sido prolatada de acordo com então firme posicionamento da Corte Suprema sobre questão constitucional, ainda que houvesse posterior alteração desse entendimento. Vale dizer: a superveniente alteração da jurisprudência do STF - que pressupõe, portanto, existência de um firme posicionamento sobre determinado tema constitucional - não autoriza a rescisão de decisão judicial proferida à luz do anterior posicionamento da Corte. Ao lado disso, e a contrario sensu, afirmou-se que, se, ao tempo da decisão rescindenda, inexistir posição do Supremo Tribunal Federal sobre a questão constitucional debatida, fica aberto o caminho para o manejo da ação rescisória. Cito, por oportuno, a ementa do julgado:

PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. DESAPOSENTAÇÃO. SÚMULA 343 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INAPLICABILIDADE.

1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 590.809/RS, assentou que a superveniente alteração de sua jurisprudência não autoriza, por si só, a rescisão de decisão proferida à luz de entendimento daquele Tribunal Superior que à época de sua prolação era firme.

2. O precedente originado do julgamento do RE 590.809/RS não se aplica nas ações rescisórias que visam desconstituir decisões que reconheceram o direito à desaposentação.

3. O Supremo Tribunal Federal não tinha uma posição uniforme e firme no sentido de que os segurados têm direito à desaposentação. Nunca sinalizou, de forma pacífica, óptica nesse sentido, a ser seguida pelos tribunais.

4. No âmbito do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à 'desaposentação', sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91 (RE 661.256/DF, submetido à sistemática de repercussão geral - Tema 503).

(TRF4 5027168-83.2013.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 16/11/2017, grifei)

Inegavelmente, constitui matéria constitucional a possibilidade de desaposentação, tanto que compôs o Tema 503 da repercussão geral no STF. Todavia, a natureza da matéria discutida (se legal ou se constitucional), como se viu, não é mais decisiva para definir a aplicabilidade da Súmula 343, ou seja, para se admitir ou não a ação rescisória.

Cuidando-se de matéria constitucional, a questão, então, é saber se, (a) quando da decisão rescindenda, existia posicionamento firme do Supremo Tribunal Federal no mesmo sentido e a rescisória se funda em posterior alteração da jurisprudência da Corte (hipótese na qual a rescisória não é cabível) ou se (b) simplesmente inexistia posição firme do STF sobre a matéria constitucional à época da decisão rescindenda e a Corte vem a se posicionar pela primeira vez - em sentido contrário ao da decisão rescindenda - de maneira a vincular ou ao menos orientar inequivocamente os demais tribunais (caso em que será cabível a ação rescisória).

Estabelecidas tais premissas, passo a examinar, em breve digressão, o tema da desaposentação na jurisprudência deste TRF4, do STJ e do STF.

Desaposentação na jurisprudência do TRF4, do STJ e do STF

As Turmas integrantes da Terceira Seção desta Corte vinham decidindo ser possível a renúncia ao benefício previdenciário titularizado por beneficiário da Previdência Social para efeitos de averbação desse tempo em regime diverso (AMS nº 2000.71.00.029807-8/RS, 5ª Turma, Rel. Juiz Federal Fernando Quadros da Silva, D.J.U de 02-06-2004; AMS nº 2002.72.00.003367-7/SC, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Rômulo Pizzolatti, D.E. de 18-12-2007) ou, ainda, para fins de requerimento de aposentadoria mais vantajosa no próprio Regime Geral, com o cômputo do tempo laborado após a primeira inativação (AC nº 2004.04.01.004459-5/RS, Turma Suplementar, Rel. Des. Federal Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. de 17-42-2007; REOMS nº 2005.72.06.000435-0/SC, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.J.U de 16-08-2006; AC nº 2005.70.03.004017-6/PR, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, D.J.U de 24-09-2007; 2000.71.00.001821-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Néfi Cordeiro, D.J.U. de 03-09-2003; REOMS nº 2004.71.07.000434-0/RS, Rel. Des. Federal Nylson Paim de Abreu, D.J.U. de 02-03-2005).

Tais julgados fundamentavam-se no entendimento então consolidado na jurisprudência, inclusive no Superior Tribunal de Justiça (REsp 310884/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, D.J. de 26-09-2005; AgRg no REsp nº 497683/PE, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, D.J. de 04-08-2003; RMS nº 14624/RS, 6ª Turma, Rel. Min. Hélio Qualia Barbosa, D.J. de 15-08-2005, entre outros), de que a aposentadoria seria direito patrimonial disponível, passível, portanto, de renúncia.

Na sessão de 8 de maio de 2013, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.334.488/SC, submetido ao regime dos recursos repetitivos (Tema 563), firmou tese na qual, reconhecendo o direito à desaposentação, dispensava os segurados da devolução das prestações recebidas na aposentadoria original:

A pretensão do segurado consiste em renunciar à aposentadoria concedida para computar período contributivo utilizado, conjuntamente com os salários de contribuição da atividade em que permaneceu trabalhando, para a concessão de posterior e nova aposentação. Os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, prescindindo-se da devolução dos valores recebidos da aposentadoria a que o segurado deseja preterir para a concessão de novo e posterior jubilamento. A nova aposentadoria, a ser concedida a contar do ajuizamento da ação, há de computar os salários de contribuição subsequentes à aposentadoria a que se renunciou.

Todavia, o Supremo Tribunal Federal, na sessão de 27 de outubro de 2016, ultimou o julgamento do RE 661.256/DF (Tema 503), em regime de repercussão geral, fixando como acertada a tese contrária à desaposentação. Veja-se:

No âmbito do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à 'desaposentação', sendo constitucional a regra do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91.

Vale destacar que, até a fixação da tese no aludido precedente, a Corte Suprema não tinha posicionamento firme e uniforme (vinculante ou inequivocamente orientador dos tribunais) no sentido de reconhecer aos segurados do RGPS o direito à desaposentação.

Como bem salientou o Des. Federal Rogério Favreto nos debates ocorridos no âmbito da Corte Especial deste Regional por ocasião do julgamento antes citado, "o STF já tinha posição variada sobre a desaposentação, inclusive duas opostas (favorável e contra), tanto que foi afetada à repercussão geral. Aliás, o voto prevalente do Min. Barroso foi uma terceira posição" (TRF4 5027168-83.2013.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 16/11/2017).

Portanto, não se aplica a vedação da Súmula 343 do STF, admitindo-se a presente ação rescisória.

E como a decisão rescindenda foi proferida em desacordo com o que veio a ser firmado pelo Supremo Tribunal Federal, com força de precedente obrigatório, no julgamento do Tema 503 (RE 661.256/DF), a ação rescisória, em juízo rescindente, deve ser julgada procedente, com fundamento no art. 966, V, do CPC/15 (art. 485, V, do CPC/73), para, em juízo rescisório, julgar-se improcedente o pedido de desaposentação.

Restrição da eficácia ex tunc da rescisão

Embora não exista absoluto consenso em torno da maneira como se operam os efeitos da desconstituição na ação rescisória (se ex tunc ou ex nunc), a doutrina majoritária reconhece que a eficácia desconstitutiva da decisão atua, em regra, ex tunc, ou seja, retroativamente, à luz do que dispõe o art. 182 do Código Civil ("Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente") - por todos, DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e Processo nos Tribunais. v 3. Salvador: JusPodivm, 2013, p. 487).

Porém, "as soluções radicais (eficácia ex tunc - eficácia só ex nunc) seduzem pela simplicidade, mas nenhuma delas se mostra capaz de atender satisfatoriamente, em qualquer hipótese, ao jogo de interesses contrapostos" (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil, Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. vol V: arts. 476 a 565. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 208). Nesse sentido, pode ocorrer de alguns atos terem sido praticados de forma irreversível com base na coisa julgada. Há de se conferir proteção a essas situações que se consolidaram sob a confiança depositada pelo jurisdicionado na sentença transitada em julgado. Assim, e nada obstante a eficácia ex tunc da rescisão, é possível a ressalva de atos praticados sob a égide da coisa julgada (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Ação Rescisória: Do Juízo Rescindente ao Juízo Rescisório. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 347).

Salvo hipóteses incomuns, que requerem demonstração inequívoca (como, por exemplo, as que justificam a rescisão pelos incisos III e VI do art. 966 do CPC/15), é inegável a boa-fé do segurado na percepção de prestações de benefício previdenciário concedido por força de decisão judicial transitada em julgado. Supor o contrário implicaria lançar um voto de desconfiança sobre o jurisdicionado que obteve da autoridade judiciária uma declaração de certeza acerca do direito à cobertura previdenciária, o que é de todo inconcebível num Estado que se pretende democrático.

Portanto, no caso, o caráter alimentar do benefício previdenciário e a boa-fé do segurado na percepção da aposentadoria impõem seja limitada a eficácia ex tunc da rescisão no sentido de que não devem ser repetidas as prestações efetivamente recebidas pelo réu por força da sentença rescindenda.

Esse, aliás, é o entendimento da Terceira Seção deste Regional (AR 2003.04.01.058646-6, TERCEIRA SEÇÃO, Relator MARCELO MALUCELLI, D.E. 05/05/2015; TRF4, AR 2002.04.01.057373-0, TERCEIRA SEÇÃO, Relator LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON, D.E. 17/03/2015; AR 0000523-72.2014.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, D.E. 17/03/2015; AR 5001821-48.2013.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 22.02.2018).

Ressalte-se que isso não implica reconhecer o direito de o segurado receber verbas cuja execução tenha sido suspensa por liminar concedida na ação rescisória.

Honorários advocatícios

Condeno o réu ao pagamento, por inteiro, dos honorários de sucumbência, uma vez que o autor sucumbiu em parte mínima do pedido (art. 86, parágrafo único, do CPC/15), fixando-se a verba honorária em 10% sobre o valor atribuído à causa (art. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC/15), cuja inexigibilidade fica suspensa em face da gratuidade da justiça concedida à parte.

Conclusão

Julga-se parcialmente procedente a ação rescisória para, em juízo rescindente, desconstituir a decisão do processo originário e, em juízo rescisório, julgar improcedente o pedido de desaposentação, sem a necessidade de devolução de eventuais prestações efetivamente percebidas pelo réu por força da decisão rescindenda.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por julgar parcialmente procedente a ação rescisória.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001802366v15 e do código CRC ee721592.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 26/6/2020, às 18:50:59


5029546-36.2018.4.04.0000
40001802366.V15


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:43:44.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Ação Rescisória (Seção) Nº 5029546-36.2018.4.04.0000/

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RÉU: IVO MICHAILEV

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. SÚMULA 343 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. APLICABILIDADE. DESAPOSENTAÇÃO. TEMA 503 DA REPERCUSSÃO GERAL NO STF. SENTENÇA PROFERIDA EM DESACORDO COM O PRECEDENTE. PROCEDÊNCIA PARCIAL. EFEITOS EX TUNC. RESTRIÇÃO. PRESTAÇÕES RECEBIDAS POR FORÇA DE DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE.

1. A Corte Especial deste Regional, interpretando o julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 590.809/RS, compreendeu que a superveniente alteração da jurisprudência do STF não autoriza a rescisão de decisão judicial proferida à luz do anterior posicionamento da Corte, hipótese em que aplicável a Súmula 343 do STF. De outra parte, inexistindo posição do Supremo Tribunal sobre a questão constitucional debatida, é admissível a ação rescisória (TRF4 5027168-83.2013.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 16/11/2017).

2. Como à época da decisão rescindenda não havia posição firme e uniforme do Supremo Tribunal Federal acerca da desaposentação, é inaplicável a Súmula 343 do STF, admitindo-se, portanto, a rescisória.

3. No julgamento do RE 661.256/DF (Tema 503 da repercussão geral), finalizado na sessão de 27.10.2016, o STF reconheceu não existir direito dos segurados do RGPS à desaposentação.

4. Tendo a decisão rescindenda se fundado em interpretação da lei tida pelo STF como incompatível com a Constituição, tem lugar a rescisão do julgado.

5. Considerando o caráter alimentar do benefício e a boa-fé do segurado, a eficácia ex tunc da rescisão deve ser restringida de modo a não atingir as prestações efetivamente recebidas por força da decisão judicial transitada em julgado.

6. Ação rescisória julgada parcialmente procedente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, julgar parcialmente procedente a ação rescisória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 24 de junho de 2020.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001802367v3 e do código CRC b8ea9994.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 26/6/2020, às 18:50:59


5029546-36.2018.4.04.0000
40001802367 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:43:44.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 17/06/2020 A 24/06/2020

Ação Rescisória (Seção) Nº 5029546-36.2018.4.04.0000/

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE

PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO

AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RÉU: IVO MICHAILEV

ADVOGADO: JOSE EDUARDO QUINTAS DE MELLO (OAB PR024695)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/06/2020, às 00:00, a 24/06/2020, às 16:00, na sequência 101, disponibilizada no DE de 05/06/2020.

Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 3ª SEÇÃO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PAULO ANDRÉ SAYÃO LOBATO ELY

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:43:44.

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