Apelação Cível Nº 5000344-19.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: JOSUEL CHIMANGOSEVSKI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de embargos de declaração opostos pelo autor contra acórdão proferido por esta Turma Suplementar Regional que restou assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL. NÃO COMPROVAÇÃO DE ATIVIDADE RURAL EM PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. VÍNCULO URBANO. DESCONTINUIDADE DA ATIVIDADE AGRÍCOLA. PRAZO SUPERIOR A 120 DIAS. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO IMPLANTAÇÃO DO QUESITO ETÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL.
1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas.
2. Hipótese em que a parte autora não preencheu os requisitos necessários à concessão da aposentadoria por idade rural, uma vez que exerceu atividade urbana em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, por prazo superior aos 120 dias estabelecidos pelo art. 11, § 9o , III da Lei 8.213/1991 e da Lei n.º 12.873/2013.
3. Impossibilidade de análise da aposentadoria por idade híbrida por ausência de cumprimento do quesito etário.
4. Comprovado o exercício de atividade na qualidade de segurado especial, é de ser averbado o labor rural no período de 01-01-1982 a 31-12-1993 e 01-01-2007 a 15-10-2017.
O embargante alega o erro ou contradição no julgado, porquanto "o fato da parte autora possuir alguns vínculos urbanos dentro do período de carência, de maneira descontínua, não descaracteriza a sua condição de segurado especial, em face das provas produzidas."
Requer sejam os embargos conhecidos e providos.
Vieram os autos conclusos.
VOTO
De fato, no caso concreto, assiste parcial razão ao autor. Não houve erro ou contradição, como afirmado nos embargos. Todavia, há omissão no voto porquanto não analisada a questão da descontinuidade do labor rural no caso concreto. Passo a sanar a referida omissão já alertando que o resultado da decisão não se modifica em que pese a argumentação do autor.
O trecho que segue passa a fazer parte integrante do voto embargado.
No caso em apreço, o INSS reconheceu administrativamente a condição de segurado especial trabalhador rural do autor no período de 31-12-2007 a 18-10-2017 (ev. 2, OUT8) (DER 15-08-2017).
Da análise do CNIS (ev. 2, OUT18), verifica-se que o autor possui vínculo urbanos nos períodos de 01-07-1998 a 03-08-1998, 01-09-1998 a 05-05-2003, 01-04-2004 a 08-10-2004 e 18-08-2005 a 17-08-2006, sendo alguns dentro do período de carência, que se estende de 2002 a 2017.
Com efeito, conforme jurisprudência consolidada, para a concessão de aposentadoria rural por idade (Lei n. 8.213/91, art. 48, §§ 1º e 2º), o trabalhador deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, por tempo equivalente ao da carência, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (STJ, Pet n. 7476, Rel. para o acórdão Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, DJ 29-07-2011; Ag n. 1424137, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 24-04-2012; RESP n. 1264614, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJ 03-08-2011; TRF - 4ª Região, EIAC n. 0010573-75.2010.404.9999, Rel. Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, Terceira Seção, DE 17-08-2011; AR n. 2009.04.00.008358-9, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Terceira Seção, DE 18-06-2010), ressalvando-se, de um lado, por aplicação do art. 102, § 1º, da mesma Lei, a possibilidade de ser considerada como marco inicial da contagem retroativa do período de labor rural a data do implemento da idade necessária, ainda que bastante anterior à do requerimento, ou mesmo datas intermediárias entre esta e aquela, haja vista que, desde então, o segurado já teria o direito de pleitear o benefício, e, de outro, a descontinuidade da prestação laboral, entendida como um período ou períodos não muito longos sem atividade rural (TRF - 4ª Região, EIAC n. 0016359-66.2011.404.9999, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, DE 15-05-2012; TRF - 4ª Região, AC n. 2006.71.99.001397-8, Rel. Des. Federal Celso Kipper, Quinta Turma, DE 26-08-2008). Dentro dessa perspectiva, não tem direito ao benefício o trabalhador que não desempenhou a atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento ou ao cumprimento do requisito etário, ainda que perfaça tempo de atividade equivalente à carência se considerado o trabalho rural desempenhado em épocas pretéritas (STJ, AgRg no RESP n. 1.242.720, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 15-02-2012; AgRg no RESP n. 1.242.430, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJ 09-05-2012; AgRg no RESP n. 1.298.063, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJ 25-04-2012; e, ainda, TRF - 4ª Região, EIAC n. 2004.70.03.002671-0, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. de 28-07-2008).
Se o objetivo da lei fosse permitir que a descontinuidade da atividade agrícola pudesse consistir em um longo período de tempo - muitos anos ou até décadas -, o parágrafo 2º do art. 48 da LBPS não determinaria que o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, mas sim disporia acerca da aposentadoria para os trabalhadores rurais que comprovassem a atividade agrícola exercida a qualquer tempo. A locução "descontinuidade" não pode abarcar as situações em que o segurado deixa de desempenhar a atividade rural por muito tempo.
O argumento da desnecessidade de concomitância dos requisitos aplica-se à aposentadoria por idade urbana, consagrada pelo art. 48, caput, da Lei n. 8.213/91. Afinal, em tal tipo de benefício por idade, fala-se em carência (número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício pretendido) e se leva em conta a quantidade de contribuições vertidas pelo segurado ao sistema (art. 50 da LBPS). É diante dessas características que este Regional e o Superior Tribunal de Justiça vêm admitindo, de forma reiterada, o preenchimento não simultâneo dos requisitos etário e de carência para a concessão de benefício do gênero, haja vista que a condição essencial para o deferimento é o suporte contributivo correspondente, posição que restou consagrada pelo art. 3º, § 1º, da Lei n. 10.666/03. Nesse sentido: STJ, ERESP n. 502420, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Terceira Seção, DJ de 23-05-2005, p. 147; STJ, ERESP n. 551997, Rel. Min. Gilson Dipp, Terceira Seção, DJ de 11-05-2005, p. 162; TRF - 4ª Região, EDAC n. 2003.04.01.000839-2, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, Sexta Turma, DJU de 30-06-2004; TRF - 4ª Região, AC n. 2005.04.01.008807-4, Rel. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona, Quinta Turma, DJU de 13-07-2005; TRF - 4ª Região, AC n. 2004.04.01.017461-2, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, Sexta turma, DJU de 01-12-2004; TRF - 4ª Região, EIAC n. 1999.04.01.007365-2, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, Terceira Seção, DJU de 17-07-2002.
No caso, contudo, da aposentadoria rural por idade, devida independentemente do aporte contributivo (arts. 26, inciso III, e 39, inciso I, ambos da Lei de Benefícios) e garantida com uma idade reduzida, releva justamente a prestação do serviço agrícola no período imediatamente anterior à época da aquisição do direito à aposentação, em número de meses idêntico ao período equivalente à carência. Em situações tais, pretender a concessão do benefício previdenciário sem o preenchimento simultâneo das exigências legais, consistiria, em verdade, na combinação de dois sistemas distintos de outorga de aposentadoria, o que não é possível, porquanto acarretaria um benefício não previsto em lei. Essa, aliás, foi a posição adotada pela Terceira Seção deste Tribunal por ocasião do julgamento dos EIAC n. 2004.70.03.002671-0, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, D.E. de 28-07-2008 e, ainda, dos EIAC n. 2007.71.99.010262-1, Rel. Juiz Federal Alcides Vettorazzi, D.E. de 29-06-2009.
Acerca do exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, cumpre referir o entendimento do STJ, no julgamento do recurso especial repetitivo nº 1.354.908/SP, vinculado ao Tema nº 642, representativo de controvérsia, assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil (REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016. (Grifo nosso)
Assim, restou assentada a tese de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.
Ademais, nas hipóteses em que a ausência de efetivo trabalho rural, por um período considerável, for decorrente do exercício de trabalho urbano, este só pode ser considerado para a concessão da aposentadoria por idade mista (Lei de Benefícios, art. 48, §3º), que exige o implemento da idade de 65 anos, se homem, ou 60 anos, se mulher. O deferimento de aposentadoria rural por idade, em casos de expressiva interrupção da atividade campesina no período equivalente à carência, período no qual houve trabalho urbano, consubstanciaria, na verdade, a concessão da aposentadoria por idade mista com idade reduzida (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), em afronta ao parágrafo terceiro do art. 48, acima mencionado.
De outro lado, se a larga interrupção no trabalho rural consistir em simples e pura inatividade, a não concessão da aposentadoria rural por idade decorrerá justamente do não cumprimento de um dos dois únicos requisitos para a concessão do benefício, a saber, o efetivo exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao implemento da idade (ou do requerimento) em número de meses idêntico à carência.
Há de se lembrar que, em regra, nosso sistema previdenciário tem caráter contributivo (Constituição Federal, art. 201, caput), sendo razoável, no entanto, excepcioná-lo no caso de aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais, dadas as condições de trabalho normalmente desfavoráveis, a depender das condições do solo e das intempéries, e a exigir, muitas vezes, esforço desmedido e jornada estafante, isso sem falar do descaso, em termos de proteção social, a que aqueles foram relegados por décadas, em contraposição à sua relevante contribuição para o desenvolvimento nacional. Entretanto, razoável também que a legislação exija, para o deferimento do benefício - que é garantido, repito, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias e com o implemento de uma idade reduzida - que no período equivalente ao da carência, imediatamente anterior ao cumprimento da idade, haja o efetivo desempenho das lides rurícolas, salvo descontinuidade consistente em curto ou curtos períodos de inatividade ou de trabalho não rural, que não afasta a condição de segurado especial do lavrador (STJ, Primeira Turma, AgRg no Agravo em Recurso Especial n. 167.141/MT, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 25-06-2013). Não vislumbro, portanto, inconstitucionalidade na lei que daquela forma dispôs, nem desvalorização do trabalho rural desempenhado em tempo pretérito, desvinculado e não simultâneo com o período equivalente ao da carência, na mesma medida em que não é desvalorizado, por exemplo, o trabalho (urbano) de um pedreiro autônomo pelo fato de lhe ser recusada a aposentadoria em razão de ausência de recolhimento de contribuições previdenciárias. São dois regimes distintos, com pressupostos e requisitos próprios: neste último (urbano), privilegia-se o recolhimento de contribuições e se exige o cumprimento de uma idade maior; no primeiro (rural), desobriga-se o segurado do recolhimento de contribuições e garante-se a aposentadoria com uma idade reduzida, mas, em contrapartida, exige-se o efetivo exercício de atividade rural em período (equivalente ao da carência) imediatamente anterior à época da aquisição do direito à aposentação.
A respeito do interregno que pode ser considerado como curto período de não exercício do trabalho campesino, para o efeito de não descaracterizar a condição de segurado especial e possibilitar a perfectibilização do período equivalente ao da carência, ficando a interrupção, dessa forma, albergada no conceito de descontinuidade, tenho o entendimento de que deve ser associado, por analogia, ao período de graça estabelecido no art. 15 da Lei de Benefícios, podendo chegar, portanto, conforme as circunstâncias, ao máximo de 38 meses [24+12+2]. Esta exegese, no tocante à utilização do período de graça do art. 15 da Lei de Benefícios como parâmetro de aferição do tempo de descontinuidade permitido, tem ressonância no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, como se observa de recente julgamento da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, § 9º, III, DA LEI 8.213/91 COM A REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 11.718/08. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA NO PERÍODO DE CARÊNCIA. ADOÇÃO, POR ANALOGIA, DOS PRAZOS DO PERÍODO DE GRAÇA. ART. 15 DA LEI 8.213/91. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Os arts. 39, I, e 143 da Lei 8.213/91 dispõem que o trabalhador rural enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social na forma da VII do art. 11 [segurado especial], tem direito a requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
2. A norma previdenciária em vigor à época do ajuizamento da ação, antes do advento da Lei 11.718/08, não especificava, de forma objetiva, quanto tempo de interrupção na atividade rural seria tolerado para efeito da expressão legal "ainda que de forma descontínua".
3. A partir do advento da Lei 11.718/08, a qual incluiu o inciso III do § 9º do art. 11 da Lei 8.213/91, o legislador possibilitou a manutenção da qualidade de segurado especial quando o rurícola deixar de exercer atividade rural por período não superior a cento e vinte dias do ano civil, corridos ou intercalados, correspondentes ao período de entressafra. Todavia, a referida regra, mais gravosa e restritiva de direito, é inaplicável quando o exercício da atividade for anterior à inovação legal.
4. A teor do disposto nos arts. 4º e 5º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro - LINDB, diante da ausência de parâmetros específicos indicados pelo legislador originário, mostra-se mais consentânea com o princípio da razoabilidade a adoção, de forma analógica, da regra previdenciária do art. 15 da Lei 8.213/91, que garante a manutenção da qualidade de segurado, o chamado "período de graça".
5. Demonstrado que a parte recorrente exerceu atividade urbana por período superior a 24 (vinte e quatro) meses no período de carência para a aposentadoria rural por idade, forçosa é a manutenção do acórdão recorrido.
6. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1354939/CE, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/06/2014, DJe 01/07/2014)
Ressalte-se, ainda, que a interpretação acima é plenamente aplicável nas seguintes circunstâncias: a) aos períodos equivalentes à carência compreendidos, total ou parcialmente, em tempo anterior à publicação da Lei n.º 11.718/2008, independentemente de a descontinuidade no trabalho rural consistir em completa inatividade ou decorrer de atividade urbana remunerada; b) aos períodos equivalentes à carência que se seguirem à publicação da aludida lei (total ou parcialmente), quando a descontinuidade no trabalho rural consistir em inatividade.
Tratando-se, porém, (c) de período equivalente à carência que se perfectibilizar sob a égide da Lei n.º 11.718/2008, que acrescentou o parágrafo 9º ao art. 11 da Lei de Benefícios, e da Lei n.º 12.873/2013 (que alterou a redação do seu inciso III), no tocante à porção de tempo posterior a tais leis, quando a descontinuidade for decorrente de atividade urbana remunerada, deve-se ter como norte o estabelecido nas aludidas leis, ou seja, considera-se possível a interrupção no trabalho rural sem descaracterizar a condição de segurado especial se o exercício de atividade remunerada não exceder a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil.
Portanto, ainda que os períodos de labor urbano tenham ocorrido anteriormente à publicação da Lei n.º 11.718/2008, é certo que ultrapassaram o prazo de 36 meses equivalente ao período de graça, não sendo cabível o deferimento da aposentadoria por idade rural pleiteada. Sinale-se que, conforme documentação nos autos, o labor urbano teve início em 1998 e perdurou até meados de 2006.
Desta forma, é de ser sanada a omissão, com inclusão dos trechos supra citados, sem que haja, no entanto, modificação no teor da decisão.
Ante o exposto, voto por conhecer e dar provimento aos embargos de declaração, sem efeitos infringentes.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002258291v3 e do código CRC a1e565d5.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 18/2/2021, às 18:4:40
Conferência de autenticidade emitida em 26/02/2021 04:00:54.
Apelação Cível Nº 5000344-19.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: JOSUEL CHIMANGOSEVSKI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
Acompanho o eminente Relator, apenas ressalvando meu entendimento pessoal quanto à tese adotada em seu substancioso voto, no sentido de que, na vigência da Lei 11.718/2008, é de 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil, o período máximo de interrupção do trabalho rural para que ela seja albergada no "conceito de descontinuidade", de modo a permitir a soma dos meses de atividade rural, para fins de carência.
Registro minha ressalva, mui respeitosamente, nos seguintes termos.
O direito à aposentadoria por idade ao segurado especial está disciplinado pelo art. 39, I, da Lei 8.213/91, na forma seguinte:
Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86 desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, observado o disposto nos arts. 38-A e 38-B desta Lei; ou (sublinhou-se)
A teor do art. 11, § 10, b, da Lei 8.213/91, com a redação da Lei 11.718/2008:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
(omissis)
§ 10. O segurado especial fica excluído dessa categoria:
(omissis)
b) enquadrar-se em qualquer outra categoria de segurado obrigatório do Regime Geral de Previdência Social, ressalvado o disposto nos incisos III, V, VII e VIII do § 9o e no § 12, sem prejuízo do disposto no art. 15; (sublinhou-se)
Depreende-se das disposições normativas acima transcritas que, de um lado, o segurado especial apenas será excluído dessa categoria se exercer atividade atividade de natureza urbana, de modo a se enquadrar em qualquer outra categoria de segurado obrigatório do RGPS, por lapso temporal superior a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil.
De outro lado, como a exclusão da categoria de segurado especial se opera sem prejuízo da aplicação das regras que se encontram no art. 15 da Lei 8.213/91, conclui-se que, vencidos os 120 (cento e vinte) dias e excluído o trabalhador da categoria de segurado especial, inicia-se o cômputo do período de graça, isto é, o período em que o segurado especial mantém a filiação e, portanto, a qualidade de segurado especial perante a previdência social, independentemente do exercício dessa atividade.
Confira-se o art. 15 da Lei 8.213/91, cujas disposições, por expressa determinação legal, se aplicam ao segurado especial que tenha sido excluído dessa categoria:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Outrossim, uma vez que, somente há sentido falar-se em interrupção do trabalho pelo segurado especial com a exclusão do trabalhado dessa categoria, conclui-se que essa exclusão é que faz iniciar a contagem do período de graça e caracteriza o início da descontinuidade do exercício do trabalho na condição de segurado especial.
Por outro lado, se durante os prazos do art. 15 da Lei 8.213/91, "o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social" (art. 15, §4º), enquanto perdurar o período de graça, não é caso de aplicação do entendimento fixado no Tema 642 do STJ (Resp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016), para o efeito de excluir-lhe o direito à aposentadoria por idade rural de que trata o art. 48, § 1º, da Lei 8.213/91.
Dito de outro modo, a exclusão da categoria de segurado especial, quer porque o segurado tenha deixado de exercer a atividade típica, satisfazendo as condições que lhe vinculavam a essa condição, quer porque tenha exercido atividade remunerada em período superior a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil, não implica automática perda da qualidade de segurado (especial).
Insista-se que é a letra da lei que o ressalva.
Enquanto mantida a qualidade de segurado especial (filiação nesta condição), o trabalhador fará jus aos benefícios de que trata o art. 39, desde que comprove o exercício de atividade rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício requerido.
Por outro lado, para fins de concessão de benefício ao segurado especial, o exercício de atividade rural deve-se dar, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido.
A legislação não estabelece limite temporal fechado, rígido ou inflexível de descontinuidade para que se possam somar os períodos de exercício de atividade rural, apenas exigindo que a atividade rural se faça presente no período imediatamente anterior ao requerimento.
No âmbito administrativo, quando se analisa a descontinuidade do trabalho rural, nem mesmo a perda da qualidade de segurado constitui óbice à outorga da aposentadoria por idade. Exige-se apenas que o segurado totalize o número de meses igual ao período de carência exigido para a concessão do benefício e se encontre no exercício da atividade rural, quando do requerimento administrativo.
Com efeito, a Instrução Normativa INSS/PRES nº 77, de 21/07/2015, que estabelece procedimentos e rotinas para agilizar e uniformizar o reconhecimento de direitos dos segurados e beneficiários da Previdência Social do INSS, em seus artigos 157 e 158, dispõe que:
Art. 157. No caso de comprovação de desempenho de atividade urbana entre períodos de atividade rural, com ou sem perda da qualidade de segurado, poderá ser concedido benefício previsto no inciso I do art. 39 e caput e § 2º do art. 48, ambos da Lei nº 8.213,de 1991, desde que cumpra o número de meses de trabalho idêntico à carência relativa ao benefício, exclusivamente em atividade rural.
Art. 158. Para fins de concessão dos benefícios devidos ao trabalhador rural previstos no inciso I do art. 39 e caput § 2º do art. 48 ambos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, considera-se como período de carência o tempo de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, correspondente ao número de meses necessários à concessão do benefício requerido, computados os períodos a que se referem as alíneas "d" e "i" do inciso VIII do art. 42 observando-se que:
I - para a aposentadoria por idade prevista no art. 230 do trabalhador rural empregado, contribuinte individual e especial será apurada mediante a comprovação de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício ou, conforme o caso, no mês em que cumprir o requisito etário, computando-se exclusivamente, o período de natureza rural; e
II - (...)
Parágrafo único. Entendem-se como forma descontínua os períodos intercalados de exercício de atividades rurais, ou urbana e rural, com ou sem a ocorrência da perda da qualidade de segurado, observado o disposto no art. 157. (sublinhou-se)
Como se pode verificar, de acordo com o conjunto normativo que orienta toda a atuação administrativa no âmbito do INSS, inexistem limites temporais para que se possa invocar a cláusula da descontinuidade.
Por essas razões, concessa maxima venia, afigure-se equivocado o pensamento de que a descontinuidade autorizada para a soma dos períodos de atividade rural seja de 120 (cento e vinte) dias, prazo este disposto em lei, que pode ser corrido ou intercalado, durante o qual o segurado especial mantém essa condição, sem que ainda seja necessário invocar o início de período de graça (art. 15 da Lei 8.213/91).
A locução “período imediatamente anterior ao requerimento” deve ser compreendida, portanto, na forma decidida pelo STJ no Tema 642, conjuntamente com os períodos de manutenção da condição de segurado especial, na forma do art. art. 11, § 10, c/c art. 15, ambos da Lei 8.213/91.
Isto é, para que faça jus aos benefícios de que trata o art. 39 da Lei 8.213/91, não se exige que o trabalhar esteja exercendo efetivamente atividade rural, na condição de segurado especial atuante, até a véspera da data de requerimento administrativo ou do implemento das condições para a concessão do benefício pretendido, mas que se encontre filiado, detendo a qualidade de segurado especial, mesmo que se valendo das regras do art. 15 da Lei 8.213/91, que disciplinam os prazos do chamado período de graça.
Em suma, o período de 120 (cento e vinte) dias não pode ser o prazo máximo de descontinuidade do trabalho rural para que se faça possível a soma do tempo anterior e posterior do exercício da atividade rural e tampouco pode ser tomado como limite temporal de manutenção da qualidade de segurado perante a previdência social após a cessação da atividade na categoria de segurado especial. Isso porque nesse período de 120 dias, o trabalho desenvolvido pelo segurado é considerado como realizado na categoria de segurado especial.
Ante ao exposto, voto por ACOMPANHAR o culto Relator, com ressalva de entendimento.
Documento eletrônico assinado por JOSÉ ANTONIO SAVARIS, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002340263v8 e do código CRC 925eb7ae.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5000344-19.2020.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: JOSUEL CHIMANGOSEVSKI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. EXISTÊNCIA DE OMISSÃO. DESCONTINUIDADE DE LABOR RURAL. ULTRAPASSADO PRAZO DO PERÍODO DE GRAÇA. INDEVIDA A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA. SEM EFEITOS INFRINGENTES.
1. Acolhidos os embargos de declaração a fim de acrescer ao voto o trecho que analisa a questão da descontinuidade do labor rural durante o período da carência, sem que haja, no entanto, efeitos infringentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer e dar provimento aos embargos de declaração, sem efeitos infringentes, com ressalva de entendimento do Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de fevereiro de 2021.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002258292v4 e do código CRC 556e1736.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 08/02/2021 A 17/02/2021
Apelação Cível Nº 5000344-19.2020.4.04.9999/SC
INCIDENTE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: JOSUEL CHIMANGOSEVSKI
ADVOGADO: NADIA MARIA VOIGT OLSEN (OAB SC041071)
ADVOGADO: ACACIO PEREIRA NETO (OAB SC026528)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 08/02/2021, às 00:00, a 17/02/2021, às 17:00, na sequência 618, disponibilizada no DE de 27/01/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER E DAR PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, SEM EFEITOS INFRINGENTES, COM RESSALVA DE ENTENDIMENTO DO JUIZ FEDERAL JOSÉ ANTONIO SAVARIS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Voto - GAB. 91 (Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ) - Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS.
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 93 (Des. Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ) - Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ.
Conferência de autenticidade emitida em 26/02/2021 04:00:54.