Apelação Cível Nº 5028947-39.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: DOURIVAL DOS SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pela parte autora (apelação 166) contra sentença, publicada em 18/02/2019, que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos (sent 160):
Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por Dourival dos Santos em desfavor do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. Condeno a parte autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00, na forma do art. 85, § 8º, do CPC. A exigibilidade das despesas processuais e dos honorários advocatícios está suspensa com relação à parte atora, durante o prazo extintivo de 5 (cinco) anos, em face da concessão dos benefícios da Gratuidade da Justiça, nos termos dos arts. 98 a 102 do CPC e da Lei 1.060/1950. Após o trânsito em julgado, arquivem-se com as devidas baixas. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Papanduva (SC), 18 de fevereiro de 2019.
O autor busca, em síntese, reconhecimento do período de atividade rural prestado pelo Recorrente nos períodos de 17/03/1971 à 11/02/1976 e 24/07/1976 à 31/10/1983 e a especialidade das atividades desempenhadas nos períodos de 01/11/1983 a 28/04/1986, 01/07/1986 a 26/07/1989, 01/09/1989 a 03/08/1993, 02/05/1994 a 13/10/1998, 01/10/1999 a 24/07/2000, 01/09/2001 a 12/01/2005, 01/02/2006 a 09/05/2011 e 01/08/2012 a 19/04/2013, com a conversão de especial para comum e o seu aproveitamento na contagem do tempo de serviço, e, assim, determinar a concessão em seu favor do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, com efeitos retroativos e condenação do Recorrido ao pagamento dos proventos vencidos e vincendos com atualização monetária e juros, bem como em honorários advocatícios de 10%.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de recurso interposto pela parte autora no qual busca, em síntese, reconhecimento de atividade rural prestada nos períodos de 17/03/1971 à 11/02/1976 e 24/07/1976 à 31/10/1983 e a especialidade das atividades desempenhadas nos períodos de 01/11/1983 a 28/04/1986, 01/07/1986 a 26/07/1989, 01/09/1989 a 03/08/1993, 02/05/1994 a 13/10/1998, 01/10/1999 a 24/07/2000, 01/09/2001 a 12/01/2005, 01/02/2006 a 09/05/2011 e 01/08/2012 a 19/04/2013, com a conversão de especial para comum e o seu aproveitamento na contagem do tempo de serviço, e, assim, determinar a concessão em seu favor do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, com efeitos retroativos à primeira DER (12/08/13).
Erro material no dispositivo da sentença
Na fundamentação da sentença foram reconhecidos como especiais os períodos postulados, in verbis:
No caso em apreço, a atividade especial controversa cinge-se quanto aos períodos de labor realizados de 01.11.1983 a 28.04.1986, 01.07.1986 a 26.07.1989, 01.09.1989 a 03.08.1993, 02.05.1994 a 13.10.1998, 01.10.1999 a 24.07.2000, 01.09.2001 a 12.01.2005, 01.02.2006 a 09.05.2011 e 01.08.2012 a 19.04.2013. A partir de 06.03.1997, com a vigência do Decreto n. 2.172/1997, que regulamentou a Lei n. 9.528/1997, passou-se a exigir para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, devidamente preenchido pela empresa ou seu preposto com base em laudo técnico de condições ambientais expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. Ressalto que não foram inquiridas testemunhas capazes de confirmar a exposição da autora a agentes nocivos biológicos no período pretendido. Compulsando os autos é possível constatar que a autora juntou documentos que comprovam sua exposição à agentes nocivos no período que pretende ver reconhecido como trabalhado em atividades especiais (PPP). Dos PPP's (fls. 21-35), é possível observar que o autor esteve exposto ao ruído nos períodos ora discutidos. Desse modo, resta claro que a atividade especial é proveniente do contato habitual com agente penoso, ou seja, houve exposição a ruído durante todo o período que pretende comprovar. Cabe salientar que o uso de EPI não descaracteriza o direito ao cômputo do tempo trabalhado em atividades especiais. Após a análise dos documentos, considerando os PPP's, as atividades especiais desenvolvidas pela parte autora nesse período encontam-se devidamente comprovadas, tendo alcançado o montante de 24 anos 1 mês e 5 dias
Porém nada constou a respeito no dispositivo.
O erro material no dispositivo da sentença, inclusive por omissão, pode ser corrigido de ofício, consoante dispõe o art. 494, inciso I, do Código de Processo Civil.
Assim, de ofício, corrige-se o dispositivo da sentença, para reconhecer a parcial procedência do pedido, no que toca à atividade especial nos períodos de 01.11.1983 a 28.04.1986, 01.07.1986 a 26.07.1989, 01.09.1989 a 03.08.1993, 02.05.1994 a 13.10.1998, 01.10.1999 a 24.07.2000, 01.09.2001 a 12.01.2005, 01.02.2006 a 09.05.2011 e 01.08.2012 a 19.04.2013.
Não havendo recurso do INSS, tais períodos restam incontroversos.
Períodos reconhecidos na esfera administrativa
A autora pleiteia o reconhecimento de período de atividade rural entre 17/03/1971 à 11/02/1976, desde a data do primeiro requerimento administrativo, formulado em 12/08/2013.
Quanto a tal período, não cabem maiores digressões.
Num segundo requerimento administrativo, datado de 14/04/2016, tal período rural em regime de economia familiar foi reconhecido pela autarquia, sendo concedido o benefício de aposentadoria por contribuição NB 174.535.915-7 (OUTROS 111/112) ao segurado.
Não há motivo lógico para não considerar tal período rural já na primeira DER.
É certo que a Autarquia tem a possibilidade de rever, em princípio, os atos administrativos que concedem benefício ou reconhecem direito aos segurados, a teor do art. 43 da Lei nº 9.784/99 e do art. 103-A da Lei nº 8.213/91. Todavia, esse poder-dever da Administração encontra limites em normas que protegem a situação jurídica do segurado, a fim de se evitar arbitrariedades.
Ora, tendo a autarquia considerado como tempo de serviço rural o sobredito intervalo, ainda que somente quando do segundo requerimento do benefício, ocorre a coisa julgada adminstrativa, não sendo facultado à Administração desfazer ato de reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de processo administrativo perfeito e acabado, razão pela qual este lapso também será contabilizado no cálculo do benefício deferido a contar da data do primeiro requerimento.
Ausente prova de ilegalidade a justificar a anulação do ato, não tem cabimento o seu desfazimento, baseado meramente na mudança de critério interpretativo ou reavaliação da prova, sob pena de violação da segurança jurídica.
Em caso análogo, já decidiu esta Corte que A existência de "coisa julgada administrativa", decorrente do formal reconhecimento pelo INSS do labor exercido pela parte autora, para fins de tempo de serviço, a partir de documentos válidos e valorados como suficientes à época, impede que se reaprecie a situação, sob pena de violação à natureza jurídica. Mera mudança de interpretação ou de critério de análise de provas por parte da Administração não afeta situação jurídica regularmente constituída.(TRF4 5011307-05.2015.4.04.7205, Quinta Turma, Relatora Juiza Federal Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 16/05/2017).
Ao lado disso, destaco que o cômputo administrativo do período especial postulado no presente feito equivale ao reconhecimento jurídico do pedido, nos termos do art. 487, III, "a", do CPC.
O período rural de 17/03/1971 à 11/02/1976 (04 anos, 10 meses e 25 dias) deve ser computado também na primeira DER, portanto.
Atividade rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
Acresce-se que o cômputo do tempo de serviço rural exercido no período anterior à Lei n.º 8.213/91, em regime de economia familiar e sem o recolhimento das contribuições, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante início de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91, e Súmula 149 do STJ.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Cumpre salientar que, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.
O autor busca o reconhecimento do período rural de 24/07/1976 à 31/10/1983, destacando suficiência das provas materiais e testemunhal.
Relativamente a tal interstício, foram apresentados os seguintes documentos:
- Certidões de nascimento lavradas em 67 onde a mãe declara o nascimento dos 03 filhos, qualificando o pai, Altino dos Santos, como lavrador (outros 7);
- Certidão de nascimento da irmã Deise dos Santos, datada de 08/10/84, onde o pai e qualificado como lavrador (outros 7);
- Declaração e ficha de inscrição do pai, Altino dos Santos, no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Monte Castelo/SC.
- Certidão do INCRA, apontando que o pai foi proprietário de terras em Monte Castelo entre 72 e 91 (out 8);
Entre 14/02/76 e 23/07/76 (quando possuía 17 anos) o autor registra vínculo urbano (SINODA CONSTRUÇÕES S/A).
Por sua vez, a questão que permeia o período de 24/07/1976 à 31/10/1983, - comprovação do retorno ao labor campesino após períodos em atividade urbana - implica questionamentos.
A premissa da continuidade da atividade deve prosperar quando se examina tanto o exercício de atividade urbana, como rural. Neste cenário, o postulado erigido no § único do art. 145 da IN nº 45/2010 merece amparo ao estatuir que "na hipótese de períodos intercalados de exercício de atividade rural e urbana, observado o disposto nos arts. 149 e 216, o requerente deverá apresentar um documento de início de prova material do exercício de atividade rural após cada período de atividade urbana".
Ocorre que, quando há a quebra de continuidade do exercício da atividade rural, a comprovação do exercício de atividade rural constitui ônus da prova da parte autora, o que não ocorreu, conforme adiante se verá. A dificuldade está na percepção de que, embora se tenha certeza do labor rural do segurado na sua infância, pela existência de fato divergente (vínculos urbanos), resta assentada dúvida sobre sua presença posterior no labor rurícola.
Não há como presumir que, um dia após deixar atividades urbanas o autor tenha retornado ao labor campesino, sendo necessário ao menos início material de prova do alegado retorno às atividades agrícolas.
Relativos ao período posterior ao término dos vínculos empregatícios urbanos, o autor não acostou quaisquer elementos materiais em seu nome.
Por mais que se deseje relativizar a necessidade de prova material contemporânea aos períodos em que se deseja comprovar o labor rural, na hipótese não se verifica um só documento que venha em auxílio da tese do autor no que toca ao período.
Assim, reputo insuficientes os elementos de prova acostados aos autos.
Tampouco a prova oral lhe socorre, tendo em vista que apenas confirma a permanência do autor no campo até os 18 anos (nascido em 59, calcula-se até o ano de 77), sendo que uma das testemunhas afirma que ele teria saído para trabalhar numa serraria antes mesmo dessa idade (OUT 98, 100 E 102).
Por outro lado, diante da hipossuficiência da parte autora, seria desarrazoado reconhecer a improcedência do pleito formando a coisa julgada material, haja vista que recente precedente da Corte Especial do STJ, em sede de recurso representativo de controvérsia, mudou o encaminhamento das demandas previdenciárias com ausência ou insuficiência de provas:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido. (REsp 1.352.721/SP, Corte Especial, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, pub. no DJ em 28/04/2016, p. 118).
Saliente-se que, não obstante o caso que foi objeto de análise naquele julgado ser relativo à aposentadoria por idade, a ratio decidendi mostra-se aplicável a todas as hipóteses em que se rejeita a pretensão a benefício previdenciário em decorrência de ausência ou insuficiência de lastro probatório, consoante leciona o eminente Juiz Federal José Antonio Savaris:
"Orientando-se ao encerramento sem o julgamento do mérito, contudo, o juiz se abre ao apelo do bem da vida que se encontra em discussão, distanciando-se da forma processual civil em nome de um valor maior. Resguardando a possibilidade de o indivíduo reunir os elementos de prova necessários e obter finalmente o benefício previdenciário, a homenagem é feita à lógica da preservação da existência humana, à ideia da não preclusão do direito previdenciário. (...) Na extinção do processo sem o julgamento do mérito por falta de provas, há também um importante reconhecimento da insuficiência do poder de cognição do juiz. A decisão final deixa de ser vista como um veredicto imutável para ser melhor compreendida como uma decisão 'nesses termos' ou 'por agora'. É isso o que expressa a decisão que extingue o feito sem julgamento do mérito: primeiro, a possibilidade de que existam provas favoráveis ao autor que não constam dos autos e que poderiam mudar a sua sorte; segundo, a injustiça ou a gravidade de se tornar essa decisão imutável e, assim, negar definitivamente o benefício previdenciário em que pese aquela possibilidade. (...) Com base nesse entendimento [REsp 1352721, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 16.12.2015], deve ser extinto sem jultamento de mérito o processo previdenciário em que a decisão judicial não reconhece o direito ao benefício em razão da ausência ou insuficiência de prova material, pressuposto para a comprovação do tempo de serviço(Direito Processual Previdenciário. Curitiba. 2016: Alteridade, p. 93-94).
Em síntese, a solução que melhor se amolda ao caso é a extinção em parte do feito sem exame do mérito, em relação ao período rural de 24/07/1976 à 31/10/1983, com fulcro no art. 485, inc. IV, NCPC, o que não obsta o ajuizamento de nova ação para renovação do pleito, pelo segurado, mediante apresentação de novas provas, conforme recentemente decidido por este Colegiado, por unanimidade, nos autos da Apelação Cível nº 0011414-31.2014.4.04.9999 (TRF4, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Roger Raupp Rios, julg. em 07/06/2016).
Conclusão quanto ao tempo de atividade especial
O período especial confirmado pelo presente acórdão totaliza 24 anos, 01 mês e 13 dias.
Fator de conversão
Destaco que, quanto ao fator de conversão deve ser observada a relação existente entre os anos de trabalho exigidos para a aposentadoria por tempo de serviço ou de contribuição na data do implemento das condições, e os anos exigidos para a obtenção da aposentadoria especial (15, 20ou 25 anos de tempo de atividade, conforme o caso).
Em se tratando de benefício que a ser deferido a segurado que implementou as condições já na vigência da Lei nº 8.213/91, como sabido, a concessão do benefício depende da comprovação de 35 anos de tempo de serviço ou de contribuição, se homem, e 30 anos, se mulher. Nesse contexto, a relação a ser feita para a obtenção do fator aplicável para a conversão do tempo de serviço especial para comum, quando se trata de enquadramento que justifica a posentadoria aos 25 anos de atividade, é de 25 anos para 35, se homem, e 25anos para 30, se mulher, resultando, assim, num multiplicador de 1,4 paraaquele e 1,2 para esta.
Prestado o serviço sob a égide de legislação que o qualifica como especial, o segurado adquire o direito à consideração como tal até quando possível a conversão. A conversão, todavia, só pode ser disciplinada pela lei vigente à data em que implementados todos os requisitos para a concessão do benefício. Não se pode confundir critério para reconhecimento de especialidade com critério para concessão de benefício, aí incluídas a possibilidade e a sistemática de conversão de tempo especial pretérito.
O Decreto 3.048/99, em seu artigo 70, determina a utilização do fator 1,40 quanto ao homem e 1,20 quanto à mulher para a conversão do tempo especial sob regime de 25 anos, independentemente da data em que desempenhada a atividade.
Do direito do autor no caso concreto
No caso dos autos, temos a seguinte soma:
a) o tempo rural reconhecido na presente decisão (17/03/1971 à 11/02/1976): 04 anos, 10 meses e 25 dias
b) tempo especial reconhecido em sede judicial convertido pelo fator 1,4: 9 anos, 7 meses e 24 dias
c) lapso reconhecido em sede administrativa (evento 2, out 6): 25 anos, 10 meses 05 dias;
TOTAL: 40 ANOS, 04 MESES E 24 DIAS.
Assim, tem-se que o autor, por ocasião do primeiro requerimento administrativo (DER - 12/08/13), contava com 40 anos, 04 meses e 24 dias de tempo de serviço/contribuição.
Nessas condições, tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição na PRIMEIRA DER (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88), assegurada a concessão do benefício mais vantajoso, nos termos da decisão proferida pelo STF no RE 630.501.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício mais vantajoso ao segurado, nos termos do art. 497 do CPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Há notícia dos autos de que a parte obteve administrativamente em 16/06/16, numa segunda DER, o benefício NB 174.535.915-7 (OUTROS 48).
Saliente-se, por oportuno, que, nesse contexto, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Com efeito, a teor da regra inserta no art. 122 da Lei nº 8.213/91, o segurado tem direito à implantação do benefício mais vantajoso, pouco importando o decesso remuneratório ocorrido em data posterior ao implemento das condições legais, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, no julgamento do RE nº 630.501/RS (Relatora Ministra Ellen Gracie, Plenário, DJE 26/08/2013). É que O segurado do regime geral de previdência social tem direito adquirido a benefício calculado de modo mais vantajoso, sob a vigência da mesma lei, consideradas todas as datas em que o direito poderia ter sido exercido, desde quando preenchidos os requisitos para a aposentadoria. (...) O Tribunal garantiu a possibilidade de os segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondessem à maior Renda Mensal Inicial - RMI, consideradas as diversas datas em que o direito poderia ter sido exercido, caso tivessem requerido o benefício em algum momento anterior, desde quando possível a aposentadoria proporcional. Destacou que os efeitos financeiros contariam do desligamento do emprego ou da data de entrada do requerimento, respeitadas a decadência do direito à revisão e a prescrição quanto às prestações vencidas. (Tema nº 334 do STF). Na esteira deste entendimento, restou assentado neste Regional que, Comprovado o tempo de serviço/contribuição suficiente e implementada a carência mínima, é devida a aposentadoria por tempo de contribuição integral na data do requerimento administrativo, ou, ainda, aposentadoria especial, devendo a Autarquia realizar os cálculos e implantar o benefício que resultar mais vantajoso, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do art. 54 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91. (TRF4, APELREEX 5003161-80.2012.404.7107, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 19/12/2014).
Idêntica orientação foi adotada administrativamente pelo INSS, sendo que, segundo o art. 688 da IN/INSS nº 77/2015, Quando, por ocasião da decisão, for identificado que estão satisfeitos os requisitos para mais de um tipo de benefício, cabe ao INSS oferecer ao segurado o direito de opção, mediante a apresentação dos demonstrativos financeiros de cada um deles.ão.
Conclusão
- Extingue-se em parte o feito, sem exame do mérito, com fulcro no art. 485, inc. IV, NCPC, no que toca aos períodos de 24/07/1976 à 31/10/1983;
- Recurso da parte autora parcialmente acolhido para:
a) determinar que a autarquia compute o período rural de 17/03/1971 à 11/02/1976 já na primeira DER (coisa julgada administrativa);
b) de ofício, corrigir dispositivo da sentença para, nos termos da fundamentação do julgado, reconhecer os períodos especiais de 01/11/1983 a 28/04/1986, 01/07/1986 a 26/07/1989, 01/09/1989 a 03/08/1993, 02/05/1994 a 13/10/1998, 01/10/1999 a 24/07/2000, 01/09/2001 a 12/01/2005, 01/02/2006 a 09/05/2011 e 01/08/2012 a 19/04/2013, determinando sejam os mesmos averbados pela autarquia, e a conversão feita pelo fator 1,4;
c) reconhecer que o autor, por ocasião do PRIMEIRO requerimento administrativo (DER - 12/08/13), contava com 40 anos, 04 meses e 24 dias de tempo de serviço/contribuição. Nessas condições, o autor tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição na DER (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88), assegurada a concessão do benefício mais vantajoso, nos termos da decisão proferida pelo STF no RE 630.501.
- INSS condenado aos ônus da sucumbência;
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por extinguir em parte o feito, sem exame do mérito, com fulcro no art. 485, inc. IV, NCPC, no que toca ao período de 24/07/1976 à 31/10/1983, dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002391998v21 e do código CRC f87eebbc.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 22/4/2021, às 11:28:51
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Apelação Cível Nº 5028947-39.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: DOURIVAL DOS SANTOS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. processual civil. SENTENÇA. DISPOSITIVO. ERRO MATERIAL. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. atividade rural. regime de economia familiar. ATIVIDADE URBANA INTERCALADA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO RETORNO AO CAMPO. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. concessão.
1. O erro material no dispositivo da sentença, inclusive por omissão, pode ser corrigido de ofício, consoante dispõe o art. 494, inciso I, do CPC.
2. Tendo a Autarquia reconhecido período rural em regime de economia familiar, por parecer fundamentado do seu corpo técnico, não pode alterar livremente o conteúdo do ato administrativo, conferindo-lhe outra interpretação, tendo em conta a segurança jurídica concretizada pelo respeito à coisa julgada administrativa.
3. Inexistindo início razoável de prova material, de que a parte autora após exercer atividades urbanas, retornou às rurais, é indevido o reconhecimento do respectivo tempo de atividade campesina.
4. A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.
5. Em síntese, a solução que melhor se amolda ao caso a extinção em parte do feito sem exame do mérito, em relação ao segundo período rural postulado, com fulcro no art. 485, inc. IV, NCPC, o que não obsta o ajuizamento de nova ação para renovação do pleito, pelo segurado, mediante apresentação de novas provas, conforme recentemente decidido por este Colegiado, por unanimidade, nos autos da Apelação Cível nº 0011414-31.2014.4.04.9999 (TRF4, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Roger Raupp Rios, julg. em 07/06/2016).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, extinguir em parte o feito, sem exame do mérito, com fulcro no art. 485, inc. IV, NCPC, no que toca ao período de 24/07/1976 à 31/10/1983, dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 19 de abril de 2021.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002391999v8 e do código CRC ae9b31bd.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 12/04/2021 A 19/04/2021
Apelação Cível Nº 5028947-39.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: DOURIVAL DOS SANTOS
ADVOGADO: ACACIO PEREIRA NETO (OAB SC026528)
ADVOGADO: MARILEI DE FATIMA BECKER (OAB SC026712)
ADVOGADO: NADIA MARIA VOIGT OLSEN (OAB SC041071)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/04/2021, às 00:00, a 19/04/2021, às 16:00, na sequência 209, disponibilizada no DE de 29/03/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, EXTINGUIR EM PARTE O FEITO, SEM EXAME DO MÉRITO, COM FULCRO NO ART. 485, INC. IV, NCPC, NO QUE TOCA AO PERÍODO DE 24/07/1976 À 31/10/1983, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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