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1. QUESTÕES DE FATO. EXPOSIÇÃO DO SEGURADO A RUÍDO E A AGENTES QUÍMICOS DE FORMA HABITUAL E PERMANENTE CONFIRMADA SEGUNDO A PROVA DOS AUTOS. TRF4. 5018400-...

Data da publicação: 16/06/2021, 07:01:11

EMENTA: 1. QUESTÕES DE FATO. EXPOSIÇÃO DO SEGURADO A RUÍDO E A AGENTES QUÍMICOS DE FORMA HABITUAL E PERMANENTE CONFIRMADA SEGUNDO A PROVA DOS AUTOS. 2. É ADMITIDA COMO ESPECIAL A ATIVIDADE EM QUE O SEGURADO FICOU EXPOSTO A RUÍDOS SUPERIORES A 80 DECIBÉIS ATÉ 05/03/1997, EM QUE APLICÁVEIS CONCOMITANTEMENTE, PARA FINS DE ENQUADRAMENTO, OS DECRETOS N. 53.831/64 E 83.080/79; SUPERIORES A 90 DECIBÉIS NO PERÍODO DE 06/03/1997 A 18/11/2003, DE ACORDO COM O DECRETO Nº 2.172/97, E, A PARTIR DE 19/11/2003 SUPERIORES A 85 DECIBÉIS, NOS TERMOS DO DECRETO 4.882/200. 3. A EXPOSIÇÃO A RUÍDO ACIMA DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA É PREJUDICIAL À SAÚDE, ENSEJANDO O RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO COMO ESPECIAL. 4. EM SE TRATANDO DE INDÚSTRIA CALÇADISTA, É NOTÓRIO QUE OS OPERÁRIOS SÃO CONTRATADOS NA FUNÇÃO "SERVIÇOS GERAIS", MAS A ATIVIDADE EFETIVA CONSISTE NO TRABALHO MANUAL DO CALÇADO (0025291-38.2014.404.9999 - SALISE MONTEIRO SANCHOTENE). 5. SÃO ADMISSÍVEIS COMO PROVA A PERÍCIA INDIRETA, O LAUDO SIMILAR E A PROVA EMPRESTADA (5014769-04.2014.4.04.7108 - HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR) (TRF4, AC 5018400-48.2017.4.04.7108, SEXTA TURMA, Relator JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, juntado aos autos em 08/06/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5018400-48.2017.4.04.7108/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ARI DE ALMEIDA (AUTOR)

ADVOGADO: GILSON PINHEIRO (OAB RS052129)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação de sentença (proferida na vigência do novo CPC) cujo dispositivo tem o seguinte teor:

Ante o exposto, afasto a alegação de ausência de interesse de agir argüida pelo INSS e julgo parcialmente procedentes os pedidos nos termos do art. 487, inciso I, do CPC/2015, resolvendo o mérito do processo, para o fim de condenar o réu a:

a) reconhecer e averbar como atividade especial os intervalos de 23/11/1983 a 02/10/1985 e 27/06/1986 a 14/05/1987, laborados para Ernesto Rehn e Cia Ltda., 01/09/1987 a 04/07/1990 e 10/07/1990 a 21/02/1992, laborados para Pamper Calçados Ltda., 01/07/1992 a 28/08/1992, laborado para Prima Moda Calçados Ltda., 16/02/1993 a 18/03/1993, laborado para Nova Era Calçados Ltda. e 09/01/1995 a 26/09/1996, laborado para Papael Calçados Ltda., 01/09/1997 a 17/02/2000, 01/03/2000 a 31/03/2005, 18/04/2005 a 30/04/2007 e 07/01/2008 a 24/12/2008, laborados para Via Oeste Pré Fabricado Ltda., 01/07/2009 a 14/09/2012, laborado para Pollo Materiais para Móveis Ltda., e 01/03/2013 a 07/07/2015, laborado para TRP Madeira Ltda., nos termos da fundamentação;

b) conceder o benefício de aposentadoria especial (B46), a partir da DER, em 17/11/2015, mediante a aplicação da legislação mais vantajosa; e

c) pagar as parcelas vencidas e vincendas corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, de acordo com os critérios da fundamentação, observada a incidência da prescrição e descontando-se eventuais valores recebidos, no período, a título de benefício previdenciário.

Condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, em percentual a ser fixado por ocasião da liquidação de sentença (art. 85, §4º, II, do CPC/2015), sobre o valor condenação, excluídas as parcelas que se vencerem após a prolação da sentença (Súmula nº 111 do STJ).

Sem custas, a teor do art. 4º, da Lei nº 9.289/96.

Ainda que ilíquida, a condenação não alcançará o patamar previsto no art. 496, § 3º, do CPC/2015; portanto, inaplicável a remessa necessária.

Em homenagem aos princípios da instrumentalidade, celeridade e economia processual, eventuais apelações interpostas pelas partes serão recebidas apenas no efeito devolutivo na parte relativa à tutela provisória (art. 1012, § 1º, V, do CPC/2015) e, quanto ao resto, no duplo efeito, salvo nas hipóteses de intempestividade e, se for o caso, ausência de preparo, que serão oportunamente certificadas pela Secretaria.

Havendo interposição de recurso, intime-se a parte contrária para, querendo, ofertar contrarrazões. Decorrido o prazo, remeta-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se, inclusive ao INSS, para que implante o benefício em favor da parte autora, no prazo sinalado na fundamentação.

O benefício previdenciário foi concedido com DIB em 17-11-2005.

Em suas razões de apelação, a Autarquia Previdenciária alega ser indevido o reconhecimento do tempo especial nos períodos de 23-11-1983 a 2-10-1985, de 27-6-1986 a 14-5-1987, de 1-9-1987 a 4-7-1990, de 10-7-1990 a 21-2-1992, de 1-7-1992 a 28-8-1992, de 16-2-1993 a 18-3-1993 e de 9-1-1995 a 26-9-1996, laborados na função de "serviços gerais", diante da ausência de formulários descritivos das atividades desempenhadas pelo segurado. Ainda, pugna pela inadmissibilidade de laudo pericial similar, bem como alega ser indevido o enquadramento do segurado por categoria profissional.

Houve apresentação de contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

I

Tempo Especial

Em relação ao tempo especial dos períodos controvertidos pelo recurso do INSS, adoto como razões de decidir os fundamentos da sentença, transcrevendo o seguinte trecho:

"Entendo que deve ser reconhecida a especialidade dos seguintes períodos:

EmpresaErnesto Rehn e Cia Ltda.
Períodos requeridos23/11/1983 a 02/10/1985 e 27/06/1986 a 14/05/1987
ProvasAnotações na CTPS (PROCADM1 – evento 21 – p. 14), comprovante de baixa da empresa (PROCADM1 – evento 21 – p. 28), pedido administrativo (PROCADM1 – evento 21 –p. 3/6) e LRA 1992 similar – Iocpe Maxion (PROCADM1 – evento 21 – p. 30/37).
Cargo/Setorfurador
EnquadramentoCaracterizada a especialidade. Laudo similar informa ruído de 85 a 95 dB para a atividade o que está acima do limite de 80 dB vigente no período (Dec. 53.831/64).

EmpresaPamper Calçados Ltda.
Períodos requeridos01/09/1987 a 04/07/1990 e 10/07/1990 a 21/02/1992
ProvasAnotações na CTPS (PROCADM1 – evento 21 – p. 14/15), comprovante de baixa da empresa (PROCADM1 – evento 21 – p. 38), pedido administrativo (PROCADM1 – evento 21 –p. 3/6) e LRA 1995 similar – Cairú (PROCADM1 – evento 21 – p.42/45).
Cargo/SetorServiços gerais / corte e auxiliar de almoxarifado
EnquadramentoCaracterizada a especialidade. Enquadramento por categoria profissional (trabalhador na indústria calçadista), conforme fundamentação acima.

EmpresaPrima Moda Calçados Ltda.
Período requerido01/07/1992 a 28/08/1992
ProvasAnotação na CTPS (PROCADM1 – evento 21 – p. 15), comprovante de baixa da empresa (PROCADM1 – evento 21 – p. 36), pedido administrativo (PROCADM1 – evento 21 –p. 3/6) e LRA 1995 similar – Cairú (PROCADM1 – evento 21 – p.42/45).
Cargo/SetorEncarregado de almoxarifado
EnquadramentoCaracterizada a especialidade. Enquadramento por categoria profissional (trabalhador na indústria calçadista), conforme fundamentação acima.

EmpresaNova Era Calçados Ltda.
Período requerido16/02/1993 a 18/03/1993
ProvasAnotação na CTPS (PROCADM1 – evento 21 – p. 15), comprovante de baixa da empresa (PROCADM1 – evento 21 – p. 40), pedido administrativo (PROCADM1 – evento 21 –p. 3/6) e LRA 1995 similar – Cairú (PROCADM1 – evento 21 – p.42/45).
Cargo/SetorAuxiliar de almoxarifado
EnquadramentoCaracterizada a especialidade. Enquadramento por categoria profissional (trabalhador na indústria calçadista), conforme fundamentação acima.

EmpresaPapael Calçados Ltda.
Período requerido09/01/1995 a 26/09/1996
ProvasAnotação na CTPS (PROCADM1 – evento 21 – p. 16), comprovante de baixa da empresa (PROCADM1 – evento 21 – p. 41), pedido administrativo (PROCADM1 – evento 21 –p. 3/6) e LRA 1995 similar – Cairú (PROCADM1 – evento 21 – p.42/45).
Cargo/SetorFauxiliar de almoxarifado
EnquadramentoCaracterizada a especialidade. Enquadramento por categoria profissional (trabalhador na indústria calçadista), até 28/04/1995, conforme fundamentação acima. Laudo similar informa exposição a ruído de 83 dB, o que está acima do limite de 80 dB vigente no período (Dec. 53.831/64).

Relativamente ao ruído, revisando a jurisprudência desta Corte, providência do colegiado para a segurança jurídica da final decisão esperada, passa-se a adotar o entendimento pacífico do egrégio Superior Tribunal de Justiça, no sentido que devem limitar o reconhecimento da atividade especial os estritos parâmetros legais vigentes em cada época (RESP 1333511 - CASTRO MEIRA, e RESP 1381498 - MAURO CAMPBELL), de modo que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.172/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis (AgRg no REsp 1367806, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, vu 28/05/2013), desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.

No caso de trabalhadores da indústria calçadista, em que as atividades desempenhadas pelos contratados como "serviços gerais" notoriamente envolvem o contato com agentes químicos nas etapas de produção dos calçados, admite-se como prova da especialidade o laudo pericial por similaridade produzido em juízo.

Sobre o trabalho prestado em indústria calçadista cito voto da Des. Salise Monteiro Sanchotene no julgamento do processo n. 0025291-38.2014.4.04.9999 (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0025291-38.2014.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, POR UNANIMIDADE, D.E. 03/08/2016, PUBLICAÇÃO EM 04/08/2016):

No que se refere a empresas calçadistas, é fato notório que neste tipo de local de trabalho os operários são contratados como serviços gerais, mas que a atividade efetiva consiste no trabalho manual do calçado, em suas várias etapas industriais. É notório ainda que a indústria calçadista sempre depende da cola para a industrialização dos seus produtos. Os vapores da cola são hidrocarbonetos aromáticos e alifáticos que causam tontura, dor de cabeça, náuseas, tosse, ardência nos olhos, além de outros problemas de saúde ao trabalhador. Acrescente-se que este tipo de indústria também precisa de produtos químicos e vários outros insumos que contêm na sua composição diversos agentes nocivos à saúde.
Ora, a realidade e a singularidade das funções dos trabalhadores nas indústrias de calçados não podem ser ignoradas, razão por que a prova pericial pode ser produzida em empresa similar àquela falida ou desativada. Se a perícia assim realizada for compatível com as informações sobre as atividades exercidas em condições especiais, ainda que tais informações tenham sido preenchidas por síndico ou sindicato, isto não deixará dúvida acerca dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto, assegurando-lhe o direito à conversão para tempo comum daquele serviço exercido numa atividade que efetivamente era especial. (grifei)
Destaco também que muitas vezes a solução para a busca da melhor resposta às condições de trabalho, com a presença ou não de agentes nocivos, é a constatação dessas condições em estabelecimento de atividade semelhante àquele onde laborou originariamente o segurado, no qual poderá estar presente os mesmos agentes nocivos, o que permitirá um juízo conclusivo a respeito.
Logo, não há óbice na utilização de laudo pericial elaborado em uma empresa, para comprovar a especialidade do labor em outra do mesmo ramo e no exercício de função semelhante, sendo cabível, inclusive, a utilização de laudo pericial produzido no curso de outra demanda, tendo em conta que foi elaborado sob a presença do contraditório e do princípio da bilateralidade da audiência. Neste sentido, é a jurisprudência dominante deste Tribunal: AC 2006.71.99.000709-7, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, DJU 2/3/2007 e APELREEX 2008.71.08.001075-4, Relator Juiz Federal Guilherme Pinho Machado, D.E. 3/8/2009.

Em relação à exposição a agentes químicos, especialmente hidrocarbonetos, o entendimento já consolidado neste Tribunal é no sentido de que os riscos ocupacionais gerados por esses agentes não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa.

Ressalte-se que é perfeitamente possível o reconhecimento da especialidade da atividade, mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre. Necessária, apenas, a demonstração de que o segurado estava sujeito, diuturnamente, a condições prejudiciais à sua saúde. A propósito, a jurisprudência desta Corte, ipsis litteris:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. INTERMITÊNCIA. (...) 3. Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. 4. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente.(AC nº 2000.04.01.073799-6/PR,TRF-4ª Região, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon , DJU 9-5-2001).

Além disso, a 3ª Seção desta Corte tem entendido que não só as atividades que realizam a fabricação desses agentes, mas também aquelas que envolvam o manuseio das substâncias compostas por hidrocarbonetos são abrangidas pela legislação previdenciária atinente à aposentadoria especial. O manuseio de hidrocarbonetos permite o reconhecimento da atividade como especial mesmo em período anterior ao Decreto 2172/97, de acordo com entendimento da 3ª Seção desta Corte, na medida que os decretos 53831/64 e 83080/79 vigoraram de forma concomitante até 1997. Ademais, o manuseio se insere, lato sensu, no conceito de fabricação.

No ponto, a fim de evitar tautologia, transcrevo excerto do voto do eminente Des. Celso Kipper (Apel/Reexame Necessário nº 0002033-15.2009.404.7108/RS, D.E. 11/04/2011):

[...] A Terceira Seção desta Corte de há muito já pacificou o entendimento de que são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos de números 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79 até 05-03-1997, data imediatamente anterior à publicação do Decreto n. 2.172/97, consoante os EIAC 2000.04.01.134834-3/RS, Rel. Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU, Seção 2, de 19-02-2003, p. 485, de cujo voto condutor do acórdão extraio o seguinte trecho:

"Assim, tomando-se por base o raciocínio acima e a interpretação interna da Autarquia, tenho que se a atividade tiver sido prestada anteriormente à regulamentação da Lei nº 9.032/95 (pelo Decreto nº 2.172, em 05.03.97), e mesmo que o segurado não tenha implementado as condições suficientes ao benefício da aposentação até 28.04.95, deve-se seguir o enquadramento como especial com base em qualquer um dos Decretos (53.831/64 ou 83.080/79). Retifico, a esse respeito, o entendimento esposado em outros acórdãos de minha lavra."

Desde então os julgados desta Casa têm, invariavelmente, levado em consideração aqueles decretos, de forma concomitante, no que toca ao enquadramento das atividades como especiais, seja em razão da exposição a agentes insalubres ou do exercício de atividade profissional. Como exemplo significativo destaco a atividade de cobrador de ônibus, prevista como especial no Decreto 53.831/64 (código 2.4.4) e que não é mencionada no Decreto 83.080/79; independentemente disso, contudo, a atividade tem sido reconhecida como especial mesmo tendo sido exercida no período em que vigente este último dispositivo (veja-se, por exemplo, AC nº 2006.71.18.001668-0, Turma Suplementar, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 04-11-2008).

Dito isto observo que, apesar de o Decreto 83.080/79, sob o código 1.2.10, enquadrar como especial apenas a atividade de fabricação de hidrocarbonetos e outros compostos de carbono (com a exceção de inseticidas, em que é admitida também sua aplicação), o Decreto 53.831/64 é taxativo ao considerar como especial (código 1.2.11) as "operações executadas com derivados tóxicos do carbono" (sublinhei), tais como os hidrocarbonetos (inciso I) e vários outros compostos (ácidos carboxílicos, álcoois, amidas, éteres, etc), deixando claro também que tais operações significam "trabalhos permanentes expostos a poeiras, gases, vapores, neblinas e fumos de derivados do carbono constantes da Relação Internacional das Substâncias Nocivas publicada no Regulamento da OIT - tais como ..." e listando, exemplificativamente, várias dessas substâncias.

Concluo, assim, pela existência de previsão legal para o reconhecimento da especialidade de atividade que envolva o manuseio de hidrocarbonetos, e não apenas sua fabricação.

Ademais, quanto à exposição em si, o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc) é responsável por freqüentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais. Devido ao fato de sua ação ser cumulativa na maior parte dos casos, a exposição habitual, ainda que intermitente, pode ser suficiente para a caracterização da insalubridade da atividade, o que deverá, por óbvio, ser verificado caso a caso.

Por fim, cabe registrar que a 3ª Seção desta Corte também vem julgando a questão no mesmo sentido, de que as atividades profissionais que envolvam o manuseio de hidrocarbonetos são passíveis de serem reconhecidas como especiais (EMBARGOS INFRINGENTES Nº 2004.71.04.003543-6, 3ª Seção, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR MAIORIA, D.E. 20/10/2008; EMBARGOS INFRINGENTES Nº 2000.71.08.002850-4, 3ª Seção, Des. Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, POR MAIORIA, D.E. 06/11/2008; EMBARGOS INFRINGENTES EM AC Nº 2003.71.08.000621-2, 3ª Seção, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR MAIORIA, D.E. 19/08/2008).

Também são pertinentes ao caso os seguintes precedentes da Turma: [a] são admissíveis como prova a perícia indireta, o laudo similar e a prova emprestada (5014769-04.2014.4.04.7108 - HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR); [b] o fato das provas não serem contemporâneas ao exercício das atividades não prejudica a validade dos documentos para fins de averiguação das reais condições de trabalho na empresa (0001893-57.2017.4.04.9999 - ARTUR CÉSAR DE SOUZA).

II

Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, este regramento é aplicável quanto à sucumbência.

No tocante ao cabimento da majoração da verba honorária, conforme previsão do §11 do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):

É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:

a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;

b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;

c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.

No caso concreto, estão preenchidos todos os requisitos acima elencados, sendo devida, portanto, a majoração da verba honorária.

Considerando que o magistrado postergou para a liquidação a definição do valor da verba honorária, fixo em 15% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, compreendidas as parcelas vencidas até a sentença, conforme Súmula 111 do STJ e 76 desta Corte.

Conclusão

Negar provimento à apelação do INSS.

Determinar o cumprimento imediato do acórdão.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão.



Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002556403v19 e do código CRC 3ab68526.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5018400-48.2017.4.04.7108/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ARI DE ALMEIDA (AUTOR)

ADVOGADO: GILSON PINHEIRO (OAB RS052129)

EMENTA

1. QUESTÕES DE FATO. EXPOSIÇÃO DO SEGURADO A RUÍDO E A AGENTES QUÍMICOS DE FORMA HABITUAL E PERMANENTE CONFIRMADA SEGUNDO A PROVA DOS AUTOS.

2. É ADMITIDA COMO ESPECIAL A ATIVIDADE EM QUE O SEGURADO FICOU EXPOSTO A RUÍDOS SUPERIORES A 80 DECIBÉIS ATÉ 05/03/1997, EM QUE APLICÁVEIS CONCOMITANTEMENTE, PARA FINS DE ENQUADRAMENTO, OS DECRETOS N. 53.831/64 E 83.080/79; SUPERIORES A 90 DECIBÉIS NO PERÍODO DE 06/03/1997 A 18/11/2003, DE ACORDO COM O DECRETO Nº 2.172/97, E, A PARTIR DE 19/11/2003 SUPERIORES A 85 DECIBÉIS, NOS TERMOS DO DECRETO 4.882/200.

3. A EXPOSIÇÃO A RUÍDO ACIMA DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA É PREJUDICIAL À SAÚDE, ENSEJANDO O RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO COMO ESPECIAL.

4. EM SE TRATANDO DE INDÚSTRIA CALÇADISTA, É NOTÓRIO QUE OS OPERÁRIOS SÃO CONTRATADOS NA FUNÇÃO "SERVIÇOS GERAIS", MAS A ATIVIDADE EFETIVA CONSISTE NO TRABALHO MANUAL DO CALÇADO (0025291-38.2014.404.9999 - SALISE MONTEIRO SANCHOTENE).

5. SÃO ADMISSÍVEIS COMO PROVA A PERÍCIA INDIRETA, O LAUDO SIMILAR E A PROVA EMPRESTADA (5014769-04.2014.4.04.7108 - HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR)

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 02 de junho de 2021.



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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 02/06/2021

Apelação Cível Nº 5018400-48.2017.4.04.7108/RS

RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ARI DE ALMEIDA (AUTOR)

ADVOGADO: GILSON PINHEIRO (OAB RS052129)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 02/06/2021, na sequência 822, disponibilizada no DE de 24/05/2021.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



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