Apelação Cível Nº 5010633-22.2018.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: ADELIO KLAUS (AUTOR)
ADVOGADO: ARLETE TERESINHA MARTINI (OAB RS019286)
ADVOGADO: Tânia Cristina Schneider (OAB RS040838)
ADVOGADO: TANIA REGINA SILVA SILVEIRA (OAB RS033289)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
A sentença proferida na ação ajuizada por Adélio Klaus contra o INSS julgou improcedente o pedido de revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento do tempo de serviço na condição de empregado no período de 01/10/2009 a 05/12/2011. A parte autora foi condenada ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, ficando suspensa a exigibilidade da verba de sucumbência.
O autor interpôs apelação. Referiu que trabalhou na empresa Bolsas Liú Indústria e Comércio Ltda. entre 01/10/2009 e 05/12/2011, porém o vínculo empregatício não foi anotado na carteira de trabalho, sendo reconhecido apenas em ação trabalhista ajuizada contra a empresa. Alegou que o registro na carteira de trabalho e a sentença trabalhista constituem início de prova material do tempo de contribuição, permitindo a comprovação através de prova testemunhal. Aduziu que a prova testemunhal realizada nesta ação é amplamente favorável. Apontou que as testemunhas confirmaram com convicção a prestação de serviços no período requerido e relataram que a empresa tinha por rotina contratar os seus empregados sem anotação na carteira de trabalho. Ponderou que não procede a afirmação da sentença de que apenas o autor trabalhou por um longo tempo na empresa sem vínculo empregatício anotado.
O INSS apresentou contrarrazões.
A sentença foi publicada em 20 de fevereiro de 2019.
VOTO
Tempo de serviço urbano
A sentença julgou improcedente o pedido com base nos seguintes fundamentos:
Tempo de serviço comum - empregado urbano (01/10/2009 a 05/12/2011)
Da mesma forma que o tempo de atividade rurícola, o § 3º do art. 55 da Lei 8.213/91 exige, para comprovação da atividade urbana, início de prova material que demonstre o exercício da atividade laborativa na função e períodos alegados, não se admitindo prova exclusivamente testemunhal. Anoto que, em se tratando de segurado empregado, uma vez comprovado o vínculo empregatício, faz-se desnecessário comprovar o efetivo recolhimento das contribuições, porque tal se presume, conforme previsão do art. 26, § 4º, do Decreto 3.048/99, sendo que incumbe à empresa o dever de recolher a respectiva contribuição previdenciária (art. 30, inciso I, alínea "a", da Lei nº 8.212/91).
O art. 62 do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99) traz um rol exemplificativo dos documentos aceitos para esse fim, os quais são exigidos conforme a atividade, verbis:
Art. 62. A prova de tempo de serviço, considerado tempo de contribuição na forma do art. 60, observado o disposto no art. 19 e, no que couber, as peculiaridades do segurado de que tratam as alíneas "j" e "l" do inciso V do caput do art. 9º e do art. 11, é feita mediante documentos que comprovem o exercício de atividade nos períodos a serem contados, devendo esses documentos ser contemporâneos dos fatos a comprovar e mencionar as datas de início e término e, quando se tratar de trabalhador avulso, a duração do trabalho e a condição em que foi prestado.(Redação dada pelo Decreto nº 4.079, de 2002)
§ 1º As anotações em Carteira Profissional e/ou Carteira de Trabalho e Previdência Social relativas a férias, alterações de salários e outras que demonstrem a seqüência do exercício da atividade podem suprir possível falha de registro de admissão ou dispensa. (Redação dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
§ 2º Subsidiariamente ao disposto no art. 19, servem para a prova do tempo de contribuição que trata o caput: (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
I - para os trabalhadores em geral, os documentos seguintes: (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
a) o contrato individual de trabalho, a Carteira Profissional, a Carteira de Trabalho e Previdência Social, a carteira de férias, a carteira sanitária, a caderneta de matrícula e a caderneta de contribuições dos extintos institutos de aposentadoria e pensões, a caderneta de inscrição pessoal visada pela Capitania dos Portos, pela Superintendência do Desenvolvimento da Pesca, pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas e declarações da Secretaria da Receita Federal do Brasil; (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
b) certidão de inscrição em órgão de fiscalização profissional, acompanhada do documento que prove o exercício da atividade; (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
c) contrato social e respectivo distrato, quando for o caso, ata de assembléia geral e registro de empresário; ou (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
d) certificado de sindicato ou órgão gestor de mão-de-obra que agrupa trabalhadores avulsos; (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
Especificamente nos casos em que a única prova dos autos é a CTPS, filio-me ao entendimento de que o registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados.(TRF4 5001463-60.2012.4.04.7003, Turma Regional Suplementar do PR, Rel. Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 14/11/2017).
No caso dos autos, requer a parte autora o reconhecimento do labor urbano no período de 01/10/2009 a 05/12/2011, em que teria laborado para Bolsas Liu Indústria e Comércio Ltda. ME.
O intervalo restou reconhecido na ação trabalhista 0000.189.42.2013.5.04.0371, que teve curso perante a 1ª Vara do Trabalho de Sapiranga/RS (OUT5 a OUT40 – evento 1).
Ocorre que naqueles autos foi declarada a revelia do empregador Calçados Liu Ltda. (OUT7 – evento 1 – fl. 12/13).
Por fim restou reconhecido o vínculo, sem a juntada de provas materiais, sendo condenada a empresa H Kuntzler Ltda. ao pagamento das verbas trabalhistas, na condição de responsável solidária, por ser tomadora dos serviços da primeira empregadora.
A sentença trabalhista, não faz coisa julgada previdenciária. Trata-se, no entanto, de início de prova material, se for fundamentada em elementos que comprovem o labor exercido.
Não há naqueles autos e não foi juntada nesta ação nenhuma prova apta a comprovar o vinculo da parte autora com a empresa em questão. Assim, sem oferta de quaisquer provas da relação de trabalho, entendo que não há como reconhecer o período como tempo de serviço.
Sobre o tema já se manifestaram o STJ e o TRF da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL. ANOTAÇÕES FEITAS POR ORDEM JUDICIAL. SENTENÇA TRABALHISTA NÃO FUNDAMENTADA EM PROVAS DOCUMENTAIS E TESTEMUNHAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL NÃO CARACTERIZADO. 1. A sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária. Precedentes das Turmas que compõem a Terceira Seção. 2. No caso em apreço, não houve produção de qualquer espécie de prova nos autos da reclamatória trabalhista, tendo havido acordo entre as partes.3. Embargos de divergência acolhidos.(EREsp 616.272, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ 24.10.2005).
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. AVERBAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. REVELIA. AUSÊNCIA DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. 1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço, com a respectiva averbação para fins de futura aposentadoria. 3. A sentença proferida em reclamatória trabalhista consubstancia início de prova material para a concessão de benefício previdenciário, salvo hipóteses excepcionais, somente quando fundada em documentos que demonstrem o exercício da atividade laborativa na função e períodos alegados, sendo irrelevante o fato de inexistir participação do INSS no processo trabalhista. 4. Se o período controvertido foi reconhecido em decorrência de confissão ficta, ante a revelia da reclamada e não de sentença judicial fundada em início de prova material, tal documento não serve como prova apta a autorizar o reconhecimento do tempo de serviço pleiteado. (TRF4, AC 0003363-94.2015.4.04.9999, Sexta Turma, Rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 19/12/2017).
Esclareço que embora tenha havido a produção de prova testemunhal (evento 32) e que todas as testemunhas ouvidas, ainda que afirmando que tenham trabalhado “frio”, sem a carteira assinada por algum tempo (de 3 a 5 meses), apresentaram a CTPS devidamente assinada pela empresa.
Já a parte autora, que requer o reconhecimento de um longo intervalo (mais de dois anos), não teve nenhuma anotação efetuada pela empresa Bolsas Liu Ltda. Sua CTPS somente foi assinada em 01/11/2011, por Neri Klaus Couros ME, que segundo informado nos autos seria a nova empresa do mesmo empregador (PROCADM4 – evento 1 – fl. 33), sendo que este intervalo (01/11/2011 a 25/06/2012) consta corretamente reconhecido no extrato de tempo de serviço/contribuição do INSS (RESPOSTA1 – evento 9 – p. 45/56).
Some-se a isso que foi informado, em audiência trabalhista, que Luis Klaus e Demi Klaus, sócios da reclamada, são irmão e cunhada, respectivamente, da parte autora, o que de forma alguma invalida o pleito, mas causa estranheza o fato da relação familiar não ser mencionada em nenhum momento no presente feito.
Por todo o exposto, na ausência de qualquer prova material mínima que indique a relação de trabalho, tenho que não há como reconhecer o intervalo pleiteado.
A prova da vinculação do segurado à Previdência Social, na condição de empregado, via de regra, é feita mediante a anotação na carteira de trabalho, confirmada por meio de consulta no CNIS, de acordo com o disposto no art. 29-A da Lei nº 8.213, com a redação dada pela Lei Complementar nº 128. Admite-se, todavia, a comprovação por outros documentos idôneos, caso o empregador não tenha cumprido o dever de anotar o contrato na carteira de trabalho do empregado, servindo para esse fim os recibos de pagamento contemporâneos ao fato alegado, com a necessária identificação do empregador, ou outros elementos de prova que se amoldem ao conceito de início de prova material. Neste sentido, já decidiu este Tribunal Regional Federal:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. EMPREGADO RURAL. TEMPO DE SERVIÇO. COMPROVAÇÃO. 1. Não é possível somatório do tempo de serviço posterior ao requerimento administrativo se o marco inicial do benefício foi fixado - tal como no caso dos autos - na data do referido protocolo. 2. Os recibos de pagamento de salários e comprovantes de pagamento de férias e décimo terceiro salário constituem prova plena do tempo de serviço como empregado rural. 3. Implementado o requisito etário de 60 anos (art. 48, I, da Lei n. 8.213/91) e cumprida a carência mínima exigida no art. 142 da Lei de Benefícios, é devida a aposentadoria por idade, a contar da data do requerimento administrativo. 4. O recolhimento das contribuições previdenciárias do empregado constitui encargo do empregador. (TRF4, APELREEX 2004.71.12.002169-7, SEXTA TURMA, Relator CELSO KIPPER, D.E. 18/12/2009)
A sentença proferida em reclamatória trabalhista que reconhece a existência de relação de emprego, por si só, não constitui início de prova material para efeitos previdenciários. A norma jurídica do caso concreto, definida no dispositivo da sentença, não tem relevância, mas sim as provas documentais que instruíram o feito trabalhista e fundaram a decisão. Demais, os limites subjetivos da coisa julgada material que se forma no juízo trabalhista não alcançam partes estranhas à relação processual, como o INSS.
Portanto, isoladamente, a sentença e o acordo no processo trabalhista não valem como início de prova material de tempo de serviço, principalmente quando o feito não foi instruído satisfatoriamente e as circunstâncias do caso concreto indicam que o processo foi ajuizado com o único propósito de obter direitos perante a Previdência Social.
A jurisprudência deste Tribunal acolhe esse entendimento:
PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA EXTRA PETITA. NULIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. REQUISITOS LEGAIS. SENTENÇA TRABALHISTA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. ANALOGIA. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. REVOGAÇÃO. 1. A decisão que contém fundamentos suficientes para esclarecer por quais motivos o julgador decidiu a causa, demonstrando a sua convicção, não é nula por ausência de fundamentação. 2. Evidenciada a condenação do réu em obrigação não arguida pelo autor na inicial, há infringência ao princípio da correlação, na modalidade julgamento extra petita, o que acarreta a nulidade de parte da sentença. 3. Faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço, o segurado que comprovar o labor rural mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal. 4. Em relação ao reconhecimento do tempo de serviço por meio de reclamatória trabalhista, a Terceira Seção do Egrégio STJ tem reiteradamente decidido que "a sentença trabalhista será admitida como início de prova material apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária." (EREsp n. 616.242/RN, Rel.ª Min.ª Laurita Vaz, DJ de 24-10-2005). A sentença trabalhista de procedência decorrente de confissão ficta do empregador, não constitui, por si só, meio de prova suficiente para evidenciar vínculo de emprego no âmbito previdenciário. 5. Hipótese em que observada, por analogia, a decisão proferida no Recurso Especial 1.352.721/SP 6. Tendo em vista que não está efetivamente pacificada nas Cortes Superiores a questão relativa à restituição dos valores recebidos a título de tutela antecipada posteriormente revogada, não há que se falar em devolução de tais valores, a fim de evitar decisões contraditórias. (TRF4, AC 5014735-76.2020.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 04/10/2021)
No caso presente, a Justiça do Trabalho reconheceu o vínculo empregatício devido à confissão ficta, pois o empregador não compareceu à audiência, nem justificou a ausência. Nenhuma prova documental da relação de emprego foi juntada, seja na reclamatória trabalhista, seja neste processo. Além disso, o empregador não adimpliu as verbas a que foi condenado. Os efeitos financeiros da sentença foram suportados pela empresa tomadora dos serviços do empregador da parte autora, na condição de responsável subsidiária.
A legislação previdenciária veda a comprovação do tempo de serviço com base em prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme dispõe o art. 55, §3º, da Lei nº 8.213. A legalidade da norma é corroborada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consoante a Súmula 149: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário. Em julgado mais recente, apreciado sob a sistemática dos recursos repetitivos, o STJ reafirmou o entendimento no Tema 297 (REsp 1133863/RN, 3ª Seção, Rel. Ministro Celso Limongi, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
Cabe salientar que os precedentes são igualmente aplicáveis para a comprovação do tempo de serviço urbano. Se do trabalhador rural se exige, invariavelmente, um início de prova material para demonstrar o labor na agricultura, não se pode dispensar a apresentação de elementos objetivos, ainda que incipientes, do vínculo empregatício daquele que trabalha em empresa urbana.
Dessa forma, não é cabível a valoração da prova testemunhal, visto que não há início de prova material indicativo da prestação de serviços pelo autor à empresa Bolsas Liú Indústria e Comércio Ltda. no período de 01/10/2009 a 05/12/2011.
Majoração dos honorários advocatícios
Desprovido o recurso interposto pelo autor contra a sentença de improcedência do pedido, devem os honorários de advogado ser majorados, com o fim de remunerar o trabalho adicional do procurador da parte adversa em segundo grau de jurisdição.
Considerada a disposição do art. 85, §11, do Código de Processo Civil (CPC), majora-se em 20% a verba honorária fixada na sentença, observados os limites máximos previstos nas faixas de incidência do art. 85, § 3º, do CPC.
A exigibilidade da verba fica suspensa, em razão do benefício de gratuidade da justiça concedido à parte autora.
Conclusão
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5010633-22.2018.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: ADELIO KLAUS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
VOTO DIVERGENTE
Pelo Des. Federal Roger Raupp Rios:
O voto do e. Relator é no sentido de negar provimento à apelação da parte autora.
Peço vênia ao e. Relator para divergir, pelos fundamentos que seguem.
Com relação ao pedido de averbação do período de 01/10/2009 e 05/12/2011 como tempo de serviço urbano comum, entendo que a solução que melhor se amolda ao caso, pois, é a extinção do feito, sem exame do mérito, com fulcro no art. 485, IV do CPC.
De fato, inexiste nos autos início de prova material a respeito do alegado vínculo empregatício, não valendo para tanto, a sentença proferida na reclamatória trabalhista com base em confissão ficta, o que impede, em consequência, a valoração da prova testemunhal produzida.
Em se tratando de insuficiência probatória, discute-se se o processo deve ser extinto sem exame do mérito, ou a demanda julgada improcedente, com análise do mérito, formando a sentença coisa julgada secundum eventum probationis. Na primeira hipótese, inexistente coisa julgada, será sempre possível o ajuizamento de nova demanda; no segundo caso, admitir-se-á a nova ação acaso apresentadas novas provas.
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso representativo de controvérsia (CPC, art. 543-C), RESp 1.352.721/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 16/12/2015, decidiu que "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa".
Prevaleceu o entendimento do relator, Min. Napoleão Nunes Maia Filho, vencida a posição do Min. Mauro Campbell Marques, para quem "em lides previdenciárias, se as provas forem insuficientes, a coisa julgada se fará segundo o resultado da prova, isto é, secundum eventum probationis".
Inicialmente, sustentei que a extinção do processo sem resolução do mérito é solução que deve ser aplicada quando não existir qualquer prova do direito postulado, caso em que haverá inépcia da petição inicial, já que desacompanhada de documentos essenciais e necessários. Por outro lado, havendo instrução deficiente, haverá julgamento de mérito, formando-se a coisa julgada "secundum eventum probationis". Entendo que as posições não são excludentes, cabendo a aplicação de ambas conforme a instrução do processo. Daí que não há voto vencedor ou vencido no precedente do Superior Tribunal de Justiça.
A aplicação da coisa julgada secundum eventum probationis em caso de instrução deficiente (quer dizer, deficiência probatória e não insuficiência completa de provas), harmoniza a necessidade de preservação da coisa julgada, evitando-se a eternização dos litígios, com a proteção do segurado que, por circunstâncias diversas, não teve oportunidade de produzir determinada prova. Se, de um lado, não permite o ajuizamento de inúmeras ações idênticas, baseadas nas mesmas provas (o que será permitido se houver extinção sem exame do mérito), de outro, autoriza o ajuizamento de nova demanda, mesmo após sentença de improcedência, quando comprovado o surgimento de novas provas, que não estavam ao alcance do segurado-autor quando do processamento da primeira demanda.
Todavia, não foi esse o entendimento que se firmou no Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, o próprio prolator do voto divergente, que aplicou a teoria da coisa julgada secundum eventum probationis, Min. Mauro Campbell Marques, ressalvou seu entendimento pessoal, curvando-se ao entendimento da Corte Especial no REsp. 1.352.721/SP (nesse sentido, decisões proferidas nos REsp. 1.574.979/RS, 1.484.654/MS, 1.572.373/RS, 1.572.577/PR e 1.577.412/RS).
Na mesma linha, embora convencido de que, no caso de insuficiência de provas, deve haver julgamento de improcedência secundum eventum probationis, concluo pela extinção do processo sem exame do mérito em relação ao período, com ressalva de ponto de vista pessoal.
Destaco, por oportuno, que, embora o precedente mencionado (RESp 1.352.721/SP - Tema 629 do STJ) envolva tempo de serviço rural, alinho-me aos julgados desta Corte no sentido de a mesma diretriz pode ser aplicada em outras situações, como na hipótese dos autos, por uma questão de coerência sistêmica.
Com efeito, a ratio decidendi desse julgamento está expressa nos votos dos ministros, que concordaram que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial de uma ação previdenciária não deveria implicar a improcedência da demanda, enquanto julgamento de mérito, mas em decisão de caráter terminativo, para que permanecesse aberta a possibilidade da prova do alegado pelo segurado, em novo processo.
O fundamento para este entendimento é a preservação do direito social à previdência, a justificar a relativização das normas processuais sobre o ônus da prova. Foram as peculiaridades da lide previdenciária que reclamaram um questionamento sobre os meios e os fins do processo, enquanto garantia de realização de um direito fundamental-social.
Assim, os fundamentos determinantes daquele julgado alcançam casos como o dos autos, que envolve o reconhecimento de vínculo empregatício para fins previdenciários, com averbação de tempo de serviço urbano comum.
Por tudo isso, tenho que deva ser parcialmente provida a apelação da parte autora para julgar extinto o pedido, sem resolução de mérito, fulcro no art. 485, IV do CPC, com relação à averbação do período de 01/10/2009 a 05/12/2011, razão pela qual peço vênia para divergir do entendimento do e. Relator Osni Cardoso Filho.
Em consequência do parcial provimento da apelação, não é o caso de serem majorados os honorários fixados na sentença, eis que, conforme entendimento desta Turma, "a majoração dos honorários advocatícios fixados na decisão recorrida só tem lugar quando o recurso interposto pela parte vencida é integralmente desprovido; havendo o provimento, ainda que parcial, do recurso, já não se justifica a majoração da verba honorária" (TRF4, APELREEX n.º 5028489-56.2018.4.04.9999/RS, Relator Osni Cardoso Filho, julgado em 12/02/2019).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da parte autora.
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EMENTA
previdenciário. reconhecimento de tempo de serviço. início de prova material. reclamatória trabalhista. prova exclusivamente testemunhal.
1. Admite-se a reclamatória trabalhista como início de prova material para o fim de reconhecimento do tempo de contribuição, caso haja efetiva controvérsia judicial e instrução do feito com provas documentais do vínculo empregatício.
2. A sentença proferida em ação trabalhista, que reconhece a existência de relação de emprego, por si só, não constitui início de prova material para efeitos previdenciários. A norma jurídica do caso concreto, definida no dispositivo da sentença, não possui relevância, mas sim as provas documentais que instruíram o respectivo processo e fundamentaram a decisão, sem repercussão no âmbito jurídico de quem não integrou a lide.
3. A legislação previdenciária veda a comprovação do tempo de serviço com base em prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito (art. 55, §3º, da Lei nº 8.213).
4. Não é cabível a valoração da prova testemunhal, sem apresentação de início de prova material indicativo da prestação de serviços.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencidos os Desembargadores Federais ROGER RAUPP RIOS e TAIS SCHILLING FERRAZ, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de agosto de 2022.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/11/2021 A 18/11/2021
Apelação Cível Nº 5010633-22.2018.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
APELANTE: ADELIO KLAUS (AUTOR)
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ADVOGADO: Tânia Cristina Schneider (OAB RS040838)
ADVOGADO: TANIA REGINA SILVA SILVEIRA (OAB RS033289)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/11/2021, às 00:00, a 18/11/2021, às 16:00, na sequência 189, disponibilizada no DE de 27/10/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL OSNI CARDOSO FILHO NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELO JUIZ FEDERAL FRANCISCO DONIZETE GOMES, E A DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL ROGER RAUPP RIOS DANDO-LHE PARCIAL PROVIMENTO, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC.
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Divergência - GAB. 51 (Des. Federal ROGER RAUPP RIOS) - Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS.
Destaque automático
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 54 (Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES) - Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES.
Acompanho o(a) Relator(a)
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:20:57.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 02/08/2022 A 09/08/2022
Apelação Cível Nº 5010633-22.2018.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO
APELANTE: ADELIO KLAUS (AUTOR)
ADVOGADO: ARLETE TERESINHA MARTINI (OAB RS019286)
ADVOGADO: Tânia Cristina Schneider (OAB RS040838)
ADVOGADO: TANIA REGINA SILVA SILVEIRA (OAB RS033289)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 02/08/2022, às 00:00, a 09/08/2022, às 16:00, na sequência 631, disponibilizada no DE de 22/07/2022.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO ACOMPANHANDO O RELATOR, E O VOTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL TAIS SCHILLING FERRAZ ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, A 5ª TURMA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDOS OS DESEMBARGADORES FEDERAIS ROGER RAUPP RIOS E TAIS SCHILLING FERRAZ, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Acompanha a Divergência - GAB. 62 (Des. Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ) - Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ.
Acompanho a divergência.
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 101 (Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO) - Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO.
Acompanho o(a) Relator(a)
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:20:57.