APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001560-88.2016.4.04.7110/RS
RELATOR | : | GISELE LEMKE |
APELANTE | : | CATARINA GUIMARAES DUTRA |
ADVOGADO | : | NELSON CLECIO STÖHR |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
previdenciário. aposentadoria rural por idade. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL NÃO RECONHECIDA. COMERCIALIZAÇÃO AGRÍCOLA E PECUÁRIA ELEVADA. IMPROCEDÊNCIA. manutenção DA SENTENÇA
1. A aposentadoria por idade rural, no valor de um salário-mínimo, é devido aos trabalhadores rurais que comprovem o desempenho de atividade rural no período de carência, imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou anterior ao requerimento administrativo. Imprescindivel que o trabalho seja exercido em regime de economia familiar, de subsistência, sem o auxilio de empregados, como fonte principal de sustento ou manutenção.
2. A comercialização agrícola e pecuária elevada indica poder aquisitivo incompatível com trabalho rural em regime de economia familiar, não sendo possível concluir que o exercício de atividade rural pela parte autora seja voltado somente à própria subsistência.
3. Manutenção da sentença com o indeferimento do pedido de aposentadoria por tempo de atividade rural.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de fevereiro de 2018.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9266657v3 e, se solicitado, do código CRC A9A3942A. | |
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Signatário (a): | Gisele Lemke |
Data e Hora: | 01/03/2018 14:44 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001560-88.2016.4.04.7110/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | CATARINA GUIMARAES DUTRA |
ADVOGADO | : | NELSON CLECIO STÖHR |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada na Justiça Federal por CATARINA GUIMARAES DUTRA (nascida em 20/02/1956) contra o INSS em 14/03/2016, pretendendo concessão de aposentadoria rural por idade.
A sentença (EVENTO 34 - SENT1), datada de 17/08/2017, julgou improcedente o pedido da inicial, condenando a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais e dos honorários advocatícios, suspendendo a exigibilidade em razão do benefício da AJG concedida. Entendeu que não restou comprovado no caso em tela o trabalho rural em regime de economia familiar, uma vez que as notas fiscais de produtor rural juntadas aos autos são de valores elevados, assim como a extensão de terras de propriedade da autora, que ultrapassam os 04 módulos fiscais estabelecidos em lei.
Apelou a parte autora (EVENTO 40 - APELAÇÃO1), defendendo que exercia a atividade de trabalhadora rural em regime de economia familiar, sendo pequena produtora, e que a atividade desempenhada era dirigida para subsistência do núcleo familiar. Alegou que o tamanho da propriedade não constitui óbice para o deferimento do benefício, devendo a sentença impugnada ser reformada em sua integralidade.
Com contrarrazões (EVENTO 43 - CONTRAZAP1), vieram os autos a este Tribunal.
VOTO
DA APLICAÇÃO DO CPC/2015
Conforme o art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Logo, serão examinados segundo as normas do CPC/2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Tendo em vista que a sentença foi publicada posteriormente a esta data (17/08/2017), o recurso será analisado em conformidade com o CPC/2015.
DO REEXAME NECESSÁRIO
Sem reexame necessário, uma vez que não houve condenação da entidade na sentença prolatada.
DA APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
Economia familiar - considerações gerais
O benefício de aposentadoria por idade do trabalhador rural qualificado como segurado especial individualmente ou em regime de economia familiar (inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991), é informado pelo disposto nos §§ 1º e 2º do art. 48, no inc. II do art. 25, no inc. III do art. 26 e no inc. I do art. 39, tudo da Lei 8.213/1991. São requisitos para obter o benefício:
1) implementação da idade mínima (cinquenta e cinco anos para mulheres, e sessenta anos para homens);
2) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondente à carência exigida, ainda que a atividade seja descontínua.
Não se exige prova do recolhimento de contribuições (TRF4, Terceira Seção, EINF 0016396-93.2011.404.9999, rel. Celso Kipper, D.E. 16/04/2013; TRF4, EINF 2007.70.99.004133-2, Terceira Seção, rel. Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, D.E. 23/04/2011).
A renovação do Regime Geral de Previdência Social da Lei 8.213/1991 previu regra de transição em favor do trabalhador rural, no art. 143:
Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.
Complementando o art. 143 na disciplina da transição de regimes, o art. 142 da Lei 8.213/1991 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá a uma tabela de redução de prazos de carência no período de 1991 a 2010, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.
O ano de referência de aplicação da tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991 será aquele em que o segurado completou a idade mínima para haver o benefício, desde que, até então, já disponha de tempo rural correspondente aos prazos de carência previstos. É irrelevante que o requerimento de benefício seja apresentado em anos posteriores ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, devendo ser preservado o direito adquirido quando preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos (§ 1º do art. 102 da Lei 8.213/1991).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido, observada a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991. Nesse caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao cumprimento da carência equivalente para obter o benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, mas sim nos anos subsequentes, de acordo com a tabela mencionada, com exigências progressivas.
Ressalvam-se os casos em que o requerimento administrativo e a implementação da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994 (vigência da MP 598/1994, convertida na Lei 9.063/1995, que alterou o art. 143 da Lei 8.213/1991), nos quais o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural anterior ao requerimento por um período de cinco anos (sessenta meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991.
A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213/1991, exigindo que a atividade rural deva ser comprovada em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada a favor do segurado. A regra atende às situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente comprovar trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no § 1º do art. 102 da Lei 8.213/1991 e, principalmente, em proteção ao direito adquirido. Se o requerimento datar de tempo consideravelmente posterior à implementação das condições, e a prova for feita, é admissível a concessão do benefício.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, Plenário, RE 631240/MG, rel. Roberto Barroso, j. 03/09/2014).
O tempo de trabalho rural deve ser demonstrado com, pelo menos, um início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea. Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal, a teor do § 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991, preceito jurisprudencialmente ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR (STJ, 1ª Seção, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973). Embora o art. 106 da Lei 8.213/1991 relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo (STJ, Quinta Turma, REsp 612.222/PB, rel. Laurita Vaz, j. 28/04/2004, DJ 07/06/2004, p. 277).
Não se exige, por outro lado, prova documental contínua da atividade rural, ou em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do Imposto Territorial Rural (ITR) ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, quaisquer registros em cadastros diversos) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar:
[...] considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ [...]
(STJ, Primeira Seção, REsp 1321493/PR, rel. Herman Benjamin, j. 10out.2012, DJe 19/12/2012)
Quanto à questão da contemporaneidade da prova documental com o período relevante para apuração de carência, já decidiu este Tribunal que: A contemporaneidade entre a prova documental e o período de labor rural equivalente à carência não é exigência legal, de forma que podem ser aceitos documentos que não correspondam precisamente ao intervalo necessário a comprovar. Precedentes do STJ (TRF4, Sexta Turma, REOAC 0017943-66.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 14/08/2015).
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do trabalho rural, já que o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar o exercido pelos membros da família "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais são formalizados em nome do pater familias, que representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, em geral entre os trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental", e já consolidado na jurisprudência do STJ: "A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural (STJ, Quinta Turma, REsp 501.009/SC, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 20/11/2006, DJ 11/12/2006, p. 407).
Importante, ainda, ressaltar que o fato de um dos membros da família exercer atividade outra que não a rural também não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício. A hipótese fática do inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, que utiliza o conceito de economia familiar, somente será descaracterizada se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural seja tal que dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. Precedentes do STJ.
(TRF4, Terceira Seção, EINF 5009250-46.2012.404.7002, rel. Rogerio Favreto, juntado aos autos em 12/02/2015)
O INSS alega com frequência que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade rural no período de carência. As conclusões adotadas pelo INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pela prova produzida em Juízo. No caso de haver conflito entre as provas colhidas na via administrativa e as tomadas em juízo, deve-se ficar com estas últimas, uma vez que produzidas com as cautelas legais, garantindo-se o contraditório: "A prova judicial, produzida com maior rigorismo, perante a autoridade judicial e os advogados das partes, de forma imparcial, prevalece sobre a justificação administrativa" (TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0024057-21.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 25jun.2015). Dispondo de elementos que impeçam a pretensão da parte autora, cabe ao INSS produzir em Juízo a prova adequada, cumprindo o ônus processual descrito no inc. II do art. 373 do CPC2015 (inc. II do art. 333 do CPC1973).
DO CASO CONCRETO
O requisito etário, cinquenta e cinco anos, cumpriu-se em 20/02/2011, (nascimento em 20/02/1956, EVENTO 3 - RG3). O requerimento administrativo deu entrada em 12/05/2011 (EVENTO 5 - PROCADM1). Deve-se comprovar, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991, o exercício de atividade rural nos 180 meses imediatamente anteriores ao cumprimento do requisito etário ou ao requerimento administrativo, o que for mais benéfico à parte autora, o que neste caso é dispensável a análise, uma vez que a autora ingressou com o requerimento administrativo no ano em que completou o requisito etário (2011).
Em sua petição inicial (EVENTO 1 - INIC1), afirma a parte autora que sempre trabalhou na agricultura, em regime de economia familiar, sendo detentora dos requisitos necessários para concessão do benefício pleiteado.
Em relação às provas documentais do exercício de atividade rural, o processo foi instruído com os seguintes documentos:
1. Certidão de Casamento da autora com o Sr. José de Deus Dutra, em 1974, onde o esposo da autora é qualificado como "pecuarista" (EVENTO 1 - CERTCAS4);
2. Cópia das entrevistas rurais realizadas perante a autarquia, em nome da autora e do esposo desta (EVENTO 1 - OUT6);
3. Cópia do resultado da Justificação Administrativa realizada perante a autarquia (EVENTO 1 - RESJUSTADMIN10);
4. ITR do ano de 2010 das propriedades da autora, estando os documentos quase que completamente ilegíveis (EVENTO 1 - DECL15);
5. Formal de partilha referente ao falecimento do pai da autora, no ano de 1972, onde é informado que o mesmo era criador, deixando áreas de campo para seus sucessores (EVENTO 1 - F_PARTILHA16);
6. Documentos referentes ao processo de inventário, onde a autora era herdeira de áreas rurais (EVENTO 1 - OUT18);
7. Notas fiscais de produtor rural em nome da autora e de seu esposo nos anos de 1982 até 2011 (EVENTO 1 - NFISCAL19-NFISCAL26). Referente ao período de carência exigido (1996 a 2011), foram juntadas as notas:
PRODUTO - (Nº NOTA) | VALOR | DATA DE EMISSÃO |
"ILEGÍVEL" - (019 465452) | "ILEGÍVEL" | 29/11/1996 |
DIVERSOS - "ILEGÍVEL" | "ILEGÍVEL" | 07/01/1997 |
LÃ - (465454) | R$ 484,56 | 13/01/1997 |
"ILEGÍVEL" - (187141) | R$ 400,00 | 26/12/1998 |
VACAS - (926141) | R$ 760,00 | 26/12/1998 |
TOUROS - (092278) | R$ 500,00 | 26/03/1999 |
NOVILHOS - "ILEGÍVEL" | R$ 1.350,00 | 13/11/2000 |
NOVILHOS - (048 690956) | R$ 11.200,00 | 13/11/2000 |
ILEGÍVEL - (050 236041) | R$ 2.860,00 | 15/05/2001 |
NOVILHOS - (050 236046) | R$ 8.000,00 | 11/06/2002 |
VACAS - (066 262791) | R$ 3.915,00 | 01/09/2004 |
NOVILHOS - (066 262797) | R$ 1.500,00 | 29/06/2005 |
SOJA - (081 236551) | R$ 3.600,00 | 28/04/2006 |
SOJA - (187897) | R$ 4.800,00 | 28/04/2006 |
NOVILHOS - (081 236554) | R$ 16.500,00 | 02/05/2007 |
SOJA - (081 236558) | R$ 2.800,00 | 09/05/2008 |
SOJA - (290303) | R$ 3.120,00 | 09/05/2008 |
SOJA - (088 766133) | R$ 3.600,00 | 20/04/2009 |
BOVINOS - (088 766138) | R$ 9.000,00 | 08/04/2010 |
VACAS - (109 256302) | R$ 3.150,00 | 04/04/2011 |
8. Declaração ITR do ano de 2016 (EVENTO 22 - DECL9), onde consta que a autora e o esposo são proprietários dos seguintes imóveis rurais:
NOME | ÁREA |
Passo da Porteira I | 92,5 ha |
Alto Bonito | 36,0 ha |
Camaqua II | 96,0 ha |
Passo da Porteira II | 56,6 ha |
Camaqua I | 20,6 ha |
9. Saldo do Agronegócio de Bovinos, expedido pela Secretaria Estadual da Agricultura, Pecuária e Agronécio do Estado do Rio Grande do Sul, o qual indica que o esposo da autora possui 256 animais em sua propriedade (bovinos) no ano de 2016 (EVENTO 22 - OUT10);
10. Certidões do INCRA das propriedades da autora e do esposo, referente aos anos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014 (EVENTO 22 - INCRA11).
Também foi juntado aos autos cópia do processo administrativo do esposo da autora (EVENTO 11). Analisando os documentos, é possível constatar que o esposo da autora é cadastrado perante a autarquia como "Empregador Rural", conforme é possível verificar em seu CNIS (EVENTO 11 - PROCADM2, p.1-4).
Em relação às provas orais, colheu-se, em sede de Justificação Administrativa, o depoimento das testemunhas arroladas pela parte autora (EVENTO 5 - PROCADM4, p.77-78; PROCADM5, p.1-7). Os depoimentos foram colhidos em 15/06/2011.
A testemunha Carlos Alberto Dutra Gomes declarou a) que conhece a autora e o seu esposo há mais de 40 anos, e que eles sempre trabalharam na agricultura; b) que a autora não possui empregados trabalhando na sua propriedade rural, e que os dois filhos da autora residem na mesma propriedade; e c) que a autora planta milho, e possui criação de gado e ovelha em sua propriedade, não sabendo o destino do que a autora produz.
A testemunha Anecy Farias de Matos declarou a) que conhece a autora e o seu esposo há cerca de 50 anos, e que eles sempre trabalharam na agricultura; b) que a autora não possui empregados trabalhando na sua propriedade rural, e que os dois filhos da autora residem na mesma propriedade; c) que a autora planta milho, feijão, e possui uma horta, tendo também criação de gado, cavalos e ovelhas; e d) que a produção é comercializada, mas que não possuem um comprador específico.
A testemunha Joao Ceretta Neto declarou a) que conhece a autora e o seu esposo há mais de 30 anos, e que eles sempre trabalharam na agricultura; b) que a autora não possui empregados trabalhando na sua propriedade rural, e que os dois filhos da autora residem na mesma propriedade; e c) que a autora planta milho, feijão, e possui uma horta, tendo também criação de gado, cavalos, porcos, galinhas e ovelhas, não sabendo o destino do que a autora produz.
Em sua contestação (EVENTO 28 - CONT1) centrou o INSS a não concessão do benefício no fato de que a autora jamais foi segurada especial - mas sim, contribuinte individual - devidas as proporções da propriedade rural da autora, que ultrapassam o estabelecido em lei (04 módulos fiscais). Destacou o INSS que o esposo da autora era empregador rural, o que descaracterizaria a condição de segurada especial da autora, que alega trabalhar em regime de economia familiar.
A sentença (EVENTO 34 - SENT1), datada de 17/08/2017, julgou improcedente o pedido da inicial. Entendeu o magistrado que não restou comprovado no caso em tela o trabalho rural em regime de economia familiar, uma vez que as notas fiscais de produtor rural juntadas aos autos são de valores elevados, assim como a extensão de terras de propriedade da autora, que ultrapassam os 04 módulos fiscais estabelecidos em lei.
Apelou a parte autora (EVENTO 40 - APELAÇÃO1), defendendo que exercia a atividade de trabalhadora rural em regime de economia familiar, sendo pequena produtora, e que a atividade desempenhada era dirigida para subsistência do núcleo familiar. Alegou que o tamanho da propriedade não constitui óbice para o deferimento do benefício, devendo a sentença impugnada ser reformada em sua integralidade.
Antes de entrar no mérito sobre a condição da autora como trabalhadora rural em regime de economia familiar, é necessário destacar que a Previdência Social, a partir da Constituição de 1988, passou a dar um tratamento especial para os trabalhadores rurais, positivando regras próprias aos agricultores, principalmente àqueles considerados como segurados especiais: camponeses que atuam em pequenas propriedades individualmente ou no regime de economia familiar. Neste sentido, a legislação posterior à Constituição de 1988, como já visto no apartado anterior, (1) reduziu em cinco anos o requisito etário, (2) dispensou a contribuição previdenciária no período anterior à Lei 8.2313/1991 (dando um caráter também assistencial à concessão do benefício) e (3) flexibilizou a comprovação do período de carência para a concessão do benefício, admitindo a prova descontínua no tempo desde que o período integral de atividade rural fosse referendado pelos testemunhos orais. Tal tratamento diferenciado ao trabalhador rural advém da noção de solidariedade social, determinando que para estes trabalhadores deve ser adotado o princípio da distributividade, assegurando o trabalhador em face de eventos que lhe causem perda ou redução da capacidade de subsistência. Dessa forma, a adoção do princípio da distributividade associado ao princípio da proteção (que visa amenizar o risco social ao qual o segurado está submetido) acaba se configurando como um instrumento de redução das desigualdades sociais.
Com base nas premissas do parágrafo anterior, entendo que para a concessão da aposentadoria rural por idade ao segurado especial deve-se sempre atentar para o seu caráter muitas vezes assistencial e redutor das desigualdades sociais. Esta é a razão para limitar a concessão do benefício somente àqueles trabalhadores rurais que comprovem que a agricultura é essencial para a sua subsistência e/ou de sua família.
No caso concreto, não há comprovação que a autora exercia suas atividades rurais no regime de economia familiar, uma vez que a) a autora e o esposo são proprietários de aproximadamente 300 hectares de terra, possuindo, conforme Saldo do Agronegócio de Bovinos, expedido pela Secretaria Estadual da Agricultura, Pecuária e Agronécio do Estado do Rio Grande do Sul, 256 animais em sua propriedade (bovinos) no ano de 2016 (EVENTO 22 - OUT10); b) as notas de produtor rural juntadas aos autos possuem valores elevados, sendo as últimas três notas juntadas aos autos nos valores de R$ 3.150,00 (2011), R$ 9.000,00 (2010) e R$ 3.600,00 (2009), o que descaracteriza a pequena produção de subsistência; e c) o esposo da autora estar cadastrado perante a autarquia previdenciaria como "Empregador Rural", conforme é possível verificar em seu CNIS (EVENTO 11 - PROCADM2, p.1-4).
Nesse contexto, resta impossibilitado o reconhecimento da condição de segurada especial da autora exclusivamente pela prova testemunhal, ainda que favorável, pois do exame da documentação acostada aos autos, conclui-se que a comercialização dos produtos agrícolas e pecuários não se limitava ao excedente da atividade rural desenvolvida, mas tinha cunho evidentemente empresarial.
Acresça-se, por pertinente, que o fato de estar a demandante enquadrada na chamada agricultura empresarial afasta sua condição de segurada especial, tornando-a segurada obrigatória na condição de contribuinte individual, consoante dispõe o artigo 11, V, "a", da Lei nº. 8.213/91 na redação dada pela Lei nº 11.718/2008:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
V - como contribuinte individual:
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária, a qualquer título, em caráter permanente ou temporário, em área superior a 4 (quatro) módulos fiscais; ou, quando em área igual ou inferior a 4 (quatro) módulos fiscais ou atividade pesqueira, com auxílio de empregados ou por intermédio de prepostos; ou ainda nas hipóteses dos §§ 9o e 10 deste artigo;
Diante de comercialização frequente de elevado número de cabeças de gado e de vasta produção de soja a indicar poder aquisitivo incompatível com trabalho rural em regime de economia familiar, não é possível concluir que o exercício de atividade rural pela parte autora seja voltado somente à própria subsistência, razão pela qual não deve ser reformada a sentença singular, que julgou improcedente o pedido inicial.
Levando em conta o exposto acima, entendo que o conjunto probatório dos autos não indica a condição de segurada especial da parte autora, devendo ser mantida a sentença que considerou improcedente a ação, negando-se provimento ao recurso da parte autora.
DOS CONSECTÁRIOS
Os honorários advocatícios são em regra fixados em dez por cento sobre o valor da condenação (TRF4, Terceira Seção, EIAC 96.04.44248-1, rel. Nylson Paim de Abreu, DJ 07/04/1999; TRF4, Quinta Turma, AC 5005113-69.2013.404.7007, rel. Rogerio Favreto, 07/07/2015; TRF4, Sexta Turma, AC 0020363-44.2014.404.9999, rel. Vânia Hack de Almeida, D.E. 29/07/2015), excluídas as parcelas vincendas nos termos da Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência", e da Súmula 111 do STJ (redação da revisão de 06/10/2014): "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença". Foi este o entendimento da sentença.
Uma vez que a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC) e que foram apresentadas contrarrazões, aplica-se a majoração prevista no art. 85, §11, desse diploma, observados os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos.
Assim, majoro a verba honorária para 15% (quinze por cento) do valor da causa. Resta suspensa, no entanto, a exigibilidade do pagamento tendo em vista a concessão da Assistência Judiciária Gratuita (EVENTO 15 - DESPADEC1).
CONCLUSÃO
Em conformidade com a fundamentação acima, a sentença deve ser mantida em sua integralidade, negando-se provimento ao recurso, tendo em vista que as provas dos autos não demonstram a condição de segurada especial da parte autora.
DISPOSITIVO
Pelo exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/02/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001560-88.2016.4.04.7110/RS
ORIGEM: RS 50015608820164047110
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | CATARINA GUIMARAES DUTRA |
ADVOGADO | : | NELSON CLECIO STÖHR |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/02/2018, na seqüência 482, disponibilizada no DE de 09/01/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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