Apelação Cível Nº 5005354-29.2016.4.04.7204/SC
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | HERALDO LUIZ DOMINGOS |
ADVOGADO | : | HENOR DE MOURA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
REPETIÇÃO DE VALORES DE NATUREZA ALIMENTAR. IMPOSSIBILIDADE.
O benefício previdenciário concedido administrativamente e recebido de boa-fé é insuscetível de repetição, consoante decidiu o Superior Tribunal de Justiça, de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia (REsp 1384418/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/06/2013, DJe 30/08/2013).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 19 de outubro de 2017.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9185602v7 e, se solicitado, do código CRC 324314D7. | |
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Apelação Cível Nº 5005354-29.2016.4.04.7204/SC
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | HERALDO LUIZ DOMINGOS |
ADVOGADO | : | HENOR DE MOURA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença, prolatada em 09-01-2017, que julgou improcedente pedido de a condenação da parte ré ao pagamento de valores indevidamente recebidos a título de aposentadoria por tempo de contribuição, porquanto, no âmbito da OPERAÇÃO PERSA, foi identificado como recebedor de benefícios previdenciários mediante a inclusão de tempo de serviço comum e especial inexistente.
Sustenta, em síntese, que restou demonstrada a má-fé do recorrido, pois não é crível alguém pagar a quantia de R$ 600,00 (como afirmou em sua defesa na via administrativa) para terceiro qualificado como "despachante" formular pedido de aposentadoria junto ao INSS, quando seria possível ele mesmo o fazer de forma gratuita.
Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo provimento do recurso (e. 8).
É o relatório.
Inclua-se em pauta.
VOTO
Competência dos gabinetes da 3ª Seção
Preliminarmente, consigno que a demanda cuida de matéria envolvendo o ressarcimento de valores ao patrimônio público, de natureza previdenciária, não envolvendo relação jurídico-tributária (v.g. exigibilidade ou definição dos valores de contribuições), razão pela qual a Corte Especial deste TRF firmou entendimento de que a competência para julgamento desta matéria pertence à 3ª Seção. Leia-se, in verbis:
"CONFLITO DE COMPETÊNCIA. INSS. RESTITUIÇÃO. NATUREZA PREVIDENCIÁRIA. É de natureza previdenciária a matéria relativa a ressarcimento de benefício previdenciário pago indevidamente. Precedente da Corte Especial Judicial." (TRF4, CC nº 0015807-28.2011.404.0000/RS, Corte Especial, Relatora Des. Federal Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. 28/03/2012)
Isso posto, confirmada a competência desta Turma, passo a examinar a tese recursal.
Examinando os autos, concluo que não está suficientemente demonstrada a má-fé da parte autora, a ensejar a restituição dos valores recebidos indevidamente aos cofres da Previdência Social, conforme admitido no parecer ministerial, que opinou pelo provimento do recurso em face da tese de que os valores percebidos de boa-fé também devem ser restituídos. Confira-se, a propósito, o seguinte excerto do parecer da Procuradoria Regional da República da 4ª Região:
Conquanto a irregularidade motivadora do cancelamento de benefício objeto desta ação tenha sido identificada no curso de ampla operação realizada pela Polícia Federal relativa a fraudes na concessão de benefício previdenciário, na apelação o INSS dedica-se mais a sustentar a desnecessidade da comprovação de má-fé do recebedor de benefício indevido que a demonstrar a má-fé em concreto do apelado. Sob tal aspecto, limita-se a autarquia a destacar que o apelado teve seu benefício obtido por intermediação de despachante cujo envolvimento com a fraude foi comprovado.
Com efeito, a existência dessa fraude e o envolvimento do despachante restaram incontroversos. Não foram, contudo, explorados aspectos particulares do caso que pudessem demonstrar que o apelado tinha consciência da irregularidade, o que prejudica a análise da apelação sob tal perspectiva, razão pela qual deixa o Ministério Público Federal de se manifestar conclusivamente a respeito, conquanto entenda este órgão que o tema deveria, à luz da jurisprudência dessa Corte Regional, ter merecido mais atenção do INSS. (e. 6/ fls. 2-3).
Irrepetibilidade de valores recebidos em hipótese de não-comprovação de má-fé
Não demonstrada má-fé do segurado, são irrepetíveis os valores recebidos, consoante decidiu o STJ na sistemática de representativo de controvérsia:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RECEBIMENTO VIA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. REALINHAMENTO JURISPRUDENCIAL. HIPÓTESE ANÁLOGA. SERVIDOR PÚBLICO. CRITÉRIOS. CARÁTER ALIMENTAR E BOA-FÉ OBJETIVA. NATUREZA PRECÁRIA DA DECISÃO. RESSARCIMENTO DEVIDO. DESCONTO EM FOLHA. PARÂMETROS. (...)
2. Historicamente, a jurisprudência do STJ fundamenta-se no princípio da irrepetibilidade dos alimentos para isentar os segurados do RGPS de restituir valores obtidos por antecipação de tutela que posteriormente é revogada.
3. Essa construção derivou da aplicação do citado princípio em Ações Rescisórias julgadas procedentes para cassar decisão rescindenda que concedeu benefício previdenciário, que, por conseguinte, adveio da construção pretoriana acerca da prestação alimentícia do direito de família. A propósito: REsp 728.728/RS, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, Quinta Turma, DJ 9.5.2005.
4. Já a jurisprudência que cuida da devolução de valores percebidos indevidamente por servidores públicos evoluiu para considerar não apenas o caráter alimentar da verba, mas também a boa-fé objetiva envolvida in casu.
5. O elemento que evidencia a boa-fé objetiva no caso é a "legítima confiança ou justificada expectativa, que o beneficiário adquire, de que valores recebidos são legais e de que integraram em definitivo o seu patrimônio" (AgRg no REsp 1.263.480/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 9.9.2011, grifei). Na mesma linha quanto à imposição de devolução de valores relativos a servidor público: AgRg no AREsp 40.007/SC, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 16.4.2012; EDcl nos EDcl no REsp 1.241.909/SC, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 15.9.2011;
AgRg no REsp 1.332.763/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 28.8.2012; AgRg no REsp 639.544/PR, Rel. Ministra Alderita Ramos de Oliveira (Desembargador Convocada do TJ/PE), Sexta Turma, DJe 29.4.2013; AgRg no REsp 1.177.349/ES, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJe 1º.8.2012; AgRg no RMS 23.746/SC, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 14.3.2011.
6. Tal compreensão foi validada pela Primeira Seção em julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, em situação na qual se debateu a devolução de valores pagos por erro administrativo: "quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público." (REsp 1.244.182/PB, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 19.10.2012, grifei).
(REsp 1384418/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/06/2013, DJe 30/08/2013)
No caso, o INSS busca a devolução de valores percebidos a título de aposentadoria por tempo de contribuição concedida mediante tempo de serviço inexistente. Todavia, como bem referido na sentença recorrida, não houve demonstração pela autarquia, a quem incumbe o ônus da prova, de que o demandado tenha ardilosamente omitido qualquer informação, não restando comprovada a má-fé, a qual não se presume.
Sendo assim, deve ser prestigiada a sentença proferida pelo eminente Juiz Federal Paulo Vieira Aveline (e. 23):
O processo administrativo para apuração de irregularidades na concessão da aposentadoria do réu, foi instaurado em razão de denúncia resultante da Operação Persa, a qual foi promovida pela Polícia Federal (IPL0163/2009-4 - SR/DFP/SC). Examinando os autos, apura-se que as irregularidades encontradas foram as seguintes: (a) inserção do tempo de serviço sem a devida comprovação; (b) algumas fotocópias autenticadas da CTPS com rasuras em datas de entrada ou saída, e (c) dúvidas quanto às atividades especiais exercidas para alguns empregadores, pois faltavam as identificações dos responsáveis pelos preenchimentos dos respectivos formulários.
Constata-se, que tanto na defesa administrativa quanto na contestação judicial, o réu afirmou que foi seu colega de trabalho Valeri quem encaminhou o pedido de concessão de sua aposentadoria no INSS, tendo assinado documentos para tal intento na frente da empresa onde trabalha, entregando-os ao referido colega.
Verifica-se que o responsável pela inserção dos dados no sistema é o servidor Hamilton Bernardes, e como já relatado anteriormente, a auditoria no benefício do réu ocorreu justamente por ter sido concedido por servidor supostamente envolvido em outras situações fraudulentas, como se constata no relatório elaborado pela Gerência Executiva do INSS em Florianópolis (evento 1, PROCADM2, p. 93). Não houve, em tal oportunidade, menção a qualquer conduta fraudulenta do réu.
Desta maneira, apesar da irregularidade do benefício, não há prova inequívoca nos autos de que o réu tenha concorrido para a fraude na concessão, nem de que tenha agido de má-fé ou contribuído de alguma forma para a prática da fraude. A má-fé deve estar devidamente comprovada e não pode, em hipótese alguma, ser presumida. O ônus da prova, no caso, é do INSS do qual não se desincumbiu.
O TRF da 4ª Região mantém entendimento contrário à repetibilidade das verbas alimentares percebidas em boa-fé:
PREVIDENCIÁRIO. EXECUÇÃO. VALORES PAGOS A MAIOR. DEVOLUÇÃO NOS AUTOS DO FEITO EXECUTIVO. IMPOSSIBILIDADE. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. BOA-FÉ. 1. A execução é processo aparelhado para o fim de obter um pagamento, não implicando, salvo havendo oposição de embargos, acertamento da relação de direito, de modo que alcançado o objetivo, a conseqüência possível é a extinção, nos termos do artigo 794, I, do CPC. 2. Consumada a execução com a liberação do valor em favor do credor, eventual pretensão de restituição de pagamento a maior deve, em princípio, ser perseguida pelas vias adequadas, não sendo possível, nos próprios autos, determinação nesse sentido. 3. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. (TRF4, AC 0011098-52.2013.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, D.E. 27/05/2014)
CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE. PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. Tendo em vista a impossibilidade de cumulação do benefício de pensão por morte com benefício de amparo à pessoa idosa, nos termos do art. 20, parágrafo 4º, da Lei 8.742/93, é indevido o restabelecimento do benefício assistencial. 2. Em face de sua natureza eminentemente alimentar, são irrepetíveis as parcelas indevidas de benefícios previdenciários recebidas de boa-fé. Precedentes da Terceira Seção desta Corte. (TRF4, AC 0001268-28.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 19/05/2014)
[...]
Filio-me a tal corrente jurisprudencial, pois entendo incorreto impor ao segurado a devolução de valores recebidos em boa-fé.
Portanto, repisando-se que a má-fé nunca é presumida, não havendo segurança do juízo quanto ao ponto, a improcedência do pedido é medida que se impõe, devido a irrepetibilidade de créditos de natureza alimentar.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte autora em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/10/2017
Apelação Cível Nº 5005354-29.2016.4.04.7204/SC
ORIGEM: SC 50053542920164047204
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | HERALDO LUIZ DOMINGOS |
ADVOGADO | : | HENOR DE MOURA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/10/2017, na seqüência 439, disponibilizada no DE de 02/10/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal CELSO KIPPER | |
: | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE |
Ana Carolina Gamba Bernardes
Secretária
Documento eletrônico assinado por Ana Carolina Gamba Bernardes, Secretária, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9217615v1 e, se solicitado, do código CRC E5BDD591. | |
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