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Apelação/Remessa Necessária Nº 5000174-29.2016.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: ALMERINDA MENDES RAYMUNDO (RÉU)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)
RELATÓRIO
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL ajuizou ação de ressarcimento contra ALMERINDA MENDES RAYMUNDO, objetivando a devolução dos valores pagos indevidamente a título de benefício de pensão por morte.
Processado o feito, sobreveio sentença (
) proferida nos seguintes termos:Ante exposto, julgo IMPROCEDENTES os pedidos, extinguindo o feito, com resolução do mérito, na forma do art. 487, inciso I , do CPC/2015.
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, que vão fixados no montante de 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC/2015. Índice: INPC.
Sem condenação em custas (art. 4º, inciso I, da Lei n. 9.289/96).
Sentença sujeita à remessa necessária (art. 496, inciso I, do CPC/2015).
Apela o INSS (
).Alega irregularidade na concessão de pensão por morte, uma vez que o instituidor do benefício percebia outra fonte de renda, diversa da rural: um aluguel de pedreira existente na propriedade do segurado falecido, pelo menos desde 1987. Aduz que, após regular trâmite administrativo, restou descaracterizada a condição de segurado especial do instituidor, sendo considerada irregular a concessão da aposentadoria por idade rural e, consequentemente, da pensão por morte. Afirma a possibilidade de cobrança dos valores recebidos indevidamente.
Com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Recebo o apelo do INSS, pois cabível, tempestivo e isento de preparo.
Não conhecimento da remessa necessária
Na forma do art. 496, I, do CPC/2015, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público; por outro lado, na forma do § 3º, I, dispensa-se a remessa necessária quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público.
Embora ainda não tenha sido calculado o valor da condenação, é possível concluir, com segurança aritmética, que a condenação apenas em honorários não atingirá tal montante (registre-se, inclusive, que à causa foi atribuído o valor de R$ 52.262,21).
Assim, é caso de não conhecimento da remessa necessária.
Mérito
Pontos controvertidos
Nesta instância, é controvertido o seguinte ponto:
- A restituição dos valores recebidos de boa-fé.
Mérito
Ressarcimento ao erário
Quanto ao ponto, a sentença, em fundamentação clara e coerente, concluiu não ser cabível a devolução dos valores recebidos em razão do benefício cessado administrativamente, pois inexistente má-fé das rés, mas equívoco do INSS na interpretação dos fatos e requisitos legais.
Dessa forma, adoto os fundamentos da sentença como razões de decidir:
No caso em tela, consoante se vê dos documentos anexados ao evento 1, PROCADM2, a pensão por morte foi requerida, na esfera administrativa, em 04/06/2002, tendo sido deferido aos dependentes do segurado instituidor, Almerinda Mendes Raymundo (esposa-ré) e Carina Mendes Raymundo (filha do segurado falecido), desde a data do óbito, em 24/05/2002 (evento 1, PROCADM2, página 4, certidão de óbito).
Trata-se de benefício que foi derivado da aposentadoria por idade rural (NB 41/123.886.710-0 (DER e DIB 03/04/2002), a qual o segurado instituidor titularizava na ocasião da morte.
Alega o INSS que a ré, esposa do falecido, agiu de má-fé, pois ao requerer sua aposentadoria por idade rural no âmbito judicial (Ação nº 2009.7158.006284-0) informou, na justificação administrativa, que contava com outra fonte de renda, qual seja, o aluguel de uma pedreira existente na propriedade do casal, desde o ano de 1987.
Em razão disso, após instauração de processo administrativo, a ré teve cancelado o benefício de pensão por morte em 01/08/2011.
Logo, percebe-se que no caso dos autos, a decisão que deferiu o benefício de pensão por morte se deu pelo próprio INSS, através da análise das provas (documental e testemunhal) e do preenchimento dos requisitos objetivos do direito postulado, o que concretiza a boa-fé objetiva da segurada. Pois bem, não há elementos - sequer indiciários - que revelem a má-fé da ré.
Outrossim, se tal argumento - a má-fé da ré ao omitir a existência da pedreira na propriedade rural - se sustentasse, qual seria o motivo da autora informar tal fato, apenas na esfera judicial, no ano de 2009, ao requerer sua aposentadoria por idade rural, se ciente que tal acontecimento poderia, pelo menos em tese, ser impeditivo à concessão do benefício.
Portanto, em que pese indevido o benefício da ré, tenho que não restou suficientemente comprovada a existência de má-fé a autorizar sua devolução.
Primeiro, porque, ainda que verdadeira fosse a informação do INSS de que a ré, na DER, teria omitido informações relevantes sobre a condição de segurada especial, não se pode fechar os olhos para o fato de ser a requerente, assim como seu esposo falecido, pessoas sem instrução, trabalhadores da roça, sem conhecimento jurídico acerca da legislação previdenciária, muito menos sobre o conceito complexo e minucioso de "segurado especial".
Segundo, porque, o fato do segurado falecido ter em suas terras uma pedreira não se presta por si só, para descaracterizar sua condição de segurado especial à época, até porque não logrou o INSS demonstrar que tal exploração constituísse fonte de renda de tal monta que tornasse incompatível sua atividade rural. Outrossim, a matéria é controvertida na própria jurisprudência que já decidiu no seguinte sentido:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE CÔNJUGE. COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS. 1. O exercício de atividade rural deve ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, à exceção dos trabalhadores rurais bóias-frias. 2. Para a concessão de pensão por morte, a certidão de óbito do cônjuge falecido, qualificando-o como agricultor, constitui início de prova material da atividade agrícola. 3. A prática eventual de atividade de tirar pedras de pedreira localizada no imóvel do falecido não impede o reconhecimento de sua qualidade de segurado especial, porquanto se tratava de atividade complementar ao labor campesino, este sim essencial à subsistência do grupo familiar, conforme demonstrado pelo conjunto probatório. 4. Comprovada a qualidade de segurado especial do de cujus, a autora faz jus ao pensionamento requerido. 5. Para fins de atualização monetária, aplicáveis os índices oficiais, e jurisprudencialmente aceitos, quais sejam: INPC (07/95 a 04/96) e IGP-DI (a partir de 05/96). A correção, em ações de natureza previdenciária, face ao caráter alimentar dos proventos, deve retroagir à data em que devidos. 6. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, considerando como tais as vencidas após a data da sentença, face ao que dispõe o art. 20, § 3º, do CPC e a Súmula 111 do STJ. 7. Tendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual, deve a Autarquia responder pela metade das custas devidas, consoante a Súmula 2 do extinto Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul. (TRF4, AC 2002.04.01.042959-9, QUINTA TURMA, Relator CELSO KIPPER, DJ 21/12/2005)(grifei).
Por fim, destaco que o próprio INSS - APS Taquara, ao relatar o assunto manifestou-se pela inexistência de má-fé no caso dos autos (evento 1, PROCADM2, páginas 129-130):
(...)
" 10. Considerando-se as declarações prestadas pela esposa (fls. 42) o rendimento decorrente da locação era de meio salário mínimo até cerca de oito anos atrás, ou seja, até aproximadamente 2001. Nesse ano o segurado implementou a idade mínima para a concessão de aposentadoria por idade rural, a qual foi requerida e concedida em 2002.
11. Entendemos, s.m.j., que é controverso presumir que a atividade rural deixa de ser indispensável à subsistência do grupo familiar ante a existência de renda diversa no valor de meio salário mínimo para duas pessoas (pode-se fazer uma comparação com o benefício assistencial, em que renda nesse patamar indica impossibilidade de sustento próprio).
12. Ademais, ante o falecimento do segurado, entendemos ainda pela impossibilidade de conclusão pela má-fé com base no cotejo entre a entrevista constante nos autos e as declarações da esposa, mormente porque o segurado era analfabeto, não havendo possibilidade de convocação para prestar declarações acerca do indício de irregularidade.
13. Considerando a situação singular solicitamos orientar acerca do parecer quanto à regularidade ou não da concessão.
14. Caso a orientação seja no sentido de que a concessão foi irregular, solicitamos ratificar/retificar o entendimento, s.m.j., de que os valores percebidos (03.04.2002 a 24.05.2002) estão prescritos, uma vez que a apuração da irregularidade ocorreria mais de cinco anos após os mesmos. (grifei).
(...)
Na ocasião, a consulta foi encaminhada à Seção de Reconhecimento de Direitos, setor competente do INSS para emitir parecer sobre tal demanda. A referida Seção, em 18/01/2001, proferiu o seguinte despacho 054/2011 (evento 1, PROCAMD2, página 140):
(...)
4. Tendo em vista o contido no processo, não temos como afirmar que tenha havido má-fé do segurado, levando-nos a concluir, s.m.j., que trata-se de Erro Administrativo, devendo ser dado continuidade aos procedimentos de monitoramento operacional de benefícios, observando, quanto à prescrição quinquenal, o contido no art. 456 da Instrução Normativa nº 045/2010. (grifei).
(...)
Ante o exposto, considerando a boa-fé da segurada entendo pela impossibilidade de devolução dos valores recebidos a título de pensão por morte (NB 21/124.721.146-8).
Não há má-fé, uma vez que não demonstrada a existência de atos praticados pela parte ré que demonstrassem a intenção de levar alguma vantagem em relação ao ente previdenciário.
Registre-se, inclusive, que, se erro houve, foi na concessão do benefício originário, que, obviamente, não pode ser imputado ao beneficiário de pensão por morte. Não há como se imputar má-fé às rés na concessão de benefício não requerido por elas (aposentadoria por idade rural do instituidor da pensão), até porque a ré nunca omitiu a renda advinda da pedreira, tanto que espontaneamente a mencionou quando requereu benefício próprio.
Assim, a sentença está correta.
Registro, por oportuno, que o presente feito foi suspenso até o julgamento do tema 979 do STJ, o qual, porém, sequer se aplica ao caso.
É que o mencionado pagamento indevido não decorre de erro material ou operacional, mas sim de equívoco do INSS na análise do preenchimento dos requisitos fáticos e legais para a concessão do benefício.
Ainda que assim não fosse, a modulação de efeitos somente permitiria a cobrança após abril de 2021, e a presente ação foi ajuizada em 2016.
Por fim, destaca-se que não se discute, nesta ação, a correção ou não do cancelamento do benefício, mas apenas a restituição ao erário, cuja impossibilidade ora se reafirma.
Honorários recursais
Considerando o disposto no art. 85, § 11, NCPC, e que está sendo negado provimento ao recurso, majoro os honorários fixados na sentença em 20%, respeitados os limites máximos das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85.
Conclusão
Remessa necessária não conhecida.
Apelo do INSS desprovido.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e negar provimento ao apelo do INSS.
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5000174-29.2016.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: ALMERINDA MENDES RAYMUNDO (RÉU)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO.
1. Não cabe a restituição ao erário de benefício recebido indevidamente por má interpretação da lei ou má análise das provas apresentadas na via administrativa quando não comprovada a má-fé do segurado.
2. Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e negar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de junho de 2022.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 13/06/2022 A 21/06/2022
Apelação/Remessa Necessária Nº 5000174-29.2016.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES
APELANTE: ALMERINDA MENDES RAYMUNDO (RÉU)
ADVOGADO: CAROLINE BARBOZA DA SILVA (OAB RS090192)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (AUTOR)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/06/2022, às 00:00, a 21/06/2022, às 16:00, na sequência 334, disponibilizada no DE de 02/06/2022.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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