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Apelação Cível Nº 5008080-49.2024.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença (
) que julgou procedente o pedido de restabelecimento de aposentadoria por incapacidade permanente, nos seguintes termos:[...]
3 - DISPOSITIVO
Em face do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido por A. C. D. L. contra o Instituto NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para tornar definitiva a tutela de urgência concedida e determinar o restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez nº 1603854450, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Isento o réu do pagamento da taxa única (art. 5°, I, da Lei 14.634/2014) e condeno-o ao pagamento integral das despesas processuais (arts. 14 e 16 da Lei 14.634/2014), bem como ao pagamento de honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, forte no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Caso interposto recurso de apelação, cumpram-se as formalidades dos §§ 1º e 2º, do art. 1.010, do Código de Processo Civil, e, após, remetam-se os autos ao E. Tribunal de Justiça do RS.
Preclusa a decisão, arquive-se com baixa.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Em suas razões de apelação (
) o INSS requer a reforma da sentença, sustentando, em síntese, que o laudo pericial produzido em juízo concluiu pela incapacidade temporária da parte autora, razão pela qual o benefício a ser concedido é o de auxílio por incapacidade temporária.Processados, com contrarrazões (
), subiram os autos a esta Corte.É o relatório.
VOTO
Dos benefícios previdenciários por incapacidade
Quanto à aposentadoria por incapacidade permanente para o trabalho, reza o art. 42 da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
(...)
§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
Já no que tange ao auxílio por incapacidade temporária para o trabalho, dispõe o art. 59 do mesmo diploma:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
§ 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
Da qualidade de segurado
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Da carência
Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências.
Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;
(...)
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
(...)
II - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado; (Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)
(...)
Art. 27. Para cômputo do período de carência, serão consideradas as contribuições: (Redação dada pela Lei Complementar nº 150, de 2015)
I - referentes ao período a partir da data de filiação ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), no caso dos segurados empregados, inclusive os domésticos, e dos trabalhadores avulsos; (Redação dada pela Lei Complementar nº 150, de 2015)
II - realizadas a contar da data de efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso, não sendo consideradas para este fim as contribuições recolhidas com atraso referentes a competências anteriores, no caso dos segurados contribuinte individual, especial e facultativo, referidos, respectivamente, nos incisos V e VII do art. 11 e no art. 13.
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei;
Art. 27-A Na hipótese de perda da qualidade de segurado, para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez, de salário-maternidade e de auxílio-reclusão, o segurado deverá contar, a partir da data da nova filiação à Previdência Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
Da incapacidade laborativa
Não havendo discussão quanto à qualidade de segurada da parte autora e à carência, passa-se à análise da incapacidade laborativa.
Em regra, nas ações em que se postula a concessão ou restabelecimento de benefício previdenciário por incapacidade (aposentadoria por incapacidade permanente/invalidez ou auxílio por incapacidade temporária/auxílio-doença), o julgador firma seu convencimento quanto à alegada incapacidade para o trabalho com base na prova pericial, impondo-se, contudo, a consideração de outras variáveis, como idade, formação, histórico laboral, natureza das atividades normalmente desenvolvidas, tipo de enfermidade e, se for o caso, perspectivas de reabilitação.
No caso em apreço, podem ser extraídas as seguintes informações dos autos, a partir da perícia médico-judicial realizada por ortopedista em 03/05/2021 e dos demais documentos colacionados pelas partes:
a) idade: 61 anos (nascimento em 12/04/1963);
b) profissão: Agricultor;
c) escolaridade: Ensino fundamental incompleto;
d) histórico de benefícios/requerimentos: Auxílio por incapacidade temporária previdenciário (NB 537.402.413-9) percebido entre 18/09/2009 e 02/10/2012. Auxílio-acidente previdenciário (NB 602.452.356-8) percebido entre 01/09/2011 e 01/09/2011. Aposentadoria por incapacidade permanente previdenciária (NB 160.385.445-0) percebido entre 03/10/2012 e 06/03/2020. Auxílio por incapacidade temporária previdenciário (NB 536.881.445-0) indeferido. Auxílio por incapacidade temporária previdenciário (NB 547.994.448-3) indeferido. Aposentadoria por incapacidade permanente previdenciária (NB 607.303.910-0) indeferido;
e) enfermidade: CID-10 - S82.3 - Fratura da extremidade distal da tíbia;
f) incapacidade: Total e temporária;
g) atestados: (
, fl. 11);h) exames médicos: (
, fls. 04-06), ( ), ( ), ( ) e ( );i) laudo do INSS: Na perícia administrativa realizada em 26/08/2009 houve diagnóstico de CID S822 (Fratura da diáfise da tíbia); Nos exames dos dias 28/09/2009, 10/11/2009, 21/12/2009, 01/03/2010, 08/07/2010, 01/10/2010, 23/02/2011 e 26/05/2011 houve diagnóstico de CID S823 (Fratura da extremidade distal da tíbia); O exame realizado em 29/08/2011 não reconheceu a existência de incapacidade laborativa; e a perícia administrativa realizada em 06/09/2018 atestou que existiu incapacidade laborativa (
, fls. 13-22 e 29).Tenho que deve ser mantida a sentença que determinou o restabelecimento do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente nº 160.385.445-0.
Destaca-se, inicialmente, que o benefício em discussão foi objeto de outra ação previdenciária, que tramitou sob o nº 0002144-49.2011.8.21.0147, perante o Judiciário Estadual, e cuja sentença determinou a implementação de auxílio por incapacidade temporária desde a cessação, ocorrida em 31/08/2011.
Interposto recurso de apelação pelo autor, esta Turma, por unanimidade, deu provimento ao apelo, determinando o restabelecimento de auxílio por incapacidade temporária a contar do cancelamento indevido (31/08/2011) e a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente a partir da data do laudo judicial (03/10/2012). O trânsito em julgado ocorreu em 16/06/2014.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes excertos do voto condutor do acórdão (
, fls. 14-23):[...]
Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova, sendo certo que embora possível, teoricamente, o exercício de outra atividade pelo segurado, ainda assim a inativação por invalidez deve ser outorgada se, na prática, for difícil a respectiva reabilitação, seja pela natureza da doença ou das atividades normalmente desenvolvidas, seja pela idade avançada.
Em 03-10-12, o autor foi submetido à perícia médica conduzida por especialista em Ortopedia e Traumatologia. Do laudo oficial (fls. 69-75) extraem-se as seguintes informações sobre o caso:
a) diagnóstico: fratura consolidada dos ossos da perna esquerda, lesão ligamentar no joelho esquerdo e perda de partes moles no tornozelo e pé esquerdos;
b) grau e incapacidade: parcial e definitiva, na ordem de 30%;
c) data de início da enfermidade: paciente refere ter sofrido acidente de trânsito em 2009, com lesão no membro inferior esquerdo; foi submetido a tratamento com aparelho gessado; fez procedimento cirúrgico por necrose de partes moles no tornozelo e pé esquerdo.
Colhem-se dos autos outras informações relevantes sobre o autor:
a) idade: 50 anos (nascimento em 12-04-63 - fl. 07);
b) profissão: agricultor (fls. 28 e 69);
c) histórico de benefícios: o autor esteve em gozo de auxílio-doença (NB 31/537.402.413-9) de 18-09-09 a 31-08-11 (fls. 08 e 27).
Comprovando o estado de saúde do autor, constam dos autos:
a) atestado médico datado de 05-08-11 no qual se lê que o autor apresenta luxação inveterada do cotovelo direito, instabilidade severa do joelho esquerdo e artrose do tornozelo esquerdo por fratura (CIDs S53, M23.5 e M19.1), sendo um caso irrecuperável para o trabalho (fl. 09);
b) laudos de perícias administrativas realizadas em 26-08-09, 28-09-09, 10-11-09, 21-12-09, 01-03-10, 08-07-10, 01-10-10, 23-02-11 e 26-05-11, nos quais o autor foi considerado inapto para o trabalho devido a fratura da tíbia - CID S82.2 e S82.3 (fls. 29-37);
c) laudo de perícia administrativa realizada em 29-08-11 na qual o autor foi considerado apto para o trabalho, apesar de apresentar instabilidade no joelho após acidente ocorrido mais de 2 anos antes (fl. 38);
d) atestado médico datado de 06-11-12 dando conta de que ele é portdor de sequelas de acidente de trânsito com ruptura do ligamento cruzado posterior do joelho esquerdo, aguardando cirurgia, sem condições laborativas - CIDs S83.5 e M23.2 (fl. 81);
e) atestado médico dado por Ortopedista e Traumatologista em 28-11-12 dando conta de que o autor sofre de luxação inveterada do radio direito no cotovelo, dor, deformidade e perda de força do cotovelo e antebraço direito (CID S53) e ostecondrodermatose múltipla, sendo aconselhado tratamento clínico e afastamento do trabalho por tempo indeterminado (fl. 82).
Diante do quadro até aqui exposto, o magistrado a quo concedeu ao autor o benefício de auxílio-acidente. A meu ver, contudo, que não se está em face de mera redução da capacidade laborativa, com o que merece provimento o recurso do autor.
Com efeito, embora o perito judicial tenha concluído que a inaptidão do autor é parcial, o conjunto probatório indica que o segurado está incapacitado de forma total e permanente para o trabalho, sem condições de integrar qualquer processo de reabilitação profissional. Isso porque, é imprescindível considerar além do estado de saúde, as condições pessoais da segurado, como a sua idade, a presumível pouca instrução, o tipo de labor desenvolvido (agricultura em regime de economia familiar) e, por fim, a realidade do mercado de trabalho atual, já exíguo até para pessoas jovens e que estão em perfeitas condições de saúde. Nesse compasso, ordenar que o postulante, com tais limitações, recomponha sua vida profissional, negando-lhe o benefício no momento em que dele necessita, é contrariar o basilar princípio da dignidade da pessoa.
Assim, considerando-se todo o conjunto probatório, é de se concluir, pela reforma da sentença para se determinar o restabelecimento auxílio-doença a contar do cancelamento indevido e a concessão de aposentadoria por invalidez a partir da data do laudo judicial.
[...]
O benefício foi implantado, e em exame realizado em 06/09/2018 o médico dos quadros da autarquia considerou que o autor não apresentava elementos médico-periciais que justificassem a incapacidade para sua atividade habitual (
, fl. 29), de modo que o benefício foi descontinuado.Nesse sentido, impõe-se a discussão sobre a possibilidade de cancelamento, na esfera administrativa, de benefício de aposentadoria por incapacidade permanente concedido judicialmente, por decisão já transitada em julgado, tendo em vista a realização de nova perícia médica pela autarquia previdenciária.
Não se ignora o que estabelece o art. 101 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
Art. 101. O segurado em gozo de auxílio por incapacidade temporária, auxílio-acidente ou aposentadoria por incapacidade permanente e o pensionista inválido, cujos benefícios tenham sido concedidos judicial ou administrativamente, estão obrigados, sob pena de suspensão do benefício, a submeter-se a: (Redação dada pela Lei nº 14.441, de 2022)
I - exame médico a cargo da Previdência Social para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção; (Incluído pela Lei nº 14.441, de 2022)
II - processo de reabilitação profissional prescrito e custeado pela Previdência Social; e (Incluído pela Lei nº 14.441, de 2022)
III - tratamento oferecido gratuitamente, exceto o cirúrgico e a transfusão de sangue, que são facultativos. (Incluído pela Lei nº 14.441, de 2022)
Tampouco o disposto no art. 43, § 4º, do mesmo diploma legal:
§ 4º O segurado aposentado por invalidez poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram o afastamento ou a aposentadoria, concedida judicial ou administrativamente, observado o disposto no art. 101 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017)
Entretanto, concedida a aposentadoria por incapacidade permanente (que é benefício, em princípio, definitivo) como resultado de processo judicial, ainda que a verificação sobre a persistência dos pressupostos para a sua manutenção possa ser procedida de ofício pela autarquia, o cancelamento somente pode se dar por decisão de mesma natureza.
Nesse sentido o Código de Processo Civil prevê inclusive o instrumento processual adequado à revisão da situação:
Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo:
I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;
II - nos demais casos prescritos em lei.
É o que se depreende, aliás, da leitura que se faz do artigo 71 da Lei nº 8.212/91, sobretudo de seu parágrafo único:
Art. 71. O Instituto Nacional do Seguro Social-INSS deverá rever os benefícios, inclusive os concedidos por acidente do trabalho, ainda que concedidos judicialmente, para avaliar a persistência, atenuação ou agravamento da incapacidade para o trabalho alegada como causa para a sua concessão.
Parágrafo único. Será cabível a concessão de liminar nas ações rescisórias e revisional, para suspender a execução do julgado rescindendo ou revisando, em caso de fraude ou erro material comprovado.
O INSS, portanto, pode submeter o segurado a revisões periódicas com o fito de constatar se houve ou não recuperação de sua capacidade laborativa (artigos 43, § 4º, 47 e 101 da Lei 8.213/91 e 46, 77 e 77-A, do Decreto 3.048/99).
O cancelamento do benefício, todavia, somente poderá ser determinado judicialmente, sob pena de desrespeito à coisa julgada.
Nesse sentido o escólio de Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Júnior:
"Interessante questão é a da constatação da recuperação do segurado em caso de aposentadoria por invalidez concedida judicialmente. Nesse caso, discute-se acerca da possibilidade de cassar o INSS administrativamente o benefício, diante da autoridade da coisa julgada. Temos que nesse caso deverá o Instituto lançar mão da ação revisional prevista no inciso I do artigo 471 do Código de Processo Civil. A cassação administrativa, nesses casos, importaria violação da coisa julgada material e desrespeito ao princípio do paralelismo das formas, pelo qual o que foi concedido por um meio pode ser desfeito pela utilização da mesma via.
O agir administrativo está, aqui, isento de autogestão. Sustentamos essa opinião mesmo em face do artigo 71 da LCSS, pelo qual O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deverá rever os benefícios, inclusive os concedidos por acidente do trabalho, ainda que concedidos judicialmente, para avaliar a persistência, atenuação ou agravamento da incapacidade para o trabalho alegada como causa para sua concessão.
Ora, considerando que a incapacidade não era reconhecida anteriormente pelo INSS, situação que obrigou o segurado a ingressar em Juízo, tendo sido realizada perícia judicial para aferir o quadro clínico do segurado, não seria congruente permitir à Autarquia a possibilidade de, a qualquer momento, desconstituir os efeitos da decisão judicial, sem que tenha sido concedida, expressamente, autorização para tanto.
Data venia, aos que conferem uma interpretação ampla ao artigo 71 da Lei de Custeio, em nossa visão, o dispositivo referido não pode ser interpretado no sentido de criar a esdrúxula figura da "rescisória administrativa". O que o dispositivo faz é, simplesmente, determinar que o INSS revise, ou seja, submeta a novos exames médicos os segurados, inclusive nos casos em que os benefícios foram concedidos judicialmente. Não autoriza, no entanto, a cassação daqueles concedidos judicialmente, que deverá ser precedida de ação revisional" (Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 7ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado. P 208/209)
Portanto, não tendo sido observada a via apropriada para promover o eventual cancelamento do benefício, não merece provimento a apelação no INSS.
Em apoio ao que foi exposto os seguintes precedentes desta Casa:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. CANCELAMENTO ADMINISTRATIVO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONCEDIDA JUDICIALMENTE. IMPOSSIBILIDADE. Deferida por decisão judicial a aposentadoria por invalidez, o INSS até pode submeter o segurado a exames periódicos para avaliação da persistência da incapacidade laborativa. O cancelamento do benefício, todavia, depende de novo pronunciamento judicial, a ser obtido em ação de revisão, nos termos do inciso I do art. 471 do CPC. Precedentes desta Corte. (TRF4, AG 0004065-64.2015.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, D.E. 19/11/2015)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CANCELAMENTO ADMINISTRATIVO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO JUDICIALMENTE. IMPOSSIBILIDADE. Concedida judicialmente a aposentadoria por invalidez, benefício, em princípio, de caráter definitivo, o cancelamento do benefício somente é viável mediante o ajuizamento da competente ação; ou seja, por decisão de mesma natureza, nos termos do inciso I do artigo 471 do CPC. (TRF4, AG 0004984-87.2014.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON, D.E. 16/03/2015)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE CONCEDIDA JUDICIALMENTE. CANCELAMENTO UNILATERAL PELO INSS. LIMITES À DESCONSIDERAÇÃO DA COISA JULGADA PELA ADMINISTRAÇÃO. - O mandado de segurança constitui remédio constitucional destinado a sanar ou a evitar ilegalidades que impliquem violação de direito líquido e certo, sendo exigível prova pré-constituída, pois não comporta dilação probatória. - Deferida por decisão judicial a aposentadoria por incapacidade permanente, o INSS até pode submeter o segurado a exames periódicos para avaliação da persistência da incapacidade laborativa (artigos 43, § 4º, 101 da Lei 8.213/91 e 46 do Decreto 3.048/99). - O cancelamento do benefício, todavia, depende de novo pronunciamento judicial, a ser obtido em ação de revisão, nos termos do artigo. 505, I, do CPC e do artigo 101 da Lei 8.212/1991. - Concessão da segurança para que seja restabelecida a aposentadoria por incapacidade permanente cancelada por decisão administrativa da autarquia. (TRF4 5001964-04.2023.4.04.7108, SEXTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 02/12/2023)
Assim, frente aos fundamentos e argumentos acima alinhados, tenho que a sentença a quo não merece reparos.
Das custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei 9.289/96).
Tratando-se de feitos afetos à competência delegada, tramitados na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, a autarquia também é isenta do pagamento dessas custas (taxa única), de acordo com o disposto no art. 5º, I, da Lei Estadual n.º 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não a exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único do art. 2º da referida lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Da verba honorária
Estando preenchidos os requisitos estabelecidos pela Segunda Seção do STJ no julgamento do AgInt nos EREsp 1.539.725/DF (não conhecimento integral ou desprovimento do recurso interposto pela parte já condenada ao pagamento de honorários na origem, em decisão publicada na vigência do CPC/2015), o percentual dos honorários advocatícios devidos pelo INSS deverá ser majorado em 50% sobre o valor fixado pelo Juízo a quo, em razão do improvimento do recurso.
Prequestionamento
A fim de possibilitar o acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas no recurso, nos termos dos fundamentos do voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou havidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do que está declarado.
Da tutela específica
Estando a parte autora em gozo de benefício, deixo de determinar a implantação da pensão mediante tutela específica.
Conclusão
Apelação do INSS | DESPROVIDO O APELO. |
Apelação da parte autora | Não interpôs recurso. |
Observação SUCUMBÊNCIA: Estando preenchidos os requisitos estabelecidos pela Segunda Seção do STJ no julgamento do AgInt nos EREsp 1.539.725/DF (não conhecimento integral ou desprovimento do recurso interposto pela parte já condenada ao pagamento de honorários na origem, em decisão publicada na vigência do CPC/2015), o percentual dos honorários advocatícios devidos pelo INSS deverá ser majorado em 50% sobre o valor fixado pelo Juízo a quo, em razão do improvimento do recurso. |
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.
Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004833989v16 e do código CRC e3dd381e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Data e Hora: 12/12/2024, às 18:12:59
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Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51) 3213-3000 - www.trf4.jus.br
Apelação Cível Nº 5008080-49.2024.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. restabelecimento. benefício de aposentadoria por invalidez concedido por decisão judicial. cancelamento administrativo. impossibilidade. necessidade de respeito à coisa julgada.
- São quatro os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) existência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento da atividade habitual ou para qualquer atividade; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade.
- Deferida por decisão judicial a aposentadoria por incapacidade permanente, o INSS até pode submeter o segurado a exames periódicos para avaliação da persistência da incapacidade laborativa (artigos 43, § 4º, 101 da Lei 8.213/91 e 46 do Decreto 3.048/99).
- O cancelamento do benefício, todavia, depende de novo pronunciamento judicial, a ser obtido em ação de revisão, nos termos do artigo. 505, I, do CPC e do artigo 101 da Lei 8.212/1991.
- Impõe-se, no caso, o restabelecimento da aposentadoria por incapacidade permanente cancelada por decisão administrativa da autarquia.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de dezembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004833990v4 e do código CRC 50e9f034.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Data e Hora: 12/12/2024, às 18:12:59
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 11/12/2024
Apelação Cível Nº 5008080-49.2024.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 11/12/2024, na sequência 55, disponibilizada no DE de 02/12/2024.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PENA THOMAZ
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Comentário - GAB. 64 (Des. Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO) - Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO.
Acompanho o voto proferido pelo Relator, por também entender que a parte autora estava totalmente incapacitada para o labor na data de cessação do benefício, sendo devido o seu restabelecimento. Trago ressalva apenas quanto ao entendimento de que o INSS não poderia ter cancelado administrativamente a aposentadoria, sendo necessária, para tanto, a "revisão judicial" de que trata o artigo 505, I, do CPC. Nos casos de concessão judicial de benefícios por incapacidade, tenho entendido ser exclusivamente do INSS o poder-dever de revisar as condições para manutenção da benesse, cabendo ao segurado, nos casos de cancelamento, a ajuizamento de nova ação, se assim o desejar.
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