Apelação Cível Nº 5012260-21.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAFAEL KNORST
ADVOGADO: DANIEL LUIS SCHMIDT (OAB RS086602)
ADVOGADO: ADRIANO JOSE OST (OAB RS048228)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença proferida (na vigência do CPC/2015) com o seguinte dispositivo:
"Diante do exposto, defiro, nesse momento, o pedido de antecipação de tutela, para o efeito imediato de determinar ao réu que implante o benefício(auxílio-doença) dentro de 5 dias, sob pena de multa diária e, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por RAFAEL KNORST contra o INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS relativo ao auxílio-doença e condeno o réu a implantar o benefício, bem como ao pagamento das parcelas vencidas desde a cessação do benefício em 16.05.2016.
Fica, desde já, autorizado o desconto de eventuais valores recebidos a esse título.
Os valores atrasados devidos deverão ser corrigidos monetariamente pelo INPC, a contar do vencimento de cada prestação. Os juros de mora incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, a contar da citação.
Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC.
O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
Sentença não sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se."
Requer o INSS a reforma da sentença para que seja julgada improcedente a ação, ao argumento de que a incapacidade da parte autora é preexistente ao seu ingresso no RGPS. Caso mantida a condenação, postula seja afastada a determinação de submeter o autor a processo de reabilitação profissional.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Mérito
Por estar em consonância com o entendimento desta Relatoria quanto às questões deduzidas, a sentença recorrida merece ser mantida pelos seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:
"(...)
Não havendo questões prejudiciais para análise, passo ao exame do mérito.
Extrai-se dos autos que a parte autora pretende a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
Os requisitos da qualidade de segurado e carência são incontroversos uma vez que o demandante recebeu o benefício pleiteado até 13.05.2016. Ademais, o INSS não apresentou contestação quanto ao ponto.
Desse modo, cumpre analisar se há, ou não, incapacidade para a prática das atividades laborativas, de acordo com o que dispõe a Lei nº 8.213/91.
Inicialmente, no tocante ao pedido de auxílio-doença, ressalto que, de acordo com o artigo 59 da Lei nº 8.213/91, é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência exigido por lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos.
A perícia realizada nos autos (Evento 2, LAUDO25) confirmou que o autor apresenta quadro sequela de paralisia cerebral, com limitações funcionais do membro superior e inferior esquerdo.
Ainda, o expert foi categórico ao afirmar que o autor apresenta patologia que o incapacita para o exercício de sua atividade laborativa. Asseverou que o demandante está incapaz para o exercício de sua atividade profissional que demande a utilização de ambos os membros superiores, dorsiflexão do tornozelo esquerdo ou sua permanência em ortostase, de forma permanente.
Considerando que o requerente, na presente ação, postula o pagamento do auxílio-doença, que, nos termos do art. 59 da Lei 8.213/91, requer o reconhecimento da incapacidade para o trabalho por mais de 15 dias, o que restou devidamente comprovado, de modo que cabe ao réu o pagamento do benefício de auxílio-doença pleiteado.
Entretanto, pelo que se extrai do laudo pericial, o demandante não está incapacitado para o exercício de toda e qualquer atividade laborativa, visto que pode desempenhar atividades em que trabalhe sentado, não necessite a utilização de ambos os membros superiores ou a dorsiflexão do tornozelo esquerdo.
A esse respeito, quando se está diante de segurado que apresenta incapacidade laboral definitiva para o exercício de sua atividade habitual, mas não para o exercício de toda e qualquer atividade que lhe possa garantir o sustento, além do grau e extensão da incapacidade laborativa em si, outros elementos devem ser considerados para aferir-se se há real possibilidade de reabilitação profissional do segurado para o exercício de outra atividade laboral, tais como idade deste, nível cultural e educacional, meio social em que se acha inserido, contexto social em que sempre viveu e atividades laborais que exerceu no decorrer de sua vida.
No caso dos autos, trata-se de segurado que conta com apenas 38 anos de idade. Assim, é plenamente viável que busque uma readaptação profissional.
Considerando o acima exposto, não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
Quanto ao termo inicial do benefício, o perito informou que a incapacidade do autor pode ser comprovada desde 23.02.2016, de modo que devido o benefício a contar da cessação em 13.05.2016.
Nesse toar, destaco que o exercício de atividade remunerada não implica em contradição com a afirmação da existência de incapacidade em época coincidente, haja vista que a parte autora teve obstado o seu benefício na via administrativa, o que justifica eventual retorno ao trabalho para a sua sobrevivência. Esse foi o entendimento do STJ ao julgar o Tema 1013, em 01/07/2020, com a seguinte tese firmada: "No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente."
Por derradeiro, sinala-se que o autor deverá ser encaminhado a processo de reabilitação profissional, devendo o auxílio-doença ser mantido até a efetiva reabilitação para o exercício de qualquer outra atividade laborativa que garanta a subsistência do segurado, nos termos do art. 62 da Lei nº 8.213, de 1991.
Desse modo, ressalto que este juízo está impossibilitado de determinar a data de cessação do benefício já que o médico perito afirmou que o autor encontra-se incapacitado para o exercício de sua atividade profissional habitual de forma definitiva, mas não para outras atividades capazes de lhe proporcionar sustento, de modo que o autor deverá ser reabilitado para a realização da outra atividade."
Alegou o INSS que a incapacidade da parte autora é preexistente ao seu ingresso no RGPS. Todavia, entendo que o restante do conjunto probatório demonstra que houve o agravamento da patologia.
De acordo com o laudo pericial (Evento 22 - LAUDO25), realizado em 12-3-2020, por especialista em ortopedia e traumatologia, o demandante, auxiliar de indústria/porteiro, nascido em 30-9-1981, apresenta quadro de sequela de paralisia cerebral (CID-10: G80), desde o nascimento, com limitações funcionais do membro superior e inferior esquerdo, estando permanentemente incapacitado para o exercício de atividades "que demandem a utilização de ambos os membros superiores, a dorsiflexão do tornozelo esquerdo ou sua permanência em ortostase". A data de início da incapacidade foi fixada em 23-2-2016 (quesitos 3 do Juízo).
Em consulta ao CNIS, observa-se que o autor constituiu diversos vínculos empregatícios entre 4-2-2002 e 31-1-2008, bem como que, após essa data, não consta mais nenhum registro em sua inscrição. Tal fato evidencia que o autor, embora portador de sequelas de paralisia cerebral, apresentava capacidade para o labor e que a sua incapacidade resultou do agravamento de suas limitações funcionais (dores no punho esquerdo e no quadril esquerdo) que sobrevieram com o tempo.
Importa destacar que esta Corte tem entendido que a enfermidade preexistente não afasta o direito ao benefício, quando a incapacidade decorre de seu agravamento, como no caso dos autos. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE. DOENÇA PRE-EXISTENTE. INOCORRÊNCIA. AGRAVAMENTO EVIDENCIADO. TERMO INICIAL. TUTELA ESPECÍFICA. I. [...]. II. Comprovado nos autos que a incapacidade ocorreu em decorrência de agravamento de doença da qual o autor era portador, não há o que se falar em preexistência da incapacidade ao ingresso ao Regime Geral de Previdência Social. III. [...] . (TRF4, AC 5006912-90.2016.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 15-6-2016) - Grifei.
Assim, tendo o perito judicial concluído que a parte autora está permanentemente incapacitada para a atividade laborativa habitual (porteiro), bem como que, diante de suas condições pessoais, pode ser reabilitada para o exercício de atividades diversas, tenho por adequado determinar o restabelecimento do auxílio-doença, desde a cessação administrativa, em 13-5-2016 (Evento 22 - INIC1, fl. 16), devendo o autor ser submetido a processo de reabilitação profissional.
Como bem destacou o magistrado a quo, o benefício deverá ser mantido até que o segurado seja reabilitado para o desempenho de outra atividade, compatível com sua limitação e que lhe garanta a subsistência, ou, caso considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez, nos termos do § 1º do artigo 62 da LBPS.
Desse modo, entendo que deve ser mantida a sentença de procedência.
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, este regramento é aplicável quanto à sucumbência.
Vencido na lide, deve o INSS arcar com os ônus de sucumbência.
Outrossim, esta Turma mantém o entendimento de que os honorários advocatícios devem ser fixados no percentual de 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte, que preceitua:
Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.
No tocante ao cabimento da majoração da verba honorária, conforme previsão do §11 do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):
É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:
a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;
b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;
c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No caso concreto, estão preenchidos todos os requisitos acima elencados, sendo devida, portanto, a majoração da verba honorária.
Assim, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios em 50% sobre o percentual anteriormente fixado.
Antecipação de tutela
Confirmado o direito ao benefício, resta mantida a antecipação de tutela deferida pelo juízo de origem, em razão do seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Conclusão
- Apelação do INSS desprovida;
- explicitado que os honorários advocatícios, a cargo do INSS, incidem somente sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença;
- verba honorária majorada conforme o art. 85, §11, do NCPC;
- mantida a antecipação de tutela deferida pelo juízo de origem.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e manter a antecipação de tutela concedida.
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Apelação Cível Nº 5012260-21.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAFAEL KNORST
ADVOGADO: DANIEL LUIS SCHMIDT (OAB RS086602)
ADVOGADO: ADRIANO JOSE OST (OAB RS048228)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL E PERMANENTE COM POSSIBILIDADE DE REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. PERÍCIA JUDICIAL CONCLUDENTE. DOENÇA PREEXISTENTE. AGRAVAMENTO. DIREITO AO BENEFÍCIO.
1. Nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova.
2. A circunstância de a parte autora ter ingressado no RGPS quando já portadora de doença ou lesão não impede a percepção de benefício por incapacidade quando decorrente do agravamento dessa doença. Previsão dos arts. 42 e 59 da Lei 8213/91.
3. É devido o auxílio-doença quando a perícia judicial é concludente de que a parte autora está permanentemente incapacitada para a sua atividade laborativa habitual, podendo ser reabilitada para o exercício de atividades diversas.
4. O benefício deve ser mantido até que o segurado seja reabilitado para o desempenho de outra atividade, compatível com sua limitação e que lhe garanta a subsistência, ou, caso considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez, nos termos do artigo 62 da LBPS.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e manter a antecipação de tutela concedida, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 02 de dezembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002205669v7 e do código CRC 10a2a1b4.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 25/11/2020 A 02/12/2020
Apelação Cível Nº 5012260-21.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAFAEL KNORST
ADVOGADO: DANIEL LUIS SCHMIDT (OAB RS086602)
ADVOGADO: ADRIANO JOSE OST (OAB RS048228)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 25/11/2020, às 00:00, a 02/12/2020, às 14:00, na sequência 520, disponibilizada no DE de 16/11/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E MANTER A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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