Apelação Cível Nº 5013912-39.2019.4.04.9999/SC
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO FRANCISCO MARTINAZZO
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por Pedro Francisco Martinazzo em face do INSS, em que requer o restabelecimento do auxílio-doença que titulariou de 13/01/2010 a 09/12/2011 ou a concessão de aposentadoria por invalidez, em razão de problemas na coluna. Narra na inicial que a incapacidade persiste, não tendo condições de retomar o labor habitual como garçom.
Foi proferida sentença de improcedência (evento 2, Sent88-93), atacada por apelação do autor (evento 2, Apelação96 e Pet97-102), provida nesta Corte, para anular a sentença e determinar a realização de perícia com ortopedista (evento 2, Out147-153).
Foi produzida a perícia com especialista (evento 2, Pet204).
O magistrado de origem, da Comarca de São José do Cedro/SC, proferiu nova sentença em 26/04/2019, deferindo a antecipação de tutela e julgando procedente o pedido, para determinar a implantação do benefício de aposentadoria por invalidez desde a DCB (09/12/2011), condenando a autarquia ao pagamento das prestações vencidas corrigidas monetariamente pelo INPC e com juros de mora pelos índices de poupança. O INSS foi onerado ainda ao pagamento de despesas processuais e de honorários advocatícios pelo percentual mínimo das faixas de valor previstas no § 3º do art. 85 do CPC/2015, a incidir sobre o valor da condenação. O R. Juízo referiu que não era caso de reexame necessário (evento 2, Sent223).
Em consulta ao CNIS, observa-se que o benefício foi implantado.
Irresignada, a autarquia apelou, sustentando que o perito identificou a existência de incapacidade parcial e definitiva para o labor habitual, havendo possibilidade de o demandante exercer outras atividades. Assevera que, no máximo, poderia ser concedido auxílio-acidente. Pede a reforma da sentença. Caso não seja este o entendimento, requer a aplicação do art. 1º-F da Lei 9.494/97 no que tange à correção monetária e o prequestionamento da matéria debatida na petição recursal (evento 2, Apelação 226-228).
Com contrarrazões (evento 2, Pet239), os autos vieram a esta Corte para julgamento.
VOTO
Trata-se de apelação do INSS.
Controvérsia dos autos
A controvérsia recursal cinge-se à incapacidade do autor e à correção monetária aplicável às prestações vencidas.
Auxílio-doença e aposentadoria por invalidez
Requisitos - Os requisitos para a concessão dos benefícios acima requeridos são os seguintes: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais, prevista no art. 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24 c/c o art. 27-A da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
Em se tratando de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença o julgador firma a sua convicção, em regra, por meio da prova pericial, porquanto o profissional de medicina é que possui as melhores condições técnicas para avaliar a existência de incapacidade da parte requerente, classificando-a como parcial ou total e/ou permanente ou temporária.
Nesse sentido, traz-se a lição de José Antonio Savaris:
O laudo técnico pericial, reconhecidamente a mais relevante prova nas ações previdenciárias por incapacidade, deve conter, pelo menos: as queixas do periciando; a história ocupacional do trabalhador; a história clínica e exame clínico (registrando dados observados nos diversos aparelhos, órgãos e segmentos examinados, sinais, sintomas e resultados de testes realizados); os principais resultados e provas diagnósticas (registrar exames realizados com as respectivas datas e resultados); o provável diagnóstico (com referência à natureza e localização da lesão); o significado dos exames complementares em que apoiou suas convicções; as consequências do desempenho de atividade profissional à saúde do periciando. (Direito Processual Previdenciário: Curitiba, Alteridade Editora, 2016, p. 274).
Cabível ressaltar-se, ainda, que a natureza da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliada conforme as circunstâncias do caso concreto. Isso porque não se pode olvidar que fatores relevantes - como a faixa etária da postulante e o grau de escolaridade, dentre outros - sejam essenciais para a constatação do impedimento laboral.
Doença preexistente - Importa referir que não será devido o auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez ao segurado que se filiar ao RGPS já portador de doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da enfermidade, conforme disposto na Lei 8.213/91, no art. 42, § 2º (aposentadoria por invalidez) e no art. 59, § único (auxílio-doença).
Carência - Conforme já referido, os benefícios por incapacidade exigem cumprimento de período de carência de 12 contribuições mensais (art. 25, I, e 24 da Lei 8.213/91).
Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores poderão ser computadas para fins de carência, exigindo-se um número variável de novas contribuições a partir da refiliação ao sistema, conforme a evolução legislativa:
a) de 20/07/2005 a 07/07/2016, quatro contribuições; b) de 08/07/2016 a 04/11/2016, doze contribuições; c) de 05/11/2016 e 05/01/2017, quatro contribuições; d) de 06/01/2017 e 26/06/2017, doze contribuições; e) de 27/06/2017 a 17/01/2019, seis contribuições; f) de 18/01/2019 a 17/06/2019, doze contribuições; e g) a partir 18/06/2019, seis contribuições.
Caso concreto
A parte autora, nascida em 09/03/1955, aos 54 anos de idade protocolou pedido administrativo de auxílio-doença em 13/01/2010, deferido e mantido ativo até 09/12/2011 (evento 2, Out55), em decorrência de outros transtornos de discos intervertebrais - CID M51, conforme constou das perícias efetuadas pela autarquia (evento 2, LaudoPeric59-65).
A presente ação foi ajuizada em 22/04/2012.
Não houve controvérsia sobre a qualidade de segurado e o preenchimento do requisito da carência, porquanto se trata de pedido de restabelecimento de benefício.
Logo, passo à análise do ponto controvertido, que é a incapacidade.
Incapacidade
A partir da perícia médica realizada nestes autos em 25/10/2017 pelo ortopedista Rafael Ricardo Lazzari, é possível obter os seguintes dados (evento 2, Pet204. Quesitos do autor, evento 2, Quesitos 13. Quesitos do INSS, evento 2, Contes52-53. Quesitos do juízo, evento 2, Desp154-155):
- enfermidades (CID): anterolistese da coluna lombar ao nível L3-4 - M43.1; discopatia lombar com protrusões - M51.2; artrose de coluna vertebral - M19.9; e síndrome de cervicobraquialgia - M53.1;
- incapacidade: parcial, definitiva e multiprofissional;
- data de início da doença: 2005;
- data de início da incapacidade: 2009;
- idade na data do laudo: 62 anos;
- profissão: garçom, gerente em serraria e motorista;
- escolaridade: ensino fundamental incompleto.
Segundo o expert, as patologias verificadas eram degenerativas, -aceleradas pelas atividades braçais desempenhadas -, inflamatórias e traumáticas, as quais se encontravam consolidadas. Mencionou que o autor tinha condições de exercer apenas atividades leves, sem nada de esforço físico ou mental.
Embora verificada a existência de incapacidade parcial, em virtude de várias patologias na coluna, importa considerar as condições pessoais desfavoráveis do requerente: idade avançada (atualmente, com 65 anos), baixa escolaridade (estudou até o terceiro ano do ensino fundamental), afeito a trabalhos braçais (garçom, motorista e gerente de serraria) e residente em pequena cidade do interior de Santa Catarina, São José do Cedro, município com 13 mil habitantes, conforme informações do IBGE, o que, consabidamente, resulta em limitadas oportunidades de recolocação no mercado de trabalho em função diversa.
Firmadas tais premissas, conclui-se que não merece reparos a sentença, que concedeu a aposentadoria por invalidez ao autor desde a DCB (09/12/2011).
Desprovido o recurso do INSS quanto ao mérito.
Correção monetária
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu, o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)
Como o disposto na sentença está em consonância com o entendimento desta Corte, não merece acolhida o recurso do INSS no que concerne à correção monetária.
Honorários de sucumbência
Considerando o disposto no art. 85, § 11, NCPC, e que está sendo negado provimento ao recurso, majoro os honorários fixados na sentença em 20%, observados os limites das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85.
Tendo em vista os termos da Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência", e da Súmula 111 do STJ (redação da revisão de 06/10/2014): "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença", os honorários no percentual fixado supra incidirão sobre as parcelas vencidas até a data da sentença.
Prequestionamento
No que concerne ao pedido de prequestionamento, observe-se que, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.
Tutela Específica
Tendo em conta que o cumpriu a antecipação de tutela deferida na sentença, conforme consta do CNIS, visto que o benefício está ativo, não se determina a imediata implantação da aposentadoria por invalidez.
Conclusão
Desprovido o recurso do INSS e majorada em 20% a verba honorária fixada na sentença, observados os limites das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85 do CPC/2015.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.
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Apelação Cível Nº 5013912-39.2019.4.04.9999/SC
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO FRANCISCO MARTINAZZO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. restabelecimento de benefício. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO. PERÍODO DE CARÊNCIA. INCAPACIDADE. condições pessoais desfavoráveis. COMPROVAÇÃO. honorários advocatícios. majoração.
1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
2. A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto permanecer ele nessa condição. No entanto, não se admite que a doença geradora da incapacidade seja preexistente à filiação ao RGPS, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da enfermidade,conforme os arts. 42, § 2º, e 59, § único da Lei 8.213/91.
3. Comprovada a incapacidade parcial, definitiva e multiprofissional, associada a condições pessoais desfavoráveis (idade avançada, baixa escolaridade, afeito a trabalhos braçais e residente em pequena cidade do interior), o autor faz jus à aposentadoria por invalidez desde a DCB.
4. Majorada em 20% a verba honorária fixada na sentença, observados os limites das faixas de incidência previstas no § 3º do art. 85 do CPC/2015.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de julho de 2020.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001847797v3 e do código CRC dc96459c.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 29/06/2020 A 07/07/2020
Apelação Cível Nº 5013912-39.2019.4.04.9999/SC
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): EDUARDO KURTZ LORENZONI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO FRANCISCO MARTINAZZO
ADVOGADO: MARCOS DANIEL HAEFLIEGER (OAB SC029122)
ADVOGADO: ANDREY LUIZ GELLER (OAB SC016670)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 29/06/2020, às 00:00, a 07/07/2020, às 14:00, na sequência 651, disponibilizada no DE de 18/06/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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