Apelação Cível Nº 5018578-89.2020.4.04.7108/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: MARILENE PINCELLI DE MOURA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora pretende a revisão do benefício de origem (DIB em 02/11/1990), com reflexos em sua pensão por morte (DIB em 23/02/2006), mediante a recuperação do excedente ao teto recortado do salário de benefício por ocasião da concessão, limitando-se a renda mensal apenas para efeito de pagamento. Pediu a satisfação das diferenças apuradas, considerando-se a interrupção da prescrição por força da Resolução 151, de 30/08/2011.
O juízo a quo julgou procedente o pedido, em sentença com o seguinte dispositivo:
Em face do exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, reconhecendo a prescrição das parcelas anteriores a 06/11/2015, julgo procedente o pedido, resolvendo o mérito, para:
a) Determinar à parte ré que revise o benefício aposentadoria por tempo de contribuição sob NB 42/086.304.707-6 (DIB em 02/11/1990) majorando a RMI deste benefício para Cr$ 54.712,70, para fins de pagamento do benefício de pensão por morte da parte autora sob NB 21/139.333.642-3, desde a DIB (23/02/2006), e a consequente implantação da nova RMI no valor de R$ 1.220,73 (um mil, duzentos e vinte reais e setenta e três centavos), que no mês de 10/2021 corresponde ao valor atualizado de R$ 2.943,50(dois mil, novecentos e quarenta e três reais e cinquenta centavos); e,
b) Condenar o INSS a pagar à parte autora, após o trânsito em julgado, a importância decorrente da presente decisão, resultante da soma das parcelas retroativas a 06/11/2015 até a data da efetiva implantação da nova renda mensal reconhecida na alínea "a", correspondendo, em 31/10/2021, a R$ 54.605,13 (cinquenta e quatro mil seiscentos e cinco reais e treze centavos), dos quais R$ 49.641,03 são relativos ao principal e R$ 4.964,10 aos honorários advocatícios, devidamente acrescida de juros e correção monetária, até o efetivo pagamento, nos moldes acima definidos e conforme cálculos incluídos no item "Anexos Eletrônicos" disponíveis para consulta na aba "Informações Adicionais" da capa deste processo eletrônico.
Considerando pedido expresso pela parte autora lançado na petição inicial e demonstrada, nos termos da fundamentação, tanto a probabilidade do direito como o perigo de dano, concedo, com fundamento no artigo 300 do CPC, tutela provisória de urgência, para determinar ao INSS que implante, imediatamente, a partir de 01/11/2021, a nova renda mensal ora reconhecido, conforme parâmetros e valores definidos nesta sentença, sob pena de aplicação de multa diária de R$ 200,00 (duzentos reais).
Condenou o réu ao pagamento de honorários advocatícios fixados no percentual mínimo de cada uma das faixas de valor no § 3° do art. 85 do CPC, aplicando-se a evolução tratada no § 5º, a incidir sobre o valor das prestações vencidas até a data de publicação da sentença (Súmulas n. 76 do TRF-4 e 111 do STJ).
A autora interpôs apelação, alegando que o INSS aplicou o equivocado coeficiente de 70%, quando o correto, como admite o próprio réu, é 94%. Assim, a sentença, que adotou o cálculo da contadoria, que por sua vez aplicou o coeficiente equivocado, deve ser reformada.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
O juízo a quo, na decisão do evento 21, determinou a remessa dos autos à Contadoria Judicial para feitura dos cálculos referentes à revisão postulada (utilização do salário de benefício não limitado ao teto para verificação de eventual diferença a ser incorporada quando da alteração do valor do teto em razão das EC 20/1998 e 41/2003).
Apresentados os cálculos no evento 29, foi dada vista às partes, e o INSS sustentou que o cálculo judicial aplicou o coeficiente de 94%, quando deveria ser 70%, pois esse erro da revisão do art. 144 NÃO pode ser corrigido na "revisão dos tetos", em razão (i) da decadência - já que o erro fora cometido em 01/1994; (ii) a retificação dos erros da revisão do art. 144 não é objeto desta ação (
).O juízo a quo, então, determinou nova remessa à Contadoria, sobrevindo o cálculo do evento 40, que, sobre salário de benefício de Cr$ 78.161,01, aplicou o coeficiente de 70%, gerando nova RMI, na DIB de 02/11/1990, de Cr$ 54.712,70 (
), e a sentença determinou a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição sob NB 42/086.304.707-6 (DIB em 02/11/1990) majorando a RMI deste benefício para Cr$ 54.712,70, para fins de pagamento do benefício de pensão por morte da parte autora sob NB 21/139.333.642-3, desde a DIB (23/02/2006), e a consequente implantação da nova RMI no valor de R$ 1.220,73 (um mil, duzentos e vinte reais e setenta e três centavos), que no mês de 10/2021 corresponde ao valor atualizado de R$ 2.943,50(dois mil, novecentos e quarenta e três reais e cinquenta centavos).Ocorre que, para fins de verificação da aplicação do teto no salário de benefício da aposentadoria concedida no "buraco negro", deve ser aplicada a revisão do art. 144 da Lei 8.213/91, ainda que a parte autora não tenha expressamente pedido na inicial.
Veja-se que, com base em voto-vista levado a julgamento em 07/12/2022 (nº 50032435120164047114), esta Turma considerou que a aplicação do art. 144 pode ocorrer na execução, por decorrer da aplicação adequada da lei que sobreveio à concessão do benefício sob revisão. Não se trata, aqui, de rever o ato de concessão do benefício originário, mas de evoluir o valor da respectiva renda mensal de forma adequada, para assegurar o cumprimento - também adequado - da decisão que garante a aplicação dos novos tetos.
Ademais, contrariamente ao que alega o INSS, não incide, na hipótese, a decadência ou a prescrição de fundo do direito, pois o art. 103, caput, da Lei nº 8.213/91 prevê prazo extintivo de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão do benefício, e, no caso, não está em causa o ato de concessão ou indeferimento do benefício originário, e, sim, a correta aplicação, a benefício já concedido, da recomposição de que trata o art. 144 da Lei n.º 8.213/91. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. PENSÃO POR MORTE. DECADÊNCIA. ART. 144 DA LEI 8.213/91. TETO.
1. Concedido o benefício no período chamado "buraco negro", ou seja, entre 05-10-1988 (data da promulgação da CF/88) e 05-04-1991 (data de retroação dos efeitos da Lei nº 8.213/91), sua RMI deve ser revista de acordo com as regras dispostas no art. 144 da Lei de Benefícios.
2. Não incide, na hipótese, a decadência ou a prescrição de fundo do direito, pois o art. 103, caput, da Lei nº 8.213/91 prevê prazo extintivo de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão do benefício, e, no caso, não está em causa o ato de concessão ou indeferimento do benefício, e sim a correta aplicação, a benefício já concedido, da recomposição de que trata o art. 144 da Lei n.º 8.213/91.
3. Não há decadência quanto à revisão dos tetos, porquanto não se trata de revisão do ato de concessão do benefício e sim estabelecimento de critérios de evolução da renda mensal.
4. Uma vez que o benefício em tela foi concedido no regime anterior à Lei 8.213/91, quando o valor mensal da pensão por morte era equivalente a 50% do salário de benefício, acrescido de 10% por dependente, e o INSS não efetuou sua revisão por força da aplicação do art. 144, deve proceder à aludida revisão, recalculando o benefício de pensão considerando a regra do art. 75 da Lei 8.213/91, em sua redação original.
5. Havendo limitação do salário de benefício ao teto previdenciário da época, quando da concessão, há, em tese, direito à revisão dos novos tetos, consoante decisão do STF em repercussão geral (RExt 564.354), o que é de ser verificado por ocasião do cálculo de liquidação.
6. Julgamento nos termos do art. 942 do Código de Processo Civil/2015.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 5015654-81.2015.4.04.7205/SC, de minha relatoria, julgado em 04/10/2017)
PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REVISÃO - ART. 103 DA LEI DE BENEFÍCIOS. RE Nº 626.489/SE. REVISÃO DE PENSÃO POR MORTE DECADÊNCIA - NÃO OCORRÊNCIA. RECÁLCULO DA RMI, ART. 144 DA LEI 8213/91.
1. Considerando que a revisão nos termos do art. 144 da Lei 8213/91, não se refere ao ato de concessão do benefício, não há falar em decadência ou prescrição de fundo de direito.
2. Segundo a redação do revogado art. 144 da Lei 8.213/91, "até 1º/06/92, todos os benefícios de prestação continuada concedidos pela Previdência Social, entre 05/10/88 e 05/04/91, devem ter sua renda mensal inicial recalculada e reajustada, de acordo com as regras estabelecidas nesta Lei".
(APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5005189-64.2011.4.04.7201/SC07, Rel. Des. Federal Roger Raupp Rios, julgado em 07/03/2017)
Assim, considerando que a informação da Contadoria parte do coeficiente de 70% (ao invés de 94%) para o cálculo das diferenças para adequação aos novos tetos, a sentença que se embasa nessa informação merece reforma.
Em se tratando de sentença líquida, havendo ressalva com relação aos critérios de cálculo em sede recursal, o julgamento do recurso afeta a mencionada liquidez, de modo a permitir que, na fase de cumprimento, sejam refeitos os cálculos do valor do benefício e do montante dos atrasados.
Portanto, a apelação da autora merece acolhida, para que a apuração dos exatos valores devidos em relação ao quantum da renda mensal do benefício e dos atrasados seja feita por ocasião da liquidação, considerando-se o adequado cumprimento da revisão do art. 144 da Lei 8.213/91.
- Correção monetária e juros de mora
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.
Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 13, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.
Tutela específica
Confirmado o direito à revisão do benefício, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela concedida pelo juízo de origem, mas deve ser adequada aos parâmetros decorrentes da parcial reforma da sentença.
Conclusão
Apelação provida, para que, considerando-se o adequado cumprimento da revisão do art. 144 da Lei 8.213/91, a apuração dos exatos valores devidos em relação ao quantum da renda mensal do benefício e dos atrasados seja feita por ocasião da liquidação.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003126779v11 e do código CRC 3b0c1b78.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5018578-89.2020.4.04.7108/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: MARILENE PINCELLI DE MOURA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. teto. ART. 144 DA LEI 8.213/91.
1. Concedido o benefício de aposentadoria no período chamado "buraco negro", ou seja, entre 05/10/1988 (data da promulgação da CF/88) e 05/04/1991 (data de retroação dos efeitos da Lei nº 8.213/91), para fins de cálculo das diferenças para adequação da renda mensal aos novos tetos previdenciários trazidos com as Emendas Constitucionais 20/98 e 41/2003, deve-se observar a revisão do art. 144 da Lei de Benefícios
2. Em se tratando da correta aplicação, a benefício já concedido, da recomposição de que trata o art. 144 da Lei n.º 8.213/91, não há incidência da decadência ou prescrição de fundo do direito, pois o art. 103, caput, da Lei nº 8.213/91 prevê prazo extintivo de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão do benefício.
3. Em se tratando de sentença líquida, havendo ressalva com relação aos critérios de cálculo em sede recursal, o julgamento do recurso afeta a mencionada liquidez, de modo a permitir que, na fase de cumprimento, sejam feitos os cálculos do valor do benefício e do montante dos atrasados.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, DAR provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de abril de 2022.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003126780v4 e do código CRC 8eabc91f.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 06/04/2022
Apelação Cível Nº 5018578-89.2020.4.04.7108/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
APELANTE: MARILENE PINCELLI DE MOURA (AUTOR)
ADVOGADO: MÁRIO ANTÔNIO ZART
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 06/04/2022, na sequência 539, disponibilizada no DE de 28/03/2022.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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