Apelação Cível Nº 5006525-72.2017.4.04.7111/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LUSARDO MOREIRA SIQUEIRA (AUTOR)
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora pretende a revisão de seu benefício, mediante a recuperação do excedente ao teto aplicado ao salário de benefício por ocasião da concessão da aposentadoria, DIB em 06-05-1981, limitando-se a renda mensal apenas para efeito de pagamento.
O juízo a quo julgou procedente a ação, para condenar o INSS a revisar a renda mensal do benefício previdenciário titularizado pela parte autora, mediante aplicação dos novos tetos estabelecidos pelas EC nºs 20/1998 e 41/2003, e a pagar as diferenças apuradas, respeitada a prescrição das parcelas anteriores a 05-05-2006, com correção monetária desde o vencimento e juros moratórios a contar da citação, bem como a pagar honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor das diferenças vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do STJ, considerando os critérios elencados no art. 85, §§ 2° e 3°, do CPC; ultrapassada a faixa inicial do art. 85, § 3º, do CPC, determinou a observância dos percentuais mínimos escalonados nos demais incisos do dispositivo.
Em apelação, o INSS alegou decadência, com fundamento no art. 103 da Lei 8.213/91. Sustentou que o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n. 564.354 aplica-se aos benefícios que tiveram o salário de benefício limitado ao teto do salário de contribuição, ao passo que a parte autora pretende a aplicação de eventual resíduo decorrente da palicação do menor valor-teto previsto no Decreto 77.077/76, o qual é utilizado na apuração da segunda parcela e proporcionalmente incorporado à RMI, de modo que não há saldo a ser aplicado em reajustes posteriores. Frisou que em nenhum momento o STF, no julgamento referido, maculou sua jurisprudência acerca da constitucionalidade do teto limitador fixado em lei (art. 29, §2º, da Lei 8.213/91), tampouco revitalizou seu posicionamento quanto à irretroatividade da lei previdenciária. De outro lado, sustentou que a prescrição deve ser contada do quinquênio antecedente ao ajuizamento da ação.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A decisão impugnada não se sujeita a reexame necessário. A questão de fundo restou decidida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 564354, DJe de 15-02-2011. Incidente, assim, a hipótese de dispensa, constante do art. 496, §4º, inc. II, do NCPC.
Decadência
O art. 103, caput, da Lei 8.213/91, dispõe que "É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício (...)".
A discussão da aplicação dos limites das ECs n. 20/98 e n. 41/2003 diz respeito ao estabelecimento de critérios de evolução da renda mensal e não ao recálculo da renda mensal inicial ou de qualquer critério pertinente ao ato de concessão do benefício.
Em tais condições, não há falar em decadência.
Emendas Constitucionais n. 20/98 e n. 41/2003 - reflexos das alterações dos tetos nos benefícios previdenciários concedidos antes da sua vigência
A matéria discutida nestes autos, acerca dos novos limites máximos dos valores dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, fixados pelas Emendas Constitucionais n. 20 de 1998 e n. 41 de 2003, já foi objeto de apreciação pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 564354, cuja decisão foi publicada em 15-02-2011, e cuja questão constitucional suscitada foi reconhecida como sendo de repercussão geral.
Eis a ementa:
DIREITOS CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ALTERAÇÃO NO TETO DOS BENEFÍCIOS DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA. REFLEXOS NOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DA ALTERAÇÃO. EMENDAS CONSTITUCIONAIS 20/1998 E 41/2003. DIREITO INTERTEMPORAL: ATO JURÍDICO PERFEITO. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO DA LEI INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DAS LEIS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Há pelo menos duas situações jurídicas em que a atuação do Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição da República demanda interpretação da legislação infraconstitucional: a primeira respeita ao exercício do controle de constitucionalidade das normas, pois não se declara a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei sem antes entendê-la; a segunda, que se dá na espécie, decorre da garantia constitucional da proteção ao ato jurídico perfeito contra lei superveniente, pois a solução de controvérsia sob essa perspectiva pressupõe sejam interpretadas as leis postas em conflito e determinados os seus alcances para se dizer da existência ou ausência da retroatividade constitucionalmente vedada.
2. Não ofende o ato jurídico perfeito a aplicação imediata do art. 14 da Emenda Constitucional nº 20/1998 e do art. 5º da Emenda Constitucional nº 41/2003 aos benefícios previdenciários limitados a teto do regime geral de previdência estabelecido antes da vigência dessas normas, de modo a que passem a observar o novo teto constitucional.
3. Negado provimento ao recurso extraordinário.
(RE 564354/SE, Plenário, Rel. Ministra Cármen Lúcia, DJE 15-02-2011)
O Plenário do STF entendeu, por ampla maioria de votos "que só após a definição do valor do benefício é que se aplica o limitador (teto). Ele não faz parte do cálculo do benefício a ser pago. Assim, se esse limite for alterado, ele é aplicado ao valor inicialmente calculado". Considerou, portanto, como disse o Ministro Gilmar Mendes, que "o teto é exterior ao cálculo do benefício". Em outras palavras, o teto, segundo tal interpretação, tem por função apenas limitar o valor do benefício previdenciário no momento de seu pagamento, não impedindo que o valor eventualmente glosado em virtude de sua incidência venha a ser, total ou parcialmente, considerado por ocasião de um aumento real do valor do teto, o que ocorreu por intermédio das Emendas Constitucionais 20/98 e 41/03.
Depreende-se, assim, que o salário de benefício é o resultado da média corrigida dos salários de contribuição que compõem o período básico de cálculo, com a incidência do fator previdenciário, quando couber. Após, para fins de apuração da renda mensal inicial, o salário de benefício é limitado ao valor máximo do salário de contribuição vigente no mês do cálculo do benefício (art. 29, § 2º, da Lei nº 8.213/91) e, ato contínuo, recebe a aplicação do coeficiente de cálculo relativo ao tempo de serviço/contribuição. Portanto, o salário de benefício é preexistente à referida glosa; já o cálculo da renda mensal inicial é posterior, inclusive no que diz respeito ao coeficiente de cálculo do benefício, cuja incidência se dá somente após a limitação do salário de benefício. Nessa linha de entendimento, a renda mensal inicial do amparo previdenciário deveria corresponder ao valor do salário de benefício apurado, proporcional ao tempo de serviço/contribuição do segurado, e assim se manter, submetida à política de reajustes da Previdência Social.
Dito de outra forma, o que decidiu o STF é que, tendo sido o valor do salário de benefício limitado ao teto previdenciário, impõe-se que o montante inicial não limitado seja sempre a base de cálculo da renda mensal em manutenção a ser recalculada para fins de submissão aos novos tetos que vierem a ser definidos. Em face do entendimento de que o limitador (teto do salário de contribuição) é elemento externo à estrutura jurídica dos benefícios previdenciários, o valor apurado para o salário de benefício integra-se ao patrimônio jurídico do segurado, e todo o excesso não aproveitado em razão da restrição poderá ser utilizado sempre que alterado o teto, adequando-se ao novo limite.
Ressalto que, conforme notícia veiculada no site do Ministério da Previdência Social (http://www.mpas.gov.br/vejaNoticia.php?id=42995), em 12-07-2011, a questão de direito resta incontroversa, visto que o próprio réu reconheceu administrativamente o direito dos segurados à revisão de acordo com as alterações trazidas pelas Emendas Constitucionais n. 20/98 e n. 41/03, inclusive com previsão de implantação da revisão dos benefícios e de calendário de pagamento das diferenças pretéritas.
BENEFÍCIOS DEFERIDOS NO PERÍODO BURACO NEGRO
O STF, no julgamento pelo Plenário Virtual do Recurso Extraordinário 937595, reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria, fixando como tese de repercussão geral que "os benefícios concedidos entre 05.10.1988 e 05.04.1991 (período do buraco negro) não estão, em tese, excluídos da possibilidade de readequação segundo os tetos instituídos pelas ECs 20/1998 e 41/2003, a ser aferida caso a caso, conforme os parâmetros definidos no julgamento do RE 564354, em regime de repercussão geral", conforme notícia divulgada em seu sítio eletrônico (www.stf.jus.br/portal/cms/listarNoticiaSTF.asp), na data de 06-02-2017.
BENEFÍCIOS DEFERIDOS ANTERIORMENTE À CONSTITUIÇÃO DE 1988
A jurisprudência deste Regional é assente no sentido de que a decisão do STF no RE n. 564.354 é aplicável também aos benefícios concedidos anteriormente à vigência da CF/88 (Apelação Cível nº 5018812-80.2015.4.04.7000/PR, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, julgada em 13-09-2016; Apelação Cível nº 5011491-58.2015.4.04.7205/SC, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgada em 17-08-2016, e Apelação Cível nº 5075077-30.2014.4.04.7100/RS, Rel. Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, julgada em 27-07-2016)
Tal entendimento vem respaldado por decisões do próprio STF (RE n.1004657/PR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, julgado em 24-10-2016, e RE n. 998396, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe 29-03-2017). Destaco a ementa do RE n. 959061 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, 1ª Turma, DJe 17-10-2016:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. RGPS. REVISÃO DE BENEFÍCIO. TEMA 76 DA REPERCUSSÃO GERAL. BENEFÍCIO CONCEDIDO ANTES DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IRRELEVÂNCIA.
1. Verifico que a tese do apelo extremo se conforma adequadamente com o que restou julgado no RE-RG 564.354, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 15.02.2011, não havendo que se falar em limites temporais relacionados à data de início do benefício.
2. Agravo regimental a que se nega provimento.
A legislação anterior à Lei n. 8.213/91 (Lei n. 5.890/1973, Decreto n. 77.077/1976, Decreto n. 83.080/1979, Decreto n. 89.312/1984) trazia, no cálculo da renda mensal inicial, as figuras do menor e maior valor-teto.
Segundo a sistemática então vigente, caso o salário de benefício fosse igual ou inferior ao menor valor-teto fixado na legislação, o cálculo da renda inicial seria feito mediante a aplicação, sobre o salário de benefício, do coeficiente relativo à espécie benefício e conforme sua integralidade/proporcionalidade.
Caso fosse superior ao menor valor-teto, o cálculo da renda mensal seria feito em duas etapas, a saber: primeiro dividia-se o salário de benefício em duas partes - a primeira igual ao menor valor-teto, sobre o qual seria calculada a parcela básica da renda mensal, com a incidência da aplicação do coeficiente relativo à espécie benefício e conforme sua integralidade/proporcionalidade; a segunda parte, igual ao valor excedente ao menor valor-teto, seria utilizada até o máximo de oitenta por cento de seu valor, para o cálculo da parcela adicional da renda mensal, multiplicando-se o valor dessa parte por tantos 1/30 (um trinta avos) quantos fossem os grupos de 12 (doze) contribuições, consecutivas ou não, acima do menor valor-teto.
A renda mensal nesse caso seria a soma da parcela básica com a parcela adicional, e não poderia ultrapassar o valor do maior valor-teto ou percentual incidente sobre este.
Em face dessa sistemática, eu vinha decidindo que, da mesma forma que a renda mensal inicial, no caso de benefícios posteriores à Constituição, esteve sujeita a um limitador externo, aplicável após o respectivo cálculo e que funcionou como limitador do valor que viria a ser pago, o mesmo sucedeu com os benefícios anteriores, cujo cálculo era feito, conforme a legislação então vigente, aplicando-se sobre o salário de benefício, o coeficiente (integral ou não), para só então avaliar se a renda mensal estaria sujeita a alguma limitação, que, na época, seria definida pelo maior valor-teto.
Por essa razão, nos casos em que a renda mensal fosse limitada ao maior valor teto no momento da concessão, se falaria em efetiva limitação ao teto então vigente. Portanto, o limitador externo seria o maior valor-teto, e somente ele. O menor valor-teto seria um mecanismo intrínseco ao cálculo do benefício, dele indissociável. Limitador sim, porém interno.
Assim, meu entendimento era o de que somente no caso de limitação do benefício pelo maior valor-teto seria aplicável a decisão do STF.
Este Regional, contudo, não tem feito essa distinção, ao fundamento de que "a diferença entre o cálculo da renda mensal inicial na legislação anterior e na atual é que a apuração do limitador é, no regime anterior, mais complexa, mas, ainda assim, aplicando-se o entendimento do STF, a restrição deve existir apenas para fins de pagamento, não havendo redução do salário de benefício, que, como se viu, é a própria média corrigida (segundo os critérios de atualização da época) dos salários de contribuição integrantes do período básico de cálculo" (TRF4, AC nº 5001650-69.2016.404.7216, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, unânime, juntado aos autos em 19-05-2017). Vale dizer, segundo essa ótica, prevalecente na Casa, menor e maior-valor teto configuram limitador externo, aplicado em duas etapas, já que o ponto de partida de ambos é o salário de benefício.
Melhor examinando a questão, passo a adotar o entendimento majoritário desta Corte, e o faço partindo de um pressuposto: Na linha dos precedentes do STF, o salário de benefício é o verdadeiro patrimônio do segurado.
Segundo afirmou o Ministro Gilmar Mendes, em manifestação e acolhida pelos demais integrantes da Corte Maior, "o salário de benefício resulta da atualização dos salários de contribuição. A incidência do limitador previdenciário pressupõe a perfectibilização do direito, sendo-lhe, pois, posterior e incidindo como elemento redutor do valor final do benefício". Ou seja, é o salário de benefício que está sujeito ao limitador externo e ele, por sua vez, é a média atualizada dos salários de contribuição.
Impõe-se retomar a definição legal do salário de benefício constante da legislação então vigente (Consolidação das Leis da Previdência Social - CLPS). Eis a redação constante na CLPS/76, repisada (no essencial) no art. 21 da CLPS/84:
Art. 26 - O benefício de prestação continuada, inclusive o regido por normas especiais, terá seu valor calculado tomando-se por base o salário-de-benefício, assim entendido:
I - para o auxílio-doença, a aposentadoria por invalidez, a pensão e o auxílio-reclusão, 1/12 (um doze avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês do afastamento da atividade, até o máximo de 12 (doze), apurados em período não superior a 18 (dezoito) meses;
II - para as demais espécies de aposentadoria, 1/36 (um trinta e seis avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês do afastamento da atividade, até o máximo de 36 (trinta e seis), apurados em período não superior a 48 (quarenta e oito) meses;
III - para o abono de permanência em serviço, 1/36 (um trinta e seis avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês da entrada do requerimento, até o máximo de 36 (trinta e seis ), apurados em período não superior a 48 (quarenta e oito) meses.
§ 1º - Nos casos dos itens II e III, os salários-de-contribuição anteriores aos 12 (doze) últimos meses serão previamente corrigidos de acordo com coeficientes de reajustamento a serem periodicamente estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social.
(grifei)
Tendo presente tal pressuposto de que o salário-benefício é patrimônio jurídico do segurado, calculado segundo critérios relacionados à sua vida contributiva, menor e maior valor-teto já se configuram como limitadores externos. São aplicáveis na definição da renda mensal inicial do benefício a ser paga. Integram o mecanismo de cálculo da renda mensal inicial, etapa que é posterior à apuração do salário de benefício, mas não definem o salário de benefício. Confira-se a CLPS/76 quanto ao ponto (repisado no art. 23 da CLPS/84):
Art. 28 - O valor do benefício de prestação continuada será calculado da seguinte forma:
I - quando o salário-de-benefício for igual ou inferior ao menor valor-teto (artigo 225, § 3º), serão aplicados os coeficientes previstos nesta Consolidação;
II - quando for superior ao menor valor-teto, o salário-de-benefício será dividido em duas parcelas, a primeira igual ao menor valor-teto e a segunda correspondente ao que exceder o valor da primeira, aplicando-se:
a) à primeira parcela os coeficientes previstos no item I;
b) à segunda um coeficiente igual a tantos 1/30 (um trinta avos) quantos forem os grupos de 12 (doze) contribuições acima do menor valor-teto, respeitado, em cada caso, o limite máximo de 80% (oitenta por cento) do valor dessa parcela;
III - na hipótese do item II o valor da renda mensal será a soma das parcelas calculadas na forma das letras a e b , não podendo ultrapassar 90% (noventa por cento) do maior valor-teto (artigo 225, § 3º).
Portanto, é o salário de benefício que reflete o aporte contributivo do segurado e que lhe deveria ser pago, na proporção correspondente ao coeficiente de cálculo, respeitados os limites vigentes para fins de pagamento. Se esses limites se alteram, tanto em termos de valor como na forma de incidência, o núcleo essencial do direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado (expresso na média atualizada dos salários de contribuição, reflexo de seu histórico contributivo) permanece intocável, havendo "a possibilidade de o segurado adequar o valor de seu benefício ao novo teto constitucional, recuperando o valor perdido em virtude do limitador anterior, pois coerente com as contribuições efetivamente pagas" (Min. Gilmar Mendes, no RE n. 564354). Ou, no dizer do Min. Ayres Britto, "os já aposentados, segundo um teto vigente à época da aposentadoria [in casu menor e maior valor-teto] são catapultados para o novo teto automaticamente".
Nem se afirme haver impossibilidade de cálculo do valor mensal a ser pago, dada a circunstância de, após o advento da Lei n. 8.213/91, estarem extintos o menor e o maior valor-teto. Se, segundo o STF, o salário de benefício é o resultado da média corrigida dos salários de contribuição que compõem o período básico de cálculo, apurada nos termos da lei previdenciária, e que o segurado deveria receber a média de suas contribuições, não fosse a incidência de teto para pagamento do benefício, o raciocínio, também aplicável para os benefícios concedidos antes da vigência da Constituição Federal de 1988, conduz ao seguinte: toma-se a média dos salários de contribuição, calculada nos termos da legislação vigente à época da concessão (art. 26 do Decreto n. 77.077/76; art. 21 do Decreto n. 89.312/84) e, considerando o disposto no art. 58/ADCT, divide-se pelo salário mínimo de então; aplica-se a equivalência salarial até dezembro/91 e, a partir de janeiro de 1992, o valor equivalente em salários mínimos deve ser atualizado pelos índices de reajustamento dos benefícios previdenciários até os dias atuais, sendo confrontado com o teto de cada competência e, após a glosa, aplicado o coeficiente de cálculo do benefício.
Embora não seja um argumento essencialmente jurídico, não posso deixar de lembrar que, nos salários de benefícios calculados anteriormente à CF/88, os últimos doze salários de contribuição integrantes do período básico de cálculo não eram atualizados, acarretando médias por vezes muito defasadas em valor, em face das altas taxas de inflação que assolavam o país. Assim, o segurado poderia ser duplamente penalizado: no cálculo do salário de benefício e, após, ao apurar-se a renda mensal inicial, na hipótese de incidirem o menor e o maior valor-teto. Nesse contexto, o entendimento da Suprema Corte vem amenizar, por via indireta, os prejuízos que a legislação de regência trouxe aos benefícios previdenciários, ao propiciar a recuperação, pelo menos em parte, do que normalmente receberiam se o teto à época fosse outro.
Impõe-se, portanto, a procedência da ação.
A verificação da existência de eventual prejuízo pela limitação aos tetos e a efetiva existência de crédito em favor do segurado somente poderá ocorrer na fase de liquidação e cumprimento de sentença.
Prescrição
A citação do INSS na ação civil pública nº 0004911-28.2011.4.03.6183, cujo pedido coincide com o formulado individualmente nesta ação, interrompeu a prescrição quinquenal, com efeitos desde o ajuizamento da ação coletiva, em 05-05-2011, nos termos do art. 240, §1º, Código de Processo Civil (art. 219, caput e § 1º, do CPC/73), até o seu trânsito em julgado.
A jurisprudência do STJ admite que a de ação civil pública ajuizada pelo MPF com o objetivo de anular ou revisar atos administrativos praticados pelo INSS, com reflexos sobre os segurados, interrompe a prescrição quinquenal das ações individuais a serem propostas com idêntica finalidade (REsp 1449964/RS, DJe 13-10-2014).
Trata-se de procedimento adotado em favor dos titulares do direito subjetivo posto em juízo, capaz de romper os efeitos da inércia em relação ao seu exercício. O que releva notar, em tema de prescrição, é se o procedimento adotado pelo titular do direito subjetivo denota, de modo inequívoco e efetivo, a cessação da inércia em relação ao seu exercício. Em outras palavras, se a ação proposta, de modo direto ou virtual, visa à defesa do direito material sujeito à prescrição (REsp n. 23.751/GO, Quarta Turma, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ 08-03-1993).
Conquanto não desconheça a existência de decisões da Segunda Turma do STJ, de relatoria do Min. Herman Benjamin, no sentido de que a prescrição atinge as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação individual, ainda que haja a interrupção do prazo prescricional em razão de ação coletiva (AgRg no REsp 1559883/RJ, DJe 23-05-2016; REsp 1647686/RJ, DJe 05-05-2017, e REsp 1656512/RJ, DJe 02-05-2017), mantenho o posicionamento acima adotado, lembrando que, no cenário atual, há decisões admitindo a interrupção da prescrição da ação individual em razão do ajuizamento de ação coletiva previdenciária (v.g. REsp 1643702/ES, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 19-06-2017, e REsp 168.914-8, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, DJe 15-09-2017).
Nesse contexto, e considerando a data da citação na ação coletiva, encontram-se prescritas apenas as eventuais parcelas anteriores a 05-05-2006.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
O juízo de origem fixou os honorários advocatícios nos percentuais mínimos dos incisos do § 3º e atendendo aos §§ 2º e 5º, todos do art. 85 do CPC, excluídas as prestações vincendas (Súmula 111 do STJ).
Mantida a decisão em grau recursal, impõe-se a majoração dos honorários, por incidência do disposto no §11 do mesmo dispositivo legal.
Assim, os honorários vão majorados em 2% sobre o valor das parcelas vencidas, observado o trabalho adicional realizado em grau recursal.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96).
Tutela específica - revisão do benefício
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à revisão do benefício da parte autora, a ser efetivada em 45 dias, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e determinar a revisão do benefício.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000507717v4 e do código CRC c058c0c7.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 11/7/2018, às 13:48:21
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 15:31:00.
Apelação Cível Nº 5006525-72.2017.4.04.7111/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LUSARDO MOREIRA SIQUEIRA (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. TETO. EMENDAS CONSTITUCIONAIS 20/1998 E 41/2003.
1. Na hipótese não incide a decadência ou a prescrição de fundo do direito, pois a discussão da aplicação dos limites das ECs n. 20/98 e n. 41/2003 diz respeito ao estabelecimento de critérios de evolução da renda mensal e não ao recálculo da renda mensal inicial ou de qualquer critério pertinente ao ato de concessão do benefício.
2. Consoante orientação do Supremo Tribunal Federal, o teto tem por função apenas limitar o valor do benefício previdenciário no momento de seu pagamento, não impedindo que o valor eventualmente glosado em virtude de sua incidência venha a ser, total ou parcialmente, considerado por ocasião de um aumento real do valor do teto, pois o valor do salário de benefício é o verdadeiro patrimônio jurídico do segurado, tradução, segundo a lei vigente, da sua vida contributiva.
3. O entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal também se aplica aos benefícios concedidos antes da Constituição Federal de 1988, época em que a legislação previdenciária estabelecia tetos a serem respeitados (no caso o menor e o maior valor teto).
4. Tendo presente o pressuposto de que o salário de benefício é patrimônio jurídico do segurado, resultado da média legal dos salários de contribuição, o menor e o maior valor-teto, aplicáveis aos benefícios anteriores à Constituição, já se configuravam como limitadores externos. Integravam o mecanismo de cálculo da renda mensal inicial, em etapa posterior à apuração do salário de benefício, mas não definiam o salário de benefício.
5. Em tais condições, se esses limites se alteram, tanto em termos de valor como na forma de incidência, o núcleo essencial do direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado (expresso na média atualizada dos salários de contribuição, reflexo de seu histórico contributivo) deve ser preservado, de forma que, em havendo elevação dos tetos, é no cotejo do salário de benefício com os novos limitadores, que se deve avaliar se há diferenças a serem recuperadas pelo segurado.
6. O ajuizamento da Ação Civil Pública nº 0004911-28.2011.4.03.6183, em 05-05-2011, promoveu a interrupção da prescrição quinquenal, que perdura até a decisão proferida naquele feito transitar em julgado. Portanto, a prescrição quinquenal, no caso, conta-se retroativamente daquela data.
7. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR.
8. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
9. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação e determinar a revisão do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de junho de 2018.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000507718v3 e do código CRC 21f5c562.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 11/7/2018, às 13:48:21
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 15:31:00.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/06/2018
Apelação Cível Nº 5006525-72.2017.4.04.7111/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: LUSARDO MOREIRA SIQUEIRA (AUTOR)
ADVOGADO: MÁRIO ANTÔNIO ZART
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/06/2018, na seqüência 132, disponibilizada no DE de 12/06/2018.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação e determinar a revisão do benefício.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 15:31:00.