Apelação/Remessa Necessária Nº 5015728-38.2010.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: AIRTON QUINTINO DA SILVA
ADVOGADO: CELSO SPERRY JUNIOR (OAB RS040614)
RELATÓRIO
A sentença proferida na ação ajuizada por Airton Quintino da Silva contra o INSS rejeitou a prescrição quinquenal e julgou o pedido parcialmente procedente, para condenar o réu a: a) reconhecer o exercício de atividade especial pelo autor nos períodos de 30-10-1968 a 06-04-1973, de 12-07-1976 a 28-02-1977, de 01-05-1977 a 31-05-1978, de 01-08-1978 a 11-07-1983, de 01-11-1985 a 10-03-1989, de 01-06-1989 a 30-01-1991 e de 01-10-1991 a 31-08-1992 e proceder à conversão para tempo comum pelo multiplicador 1,4; b) revisar o benefício de aposentadoria da parte autora (NB 127.572.814-3) na forma mais vantajosa, considerando o direito à aposentadoria integral por tempo de serviço em 16 de dezembro de 1998, ou à aposentadoria integral por tempo de contribuição em 28 de novembro de 1999 (sem a incidência do fator previdenciário) ou na data do requerimento administrativo (com a incidência do fator previdenciário), com efeitos financeiros desde a data do requerimento administrativo (06-01-2003); c) pagar as prestações vencidas até a revisão do benefício, observada a prescrição quinquenal, com atualização moentária desde o vencimento de cada parcela até o efetivo pagamento, de acordo com a variação do IGP-DI (05/96 a 03/2006) e do INPC (04/2006 em diante), acrescidas de juros de mora conforme o percentual de juros da caderneta de poupança, a contar da citação.
O INSS interpôs apelação. Em preliminar, alegou julgamento ultra petita em relação aos efeitos financeiros da condenação, visto que o autor postulou o pagamento das diferenças a partir da data do requerimento administrativo de revisão. Apontou erro material no dispositivo da sentença, já que o juízo, na fundamentação, rejeitou a prescrição quinquenal, pois não decorreram mais de cinco anos entre a data do pedido administrativo de revisão (12-03-2010) e a data do ajuizamento da ação (30-07-2010), porém determinou a observância da prescrição, ao condenar o réu ao pagamento das prestações vencidas. Afirmou ainda que o juízo incorreu em inexatidão material na contagem do tempo de contribuição. No mérito, aduziu que a documentação apresentada não atende aos requisitos para a comprovação do tempo especial, porquanto não se encontram nos autos laudos periciais de levantamento das condições de trabalho do autor que definam a exposição permanente e habitual a agentes prejudiciais a sua saúde. Aventou a inviabilidade da realização do exame pericial por semelhança no caso, já que a especialidade pela exposição ao agente ruído depende das particularidades do ambiente de trabalho do segurado. Argumentou que se observa o registro da utilização de equipamento de proteção individual eficaz a obstar os efeitos da exposição ao elemento potencialmente prejudicial à saúde, consoante o laudo pericial da empresa Spal, relativo ao período de 30-10-1968 a 06-04-1973. Ponderou que o formulário DSS-8030 fornecido pela empresa Spal não registra a exposição a qualquer agente nocivo. Caso a sentença seja mantida, sustentou que os efeitos financeiros da revisão não podem retroagir à data de concessão do benefício, porque o pedido formulado na inicial diz respeito à fixação da nova renda mensal a contar da data de requerimento administrativo de revisão e o autor não apresentou os documentos necessários para a comprovação do tempo de serviço especial quando requereu a concessão do benefício. Requereu a aplicação do índice de correção monetária do débito judicial estabelecido no art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009.
O autor ofereceu contrarrazões.
A sentença foi publicada em 19 de agosto de 2013.
VOTO
Julgamento ultra petita e erro material quanto à prescrição e aos efeitos financeiros da revisão
A sentença, no tópico referente à prescrição, entendeu que o autor havia pedido a fixação dos efeitos financeiros da condenação na data do requerimento administrativo de revisão do benefício e, por esse motivo, considerou que nenhuma parcela estava prescrita, consoante os parágrafos a seguir:
O prazo de prescrição é quinquenal, na forma do parágrafo único do art. 103 da Lei n.º 8.213/91. Contudo, por se tratar de uma relação de trato sucessivo, aplica-se o disposto na súmula 85 do STJ, segundo a qual, não tendo sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição não atinge o fundo de direito, apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação. A interrupção da prescrição ocorre com a citação, mas retroage à data do ajuizamento (art. 219, § 1º, do CPC).
No presente caso não ocorreu a prescrição, tendo em vista que não decorreram cinco anos desde a data dos efeitos financeiros mais remotos postulados até o ajuizamento da ação.
Registre-se que, de uma leitura dos termos da petição inicial, conclui-se que os efeitos financeiros pretendidos pelo autor são a contar da data do pedido de revisão administrativa formulado em 12/03/2010, pelo que inexiste prescrição a ser pronunciada.
Ao fundamentar o ponto relativo aos efeitos financeiros, porém, o juízo afirmou que o seu termo inicial deve ser a data de entrada do requerimento administrativo. Assim, na parte dispositiva da sentença, determinou a revisão do benefício a contar de 6 de janeiro de 2003 e o pagamento das diferenças desde essa data até a implantação da nova renda mensal inicial, observando-se a prescrição.
Para analisar a preliminar de julgamento ultra petita, é preciso levar em conta o conjunto da postulação. O pedido deve ser interpretado de forma sistemática, não restritiva nem extensiva, a partir da declaração de vontade do autor manifestada no contexto de toda a petição inicial, observando-se o princípio da boa-fé objetiva. Essa concepção mais flexível do princípio da congruência foi objetivada no art. 322, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015, porém já era anteriormente acolhida pela jurisprudência, consoante o seguinte acórdão do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. PETIÇÃO INICIAL. PEDIDO. INTERPRETAÇÃO AMPLA. POSSIBILIDADE. 1. O pedido deve ser extraído da interpretação lógico-sistemática da petição inicial, a partir da análise de todo o seu conteúdo. Precedentes. 2. O pedido deve ser interpretado como manifestação de vontade, de forma a tornar efetivo o processo, amplo o acesso à justiça e justa a composição da lide. Precedentes. 3. A decisão que interpreta de forma ampla o pedido formulado pelas partes não viola os arts. 128 e 460 do CPC, pois o pedido é o que se pretende com a instauração da ação. Precedentes. 4. Recurso especial provido. (REsp 1049560/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/11/2010, DJe 16/11/2010)
O pedido deduzido na inicial, em primeira análise, mostra-se confuso. O autor postulou a contagem do tempo de serviço especial e a modificação do coeficiente de cálculo da aposentadoria desde a data do requerimento administrativo, mencionando a data do pedido de revisão (12-03-2010). Logo a seguir, solicitou a revisão da renda mensal inicial a contar da data de entrada do requerimento de aposentadoria. Eis os termos do pedido:
b) Julgar a presente Ação TOTALMENTE PROCEDENTE para declarar a revisão da aposentadoria do Autor por Sentença e condenar o Réu a: 1) Reconhecer o período laborativo especial, sendo este computado com o período comum na contagem do tempo da aposentadoria proporcional deferida, alterando a mesma para aposentadoria integral desde o requerimento administrativo (12.03.2010), e revisar a renda da aposentação contada desde a data da entrada da aposentadoria; (...)
Conquanto o autor tenha incorrido em equívoco, quando se referiu à data do requerimento administrativo, depreende-se da fundamentação exposta na inicial que pretende a retroação dos efeitos financeiros da revisão da aposentadoria à data do requerimento de concessão do benefício. Veja-se a narração dos fatos:
Que o Autor deu entrada em seu pedido de aposentadoria por tempo de serviço (NB 42/127.572.814-3), junto ao Instituto Nacional do Seguro Social, ora Réu, tendo o mesmo sido deferido, conforme se comprova pelos documentos em anexos (cópia na íntegra do procedimento administrativo);
Ocorre que o pedido de aposentadoria do Autor tem base na contagem do tempo de serviço urbano com o período de atividade especial, tendo sido requerido na data de 12.03.2010 Revisão do benefício administrativamente a qual foi indeferido, sendo que a veracidade da atividade especial é facilmente comprovada através dos formulários DSS-8030 juntados e laudos periciais, estes anexos e que se encontram em poder do posto de benefícios do INSS, bem como pela prova pericial que será produzida oportunamente havendo necessidade.
Após expor a fundamentação, o autor concluiu:
Estando assim demonstrado, inequivocamente, que o direito do Autor estava amparado pela legislação vigorante, quando do requerimento administrativo, fazendo jus ao reconhecimento do período laborado em condições especiais com a devida conversão.
Portanto, a preliminar de julgamento ultra petita deve ser rejeitada. Isso implica, todavia, a reapreciação da matéria relativa à prescrição quinquenal.
Nos termos do art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/1991, prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social.
A legislação específica sobre a prescrição contra a Fazenda Pública prevê hipótese de suspensão do prazo, na forma do art. 4º do Decreto nº 20.910/1932:
Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la.
Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas, com designação do dia, mês e ano.
O Decreto nº 20.910/1932 determina que o prazo de prescrição não corre durante o trâmite do procedimento administrativo em que o titular do direito contra a Fazenda Pública reclama o pagamento de qualquer crédito, pouco importando se, ao final, há ou não o reconhecimento da dívida.
Dessa forma, deve ser excluído, na contagem do prazo prescricional, o período de tramitação do processo administrativo, computando-se o lapso decorrido entre o ajuizamento da ação, a comunicação da decisão sobre o pedido de revisão do benefício e o tempo anterior ao requerimento administrativo.
No caso dos autos, o requerimento de revisão foi protocolado em 12 de março de 2010 e a cientificação do último ato praticado no processo administrativo ocorreu em 28 de julho de 2010. Esta ação foi ajuizada em 30 de julho de 2010, o que ocasionou a interrupção da prescrição, consoante o art. 219, § 1º, do antigo CPC.
Para aferir a prescrição, o período de tramitação do requerimento de revisão (4 meses e 16 dias) deve ser excluído da contagem do prazo de cinco anos anterior à data de interrupção da prescrição. Assim, restam prescritas as parcelas anteriores a 14 de março de 2005.
A jurisprudência deste Tribunal já decidiu nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. AÇÃO TRABALHISTA. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO. (…) 3. O requerimento administrativo é causa suspensiva da prescrição. A suspensão mantém-se durante o período de tramitação do processo administrativo, até a comunicação da decisão ao interessado. Na verificação da prescrição quinquenal, computa-se, retroativamente, o lapso decorrido entre o ajuizamento da ação e a comunicação da decisão administrativa, exclui-se o período de tramitação do processo administrativo, e conta-se o tempo decorrido anteriormente ao requerimento administrativo. (…). (TRF4, AC 5001789-78.2017.4.04.7121, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 06/03/2018)
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. EFEITOS FINANCEIROS PRESCRIÇÃO. DANO MORAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. DIFERIMENTO. 1. Em regra geral, a prescrição é qüinqüenal, contada retroativamente a partir da data do ajuizamento da demanda. 2. O procedimento administrativo tem sido considerado causa suspensiva da prescrição. A suspensão mantém-se durante o período de tramitação do processo administrativo, até a comunicação da decisão ao interessado. 3. Na verificação da prescrição quinquenal, computa-se, retroativamente, o lapso decorrido entre o ajuizamento da ação e a comunicação da decisão administrativa, exclui-se o período de tramitação do processo administrativo, e conta-se o tempo decorrido anteriormente ao requerimento administrativo. 4. Inexistindo comprovação de ter o ato administrativo sido desproporcionalmente desarrazoado, inexiste direito à indenização por dano moral. 5. A definição dos índices de correção monetária e juros de mora deve ser diferida para a fase de cumprimento do julgado. (TRF4 5015094-42.2015.4.04.7108, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 26/04/2017)
Erro material na contagem do tempo de contribuição
Assiste razão em parte ao INSS.
Na contagem do tempo de contribuição a sentença computou o período de 01-01-1991 a 30-01-1991, considerando a informação prestada pelo empregador no formulário DSS-8030. No entanto, nenhum documento nos autos comprova efetivamente o exercício de atividade sujeita ao Regime Geral de Previdência Social e tampouco o autor pediu que fosse reconhecido o vínculo empregatício nesse intervalo.
Por conseguinte, deve ser excluído o período de 01-01-1991 a 30-01-1991 da contagem do tempo de contribuição do autor.
Quanto ao período de 30-10-1968 a 06-04-1973, verifica-se que foi incluído na contagem do tempo de contribuição da aposentadoria, quando foi concedido o benefício. O erro está na certidão do tempo de serviço juntada no evento 62, que não computa esse período.
Tempo de atividade especial
O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente na época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, havendo a prestação laboral sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem do tempo de serviço especial na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Nesse sentido, a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24-09-2008) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18-11-2009).
A evolução legislativa da matéria apresenta os seguintes marcos temporais:
a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei nº 3.807/1960 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social), em sua redação original (artigos 57 e 58), a especialidade do tempo de serviço decorria do exercício de atividade profissional prevista como especial nos Decretos nº 53.831/1964 e nº 83.080/1979 e/ou na legislação especial. As normas regulamentares classificavam as atividades de duas formas: segundo os grupos profissionais, presumindo-se a sujeição do trabalhador a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física; e segundo os agentes nocivos, caso em que deve ser demonstrada a exposição ao agente por qualquer meio de prova. Para os agentes nocivos ruído e calor, é necessário mensurar os seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar o grau de nocividade dos agentes envolvidos;
b) entre 29 de abril de 1995 a 05 de março de 1997, período em que estavam vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima. Foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei nº 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13 de outubro de 1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523/1996, que a revogou expressamente;
c) a partir de 06 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória nº 1.523/1996 (convertida na Lei nº 9.528/1997), passou a ser exigida, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, ou por meio de perícia técnica.
Para que se caracterize a habitualidade e a permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, §3º, da Lei n° 8.213/91), a exposição ao agente nocivo deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07-11-2011). Em suma, somente se a exposição ao agente nocivo for eventual ou ocasional, está afastada a especialidade do tempo de serviço.
Além disso, conforme o tipo de atividade, a exposição ao agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade. Não é razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-05-2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08-01-2010).
Uma vez que se incorpora ao patrimônio jurídico do trabalhador a prestação de trabalho em condições especiais, regida pela legislação em vigor na época do exercício da atividade, é possível a conversão do tempo especial para comum, independente da data da prestação do trabalho ou do requerimento de benefício. A respeito, cabe registrar que, embora o art. 28 da MP nº 1.663-10 tenha revogado o § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/1991, a lei de conversão (Lei nº 9.711/1998) não manteve o dispositivo, permanecendo a possibilidade de soma do tempo de serviço especial, após a respectiva conversão, ao tempo de atividade comum, para a concessão de qualquer benefício.
A atual redação do artigo 70 do Decreto nº 3.048/1999 estabelece que as regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Contudo, o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é o previsto na legislação vigente na data da concessão do benefício, e não aquele em vigor quando o serviço foi prestado. A matéria foi decidida em recurso especial repetitivo, firmando-se a seguinte tese no Tema nº 546 do STJ:
A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço. (REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24-10-2012, DJe 19-12-2012)
De acordo com o art. 70 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/2003, o fator de conversão a ser observado é de 1,4 para o homem e de 1,2 para a mulher (considerando, em ambos os casos, o exercício de atividade que ensejaria a aposentadoria especial em 25 anos).
Utilização de equipamento de proteção individual
A respeito da utilização de equipamento de proteção individual (EPI), a Medida Provisória nº 1.729/1998, convertida na Lei nº 9.732/1998, modificou a redação dos §§ 1º e 2º do art. 58 da Lei nº 8.213/1991, estabelecendo que a existência de tecnologia de proteção individual eficaz, que comprovadamente neutralize os agentes nocivos ou diminua a sua intensidade a limites de tolerância, afasta o efetivo prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador, razão pela qual a atividade não pode ser qualificada como especial. Note-se que a questão atinente ao uso do EPI só passou a ter relevância, para fins de reconhecimento das atividades exercidas em condições especiais, a partir de 03/12/1998, data da publicação da MP nº 1.729/1998.
O Supremo Tribunal Federal, em julgado com repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não há direito à aposentadoria especial. Contudo, havendo demonstração de que o uso do EPI, no caso concreto, não é suficiente para afastar a nocividade, deve ser reconhecida a especialidade do trabalho. Em relação ao ruído, o STF considerou que a exposição a níveis superiores aos limites de tolerância causa prejuízos ao organismo humano que vão além dos relacionados à perda das funções auditivas. Assim, a utilização do EPI não garante a eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído, pois existem fatores de difícil ou impossível controle que influenciam a sua efetividade. Esta é a redação da tese firmada no Tema nº 555:
I - O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; II - Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. (ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015)
No período posterior à MP nº 1.729/98, o uso de EPI se revela, de per si, ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano pelo ruído. Com efeito, consoante já identificado pela medicina do trabalho, a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.
Por essa razão, a declaração do empregador sobre a eficácia do EPI não tem o condão de afastar o reconhecimento da especialidade com base no agente nocivo ruído, conforme a tese firmada no Tema nº 555 do STF.
Agente físico ruído
Em se tratando do agente nocivo ruído, o reconhecimento da especialidade do labor exige, em qualquer período, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Ou seja, não basta, aqui, mesmo no período anterior a 28/04/1995, o enquadramento por categoria profissional, sendo exigida prova da exposição ao agente nocivo.
Em relação ao agente nocivo ruído, consideram-se os níveis de pressão sonora estabelecidos na legislação em vigor na data da prestação do trabalho, conforme o quadro a seguir:
Período trabalhado | Enquadramento | Limites de tolerância |
até 05/03/1997 | 1. Decreto nº 53.831/1964; 2. Decreto nº 83.080/1979 | 1. Superior a 80 dB; 2. Superior a 90 dB |
de 06/03/1997 a 06/05/1999 | Decreto nº 2.172/1997 | Superior a 90 dB |
de 07/05/1999 a 18/11/2003 | Decreto nº 3.048/1999, na redação original | Superior a 90 dB |
a partir de 19/11/2003 | Decreto nº 3.048/1999 com alteração introduzida pelo Decreto nº 4.882/2003 | Superior a 85 dB |
Cabe esclarecer que os Decretos nº 53.831/1964 e 83.080/1979 tiveram vigência concomitante até a edição do Decreto nº 2.172/1997, que revogou de forma expressa o fundamento de validade da legislação então vigente. Dessa forma, até 05/03/1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto n° 53.831/64.
O Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o limite de tolerância ao agente físico ruído para 85 decibéis, não pode ser aplicado retroativamente. Dessa forma, entre 06 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003, o limite de tolerância ao ruído corresponde a 90 decibéis, consoante o código 2.0.1 do Anexo IV dos Decretos n° 2.172/1997 e 3.048/1999. O Superior Tribunal de Justiça examinou a matéria em recurso especial repetitivo e fixou a seguinte tese:
Tema nº 694: O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). (REsp 1.398.260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)
Sob essas premissas, portanto, é que deve ser avaliada a especialidade decorrente da exposição a ruído.
Caso concreto
O reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 30-10-1968 a 06-04-1973, de 12-07-1976 a 28-02-1977, de 01-05-1977 a 31-05-1978, de 01-08-1978 a 11-07-1983, de 01-11-1985 a 10-03-1989, de 01-06-1989 a 31-12-1990 e de 01-10-1991 a 31-08-1992 está amparado nos elementos coligidos nos quadros abaixo:
Empresa | Vonpar Refrescos S/A (sucessora de SPAL – Indústria de Refrescos S/A.) |
Período | 30/10/1968 a 06/04/1973 |
Função/atividade | Ajudante de produção |
Agente nocivo | Ruído de 94,00 dB(A) - código 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 |
Provas | Formulário DSS-8030 (evento 30, out2) e laudo técnico (evento 40, lau2 a lau5) |
Conclusão | Está comprovado o exercício de atividade especial neste período, conforme a legislação da época da prestação do serviço, em virtude da exposição a nível de ruído superior ao limite de tolerância, de forma habitual e permanente. |
Empresa | Fábrica de Esquadrias Ramos Ltda. - ME |
Período | 12/07/1976 a 28/02/1977, 01/05/1977 a 31/05/1978, 01/08/1978 a 11/07/1983, 01/11/1985 a 10/03/1989, 01/06/1989 a 31/12/1990 e 01/10/1991 a 03/08/1995 |
Função/atividade | Marceneiro |
Agente Nocivo | Ruído superior a 80,00 dB(A) - código 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 |
Provas | Formulários DSS-8030 (evento 1, procadm6, p. 11-16) e laudo judicial (evento 82) |
Conclusão | Está comprovado o exercício de atividade especial neste período, conforme a legislação da época da prestação do serviço, em virtude da exposição a nível de ruído superior ao limite de tolerância, de forma habitual e permanente. |
As razões expendidas pelo INSS não merecem acolhimento.
O formulário DSS-8030 expedido pela empresa Vonpar Refrescos foi retificado no campo relativo aos agentes nocivos. O documento juntado pelo autor, durante a instrução processual, registra a exposição a ruído em torno de 94 decibéis. Essa informação é corroborada pelo laudo técnico, elaborado em novembro de 1987, que constatou o nível sonoro excessivo no setor de produção, decorrente da mobilização dos vasilhames ao longo das esteiras de enchimento e lavagem de garrafas. Conforme o laudo, no referido setor trabalham o encarregado de turma, o auxiliar de controle de qualidade, o operador de máquina e o ajudante de produção.
A perícia judicial foi realizada para verificar a efetiva exposição ao agente nocivo ruído nos períodos em que o autor trabalhou na empresa Fábrica de Esquadrias Ramos, porque o empregador não possuía laudo técnico pericial e o estabelecimento havia encerrado as atividades.
Quando o estabelecimento em que o serviço foi prestado encerrou suas atividades, admite-se a perícia indireta ou por similitude, realizada mediante o estudo técnico em outro estabelecimento, que apresente estrutura e condições de trabalho semelhantes àquele em que a atividade foi exercida.
O fato de o laudo técnico ter examinado as condições ambientais em empresa paradigma, e não na empresa em que a parte autora trabalhou, não lhe retira o valor probatório, conforme já decidiu este Tribunal (TRF4, EINF 0008289-08.2008.404.7108, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 15/08/2011; TRF4, EINF 0003914-61.2008.404.7108, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 10/06/2011).
Não se reduz a força probante da perícia, ainda que a prova não tenha sido colhida no tempo em que foram prestados os serviços. Além de inexistir laudo da época dos fatos, é notório que a evolução tecnológica permitiu maior proteção ao trabalhador, em razão do aperfeiçoamento dos equipamentos de proteção individual e das máquinas e instrumentos de trabalho. Uma vez que as antigas condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador, a extemporaneidade da perícia não afeta o seu valor probatório (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, Terceira Seção, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
No caso presente, a avaliação das condições ambientais de trabalho foi efetuada no mesmo local onde o autor exercia a atividade de marceneiro e com as mesmas máquinas utilizadas na época da prestação de serviços. O perito consignou que, embora a empresa esteja desativada, o antigo sócio ainda trabalha no local, fazendo pequenos reparos ou reformas, sem empregados. Assim, sem razão o INSS ao aduzir a inviabilidade do exame pericial por semelhança.
A respeito do equipamento de proteção individual, a sua utilização não neutraliza de forma adequada os efeitos nocivos do ruído. Assim, havendo ou não o fornecimento do EPI, não se descaracteriza a especialidade do tempo de serviço.
Efeitos financeiros da condenação
A regra geral para a data de início dos benefícios de aposentadoria por idade, tempo de serviço/contribuição e especial é a data da entrada do requerimento (DER), segundo dispõe o art. 49, inciso II, combinado com o art. 54 da Lei nº 8.213/1991.
O surgimento do direito ao benefício não decorre da comprovação cabal da sua existência, sendo irrelevante que as provas tenham sido produzidas apenas na ação judicial. Ora, se o segurado já havia cumprido todos os requisitos exigidos pela legislação para a concessão do benefício, o direito já estava aperfeiçoado e incorporado ao seu patrimônio jurídico no momento do primeiro pedido administrativo. Aliás, a prova do direito ao benefício não consiste em condição para o seu exercício, tanto que a apresentação de documentação incompleta não constitui motivo para a recusa do requerimento do benefício, consoante o art. 105 da Lei nº 8.213/1991.
A propósito, cito julgado do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. RENDA MENSAL INICIAL. SALÁRIOS DE CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO POSTERIOR PELO EMPREGADO. EFEITOS FINANCEIROS DA REVISÃO. DATA DA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. É assente no STJ o entendimento de que o termo inicial dos efeitos financeiros da revisão deve retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado, não obstante a comprovação posterior do salário de contribuição. Para o pagamento dos atrasados, impõe-se a observância da prescrição quinquenal. 2. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 156.926/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 29/05/2012, DJe 14/06/2012)
Correção monetária
O Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE 870.947, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2017), fixando as seguintes teses sobre a questão da correção monetária e dos juros moratórios nas condenações impostas à Fazenda Pública:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º,caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.
Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos (REsp 1.495.146/MG, REsp 1.492.221/PR, REsp 1.495.144/RS, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 22/02/2018), discutiu a aplicabilidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, em relação às condenações impostas à Fazenda Pública. Quanto aos índices de correção monetária e aos juros de mora aplicáveis às ações previdenciárias, a tese firmada no Tema nº 905 foi redigida nos seguintes termos:
3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
No entanto, há fato superveniente a ser considerado no julgamento.
O Ministro Luiz Fux deferiu excepcionalmente efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos no RE 870.947, a fim de obstar a imediata aplicação do acórdão, enquanto não for decidida a modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, na parte em que disciplina a atualização monetária do débito judicial segundo o índice aplicável à caderneta de poupança (TR).
Já a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, ao realizar o juízo de admissibilidade do recurso extraordinário interposto contra o acórdão proferido no REsp 1.492.221/PR (Tema 905 do STJ), determinou o sobrestamento do recurso e atribuiu-lhe efeito suspensivo, até a publicação do acórdão a ser proferido pelo Supremo Tribunal Federal nos embargos de declaração opostos no RE 870.947/SE.
Contudo, é desnecessário aguardar a decisão do STF nos embargos de declaração para que o feito tenha prosseguimento. Considerando o caráter acessório dos critérios de correção monetária das condenações impostas à Fazenda Pública, a ausência de definição sobre a matéria não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento. Desde que sejam firmados o cabimento e o termo inicial dos juros e da correção monetária em decisão judicial, a eficácia temporal do afastamento da aplicação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997 pode ser definida na fase de cumprimento de sentença, observando-se as decisões do STF sobre a questão.
Dessa forma, mostra-se adequado e racional diferir para a fase de execução a solução definitiva sobre os critérios de correção monetária aplicáveis ao débito judicial, conforme preconizam os artigos 4º, 6º e 8º, todos do CPC, pois somente nesse momento é que o real valor da condenação é determinado.
A fim de evitar novos recursos antes da solução definitiva sobre o tema, a alternativa é iniciar o cumprimento do julgado conforme os índices da Lei nº 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou de RPV pelo valor incontroverso. Após o julgamento da matéria pelo STF, cabe ao juízo da execução decidir sobre a existência de diferenças remanescentes a serem requisitadas, em conformidade com a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade no RE 870.947.
Assim, deve ser diferida para a fase de cumprimento de sentença a definição sobre os critérios de atualização monetária, aplicando-se inicialmente a Lei nº 11.960/2009.
Implantação imediata da revisão do benefício
Assim dispõe o art. 497 do CPC: "Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente".
A respeito da matéria, a Terceira Seção deste Tribunal pacificou o entendimento neste sentido:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ART. 461 do CPC. TUTELA ESPECÍFICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EFICÁCIA PREPONDERANTEMENTE MANDAMENTAL DO PROVIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE. REQUERIMENTO DO SEGURADO. DESNECESSIDADE. 1. Atento à necessidade de aparelhar o processo de mecanismos preordenados à obtenção do resultado prático equivalente à situação jurídica que se verificaria caso o direito material tivesse sido observado espontaneamente pelo "devedor" através da realização da conduta imposta pelo direito material, o legislador, que já havia, na época da edição do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) instituído a tutela específica do direito do "credor" de exigir o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes de relação de consumo, inseriu no ordenamento processual positivo, por meio da alteração no art. 461 do Código de Processo Civil operada pela Lei 8.952/94, a tutela específica para o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes das relações do direito material que não as de consumo. 2. A adoção da tutela específica pela reforma processual de 1994 do CPC veio para suprir, em parte, a morosidade judicial, na proporção em que busca dar ao cidadão aquilo e somente aquilo que lhe é devido, tirando o direito do plano genérico-abstrato da norma, conferindo-lhe efeitos concretos, com o fito de lhe garantir a mesma conseqüência do que aquela que seria obtida pelo adimplemento voluntário. 3. A sentença que concede um benefício previdenciário (ou assistencial), em regra, compõe-se de uma condenação a implantar o referido benefício e de outra ao pagamento das parcelas atrasadas. No tocante à determinação de implantação do benefício (para o futuro, portanto), a sentença é condenatória mandamental e será efetiva mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). 4. A respeito do momento a partir do qual se poderá tornar efetiva a sentença, na parte referente à implantação futura do benefício, a natureza preponderantemente mandamental da decisão não implica automaticamente o seu cumprimento imediato, pois há de se ter por referência o sistema processual do Código, não a Lei do Mandado de Segurança, eis que a apelação de sentença concessiva do benefício previdenciário será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo, nos termos do art. 520, caput, primeira parte, do CPC, motivo pelo qual a ausência de previsão de efeito suspensivo ex lege da apelação, em casos tais, traz por conseqüência a impossibilidade, de regra, do cumprimento imediato da sentença. 5. Situação diversa ocorre, entretanto, em segundo grau, visto que o acórdão que concede o benefício previdenciário, que esteja sujeito apenas a recurso especial e/ou recurso extraordinário, enseja o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, ante a ausência, via de regra, de efeito suspensivo daqueles recursos, de acordo com o art. 542, § 2º, do CPC. Tal cumprimento não fica sujeito, pois, ao trânsito em julgado do acórdão, requisito imprescindível apenas para a execução da obrigação de pagar (os valores retroativamente devidos) e, consequentemente, para a expedição de precatório e de requisição de pequeno valor, nos termos dos parágrafos 1º, 1º-A e 3º do art. 100 da Constituição Federal. 6. O cumprimento imediato da tutela específica, diversamente do que ocorre no tocante à antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, independe de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, pois aquele é inerente ao pedido de que o réu seja condenado a conceder o benefício previdenciário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC. Em suma, a determinação da implantação imediata do benefício contida no acórdão consubstancia, tal como no mandado de segurança, uma ordem (à autarquia previdenciária) e decorre do pedido de tutela específica (ou seja, o de concessão do benefício) contido na petição inicial da ação. 7. Questão de ordem solvida para que, no tocante à obrigação de implantar (para o futuro) o benefício previdenciário, seja determinado o cumprimento imediato do acórdão sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, independentemente de trânsito em julgado e de pedido específico da parte autora. (TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, 3ª Seção, relator para acórdão Des. Federal Celso Kipper, D.E. 01/10/2007)
Dessa forma, considerando as disposições do art. 497 do CPC e a ausência de recurso com efeito suspensivo por força da lei, determina-se a implantação imediata da revisão do benefício no prazo de até trinta dias úteis. Incumbe ao representante judicial do INSS que for intimado desta decisão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Conclusão
Dou parcial provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, apenas para determinar a exclusão do período de 01-01-1991 a 30-01-1991 da contagem do tempo de contribuição do autor.
De ofício, declaro a prescrição das parcelas anteriores a 14 de março de 2005.
Ainda de ofício, determino o diferimento da definição sobre os critérios de atualização monetária para a fase de cumprimento de sentença e concedo a tutela específica, para determinar a imediata implantação da revisão da aposentadoria.
Mantém-se a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios, em razão da alteração mínima na sucumbência.
Em face do que foi dito, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e, de ofício, declarar a prescrição, conceder a tutela específica e determinar o diferimento da definição sobre os critérios de atualização monetária para a fase de cumprimento de sentença.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001475765v43 e do código CRC 54922276.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 5/12/2019, às 15:52:2
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5015728-38.2010.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: AIRTON QUINTINO DA SILVA
ADVOGADO: CELSO SPERRY JUNIOR (OAB RS040614)
EMENTA
previdenciário. revisão de benefício. julgamento ultra petita. efeitos financeiros. interpretação do pedido. prescrição. exercício de atividade especial. prova pericial. agente físico ruído. empresa extinta. uso de equipamento de proteção individual. correção monetária. tutela específica.
1. A concepção mais flexível do princípio da congruência foi objetivada no art. 322, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015, porém já era anteriormente acolhida pela jurisprudência.
2. O conjunto da postulação permite que se compreenda no pedido a atribuição dos efeitos financeiros da revisão da aposentadoria à data do requerimento de concessão do benefício.
3. A sentença, ao analisar a questão dos efeitos financeiros da revisão, não julgou além dos limites do pedido.
4. Deve ser excluído, na contagem do prazo prescricional, o período de tramitação do processo administrativo.
5. A realização de prova pericial torna-se imprescindível, caso o formulário destinado à comprovação do exercício de atividade especial aponte a exposição ao agente físico ruído e a empresa não possua laudo técnico de condições ambientais de trabalho ou programa de prevenção de riscos ambientais.
6. Quando o estabelecimento em que o serviço foi prestado encerrou suas atividades, admite-se a perícia indireta ou por similitude, realizada mediante o estudo técnico em outro estabelecimento, que apresente estrutura e condições de trabalho semelhantes àquele em que a atividade foi exercida.
7. A utilização de equipamento de proteção individual não garante a eliminação dos efeitos nocivos do agente nocivo ruído.
8. Os efeitos financeiros da revisão do benefício retroagem à data do requerimento administrativo de concessão da aposentadoria, ainda que a comprovação do exercício de atividade especial tenha ocorrido posteriormente.
9. Difere-se para a fase de cumprimento de sentença a definição do índice de atualização monetária aplicável, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
10. A revisão do benefício reconhecida em juízo comporta implantação imediata, diante do que dispõe o art. 497 do CPC e da ausência de previsão legal de recurso com efeito suspensivo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e, de ofício, declarar a prescrição, conceder a tutela específica e determinar o diferimento da definição sobre os critérios de atualização monetária para a fase de cumprimento de sentença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 03 de dezembro de 2019.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001475766v6 e do código CRC 27eebd14.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 03/12/2019
Apelação/Remessa Necessária Nº 5015728-38.2010.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: AIRTON QUINTINO DA SILVA
ADVOGADO: CELSO SPERRY JUNIOR (OAB RS040614)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 03/12/2019, às 13:30, na sequência 229, disponibilizada no DE de 14/11/2019.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL E, DE OFÍCIO, DECLARAR A PRESCRIÇÃO, CONCEDER A TUTELA ESPECÍFICA E DETERMINAR O DIFERIMENTO DA DEFINIÇÃO SOBRE OS CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA PARA A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 01:36:56.