Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. ATIVIDADES CONCOMITANTES. SOMA DAS C...

Data da publicação: 01/11/2022, 07:01:02

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. ATIVIDADES CONCOMITANTES. SOMA DAS CONTRIBUIÇÕES. 1. A Lei de Benefícios da Previdência Social não excepcionou o contribuinte individual como eventual não beneficiário da aposentadoria especial ou conversão do tempo especial em comum. 2. No caso de exercício de atividades concomitantes pelo segurado, o salário-de-contribuição consistirá na soma de todas as contribuições previdenciárias por ele vertidas ao sistema, respeitado o teto previdenciário (Tema 1070, do STJ). (TRF4, AC 5005448-73.2018.4.04.7117, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator FRANCISCO DONIZETE GOMES, juntado aos autos em 25/10/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5005448-73.2018.4.04.7117/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: FLAVIO AUGUSTO GIRARDELLO (AUTOR)

RELATÓRIO

Flavio Augusto Girardello propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 27/11/2018, postulando a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, a contar da data de entrada do requerimento administrativo (03/08/2018), mediante o reconhecimento do desempenho de atividades em condições especiais nos períodos de 01/04/1988 a 30/06/1988, 01/08/1988 a 31/08/1988, 01/04/1990 a 27/10/1992, 02/08/1996 a 31/12/1996, 01/01/1997 a 30/09/1998, 01/11/1998 a 31/12/2001 e 01/02/2002 a 30/07/2018.

Em 01/07/2019, sobreveio sentença (evento 46, SENT1), que julgou o pedido formulado na inicial nos seguintes termos:

III. DISPOSITIVO

ANTE O EXPOSTO, julgo PROCEDENTES (art. 487, I, do CPC) os pedidos formulados na inicial para:

(a) reconhecer a especialidade do trabalho desenvolvido pela parte autora nos períodos de 01/04/1988 a 30/06/1988, 01/08/1988 a 31/08/1988, 01/04/1990 a 27/10/1992, 02/08/1996 a 31/12/1996, 01/01/1997 a 30/09/1998, 01/11/1998 a 31/12/2001 e 01/02/2002 a 30/07/2018, convertendo-os em tempo de serviço comum pelo fator 1,4 ;

(b) reconhecer e computar os períodos de 01/08/2003 a 31/08/2003, 01/09/2003 a 30/09/2003, 01/11/2003 a 30/11/2003, 01/01/2004 a 30/04/2004, 01/06/2004 a 31/07/2004, 01/09/2004 a 31/12/2004, 01/01/2005 a 31/01/2005, de 01/03/2005 a 31/03/2005, 01/03/2006 a 31/03/2006, 01/01/2007 a 31/01/2007, 01/10/2007 a 31/10/2007, de 01/01/2009 a 31/03/2009, de 01/06/2009 a 30/06/2009, 01/11/2009 a 30/11/2009, 01/09/2010 a 30/09/2010, de 01/12/2010 a 31/12/2010, 01/03/2011 a 31/03/2011 e 01/09/2013 a 30/09/2013, em que efetuou recolhimentos como contribuinte individual, apenas como tempo de contribuição, nos termos da fundamentação;

(c) condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com DIB em 03/08/2018 e RMI de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, calculado de acordo com as normas então vigentes, com a observância da soma dos salários-de-contribuição dos períodos concomitantes, a ser apurado em liquidação de sentença;

(d) pagar as parcelas pretéritas desde a DER, nos termos da fundamentação;

Sucumbente, condeno o INSS a pagar honorários advocatícios em favor do procurador do demandante, os quais, tendo em conta a norma inserta no art. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC, fixo em 10% sobre o valor da condenação (até 200 salários-mínimos), atualizados pelo IPCA-e desde a data desta sentença até o efetivo pagamento, excluídas as parcelas vincendas, nos termos das Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF4.

Custas ex lege (art. 4º, I e II, da Lei 9.289/96).

Sentença não sujeita a reexame necessário, considerando que manifestamente o valor da condenação e do direito controvertido nesta demanda não excede o limite de mil salários-mínimos. Deixo, assim, de aplicar a Súmula 490 do STJ.

Sentença registrada e publicada eletronicamente. Intimem-se.

Interposto recurso de apelação, intime-se a parte adversa para apresentar contrarrazões no prazo legal (art. 183, caput, e/ou 1.010, § 1º, do CPC). Após, deve ser dada vista ao recorrente caso sejam suscitadas pelo recorrido as matérias referidas no § 1º do art. 1.009, nos termos do § 2º do mesmo dispositivo. Por fim, remetam-se os autos ao Egrégio TRF da 4ª Região, nos termos do 1.010, § 3º, do Código de Processo Civil, independentemente de juízo de admissibilidade.

Opostos eventuais embargos de declaração com efeitos infringentes, abra-se vista à parte contrária, nos termos do art. 1.023, §2º, do CPC.

Inconformada, a parte ré interpôs recurso de apelação.

Em suas razões (evento 50, APELAÇÃO1), sustenta ser indevido o reconhecimento do tempo de serviço especial nos intervalos de 02/08/1996 a 31/12/1996, 01/01/1997 a 30/09/1998, 01/11/1998 a 31/12/2001 e 01/02/2002 a 30/07/2018, sob o argumento de que não é possível o reconhecimento do trabalho especial do contribuinte individual após 28/04/1995. Subsidiariamente, requer a aplicação da fórmula estabelecida no art. 32, II, b, da Lei nº 8.213/91, no cálculo do salário-de-benefício, aplicando-se o percentual da média do salário-de-contribuição de cada uma das atividades e que seja determinada a aplicação dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/2009.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O(s) apelo(s) preenche(m) os requisitos legais de admissibilidade.

Remessa oficial

À luz do que preconiza o Código de Processo Civil é cabível a remessa necessária contra as pessoas jurídicas de direito público. Excepciona-se a aplicação do instituto, quando por meros cálculos aritméticos é possível aferir-se que o montante da condenação imposta à Fazenda Pública é inferior àquele inscrito na norma legal.

O art. 496, §3º, I, do referido Estatuto Processual, dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.

Consoante informação da Divisão de Cálculos Judiciais – DICAJ deste Tribunal Regional Federal, para que uma condenação previdenciária atinja o valor de 1.000 (mil) salários mínimos, necessário seria que a RMI fosse fixada no valor teto dos benefícios previdenciários, bem como abrangesse um período de 10 (dez) anos entre a DIB e a prolação da sentença.

No caso concreto, a sentença, proferida em 01/07/2019, condenou o INSS a pagar o benefício previdenciário a partir de 03/08/2018.

Tendo em conta que o valor da condenação fica aquém do limite referido artigo 496, §3º, inc. I, do CPC/2015, ainda que considerados os critérios de juros e correção monetária, a sentença proferida nos autos não está sujeita a reexame necessário.

Atividade Especial

O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18/11/2009; APELREEX 0000867-68.2010.404.9999/RS, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. 30/3/2010; APELREEX 0001126-86.2008.404.7201/SC, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/3/2010; APELREEX 2007.71.00.033522-7/RS; Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. 25/1/2010).

Feitas estas observações e tendo em vista a sucessão de leis que trataram a matéria diversamente, é necessário inicialmente definir qual deve ser aplicada ao caso concreto, ou seja, qual a legislação que se encontrava em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei 3.807/1960 (LOPS) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991 (LBPS), em sua redação original (artigos 57 e 58), era possível o reconhecimento da especialidade do trabalho mediante a comprovação do exercício de atividade prevista como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 4/8/2008; e STJ, REsp 639066/RJ, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 7/11/2005), quando então se fazia indispensável a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar a nocividade dos agentes envolvidos;

b) a partir de 29 de abril de 1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que a revogou expressamente - de modo que, para o intervalo compreendido entre 29/4/1995 (ou 14/10/1996) e 5/3/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;

c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória 1.523/1996 (convertida na Lei 9.528/1997), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

d) a partir de 01 de janeiro de 2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (art. 148 da Instrução Normativa nº. 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.

Em relação ao enquadramento diferenciado por categorias profissionais, observo que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).

Períodos de 02/08/1996 a 31/12/1996, 01/01/1997 a 30/09/1998, 01/11/1998 a 31/12/2001 e 01/02/2002 a 30/07/2018 (contribuinte individual - médico)

Colhe-se da conclusão sentencial (evento 46, SENT1):

(a) 01/04/1988 a 30/06/1988, 01/08/1988 a 31/08/1988, 01/04/1990 a 27/10/1992, 02/08/1996 a 31/12/1996, 01/01/1997 a 30/09/1998, 01/11/1998 a 31/12/2001 e 01/02/2002 a 30/07/2018: Nos períodos, a parte autora desenvolveu atividades como médico na área de cirurgia geral, em consultório próprio bem como em entidades hospitalares, efetuando recolhimentos junto ao RGPS na qualidade de contribuinte individual. Para comprovar o desempenho da atividade, juntou aos autos, entre outros documentos:

- Cédula de identidade de médico emitida pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul, com data de inscrição em 11/08/1987 (evento 1, PROCADM3, pp. 7);

- Certificado de conclusão de Residência Médica na área de Cirurgia Geral no período de 03/03/1988 a 03/03/1990, emitido por: Hospital Nossa Senhora da Conceição S.A., Hospital Criança Conceição, Hospital Cristo Redentor S.A. e Hospital Fêmina S.A; (evento 1, PROCADM3, pp. 20/21);

- Diploma de graduação como Médico emitido pela Universidade de Passo Fundo, com data de 13/12/1986 (evento 1, PROCADM3, pp. 21/22);

- Declarações de Imposto de Renda dos exercícios 2003 a 2014 em que consta a ocupação de médico (evento 1, PROCADM5);

- Certificado de conclusão de estágio no Hospital Pronto Socorro para médicos residentes em cirurgia geral, referente ao ano de 1989 (evento 1, PROCADM7, pp. 6);

- Comunicação de ingresso no corpo clínico do Hospital de Caridade de Erechim, com data de 12/04/1990 (evento 1, PROCADM7, pp. 7);

- Exames requisitados na condição de médico, referente aos anos de 1990 a 1995 (evento 1, PROCADM7, pp. 8/31);

- Declaração emitida pelo Hospital de Caridade de Erechim atestando que o autor exerceu a atividade de Chefe do Departamente de Cirurgia nos anos de 1993 e 1994, e foi Diretor Clínico da instituição no período de 1995 a 1998 (evento 1, PROCADM7, pp. 32);

- Declaração emitida pelo Hospital de Caridade de Erechim relatando as cirurgias realizadas pelo autor entre os anos de 1994 a 1998 (evento 1, PROCADM7, pp. 33/34);

- Relação das cirurgias realizadas no Hospital de Caridade de Erechim entre os anos de 2007 a 2019 (evento 23, ANEXO2);

- Declaração emitida pelo Hospital de Caridade de Erechim atestando que o autor exerce a função de médico cirurgião na instituição desde janeiro de 1992, até a presente data, 28/01/2019 (evento 19, ANEXO2, pp. 1);

- Alvará de localização e funcionamento da atividade de médico autônomo, emitido pela Prefeitura Municipal de Erechim, com data de início de atividades em 16/04/1990 (evento 19, ANEXO2, pp. 2);

- Certidão de Lotação junto à Prefeitura Municipal de Erechim, como médico autônomo, desde 16/04/1990 (evento 19, ANEXO2, pp. 3);

- Declaração emitida pela Unimed Erechim, com data de 04/02/2019, atestando que o autor exerce a função de Médico especialista em Cirurgia Geral, sendo cooperado desde 11/10/1989 até o momento atual (evento 19, ANEXO3, pp. 1);

- Registros extraídos dos livros de controle do Hospital de Caridade de Erechim, acerca dos procedimentos cirúrgicos realizados pelo autor entre o período de 1992 a 2007 (evento 29, COMP4).

Ainda, visando a comprovação da exposição a agentes nocivos, acostou aos autos PPP próprio (evento 1, PROCADM3, pp. 24/25) referente ao perído de 01/04/1988 até "a presente data", Laudo Individual elaborado por Engenheiro de Segurança do Trabalho (evento 1, PROCADM3, pp. 32/45 e evento 1, LAUDO12) e Programa de Prevenção de Riscos Ambientais - PPRA acerca das atividades realizadas junto ao Hospital Uniclínica da Unimed (evento 16, OFIC1)

Pois bem.

A comprovação da atividade de médico permite o enquadramento como tempo de atividade especial por categoria profissional até 28/04/1995, quando demonstrado o exercício da profissão de médico, com fundamento no código 2.1.3 do Quadro Anexo ao Decreto n° 53.831/1964 e nos códigos 1.3.4 do Anexo I e 2.1.3 do Anexo II do Decreto n° 83.080/1979.

No período posterior ao advento da Lei nº 9.032/95, exige-se a exposição habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, aos agentes nocivos. No caso do autor, é cabível a caracterização da atividade como especial em razão da exposição a agentes biológicos. É intuitivo que a atuação de um médico cirurgião pressupõe o contato habitual com sangue e secreções, de modo que o risco biológico estaria presente no dia-a-dia do consultório. De fato, a propósito desse tipo de agente, cabe observar que não se faz necessária exposição habitual e permanente, bastando a habitualidade e intermitência do contato. Isso porque, "segundo a jurisprudência dominante deste Tribunal, a exposição a agentes biológicos não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho, uma vez que basta o contato de forma eventual para que haja risco de contração de doenças (EIAC nº 1999.04.01.021460-0, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJ de 05-10-2005)" (TRF/4ª Região, apelação/reexame necessário n. 5008235-70.2012.404.7122-RS, 6ª Turma, Rel. Juiz Federal Paulo Paim da Silva, D.E. 12-6-2015).

Digno de nota, no ponto, que o laudo pericial afirma que o demandante esteve exposto de forma habitual e permanente a agentes biológicos nocivos.

Cumpre salientar que, segundo jurisprudência firmada no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o uso de equipamentos de proteção individual, em se tratando de contato com agentes biológicos, não é suficiente para afastar o risco de contração de doenças. Neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. USO DE EPI. AGENTES BIOLÓGICOS. REVISÃO DE RMI. OPÇÃO RMI MAIS VANTAJOSA. TUTELA ESPECÍFICA. 1.Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 2. Em se tratando de agentes biológicos, é desnecessário que o contato se dê de forma permanente, já que o risco de acidente independe do tempo de exposição e, ainda que ocorra a utilização de EPI, eles não são capazes de elidir, de forma absoluta, o risco proveniente do exercício da atividade com exposição a agentes de natureza infecto-contagiosa. 3. O segurado empresário ou autônomo, que recolheu contribuições como contribuinte individual, tem direito à conversão de tempo de serviço de atividade especial em comum, quando comprovadamente exposto aos agentes insalubres, de forma habitual e permanente, ou decorrente de categoria considerada especial, de acordo com a legislação. 4. A parte autora tem direito à majoração da renda mensal inicial de sua aposentadoria, a contar da DER, observada a prescrição quinquenal. 5. Se a parte autora implementar os requisitos para a obtenção de aposentadoria pelas regras anteriores à Emenda Constitucional n.º 20/98, pelas Regras de Transição e/ou pelas Regras Permanentes, poderá ter o benefício revisado pela opção que lhe for mais vantajosa. 6. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (Apelação Cível nº 5001917-19.2012.404.7107, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E 08-05-2015)

Reforço que a habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. No caso dos autos, a exposição aos agentes biológicos era ínsita à atividade desenvolvida porque exercia concomitantemente o exercício da medicina na área de cirurgia geral em consultório e no âmbito hospitalar, consoante se constata pela análise do tempo de contribuição junto ao CNIS, de modo que resta comprovada a exposição de forma habitual e permanente aos agentes nocivos na integralidade dos períodos.

Portanto, considerando que a parte autora comprovou mediante prova material o exercício da atividade de médico autônomo, que teve contato habitual e permanente com agentes biológicos nocivos contidos em fluidos corporais, como sangue e secreções, de pacientes saudáveis ou não, manuseando instrumentos perfurocortantes em relação aos quais a utilização de EPI's, como máscaras e luvas, não tem o condão de eliminar o risco, pois acidentes podem ocorrer com o manuseio desses instrumentos, ainda que todas as normas de segurança sejam observadas, deve ser reconhecido o caráter especial da atividade.

Assim, defiro o reconhecimento da especialidade durante os períodos de 01/04/1988 a 30/06/1988, 01/08/1988 a 31/08/1988, 01/04/1990 a 27/10/1992, 02/08/1996 a 31/12/1996, 01/01/1997 a 30/09/1998, 01/11/1998 a 31/12/2001 e 01/02/2002 a 30/07/2018, devendo o INSS averbá-los no processo administrativo de concessão de benefício do requerente mediante conversão pelo fator 1,4.

Em suas razões de apelo, a parte ré alega não ser possível o reconhecimento da atividade especial do contribuinte individual após 28/04/1995.

A Autarquia sustenta, em suas razões recursais, que o tempo de serviço prestado na condição de contribuinte individual não pode ser reconhecido como especial, tendo em vista que este não contribui para o financiamento do benefício de aposentadoria especial.

A Lei de Benefícios da Previdência Social, ao instituir, nos artigos 57 e 58, a aposentadoria especial e a conversão de tempo especial em comum, não excepcionou o contribuinte individual, mas apenas exigiu que o segurado, sem qualquer limitação quanto à sua categoria (empregado, trabalhador avulso ou contribuinte individual), trabalhasse sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física.

Veja-se, a propósito, a redação do caput e §§ 3º e 4º do referido artigo:

Artigo 57 - A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhando sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15, 20 ou 25 anos, conforme dispuser a lei.

(...)

§ 3º - A concessão de aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado.

§ 4º - O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão de qualquer benefício.

(...)

Por outro lado, o artigo 64 do Decreto 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto 4.729, de 09/6/2003, assim estabelece: A aposentadoria especial, uma vez cumprida a carência exigida, será devida ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual, este somente quando cooperado filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, que tenha trabalhado durante quinze, vinte ou vinte e cinco anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

O Regulamento da Previdência Social, entretanto, ao não possibilitar o reconhecimento, como especial, do tempo de serviço prestado pelo segurado contribuinte individual que não seja cooperado, filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, estabeleceu diferença não consignada em lei para o exercício de direito de segurados que se encontram em situações idênticas, razão pela qual, quanto a esse ponto, extrapola indevidamente os limites estabelecidos pela lei.

Por outro lado, não se ignora que o artigo 195, §5º, da Constituição Federal prescreve que nenhum benefício da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.

Ocorre que, para a concessão de aposentadoria especial ou conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum, previstas nos artigos 57 e 58 da Lei de benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio: o parágrafo 6º do mesmo artigo 57 supracitado, combinado com o artigo 22, inciso II, da Lei 8.212/1991, os quais possuem o seguinte teor:

Art. 57 (...)

§ 6º - O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inc. II do art. 22 da Lei 8.212, de 24/07/91, cujas alíquotas serão acrescidas de 12, 9 ou 6 pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após 15, 20 ou 25 anos de contribuição, respectivamente.

Art. 22 (...)

II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei 8.213/91, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:

a) 1% para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;

b) 2% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;

c) 3% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.

Isso posto, não há óbice a que a lei indique, como fonte do financiamento da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum, as contribuições a cargo da empresa, pois o artigo 195, caput e incisos, da Constituição Federal, dispõe que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.

Por fim, cumpre ressaltar que sequer seria caso de específica indicação legislativa da fonte de custeio, uma vez que se trata de benefício previdenciário previsto pela própria Constituição Federal (artigo 201, § 1º c/c artigo 15 da EC 20/1998), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio (STF, RE 220.742-6, Segunda Turma, Relator Ministro Néri da Silveira, julgado em 3/3/1998; RE 170.574, Primeira Turma, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 31/5/1994; AI 614.268, Primeira Turma, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20/11/2007; ADI 352-6, Plenário, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, julgada em 30/10/1997; RE 215.401-6, Segunda Turma, Relator Ministro Néri da Silveira, julgado em 26/8/1997; AI 553.993, Relator Ministro Joaquim Barbosa, decisão monocrática, DJ de 28/9/2005), regra esta dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.

Diante dessas considerações, o tempo de serviço sujeito a condições nocivas à saúde, prestado pela parte autora na condição de contribuinte individual, pode ser reconhecido como especial.

Destarte, o voto é no sentido de negar provimento à apelação do INSS, mantendo-se a sentença.

Soma dos salários-de-contribuição de atividades concomitantes - Tema 1.070/STJ

Em sua redação original, o art. 32 da Lei nº 8.213/91 previa que os salários de contribuição seriam somados quando o segurado adquirisse o direito ao benefício em relação a cada atividade concomitante distinta, in verbis:

Art. 32. O salário-de-benefício do segurado que contribuir em razão de atividades concomitantes será calculado com base na soma dos salários-de-contribuição das atividades exercidas na data do requerimento ou do óbito, ou no período básico de cálculo, observado o disposto no art. 29 e as normas seguintes:

I - quando o segurado satisfizer, em relação a cada atividade, as condições do benefício requerido, o salário-de-beneficio será calculado com base na soma dos respectivos salários-de-contribuição;

II - quando não se verificar a hipótese do inciso anterior, o salário-de-benefício corresponde à soma das seguintes parcelas:

a) o salário-de-benefício calculado com base nos salários-de-contribuição das atividades em relação às quais são atendidas as condições do benefício requerido;

b) um percentual da média do salário-de-contribuição de cada uma das demais atividades, equivalente à relação entre o número de meses completo de contribuição e os do período de carência do benefício requerido;

III - quando se tratar de benefício por tempo de serviço, o percentual da alínea"b" do inciso II será o resultante da relação entre os anos completos de atividade e o número de anos de serviço considerado para a concessão do benefício.

§ 1º O disposto neste artigo não se aplica ao segurado que, em obediência ao limite máximo do salário-de-contribuição, contribuiu apenas por uma das atividades concomitantes.

§ 2º Não se aplica o disposto neste artigo ao segurado que tenha sofrido redução do salário-de-contribuição das atividades concomitantes em respeito ao limite máximo desse salário.

Nos casos, porém, em que o segurado não adquirisse o direito à obtenção do benefício de cada atividade separadamente, os salários-de-contribuição não eram somados, hipótese em que era considerado o salário da atividade principal com o acréscimo de um percentual da média dos salários-de-contribuição das demais atividades.

Todavia, com a edição da Medida Provisória nº 83/2002, convertida na Lei nº 10.666/03, entende-se que ocorreu a derrogação do art. 32 da Lei nº 8.213/91. Isso porque o período básico de cálculo já havia sido modificado pela Lei nº 9.876/99, tornando inócua a disciplina da redação original do art. 32 da Lei nº 8.213/91, uma vez que criou uma escala de salário-base a ser extinta de forma progressiva.

Dessa forma, para os benefícios concedidos a partir de 01/04/2003 não se aplicava mais o disposto no art. 32 da Lei nº 8.213/1991, sendo cabível a utilização de todos os valores vertidos em cada competência, limitados ao teto do salário de contribuição (art. 28, §5º, da Lei nº 8.212/91).

Nesse sentido, o precedente deste TRF4 (grifei):

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA DE PROFESSOR. FATOR PREVIDENCIÁRIO. NÃO INCIDÊNCIA. REVISÃO. ATIVIDADES CONCOMITANTES. ART. 32 DA LEI 8213/91. INAPLICABILIDADE. 1. A Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região afirmou a inconstitucionalidade do inciso I do artigo 29 da Lei 8.213/91, sem redução do texto, e dos incisos II e III do § 9º do mesmo dispositivo, com redução de texto, em relação aos professores que atuam na educação infantil e no ensino fundamental e médio. 2. Assim, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição de professor concedido à parte autora deve ser revisado, para que o fator previdenciário seja afastado do cálculo da renda mensal inicial. 3. Na linha do que estatui a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (antiga LICC), ocorreu, a partir de 1º de abril de 2003, a derrogação do artigo 32 das Lei 8.213/91, de modo que a todo segurado que tenha mais de um vínculo deve ser admitida, independentemente da época da competência, a soma dos salários-de-contribuição, respeitado o teto. 4. Concedido o benefício segundo as novas regras da Lei nº 10.666/2003 não mais cabe aplicar restrição de legislação anterior (art. 32 da Lei 8.213/91), mesmo para períodos anteriores, quanto à forma de cálculo da renda mensal inicial dos benefícios. (TRF4 5001027-40.2013.404.7012, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 22/08/2016)

O entendimento acima exposto foi consagrado expressamente na Lei nº 13.846/19, a qual passou a prever a possibilidade de soma dos salários-de-contribuição das atividades concomitantes, extinguindo as figuras de atividade principal e secundária. Nesse sentido, destaca-se a nova redação do art. 32 da Lei nº 8.213/91, dada pela Lei nº 13.846/19:

Art. 32. O salário de benefício do segurado que contribuir em razão de atividades concomitantes será calculado com base na soma dos salários de contribuição das atividades exercidas na data do requerimento ou do óbito, ou no período básico de cálculo, observado o disposto no art. 29 desta Lei.

§ 1º O disposto neste artigo não se aplica ao segurado que, em obediência ao limite máximo do salário de contribuição, contribuiu apenas por uma das atividades concomitantes.

§ 2º Não se aplica o disposto neste artigo ao segurado que tenha sofrido redução do salário de contribuição das atividades concomitantes em respeito ao limite máximo desse salário.

Recentemente, tal entendimento foi ratificado pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recurso especial repetitivo - Tema 1.070/STJ, no qual fixou-se a seguinte tese:

"Após o advento da Lei 9.876/99, e para fins de cálculo do benefício de aposentadoria, no caso do exercício de atividades concomitantes pelo segurado, o salário-de-contribuição deverá ser composto da soma de todas as contribuições previdenciárias por ele vertidas ao sistema, respeitado o teto previdenciário".

A ementa tem o seguinte teor, in verbis (grifei):

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. TEMA 1.070. APOSENTADORIA NO RGPS. EXERCÍCIO DE ATIVIDADES CONCOMITANTES. CÁLCULO DO SALÁRIO-DE-BENEFÍCIO. SOMA DE TODOS OS SALÁRIOS-DE-CONTRIBUIÇÃO VERTIDOS PELO SEGURADO EM SUAS SIMULTÂNEAS ATIVIDADES. POSSIBILIDADE. EXEGESE DA LEI N. 9.876/99. INAPLICABILIDADE DOS INCISOS DO ART. 32 DA LEI 8.213/91 EM SUA REDAÇÃO ORIGINAL. 1. Segundo a redação original dos incisos I, II e III do art. 32 da Lei 8.213/91, que tratavam do cálculo dos benefícios previdenciários devidos no caso de atividades concomitantes, a soma integral dos salários-de-contribuição, para fins de apuração do salário-de-benefício, somente seria possível nas hipóteses em que o segurado reunisse todas as condições para a individual concessão do benefício em cada uma das atividades por ele exercida. 2. O espírito do referido art. 32 da Lei 8.213/91, mormente no que tocava ao disposto em seus incisos II e III, era o de impedir que, às vésperas de implementar os requisitos necessários à obtenção do benefício, viesse o segurado a exercer uma segunda e simultânea atividade laborativa para fins de obter uma renda mensal inicial mais vantajosa, já que seriam considerados os últimos salários-de-contribuição no cômputo de seu salário-de-benefício. 3. No entanto, a subsequente Lei 9.876/99 alterou a metodologia do cálculo dos benefícios e passou a considerar todo o histórico contributivo do segurado, com a ampliação do período básico de cálculo; a renda mensal inicial, com isso, veio a refletir, de forma mais fiel, a contrapartida financeira por ele suportada ao longo de sua vida produtiva, além de melhor atender ao caráter retributivo do Regime Geral da Previdência Social. 4. A substancial ampliação do período básico de cálculo – PBC, como promovida pela Lei 9.876/99, possibilitou a compreensão de que, respeitado o teto previdenciário, as contribuições vertidas no exercício de atividades concomitantes podem, sim, ser somadas para se estabelecer o efetivo e correto salário-de-benefício, não mais existindo espaço para aplicação dos incisos do art. 32 da Lei 8.213/91, garantindo-se, com isso, o pagamento de benefício que melhor retrate o histórico contributivo do segurado. 5. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-I do RISTJ, com a fixação da seguinte TESE: "Após o advento da Lei 9.876/99, e para fins de cálculo do benefício de aposentadoria, no caso do exercício de atividades concomitantes pelo segurado, o salário-de-contribuição deverá ser composto da soma de todas as contribuições previdenciárias por ele vertidas ao sistema, respeitado o teto previdenciário".6. SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO: hipótese em que a pretensão do INSS vai na contramão do enunciado acima, por isso que seu recurso especial resulta desprovido. (STJ, REsps repetitivos 1870793/RS, 1870815/PR e 1870891/PR, 1ª Seção, Relator Ministro SÉRGIO KUKINA, unânime, acórdão publicado em 24/05/2022).

No caso, como se cuida de benefício requerido em 03/08/2018 (DER) - após, portanto, 04/2003 -, e considerado o exercício de atividades concomitantes pelo segurado, deve ser considerada - para fins de cálculo do benefício de aposentadoria - a soma de todas as contribuições previdenciárias vertidas ao sistema, respeitado o teto previdenciário, na forma do julgamento do Tema 1070/STJ.

Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS no ponto.

Correção monetária e juros de mora

Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu o dos respectivos embargos de declaração (que foram rejeitados, tendo sido afirmada a inexistência de modulação de efeitos), deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece, para as condenações judiciais de natureza previdenciária, o seguinte:

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.

Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)

Os juros de mora devem incidir a contar da citação (Súmula 204 do STJ), exceto no caso de concessão de benefício mediante reafirmação da DER para data após o ajuizamento da ação, hipótese em que, conforme decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 1.727.063/SP, publicação de 21/5/2020), a incidência de juros de mora dar-se-á sobre o montante das parcelas vencidas e não pagas a partir do prazo de 45 dias para a implantação do benefício (TRF4, AC 5048576-34.2017.4.04.7100, Quinta Turma, Relator Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 10/8/2021; TRF4, AC 5004167-24.2014.4.04.7117, Sexta Turma, Relatora Juíza Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 6/8/2021).

Até 29 de junho de 2009, a taxa de juros é de 1% (um por cento) ao mês. A partir de 30 de junho de 2009, eles serão computados uma única vez, sem capitalização, segundo percentual aplicável à caderneta de poupança (inclusive com a modificação da Lei 12.703/12, a partir de sua vigência), conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, considerado constitucional pelo STF (RE 870947, com repercussão geral).

A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao art. 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Anoto, por fim, que é pacífico no Superior Tribunal de Justiça que a correção monetária e os juros legais, como consectários da condenação, são matéria de ordem pública, não se lhes aplicando os óbices do julgamento "extra petita" ou da "reformatio in pejus". A propósito: AgRg no REsp 1.291.244/RJ, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 5/3/2013; AgRg no REsp 1.440.244/RS, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 10/10/2014; REsp 1781992/MG, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 26/3/2019, DJe 23/4/2019; AgInt no REsp 1663981/RJ, Relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 14/10/2019, DJe 17/10/2019.

Desse modo, a incidência de correção monetária e os juros legais deve ser adequada de ofício aos fatores acima indicados, porquanto se trata de matéria de ordem pública, podendo, assim, ser tratada pelo Tribunal sem necessidade de prévia provocação das partes.

Honorários advocatícios

Mantida a procedência do pedido, uma vez que a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC), aplica-se a majoração prevista no artigo 85, § 11, desse diploma, observando-se os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. Assim, majoro a verba honorária em 10% sobre o percentual mínimo da primeira faixa (art. 85, § 3º, inciso I, do CPC).

Caso o valor da condenação/atualizado da causa apurado em liquidação do julgado venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no §3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual mínimo da faixa subsequente, assim sucessivamente, na forma do §§4º, inciso III e 5º do referido dispositivo legal.

Implantação imediata do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no artigo 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 9/8/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora (NB 187.785.700-6), a contar da competência da publicação do acórdão, a ser efetivada em quarenta e cinco dias.

Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele previamente implementado.

Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, impende esclarecer que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.

Prequestionamento

Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.

Conclusão

Mantida a sentença de procedência.

De ofício, adequados os consectários legais.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS; de ofício, adequar os consectários legais; e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003574932v1 e do código CRC 1db6bafb.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 25/10/2022, às 16:30:33

5005448-73.2018.4.04.7117
40003574932.V1


Conferência de autenticidade emitida em 01/11/2022 04:01:01.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5005448-73.2018.4.04.7117/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: FLAVIO AUGUSTO GIRARDELLO (AUTOR)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. tempo de serviço especial. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. ATIVIDADES CONCOMITANTES. SOMA DAS CONTRIBUIÇÕES.

1. A Lei de Benefícios da Previdência Social não excepcionou o contribuinte individual como eventual não beneficiário da aposentadoria especial ou conversão do tempo especial em comum.

2. No caso de exercício de atividades concomitantes pelo segurado, o salário-de-contribuição consistirá na soma de todas as contribuições previdenciárias por ele vertidas ao sistema, respeitado o teto previdenciário (Tema 1070, do STJ).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS; de ofício, adequar os consectários legais; e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 24 de outubro de 2022.



Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003574933v2 e do código CRC e8d2a71e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 25/10/2022, às 16:30:33

5005448-73.2018.4.04.7117
40003574933 .V2


Conferência de autenticidade emitida em 01/11/2022 04:01:01.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 24/10/2022

Apelação Cível Nº 5005448-73.2018.4.04.7117/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PROCURADOR(A): VITOR HUGO GOMES DA CUNHA

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: LUIZ GUSTAVO FERREIRA RAMOS por FLAVIO AUGUSTO GIRARDELLO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: FLAVIO AUGUSTO GIRARDELLO (AUTOR)

ADVOGADO: LUIZ GUSTAVO FERREIRA RAMOS (OAB RS049153)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 24/10/2022, na sequência 11, disponibilizada no DE de 13/10/2022.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS; DE OFÍCIO, ADEQUAR OS CONSECTÁRIOS LEGAIS; E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB. ADVOGADO DISPENSOU A SUSTENTAÇÃO ORAL TENDO EM VISTA O RESULTADO FAVORÁVEL.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante: Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 01/11/2022 04:01:01.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora