Apelação Cível Nº 5003363-33.2016.4.04.7005/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: JOSE BATISTA PEREIRA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, na qual a parte autora objetiva a concessão de 'aposentadoria especial nº 175.040.076-3, requerida administrativamente em 12.08.2015, e indeferida sob a alegação de ter sido atingido o tempo mínimo de contribuição especial. Subsidiariamente, pede a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a referida DER, mediante a conversão do tempo de contribuição especial em comum. Para tanto, postula o reconhecimento da especialidade do labor desenvolvido nos períodos de 02.06.1980 a 28.06.1983, 01.07.1985 a 21.04.1987, 09.06.1987 a 09.08.1987, 23.09.1987 a 30.01.1988, 12.02.1988 a 14.07.1988, 05.10.1988 a 29.09.1989, 04.01.1990 a 07.07.1992, 03.11.1992 a 30.09.1994, 01.10.1995 a 18.09.1996, 01.10.1996 a 31.07.1999, 27.09.1999 a 11.02.2000, 24.10.2000 a 30.09.2001, 02.05.2002 a 11.04.2003 e de 04.04.2006 a 12.08.2015.'
Sentenciando em 21/06/2017, o juízo a quo julgou o pedido nos seguintes termos:
(a) reconheço a ausência de interesse processual em relação ao pedido de averbação do tempo de serviço especial relativo aos períodos de 02.06.1980 a 28.06.1983, de 09.06.1987 a 09.08.1987 e de 12.02.1988 a 14.07.1988, de 05.10.1988 a 29.09.1989, de 04.01.1990 a 07.07.1992, 03.11.1992 a 30.09.1994, nos termos do tópico 2.1., extinguindo o feito sem exame do mérito (art. 485, VI, do NCPC);
(b) julgo pacialmente procedentes os demais pedidos deduzidos na inicial, resolvendo o mérito (art. 487, I, do NCPC), para o fim de condenar o INSS a averbar em favor do autor a especialidade do trabalho prestado no período de 01.07.1985 a 21.04.1987 e de 01.10.1995 a 18.09.1996.
Dada a sucumbência mínima do INSS, condeno o autor ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios ao INSS (paragrafo único do art. 86 do NCPC) fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa devidamente atualizado, à luz do art. 85, § 2º, do CPC.
Entretanto, tendo em vista o deferimento da gratuidade da justiça (evento 4), as verbas sucumbenciais devidas pela parte autora permanecerão com a sua exigibilidade suspensa, na forma do art. 98, §3º, do NCPC.
Irresignado, apela a parte autora postulando a reforma da sentença para o fim de 'condenar o INSS –Instituto Nacional do Seguro Social a reconhecer o direito a conversão dos períodos laborados em atividade insalubre de 23.09.1987 a 30.01.1988, 01.10.1996 a 31.07.1999, 27.09.1999 a 11.02.2000, 24.10.2000 a 30.09.2001, 02.05.2002 a 11.04.2003,04.04.2006 a 12.08.2015, concedendo o benefício de aposentadoria especial ao Apelante.'
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
A controvérsia no plano recursal restringe-se:
- ao reconhecimento do exercício de atividade especial no(s) período(s) de 23.09.1987 a 30.01.1988, 01.10.1996 a 31.07.1999, 27.09.1999 a 11.02.2000, 24.10.2000 a 30.09.2001, 02.05.2002 a 11.04.2003, 04.04.2006 a 12.08.2015;
- à consequente concessão de aposentadoria especial.
TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
Inicialmente, ressalte-se que deve ser observada, para fins de reconhecimento da especialidade, a lei em vigor à época em que exercida a atividade, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
Assim, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o considere como especial, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova mais restritiva. Esse, inclusive, é o entendimento da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AGREsp n. 493.458/RS, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 23/06/2003; e REsp n. 491.338/RS, 6ª Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 23/06/2003), a qual passou a ter previsão legislativa expressa com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99.
Feita essa consideração e tendo em vista a sucessão de leis que disciplinam a matéria, necessário, preliminarmente, verificar qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, que se encontrava vigente nada data em que exercida a atividade que se pretende ver reconhecida a especialidade.
Verifica-se, assim, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) até 28/04/1995, quando vigente a Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e, posteriormente, a Lei n° 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial; ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor, que exigem a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a existência ou não de nocividade (STJ, AgRg no REsp n. 941885/SP, 5ª Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04/08/2008; e STJ, REsp n. 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07/11/2005);
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n° 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n° 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, como já salientado;
c) a partir de 06/03/1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória nº 1.523/96 (convertida na Lei nº 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos, por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Saliente-se, ainda, que é admitida a conversão de tempo especial em comum após maio de 1998, consoante entendimento firmado pelo STJ, em decisão no âmbito de recurso repetitivo, (REsp n.º 1.151.363/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011).
Por fim, observo que, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas.
Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n. 83.080/79 (Anexo I) até 05/03/1997, e os Decretos n. 2.172/97 (Anexo IV) e n. 3.048/99 a partir de 06/03/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto nº 4.882/03.
Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível, também, a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula nº. 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n° 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU de 30/06/2003).
FATOR DE CONVERSÃO
Registre-se que o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é aquele previsto na legislação aplicada na data concessão do benefício e no cálculo de sua renda mensal inicial, e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. A propósito, a questão já foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp 1151363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, 3ª Seção, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011).
AGENTE NOCIVO RUÍDO
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, a comprovação da especialidade da atividade laboral pressupõe a existência de parecer técnico atestando a exposição do segurado a níveis de pressão sonora acima dos limites de tolerância.
Referidos limites foram estabelecidos, sucessivamente, no Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, e o Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, alterado pelo Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, os quais consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1.
Quanto ao período anterior a 05/03/1997, já foi pacificado pela Seção Previdenciária desta Corte (EIAC 2000.04.01.134834-3/RS, Rel. Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU, Seção 2, de 19/02/2003, p. 485) e também no âmbito do INSS na esfera administrativa (IN nº 57/2001 e posteriores), que são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 até 05/03/1997, data imediatamente anterior à publicação do Decreto nº 2.172/97. Desse modo, até então, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto nº 53.831/64.
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, em 06/03/1997, o nível de tolerância ao ruído, considerado salubre, passou para até 90 decibéis. Posteriormente, o Decreto nº 4.882/03, de 19/11/2003 estabeleceu o referido limite em 85 decibéis.
Em face da controvérsia existente acerca da possibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, já que mais benéfico ao segurado, em 14/05/2014, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp nº 1.398.260-PR, em sede de Recurso Especial Repetitivo, firmou entendimento sobre a matéria, nos seguintes termos:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA DO DECRETO 4.882/2003 PARA RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6/3/1997 a 18/11/2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB. De início, a legislação que rege o tempo de serviço para fins previdenciários é aquela vigente à época da prestação, matéria essa já abordada de forma genérica em dois recursos representativos de controvérsias, submetidos ao rito do art. 543-C do CPC (REsp 1.310.034-PR, Primeira Seção, DJe 19/12/2012 e REsp 1.151.363-MG, Terceira Seção, DJe 5/4/2011). Ademais, o STJ, no âmbito de incidente de uniformização de jurisprudência, também firmou compreensão pela impossibilidade de retroagirem os efeitos do Decreto 4.882/2003. (Pet 9.059-RS, Primeira Seção, DJe 9/9/2013). Precedentes citados: AgRg no REsp 1.309.696-RS, Primeira Turma, DJe 28/6/2013; e AgRg no REsp 1.352.046-RS, Segunda Turma, DJe 8/2/2013. REsp 1.398.260-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 14/5/2014.
Portanto, deve-se adotar os seguintes níveis de ruído para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial: superior a 80 dB(A) até 05/03/1997, superior a 90 dB(A) entre 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 dB(A) a partir de 19/11/2003.
AGENTES QUÍMICOS
Sinale-se que a exigência relativa à necessidade de explicitação da composição e concentração dos agentes químicos a que o segurado estava exposto, não encontra respaldo na legislação previdenciária, a qual reconhece a especialidade do labor quando existe contato com agentes químicos nocivos à saúde, elencados na legislação de regência. Nesse sentido: Embargos Infringentes nº 5004090-13.2012.404.7108, 3ª Seção, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, por unanimidade, juntado aos autos em 06/12/2013.
EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP 1.729/12/1998, convertida na Lei 9.732, de 11/12/1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Esse entendimento, inclusive, foi adotado pelo INSS na Instrução Normativa 45/2010.
A partir de dezembro de 1998, quanto à possibilidade de desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência de EPIs, o STF ao julgar o ARE 664.335, submetido ao regime de repercussão geral (tema 555), Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014 e publicado em 12/02/2015, fixou duas teses:
1) "o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial"; e
2) "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".
Ressalte-se, por fim, que para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado é necessária uma efetiva demonstração da elisão das consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro durante toda a jornada de trabalho.
INTERMITÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS
A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física, referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, mas sim que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades do trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de caráter eventual. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho. Nesse sentido vem decidindo esta Corte (EINF n.º 2007.71.00.046688-7, 3ª Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011; EINF nº 0004963-29.2010.4.04.9999, 3ª Seção, Relatora Vivian Josete Pantaleão Caminha, D.E. 12/03/2013; EINF n° 0031711-50.2005.4.04.7000, 3ª Seção, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, 3ª Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, 3ª Seção, Relator Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Adotando-se tal entendimento, é possível concluir-se que, em se tratando de agentes biológicos, é desnecessário que o contato se dê de forma permanente, já que o risco de contágio independe do tempo de exposição (vide TRF4, 3ª Seção, EIAC nº 2000.04.01.034170-5/SC, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU 20/10/2004).
EXAME DO TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO
Passo, então, ao exame do (s) período(s) controvertido(s) nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.
1. Relativamente ao período de 23.09.1987 a 30.01.1988, no qual o recorrente laborou na AGROPECUÁRIA VANGUARDA LTDA e postula a reforma da sentença para obter o reconhecimento da especialidade pelo exercício da atividade de tratorista, mantenho o comando sentencial quanto ao indeferimento de utilização de prova emprestada. Articulou adequadamente o juízo monocrático na negativa de reconhecimento, pois, de fato, não estão presentes nos autos elementos probatórios que demonstrem a alegada atividade de tratorista.
Doutro lado, verifico que o autor trouxe aos autos CTPS do respectivo período (evento 1, CTPS6, fls. 2), qualificando o segurado como trabalhador rural em empresa de agropecuária, pelo que cabível o reconhecimento da especialidade pelo enquadramento da atividade profissional: trabalhadores na agropecuária - código 2.2.1 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64.
Nesse curso, dou provimento ao recurso da parte autora para reconhecer como especial o período laborado de 23.09.1987 a 30.01.1988, contudo, sob outro fundamento.
2. Quanto aos demais entretempos objeto do presente recurso (01.10.1996 a 31.07.1999, 27.09.1999 a 11.02.2000, 24.10.2000 a 30.09.2001, 02.05.2002 a 11.04.2003, 04.04.2006 a 12.08.2015) nego provimento ao apelo da parte autora, Para tanto, colaciono fração do comando sentencial que bem analisou a questão, cujos fundamentos adoto como razões de decidir pois alinhados com o atual entendimento desta Corte, in verbis:
Período: | 01.10.1996 a 31.07.1999 |
Empresa: | DIPEL DISTRIBUIDORA DE PRODUTOS ELÉTRICOS LTDA |
Função/Atividades | Motorista de caminhão guincho |
Agentes nocivos: | Eletricidade (acima de 250 volts); Ruído |
Enquadramento legal: | eletricidade: código 1.1.8 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; Súmula n.º 198 do extinto TFR, Lei n.º 7.369/85, regulamentada pelo Decreto n.º 93.412/96, Lei nº 12.740/12; |
Provas: | CTPS (evento 1, CTPS7, fls. 3), PPP (eventos 1, PPP8 e 23, PPP19) |
Equipamento de Proteção Individual (EPI): | Tratando-se de período anterior a junho de 1998, a discussão sobre os efeitos do EPI perde relevância, conforme acima já explicitado. Ademais, inexistindo exposição a agente nociva, desnecessária a análise quanto à utilização de EPI. |
Conclusão: | NÃO RECONHECIDA A ESPECIALIDADE A exposição ao ruído no período se manteve dentro do limite de tolerância (78 decibéis), conforme PPP apresentado (evento 23, PPP19). Ainda, quanto à eletricidade, o PPP apresentado não permite concluir que as funções exercidas pelo autor estavam expostas à tensão elétrica superior a 250 volts, uma vez que o PPP somente descreve as funções como "carregar e descarregar postes, transformadores, isoladores, para-raios, porta fusíveis com caminhão toco e cortar com maçarico eventualmente". Não se descreve o exercício de atividade em contato com rede elétrica de alta tensão ativa. Finalmente, quanto ao período posterior a 05-03-1997 não há laudo técnico que ampare a pretensão autoral relativamente à atividade de motorista de guincho, tendo em vista que o próprio PPRA/LTCAT apresentado (evento 23, PPP19, fls. 9) nada menciona relativamente ao agente eletricidade para a atividade de motorista de guincho. |
Período: | 27.09.1999 a 11.02.2000 |
Empresa: | RJD Engenharia Ltda |
Função/Atividades | Motorista |
Agentes nocivos: | Eletricidade (acima de 250 volts); Ruído de 85 dB(A) |
Enquadramento legal: | eletricidade: código 1.1.8 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; Súmula n.º 198 do extinto TFR, Lei n.º 7.369/85, regulamentada pelo Decreto n.º 93.412/96, Lei nº 12.740/12; |
Provas: | CTPS (evento 1, CTPS7, fls. 3) |
Equipamento de Proteção Individual (EPI): | Inexistindo exposição a agente nociva, desnecessária a análise quanto à utilização de EPI. |
Conclusão: | NÃO RECONHECIDA A ESPECIALIDADE Não há prova adequada e necessária (laudo técnico) para a comprovação da atividade especial no período. Sequer existe a possibilidade de utilização de PPP ou laudo de empresa similar, porquanto os existentes (da empresa DIPEL) não atestaram a especialidade do labor para a função de motorista. |
Período: | 24.10.2000 a 30.09.2001 |
Empresa: | MOELCO MONTAGES ELÉTRICAS LTDA |
Função/Atividades | Motorista |
Agentes nocivos: | Eletricidade (acima de 250 volts); |
Enquadramento legal: | eletricidade: código 1.1.8 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; Súmula n.º 198 do extinto TFR, Lei n.º 7.369/85, regulamentada pelo Decreto n.º 93.412/96, Lei nº 12.740/12; |
Provas: | CTPS (evento 1, CTPS7, fls. 3) |
Equipamento de Proteção Individual (EPI): | Inexistindo exposição a agente nociva, desnecessária a análise quanto à utilização de EPI. |
Conclusão: | NÃO RECONHECIDA A ESPECIALIDADE Não há prova adequada e necessária (laudo técnico) para a comprovação da atividade especial no período. Sequer existe a possibilidade de utilização de PPP ou laudo de empresa similar, porquanto os existentes (da empresa DIPEL) não atestaram a especialidade do labor para a função de motorista. |
Período: | 02.05.2002 a 11.04.2003 |
Empresa: | RODOVIA PRESTADORA DE SERVIÇOS LTDA |
Função/Atividades | Motorista |
Agentes nocivos: | Ruído e Agentes Químicos |
Enquadramento legal: | ruído superior a 80 decibéis até 05/03/1997: item 1.1.6 do Anexo do Decreto n.º 53.831/64 e item 1.1.5 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79; ruído superior a 90 decibéis de 06/03/1997 a 18/11/2003: item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 e item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99; ruído superior a 85 decibéis a partir de 19/11/2003: item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 |
Provas: | CTPS (evento 1, CTPS7, fls. 4) |
Equipamento de Proteção Individual (EPI): | Inexistindo exposição a agente nociva, desnecessária a análise quanto à utilização de EPI. |
Conclusão: | NÃO RECONHECIDA A ESPECIALIDADE O PPP fornecido pela empresa IPIRANGA ENGENHARIA LTDA (evento 29, PPP4, fls. 1/2) não pode ser utilizado por similutde, porquanto não há informações sobre laudo e responsável pelo monitamento ambiental quanto ao agente ruído. |
Período: | 04.04.2006 a 12.08.2015 |
Empresa: | DIPEL - DISTRIBUIDORA DE PRODUTOS ELÉTRICOS LTDA |
Função/Atividades | Motorista |
Agentes nocivos: | Ruído e Agentes Químicos |
Enquadramento legal: | eletricidade: código 1.1.8 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64; Súmula n.º 198 do extinto TFR, Lei n.º 7.369/85, regulamentada pelo Decreto n.º 93.412/96, Lei nº 12.740/12; ruído superior a 80 decibéis até 05/03/1997: item 1.1.6 do Anexo do Decreto n.º 53.831/64 e item 1.1.5 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79; ruído superior a 90 decibéis de 06/03/1997 a 18/11/2003: item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 e item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99; ruído superior a 85 decibéis a partir de 19/11/2003: item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 |
Provas: | CTPS (evento 1, CTPS7, fls. 4) e PPP (eventos 1, PPP8 e 23, PPP19) |
Equipamento de Proteção Individual (EPI): | Inexistindo exposição a agente nociva, desnecessária a análise quanto à utilização de EPI. |
Conclusão: | NÃO RECONHECIDA A ESPECIALIDADE A exposição ao ruído no período se manteve dentro do limite de tolerância, conforme PPP apresentado (evento 23, PPP19). Ainda, quanto à eletricidade, o PPP apresentado não permite concluir que as funções exercidas pelo autor estavam expostas à tensão elétrica superior a 250 volts, uma vez que o PPP somente descreve as funções como "carregar e descarregar postes, transformadores, isoladores, para-raios, porta fusíveis com caminhão toco e cortar com maçarico eventualmente". Não se descreve o exercício de atividade em contato com rede elétrica de alta tensão ativa. Finalmente, quanto ao período posterior a 05-03-1997 não há laudo técnico que ampare a pretensão autoral relativamente à atividade de motorista de guincho, tendo em vista que o próprio PPRA/LTCAT apresentado (evento 23, PPP19, fls. 9) nada menciona relativamente ao agente eletricidade para a atividade de motorista de guincho. |
Conclusão: Dou parcial provimento ao recurso da parte autora para, por fundamentos diversos, reconhecer a especialidade do período de 23.09.1987 a 30.01.1988.
DIREITO À APOSENTADORIA NO CASO CONCRETO
Conforme apurado em sentença, o autor não possuía na DER os requisitos para a concessão de aposentadoria especial. O parcial provimento dado ao recurso do parte autora não tem o condão de alterar a negativa de concessão ao benefício.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Parcialmente provida a apelação da parte autora para reconhecer como especial o período laborado de 23.09.1987 a 30.01.1988, contudo, sob outro fundamento.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001360493v9 e do código CRC d02b0c2d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 15/10/2019, às 22:50:46
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 03:35:59.
Apelação Cível Nº 5003363-33.2016.4.04.7005/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: JOSE BATISTA PEREIRA (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. EMPRESA AGROpecuária. POSSIBILIDADE. MATÉRIA UNIFORMIZADA.
1. A expressão "trabalhadores na agropecuária", contida no item 2.2.1 do anexo ao Decreto n.º 53.831/64, se refere aos trabalhadores rurais que exercem atividades agrícolas como empregados em empresas agroindustriais e agrocomerciais, fazendo jus os empregados de tais empresas ao cômputo de suas atividades como tempo de serviço especial.
2. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida.
3. Não tem direito à aposentadoria especial o segurado que não possui tempo de serviço suficiente à concessão do benefício. Faz jus, no entanto, à averbação dos períodos judicialmente reconhecidos para fins de obtenção de futuro benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 15 de outubro de 2019.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001360494v4 e do código CRC 250384c4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 15/10/2019, às 22:50:46
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 03:35:59.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual ENCERRADA EM 15/10/2019
Apelação Cível Nº 5003363-33.2016.4.04.7005/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: JOSE BATISTA PEREIRA (AUTOR)
ADVOGADO: EDGAR INGRÁCIO DA SILVA (OAB PR035333)
ADVOGADO: ELLEN PEDROSO INGRÁCIO DA SILVA (OAB PR045741)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual encerrada em 15/10/2019, na sequência 4, disponibilizada no DE de 27/09/2019.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juiz Federal MARCELO MALUCELLI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 03:35:59.