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PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS FRIO E UMIDADE. CATEGORIA PROFISSIONAL. PESCADOR. ANO MARÍTIMO. POSSIBILIDADE ...

Data da publicação: 13/05/2022, 07:01:05

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS FRIO E UMIDADE. CATEGORIA PROFISSIONAL. PESCADOR. ANO MARÍTIMO. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO EM RELAÇÃO A UM MESMO PERÍODO DA CONTAGEM DIFERENCIADA COM O RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. 1. Comprovado o labor urbano na condição de pescador profissional, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço. 2. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 3. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 4. A exposição a frio e umidade enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 5. As atividades de pescador e de trabalhador embarcado exercida até 28-04-1995 devem ser reconhecidas como especiais em decorrência do enquadramento por categoria profissional previsto à época da realização do labor. 6. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente. 7. É possível a contagem diferenciada do ano marítimo (convertendo o tempo de embarcado para tempo de serviço em terra pelo fator 1,41) até 16/12/1998, sendo que apenas o período de navegação por travessia não permite a contagem diferenciada. Precedentes. 8. O ano marítimo, de 255 dias, foi implantado pelo Decreto 22.872/33, que criou o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), com o intuito de compensar os trabalhadores marítimos pelo confinamento em embarcações de longo curso e o regime especial do marítimo embarcado encontra-se regulamentado no art. 54, § 1º, do Decreto 83.080/79 e art. 57, parágrafo único, dos Decretos 611/1992 e 2.172/97, sendo admitido e regulado pelo INSS na Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45/2010, arts. 111 a 113. 9. Além do cálculo diferenciado do ano marítimo, o trabalhador faz jus ao reconhecimento do tempo especial laborado em tais atividades. 10. O ano marítimo existe em razão do confinamento e da jornada de trabalho diferenciada, e o tempo de 25 anos para aposentadoria especial, ou para a conversão do tempo especial em comum, em razão da insalubridade a que se submetem os marítimos, e os trabalhadores de construção e reparos navais, consideradas atividades insalubres. A interpretação que melhor se harmoniza com o alto significado das normas de proteção ao trabalhador no Direito brasileiro é a de que é possível que um mesmo período como marítimo tenha contagem diferenciada em razão da jornada e seja reconhecido como especial. Precedentes do STJ e desta Corte Regional. 11. Não se aplicam ao trabalhador marítimo, para fins do cômputo do ano marítimo, as disposições da Lei n.º 9.032, de 29/04/95, que extinguiu o enquadramento por categoria profissional. Essa contagem diferenciada é possível até a edição da EC 20, de 15/12/1998, que impôs a observância do art. 40, § 10, da CF/88, o qual veda o tempo de contribuição fictício. 12. Implementados mais de 25 anos de tempo de atividade sob condições nocivas e cumprida a carência mínima, é devida a concessão do benefício de aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do § 2º do art. 57 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91. 13. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos. 14. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E. 15. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança. 16. A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, nos termos do art. 3º da EC 113/2021, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente. (TRF4, AC 5004671-49.2012.4.04.7101, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 05/05/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5004671-49.2012.4.04.7101/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: IZAIR SILVA DOS PASSOS (AUTOR)

ADVOGADO: FERNANDA ALMEIDA VALIATTI (OAB RS062876)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação do INSS contra sentença publicada na vigência do CPC/2015 em que o juízo a quo assim decidiu:

ANTE O EXPOSTO, DECLARO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, por ausência de interesse processual, o pedido de averbação dos interstícios de 01.10.1977 a 31.12.1977, 01.11.1984 a 16.10.1985, 17.10.1985 a 16.12.1991, 27.05.1992 a 06.01.1995, 12.02.2004 a 05.07.2004, 01.11.2004 a 12.07.2005, 05.12.2005 a 19.06.2006, 03.11.2006 a 16.08.2007, 09.11.2007 a 14.02.2008, 11.05.1981 a 11.09.1981, 12.02.2004 a 05.07.2004, bem como o pedido de reconhecimento da especialidade laboral dos entretempos de 11.05.1981 a 17.09.1981, 01.11.1984 a 16.10.1985, 16.10.1985 a 16.12.1991 e de 27.05.1992 a 06.01.1995, com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo Civil;

Quanto ao restante, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para:

a) reconhecer como tempo de serviço comum os períodos compreendidos entre 12.07.1974 a 30.09.1977, 01.01.1978 a 23.04.1981, 14.08.1985 a 16.10.1985, 26.01.1995 a 09.04.1996, 14.04.1998 a 06.03.2000, 29.03.2000 a 01.07.2001, 02.07.2001 a 02.08.2001, 04.08.2001 a 05.06.2002, 06.06.2002 a 15.08.2002 e de 15.08.2002 a 11.02.2004, cumprindo à autarquia previdenciária proceder à respectiva averbação;

b) reconhecer como tempo marítimo os períodos de 16.10.1985 a 16.12.1991, 27.05.1992 a 09.03.1994, 12.07.1974 a 23.04.1981, 11.05.1981 a 11.09.1981, 14.08.1985 a 16.10.1985, 26.01.1995 a 09.04.1996 e de 14.04.1998 a 16.12.1998;

c) reconhecer como tempo especial os períodos de 12.07.1974 a 23.04.1981, 26.01.1995 a 09.04.1996, 14.04.1998 a 06.03.2000, 29.03.2000 a 01.07.2001, 02.07.2001 a 02.08.2001, 04.08.2001 a 05.06.2002, 06.06.2002 a 15.08.2002, 16.08.2002 a 11.02.2004, 12.02.2004 a 05.07.2004, 01.11.2004 a 12.07.2005, 05.12.2005 a 19.06.2006, 03.11.2006 a 16.08.2007, 09.11.2007 a 14.02.2008;

d) condenar o INSS à implantação e ao pagamento do benefício de aposentadoria especial ao autor, desde 14.02.2008 (DER), com fulcro no art. 57 da Lei nº 8.213/91 e cálculo de acordo com as inovações decorrentes da Lei nº 9.876/99;

e) condenar o réu ao pagamento das parcelas vencidas a contar de 14.02.2008, acrescidas de correção monetária desde o vencimento de cada parcela pela variação do INPC e, a partir da citação, também de juros de mora de 6% ao ano.

Dada a sucumbência mínima da parte autora, mormente por ter reconhecido seu direito à aposentadoria, condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios ao patrono desta, verba que, em atenção aos referenciais do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vencidas após a sentença (Súmula nº 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

Condeno o INSS ao ressarcimento do valor dos honorários periciais despendidos pela Seção Judiciária do Rio Grande do Sul.

Interposto recurso, intime-se a parte apelada para, querendo, no prazo legal, apresentar contrarrazões e, após, não sendo suscitadas as questões referidas no art. 1009, §1º, do Código de Processo Civil, encaminhe-se ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (art. 1.010, §§1º e 3º, do Código de Processo Civil).

Apesar de a sentença não trazer o valor preciso da condenação, resta dispensado o reexame necessário, porque mesmo na hipótese de a renda mensal atingir o teto dos benefícios previdenciários, a condenação, aí incluídos correção monetária e juros de mora, será inferior ao equivalente a mil salários mínimos, patamar a partir do qual, de acordo com o disposto no art. 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil, ficam as sentenças proferidas em face de autarquias federais sujeitas ao duplo grau de jurisdição.

Publique-se. Registre-se, Intimem-se.

Sustenta o INSS a impossibilidade de consideração como especiais dos períodos de 12/07/1974 a 23/04/1981, 26/01/1995 a 09/04/1996, 14/04/1998 a 06/03/2000, 29/03/2000 a 01/07/2001, 02/07/2001 a 02/08/2001, 04/08/2001 a 05/06/2002, 05/06/2002 a 15/08/2002 e 15/08/2002 a 11/02/2004 por conta da ausência de comprovação da efetiva exposição do autor a agentes nocivos. Defende, também, não haver início de prova material relativamente aos períodos de labor comum de 12/07/1974 a 30/09/1977, 01/01/1978 a 23/04/1981, 11/05/1981 a 11/09/1981, 14/08/1985 a 16/10/1985, 26/01/1995 a 09/04/1996, 14/04/1998 a 06/03/2000, 29/03/2000 a 01/07/2001, 02/07/2001 a 02/08/2001, 04/08/2001 a 05/06/2002, 06/06/2002 a 15/08/2002 e 15/08/2002 a 11/02/2004. Alega, também, não ter preenchido o autor as condições legais necessárias ao enquadramento dos períodos de 16/10/1985 a 16/12/1991, 27/05/1992 a 09/03/1994, 12/07/1974 a 23/04/1981, 11/05/1981 a 11/09/1981, 14/08/1985 a 16/10/1985, 26/01/1995 a 09/04/1996 e 14/04/1998 a 16/12/1998 como regime de ano marítimo, bem como a impossibilidade de cumulação da contagem do tempo especial com a conversão do tempo de marítimo embarcado. Subsidiariamente, requer a aplicação da Lei 11.960/09 para fins de atualização monetária e juros de mora a incidir sobre as parcelas devidas.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

MÉRITO

Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:

- ao cômputo do tempo de labor comum relativo aos períodos de 12/07/1974 a 30/09/1977, 01/01/1978 a 23/04/1981, 11/05/1981 a 11/09/1981, 14/08/1985 a 16/10/1985, 26/01/1995 a 09/04/1996, 14/04/1998 a 06/03/2000, 29/03/2000 a 01/07/2001, 02/07/2001 a 02/08/2001, 04/08/2001 a 05/06/2002, 06/06/2002 a 15/08/2002 e 15/08/2002 a 11/02/2004;

- ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 12/07/1974 a 23/04/1981, 26/01/1995 a 09/04/1996, 14/04/1998 a 06/03/2000, 29/03/2000 a 01/07/2001, 02/07/2001 a 02/08/2001, 04/08/2001 a 05/06/2002, 05/06/2002 a 15/08/2002 e 15/08/2002 a 11/02/2004;

- à possibilidade de enquadramento como regime marítimo embarcado dos intervalos de 16/10/1985 a 16/12/1991, 27/05/1992 a 09/03/1994, 12/07/1974 a 23/04/1981, 11/05/1981 a 11/09/1981, 14/08/1985 a 16/10/1985, 26/01/1995 a 09/04/1996 e 14/04/1998 a 16/12/1998;

- à possibilidade de cumulação da conversão decorrente do tempo em regime de marítimo embarcado com o reconhecimento da especialidade;

- à consequente concessão de aposentadoria especial, a contar da DER (14/02/2008);

- aos critérios de juros e de correção monetária.

Tempo de Serviço Comum

A r. sentença proferida pelo MM. Juiz Federal Adérito Martins Nogueira Júnior bem analisou as questões controvertidas, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:

"Da averbação de tempo comum

Tendo em vista que um dos pontos controvertidos na presente demanda consiste na possibilidade de reconhecimento do período laborado como pescador embarcado, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, mister tecer, inicialmente, algumas considerações sobre a disciplina legal da matéria.

Nesse particular, destaca-se, em um primeiro momento, o Decreto nº 22.872/1933, que criou o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos, destinado a conceder ao pessoal da marinha mercante nacional e classes anexas os benefícios de aposentadoria e pensões na forma estatuída naquele Decreto (art. 1º.), estando incluídos nas suas disposições os serviços de navegação não só da União, Estados e Municípios, mas também as indústrias da pesca e embarcações de particulares (art. 2º.).

Tal Decreto considerou como associado obrigatório do Instituto dos Marítimos (art. 3º, "a") os capitães, oficiais, marinheiros e demais pessoas que trabalhem, mediante vencimento ou salário, a bordo de navios e embarcações nacionais, cuja contribuição, nos termos do disposto no art. 11, deveria ser descontada dos empregados pela empresa empregadora e recolhidas ao referido Instituto (art. 18).

O tempo de serviço a ser utilizado com o fim de obtenção da aposentadoria prevista naquele Decreto deveria ser comprovado mediante uma caderneta a ser fornecida aos empregados, a qual servia de base para a inscrição do empregado como associado do Instituto e contagem do seu tempo de serviço para aposentadoria (art. 110, parágrafo único).

O Decreto-Lei nº 627/1938, a seu turno, acrescentou outros associados obrigatórios, sem excluir as categorias que já haviam sido arroladas neste último.

O Decreto-Lei nº 3.832/1941, modificou o Decreto nº 22.872/33 e definiu novamente as categorias de segurados do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos, revogando as disposições em contrário, ficando definido como associados do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos todos quantos, como empregados, prestem serviços às empresas de pesca ou de atividades desta derivadas, bem como os pescadores legalmente habilitados para o exercício de sua indústria por conta própria, cabendo-lhes os direitos e deveres que estabelece o decreto nº 22.872, de 29 de junho de 1933, com as modificações do presente decreto-lei.

Ainda nos termos do Decreto-Lei 3.832/1941 são considerados empregadores as empresas de qualquer natureza, mesmo as simples parcerias, que mantenham pessoal a seu serviço, quando organizadas para a exploração da pesca marítima ou interior e atividades desta derivadas, e, bem assim, os proprietários de embarcações empregadas no mesmo fim.

Por oportuno, transcreve-se abaixo o art. 2º do dispositivo legal em comento:

Art. 2º Compreendem-se na definição do artigo 1º, para os fins nele indicados:

a) os pescadores que trabalhem mediante ordenado, salário, parte, ou quinhão, a bordo de navios os quaisquer embarcações nacionais, empregadas na pesca marítima ou interior e que pertençam à classe das que possuem rol de equipagem ou lista de tripulação;

b) os demais empregados das empresas de pesca e atividades desta derivadas, quaisquer que sejam suas funções ou serviços, nos escritórios, dependências ou instalações de propriedade das mesmas;

c) os pescadores que trabalhem por conta própria, de parceria ou mediante parte, quinhão, em embarcações não enquadradas na classe indicada na alínea a. (grifo não constante do original)

Tal Decreto-Lei repetiu, em seu art. 11, a disposição que já constava do Decreto n. 22.872/33, no sentido de que a contagem de tempo de serviço dos pescadores será feita em face de sua caderneta-matrícula, fornecida pelas Capitanias dos Portos, não devendo ser computados, nos cálculos do benefício a ser concedido, quaisquer elementos que estejam em discordância com os vistos anuais apostos na mesma caderneta.

A Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS (Lei n. 3.807/1960), assegurou em seu art. 162, aos atuais beneficiários, segurados e dependentes das instituições de previdência social, à exceção dos segurados facultativos, todos os direitos outorgados pelas respectivas legislações, salvo se mais vantajosos os benefícios nela previstos.

Posteriormente, o Decreto-Lei nº 72/1966, unificou os Institutos de Aposentadorias e Pensões até então existentes, e criou o Instituto Nacional de Previdência Social - INPS.

Com a extinção do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos, o pescador empregado passou a ser regido unicamente pela Lei n. 3.807/60, que abrangia, na redação original do art. 2º, na condição de segurados, todos aqueles que exerciam emprego ou atividade remunerada no território nacional, salvo as exceções expressamente consignadas na referida Lei.

A LOPS excluiu do seu regime, conforme a redação original do art. 3.º, os servidores civis e militares sujeitos a regime próprio de previdência e os trabalhadores rurais, e considerou, como segurados obrigatórios, dentre outros, além dos empregados, também os autônomos, a teor do art. 5.º da referida Lei Orgânica.

Diante de tais dispositivos legais, ficou assentado, sem sombra de dúvida, que o pescador empregado e aquele que exercia a pesca por conta própria (autônomo) foram abrangidos pela Lei n. 3.807/60, sendo que, no caso do primeiro, a obrigação pela arrecadação e recolhimento das contribuições era do empregador, e, no segundo caso, era do próprio segurado, que deveria, conforme a redação original do art. 79 da LOPS, recolher diretamente à Instituição de Previdência a que estivesse vinculado.

Na sequência dos atos normativos, veio à lume o Decreto nº 71.498/72, que incluiu, como beneficiários do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural - PRO-RURAL, instituído pela Lei Complementar n. 11, de 25-05-1971, os pescadores que sem vínculo empregatício, na condição de pequeno produtor, trabalhando individualmente ou em regime de economia familiar, façam da pesca sua profissão habitual ou meio principal de vida. Determinou, também, que os pescadores autônomos que estivessem regularmente inscritos e que viessem recolhendo suas contribuições para o INPS, poderiam conservar a sua condição de segurados deste Instituto, nos termos do art. 2.º do referido Decreto.

Portanto, tem-se a seguinte situação: os pescadores empregados e autônomos estavam abrangidos pela LOPS, sendo considerados segurados urbanos, e os pescadores artesanais passaram a pertencer, a partir da vigência do referido Decreto, em 06.12.1972, à mesma categoria que os trabalhadores rurais, tendo direito aos benefícios especificados na Lei Complementar n. 11/1971.

A Lei n. 7.356/85, acrescentou o § 3º ao artigo 5º da Lei n. 3.807/60, ressalvando o direito, aos pescadores artesanais, de adquirirem a condição de segurados urbanos como trabalhadores autônomos, hipótese em que deveriam, a partir de então, verter contribuições ao extinto INPS.

Atualmente, com a edição da Lei n. 8.213/91, a condição de segurado obrigatório do empregado e do autônomo (atual contribuinte individual) restaram asseguradas no incisos I e V do artigo 11.

No que tange à comprovação do tempo de serviço, o Decreto n. 3.048/99, que atualmente regulamenta a Lei n. 8.213/91, dispõe, no artigo 62, § 2º, inciso I, alínea "a", que para o trabalhadores em geral, servem como prova do tempo de serviço o contrato individual de trabalho, a Carteira Profissional, a Carteira de Trabalho e Previdência Social, a carteira de férias, a carteira sanitária, a caderneta de matrícula e a caderneta de contribuições dos extintos institutos de aposentadoria e pensões, a caderneta de inscrição pessoal visada pela Capitania dos Portos, pela Superintendência do Desenvolvimento da Pesca, pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas e declarações da Secretaria da Receita Federal do Brasil, possibilitando, assim, o cômputo do tempo de serviço do pescador empregado nos moldes que previa o já revogado Decreto n. 22.872/33, que criou o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos.

Tecidas essas considerações, passa-se à análise do caso vertente.

Considerando-se a ausência de interesse processual dos interstícios acima mencionados, resta a análise dos interregnos de 12.07.1974 a 30.09.1977, 01.01.1978 a 23.04.1981, 14.08.1985 a 16.10.1985, 26.01.1995 a 09.04.1996, 14.04.1998 a 06.03.2000, 29.03.2000 a 01.07.2001, 02.07.2001 a 02.08.2001, 04.08.2001 a 05.06.2002, 05.06.2002 a 15.08.2002 e de 15.08.2002 a 11.02.2004.

Quanto aos períodos de 12.07.1974 a 30.09.1977 e de 01.01.1978 a 23.04.1981, verifica-se da anotação na caderneta de pescador do demandante, cuja cópia se encontra anexada à inicial (evento 1, PROCADM3, página 3), a existência de anotação de embarque e desembarque, atestando o exercício da pesca pelo requerente, junto a Urbano Joaquim Pereira, proprietário da embarcação.

Sobre o ponto, sustenta a autarquia previdenciária (evento 28) que inexistem provas indicando em que condições o labor foi exercido, destacando não existir anotação na carteira profissional do autor, bem como que a pessoa de Urbano não possui inscrição no RGPS como empregador, e sim como pescador autônomo, tendo inclusive obtido aposentadoria em maio de 1983.

Nesse particular, destaque-se que as anotações em Caderneta de Inscrição e Registro da Marinha não podem ser desconsideradas, nos termos do art. 62, § 2º, inciso I, alínea "a", do Decreto nº 3.048/99, acima transcrito.

Soma-se a isso, a prova oral realizada durante a instrução processual (eventos 78-79), cujo depoimento da testemunha Francisco de Assis Costa da Silveira confirmou que o autor exercia o ofício da pesca, trabalhando em alto mar, na condição de empregado, recebendo "por parte", do dono da embarcação.

Dessa maneira, não sendo o requerente o responsável pelo pontual recolhimento das contribuições previdenciárias, obrigação que compete ao empregador - no caso em tela os proprietários das embarcações -, não pode ter limitados seus direitos previdenciários, devendo ser computado em seu favor o tempo de labor demonstrado pela análise das provas.

Assim, devem ser reconhecidos como tempo de labor comum os períodos de 12.07.1974 a 30.09.1977 e de 01.01.1978 a 23.04.1981.

Noutro passo, conforme anotações na Caderneta de Inscrição e Registro da Marinha, anexadas à inicial (evento 1, PROCADM3, páginas 9-10), verifica-se ter o autor laborado como empregado, em condições similares de labor, no ofício de pescador profissional, nos períodos de 11.05.1981 a 11.09.1981 (Luiz Custódio do Vale I), 14.08.1985 a 16.10.1985 (São Manoel de Lino Moura), 26.01.1995 a 09.04.1996 (Cometa), 14.04.1998 a 06.03.2000 (Campeão), 29.03.2000 a 01.07.2001 (Vila Lobos II), 02.07.2001 a 02.08.2001 (Santa Rita I), 04.08.2001 a 05.06.2002 (Liliane), 05.06.2002 a 15.08.2002 (Oceano) e de 15.08.2002 a 11.02.2004 (Galhista VII).

Sinale-se, nesse particular, que as testemunhas ouvidas em audiência fizeram referência às embarcações Campeão, Vila Lobos, Santa Rita, Liliane, Oceano, Galhista, confirmando que eram embarcações de pesca de alto mar, nas quais o autor pescava como empregado do dono da embarcação, geralmente entre cinco ou seis pessoas, e recebiam "por parte" do dono da embarcação.

Dessarte, considerando o valor probatório das anotações em caderneta de pescador, corroboradas pela prova oral colhida durante a instrução processual, devem ser reconhecidos como tempo comum, em favor do demandante, os períodos de 11.05.1981 a 11.09.1981, 14.08.1985 a 16.10.1985, 26.01.1995 a 09.04.1996, 14.04.1998 a 06.03.2000, 29.03.2000 a 01.07.2001, 02.07.2001 a 02.08.2001, 04.08.2001 a 05.06.2002, 05.06.2002 a 15.08.2002 e de 15.08.2002 a 11.02.2004."

Consoante bem exposto pelo magistrado de primeira instância no excerto acima transcrito, há nos autos documentação suficiente indicando o desempenho pelo autor de atividades de pescador embarcado empregado, sendo inclusive firmemente confirmada pela prova testemunhal.

Sinale-se que o recolhimento de contribuições previdenciárias nos interstícios ora reconhecidos incumbe ao empregador, nos termos do art. 30, inc. I, alíneas "a" e "b", da Lei n.º 8.212/91, não podendo ser exigida do empregado para efeito de concessão de benefícios previdenciários.

Concluindo o tópico, resta reconhecido o tempo de serviço urbano nos intervalos controvertidos, confirmando-se a sentença, no ponto.

Tempo de serviço especial

O tempo de serviço especial é disciplinado pela lei vigente à época em que exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova, cuja previsão legislativa expressa se deu com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99. Nesse sentido é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003).

Isso assentado, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) no período de trabalho até 28-04-1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto quanto à exposição a ruído e calor, em que necessária sempre a aferição de seus níveis (decibéis/ºC IBUTG), por meio de parecer técnico trazido aos autos ou, simplesmente, referido no formulário padrão emitido pela empresa;

b) a partir de 29-04-1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13-10-1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14-10-1996, que a revogou expressamente, de modo que, no interregno compreendido entre essas datas e 05-03-1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;

c) após 06-03-1997, quando vigente o Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

Essa interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).

Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).

Exame do tempo especial no caso concreto

Controverte-se nos autos sobre a especialidade dos períodos de 12/07/1974 a 23/04/1981, 26/01/1995 a 09/04/1996, 14/04/1998 a 06/03/2000, 29/03/2000 a 01/07/2001, 02/07/2001 a 02/08/2001, 04/08/2001 a 05/06/2002, 05/06/2002 a 15/08/2002 e 15/08/2002 a 11/02/2004, nos quais o autor sempre laborou como pescador embarcado.

Inicialmente, de se registrar que os períodos anteriores a 28/04/1995 são passíveis de enquadramento por categoria profissional, consoante item 2.2.3 do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e item 2.2.1 do Anexo II do Decreto n.º 83.080/79.

Em todos os períodos o perito judicial foi categórico ao indicar que as atividades do demandante era insalubres por conta de seu contato habitual e permanente com frio e umidade.

No caso, o frio advinha do manuseio constante de grandes quantidades de gelo, armazenadas nas embarcações com o fito de conservar os produtos da pesca. Ainda que não se trate de câmaras frias dentro das embarcações, os locais com gelo reservados ao armazenamento de peixes têm exatamente a mesma função, sendo análogas tais áreas às referidas câmaras.

Ainda, a umidade das embarcações originava-se não só da própria água de rios e do oceano que adentrava naturalmente nos barcos, mas também do derretimento de grandes quantidades de gelo, das atividades de limpeza de porões e convés dos navios, resultando, assim, em ambientes encharcados, sendo possível o reconhecimento da especialidade do labor, inclusive pela incidência da Súmula n.º 198 do extinto TFR.

Ainda, não há de se falar em lay-out distinto, conforme argumenta o INSS, uma vez que o labor do autor sempre foi prestado em embarcações pesqueiras, cujas condições de trabalho muito se assemelham. Ademais, a prova testemunhal colhida foi suficiente para demonstrar a similaridade das embarcações periciadas pelo expert de confiança do juízo - nas quais o autor também laborou - com as demais em que o demandante desempenhou atividade pesqueira.

Cumpre referir que a extemporaneidade do laudo técnico em relação ao período cuja especialidade o segurado pretende ver reconhecida não impede o enquadramento da atividade como especial.

Esse é o posicionamento pacífico desta Corte, conforme julgados a seguir:

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. EPI. JULGAMENTO PELO STF EM REPERCUSSÃO GERAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. LAUDO EXTEMPORÂNEO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. TUTELA ESPECÍFICA DO ART. 497 DO CPC/2015.

(...)

5. A jurisprudência posicionou-se no sentido de aceitar a força probante de laudo técnico extemporâneo, reputando que, à época em que prestado o serviço, o ambiente de trabalho tinha iguais ou piores condições de salubridade.

(...)

(TRF4, REOAC n.º 5007369-10.2012.4.04.7107/RS, 6ª Turma, Rel. Juiz Federal Artur César de Souza, julgado em 26/07/2017).

PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. LAUDO EXTEMPORÂNEO AO LABOR. CONCESSÃO. EXIGÊNCIA DE AFASTAMENTO DA ATIVIDADE. ART. 57, §8º, DA LEI N. 8.213/91. INCONSTITUCIONALIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS ATENDIDOS. CONSECTÁRIOS.

(...)

2. Se a prova pericial, realizada na empresa constata a existência de agentes nocivos em data posterior ao labor, razão não há para se deduzir que as agressões ao trabalhador fossem menores ou inexistissem na época da prestação do serviço, até porque a evolução tecnológica e da segurança do trabalho tendem a causar a redução e não o aumento da nocividade com o passar dos anos.

(...)

(TRF4, AC n.º 0023713-40.2014.4.04.9999/RS, 5ª Turma, Rel. Juíza Federal Gisele Lemke, D.E. de 08/03/2018)

Assim, não há óbice ao reconhecimento da especialidade das atividades desempenhadas pelo autor.

Dessa forma, merece confirmação a sentença quanto à especialidade do labor.

Da caracterização do regime marítimo

Sustenta a Autarquia a impossibilidade de enquadramento da atividade pesqueira no regime de trabalho do marítimo embarcado.

A r. sentença proferida pelo MM. Juiz Federal Adérito Martins Nogueira Júnior bem analisou as questões controvertidas, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:

"Do ano marítimo.

A disciplina legal do marítimo embarcado encontrou suporte, inicialmente, no art. 54, § 1º, Decreto nº 83.080/79. Posteriormente, veio à lume o Decreto nº 611/1992, que disciplinava a matéria em seu art. 57, e, finalmente, o Decreto nº 2.172/97, que versava sobre o tema também no seu art. 57.

Em resumo, os dispositivos regulamentares citados estabeleciam que, cada 255 dias de embarque em navios nacionais, contados da data do embarque à do desembarque, equivalem a um ano de atividade em terra, obtida essa equivalência pela proporcionalidade de 255 meses de embarque, no mínimo, para 360 meses em terra, o que resulta no fator de conversão de 1,41.

Assim, os períodos em que o segurado trabalhou como marítimo embarcado, devidamente comprovados pelas certidões de embarque e desembarque, são computados na forma do ano marítimo, aplicando-se o fator de conversão acima referido.

Destaque-se que a contagem diferenciada somente é possível até 16/12/1998, data da edição da Emenda Constitucional nº 20/98. Isso porque essa emenda, em seu artigo 4º, impôs a observância do artigo 40, § 10, da Constituição Federal, o qual estabelece: "A lei não poderá estabelecer qualquer forma de contagem de tempo de contribuição fictício".

Noutro vértice, orienta-se a mais recente jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assentada no julgamento do recurso de Apelação na ação nº 5004799-69.2012.404.7101, ser possível a contagem do ano marítimo independentemente de o mesmo tempo de serviço ter obtido contagem especial por exposição a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, já que o desgaste a ser compensado, no caso do marítimo, é o confinamento decorrente dos longos períodos de embarque.

Cuida-se, em verdade, de motivos distintos para a contagem diferenciada de tempo: o ano marítimo, em face do confinamento imposto ao segurado; o tempo especial, pela exposição a agentes nocivos no seu labor, de modo que não há empecilho para o cômputo concomitante, desde que demonstrado o embarque e que, uma vez embarcado, o trabalhador ficou exposto a agentes nocivos.

No mesmo sentido trilhou o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da Ação Rescisória nº 3.349/PB, onde foi salientada a possibilidade de contagem do ano marítimo anteriormente à edição da Emenda Constitucional nº 20/98.

Saliente-se, outrossim, que o próprio Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com a edição da Instrução Normativa nº 20 INSS/PRES, de 10.10.2007, e suas alterações posteriores, dentre elas a Instrução Normativa nº 27, de 02.05.2008 e a Instrução Normativa nº 77, de 21.01.2015, reconhece a contagem do ano marítimo, nos moldes anteriormente alinhados.

Enfatize-se que, de acordo com os precedentes referidos acima, nem todo o tempo do trabalhador marítimo recebe a contagem diferenciada, mas apenas aquele em que o segurado permaneceu confinado por longos períodos longe da terra.

Portanto, em princípio, não são considerados os entretempos dedicados à navegação portuária ou de apoio portuário, em que não ocorre o confinamento.

Por outro lado, em alguns casos, a simples análise do tempo indicado nas cadernetas de marítimo deixa transparecer a impossibilidade absoluta de que tenha correspondido a tempo efetivamente embarcado.

O registro de alguns períodos de embarque e desembarque, assemelha-se, em algumas hipóteses, aos registros de contrato de trabalho em carteira profissional, indicando, na realidade, o vínculo do trabalhador à determinada embarcação.

Nesse contexto, se por um lado é vedado desconsiderar a prova produzida e/ou anexada ao feito, mostra-se inadequado considerar o tempo consignado como tempo de embarque e desembarque naquelas situações em que o lapso temporal ali exposto se revelar demasiado longo, indicando situação em que materialmente não é possível o trabalhador ter permanecido tanto tempo ininterruptamente embarcado.

Nesse sentido, mostra-se razoável que para as anotações de embarque/desembarque cujo interregno supere 1 ano (12 meses) de permanência em alto mar, faça-se um fracionamento fictício do período, alternando-se dias de embarque com dias de desembarque em terra.

Para tanto, adota-se informação prestada em processos com causa de pedir similar a do caso vertente, de que, em média, o pescador permanece embarcado, em alto mar, durante 18 dias a cada viagem.

Assim, nos intervalos de tempo superiores a 1 (um) ano, e tomando-se como parâmetro o habitual descanso do labor durante dois dias da semana, devem ser considerados 18 dias de embarque para cada 2 dias de descanso.

Tomadas tais premissas, passa-se à análise das provas apresentadas pelo demadante.

Quanto aos entretempos compreendidos entre 16.10.1985 a 16.12.1991, 27.05.1992 a 06.01.1995, 12.07.1974 a 23.04.1981, 11.05.1981 a 11.09.1981, 14.08.1985 a 16.10.1985, 26.01.1995 a 09.04.1996, e 14.04.1998 a 16.12.1998 (data limite para o reconhecimento do ano marítimo, nos termos já fundamentados), verifica-se a existência de comprovações de embarque e desembarque nos referidos períodos (evento 1, PROCADM3), com exceção do interstício de 27.05.1992 a 06.01.1995, cuja anotação limita-se a 09.03.1994.

Contudo, conforme apurado por meio da prova testemunhal (eventos 78/79), no que diz respeito ao período trabalhado para Urbano Jardim (12.07.1974 a 23.04.1981), o labor era desenvolvido mediante ida para a lida da pesca e retorno para a terra no mesmo dia do embarque.

Por esse motivo, não havendo confinamento do trabalhador na embarcação, mas, sim, desenvolvimento de jornada diária com retorno para terra ao final do labor, inviável, por ausência de pressuposto a tanto - qual seja, a manutenção de longo período como embarcado -, o cômputo como ano marítimo.

Assim, devem ser convertidos como ano marítimo, pelo multiplicador 1,41, os interregnos de 16.10.1985 a 16.12.1991, 27.05.1992 a 09.03.1994, 11.05.1981 a 11.09.1981, 14.08.1985 a 16.10.1985, 26.01.1995 a 09.04.1996 e 14.04.1998 a 16.12.1998."

Conforme bem exposto acima, o autor desempenhou labor embarcado por longos períodos, não se caracterizando apenas como navegação de travessia, por exemplo, sendo totalmente cabível, no caso, o enquadramento de suas atividades no regime de marítimo embarcado.

Ainda, esta Corte reconhece a possibilidade de enquadramento das atividades de pescador no regime de marítimo embarcado:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO ESPECIAL. AGENTE RUÍDO. METODOLOGIA NHO-1. TEMA 1083 DO STJ. ANO MARÍTIMO. PESCADOR EMBARCADO. CUMULAÇÃO DA CONTAGEM DIFERENCIADA COM O ENQUADRAMENTO DO MESMO LABOR COMO TEMPO ESPECIAL. POSSIBILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS.

(...)

6. É possível a contagem diferenciada do ano marítimo (convertendo o tempo de embarcado para tempo de serviço em terra pelo fator 1,41) até 16/12/1998, sendo que apenas o período de navegação por travessia não permite a contagem diferenciada. Precedentes.

(...)

(AC n.º 5009309-51.4.04.7208/SC, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Rel. Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz, julgado em 17/03/2022)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ANO MARÍTIMO. ATIVIDADE ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. ENQUADRAMENTO. PESCADOR EMBARCADO. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. TEMA N. 555/STF. INTEMPÉRIES NATURAIS. TUTELA ESPECÍFICA.

1. Os períodos de trabalho como marítimo embarcado são computados na forma do ano marítimo, que é diferenciada, pois cada 255 dias de embarque, contados da data de embarque à do desembarque, equivalem a um ano de atividade em terra. O tempo de serviço como marítimo deve ser computado, assim, utilizando-se o fator de conversão de 1,41

(...)

(AC n.º 5013890-17.2016.4.04.7208/SC, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, Rel. Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, julgado em 20/07/2020)

Assim, afigura-se possível o enquadramento no regime de marítimo embarcado das atividades exercidas por pescador profissional, merecendo confirmação a sentença no ponto.

Possibilidade de cumulação da contagem diferenciada do ano marítimo com o reconhecimento da especialidade do labor

Inicialmente, ressalvo posicionamento pessoal no sentido da impossibilidade de cumulação da contagem diferenciada do ano marítimo com o reconhecimento da especialidade do labor, porquanto entendo que, já tendo o tempo necessário à obtenção da aposentadoria reduzido, não pode o autor também ser beneficiado através do reconhecimento da especialidade do labor e sua consequente conversão em tempo de serviço comum, pois se trata de dupla consideração das condições insalubres do trabalho, conferindo ao marítimo embarcado tratamento diferenciado no que tange aos demais trabalhadores expostos a condições insalubres no desenvolvimento de suas atividades profissionais.

Contudo, considerando-se tal questão já ter sido dirimida em sentido diverso pela Terceira Seção do STJ, bem como pela 5ª turma desta Corte, adoto o posicionamento pacífico de tais órgãos, consoante fundamentação abaixo.

A contagem diferenciada do ano marítimo, regulada pelo art. 54, § 1º, do Decreto 83.080/79 e do art. 57, parágrafo único, dos Decretos 611/92 e 2.172/97, admitida até 15/12/1998, tem relação com as peculiaridades da longa jornada de trabalho daqueles que trabalham confinados em embarcações.

Exemplificativamente, pode-se admitir que o marítimo embarcado trabalhe do dia 1º de janeiro até o dia 15 de setembro do ano, e seja dispensado do labor de 16 de setembro até 31 de dezembro do mesmo ano e assim proceda por 35 anos, sem que possa o INSS alegar falta de tempo de serviço/contribuição, porque ancorado em amparo legal.

Independentemente da contagem diferenciada do ano marítimo, a profissão de trabalhador em transporte marítimo, fluvial e lacustre foi elencado como atividade especial no item 2.4.2 do Anexo do Decreto n.º 53.831/64, em razão da insalubridade, com direito à aposentadoria aos 25 anos de trabalho. Já a atividade de pesca foi elencada em apartado, no item 2.2.3 do mesmo anexo, porque classificada como atividade perigosa, também aos 25 anos de serviço. Essa diferenciação foi mantida no Anexo II do Decreto n.º 83.080/79, a pesca elencada no item 2.2.1 e o transporte marítimo no item 2.4.4, mantido o tempo mínimo de 25 anos para aposentadoria. O Decreto n.º 611/92 (Regulamento dos Benefícios da Previdência Social), em seu art. 292, manteve a aplicação dos Anexos dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. Já o Decreto n.º 2.172/97, em seu art. 261, revogou expressamente os Anexos I e II do Decreto n.º 83.080/79, deixando de contemplar a possibilidade de reconhecimento de atividade especial por enquadramento profissional e, no seu Anexo IV, elencou os agentes nocivos cuja exposição dão direito ao benefício de aposentadoria especial.

A atividade especial do marítimo trata-se, como visto, de instituto diverso da atividade especial enquadrada por profissão ou por exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, porque instituídas por decretos diferentes. Mas não são excludentes porque, a partir de 1979, as normas de regência de ambos os institutos são as mesmas (Decretos 83.080/79, 611/1992 e 2.172/97). Se há contagem de tempo de serviço diferenciada é porque se trata de atividade especial.

Assim, além do estabelecimento do ano marítimo em 255 dias, os decretos normativos definem que o trabalhador marítimo adquire o direito à aposentadoria após 25 anos de efetivo exercício de atividade comprovadamente embarcada, admitida a contagem de períodos de atividade em terra, entre um desembarque e outro, previstos no art. 111, inciso II, da Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45/2010.

E para dar efetividade operacional ao disposto no art. 54, § 1º, do Decreto 83.080/79 e do art. 57, parágrafo único, dos Decretos 611/92 e 2.172/97, necessário transformar o ano marítimo de 255 dias em ano terrestre de 360 dias, utilizando-se para tal operação matemática o multiplicador 1,41. Após essa operação, para dar cumprimento ao disposto nos Anexos desses decretos, que dão direito à aposentadoria especial aos 25 anos de tempo de transporte marítimo, deve-se converter o tempo especial obtido pelo ano marítimo, pelo fator 1,40, para transformar em tempo comum, a fim de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço aos 35 anos, se homem.

Na dicção do art. 111 da Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45/2010, o marítimo embarcado não necessita comprovar a função que exerce no navio para o enquadramento da atividade especial por categoria profissional, porque as funções de marítimos de convés de máquinas, de câmara e de saúde e operários de construção e reparos navais, descritas no regulamento, são meramente exemplificativas e não exaustivas. Também foi expressamente afastada a exigência do preenchimento do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP para a devida conversão do ano marítimo, no art. 113 da mesma norma infralegal.

Ademais, a possibilidade de enquadramento por categoria profissional do trabalhador marítimo, previsto no parágrafo único do artigo 57 do Decreto 2.172/97, somente foi vedada após a vigência da EC 20, de 15/12/1998, que em seu art. 4º, impôs a observância do art. 40, § 10, da Constituição Federal, o qual estabelece: 'A lei não poderá estabelecer qualquer forma de contagem de tempo de contribuição fictício'.

Não se aplica, pois, ao trabalhador marítimo as disposições da Lei n.º 9.032/95, que deu nova redação ao art. 57 da Lei n.º 8.213/91 e extinguiu o enquadramento por categoria profissional, a partir de 29/04/1995. Isso porque o parágrafo único do art. 57 do Decreto n.º 2.172/97 (Regulamento dos Benefícios da Previdência Social), manteve a mesma redação dos artigos reguladores da matéria dos Decretos anteriores, não sofrendo as modificações da Lei n.º 9.032/95.

Somente é aplicada a limitação temporal prevista na Lei n.º 9.032/95, que deu nova redação ao art. 57 da Lei n.º 8.213/91 e extinguiu o enquadramento por categoria profissional, a partir de 29/04/1995, no segundo momento, quando da conversão do tempo de serviço marítimo em tempo comum, pelo fator 1,4.

Pacificando a divergência de entendimento sobre a matéria debatida, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de ação rescisória, decidiu de acordo com a posição acima firmada, cujo acórdão foi assim ementado:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. TRABALHADOR MARÍTIMO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONTAGEM DO TEMPO DE SERVIÇO. ANO MARÍTIMO. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE.

1. O ano marítimo é constituído por um período de 255 dias, implantado na vigência dos Institutos de Aposentadoria (IAPs) com o intuito de minorar o sofrimento dos trabalhadores marítimos, ocasionado pelo confinamento. Com a edição da EC nº 20/98, ficou proibida a utilização de tempo fictício para a contagem de tempo de contribuição. Tal, entretanto, não obsta a contagem do tempo pelo ano marítimo, anteriormente à sua edição, como reconhecido pelo próprio INSS, com a edição da Instrução Normativa nº 20 INSS/PRES, de 10/10/07, e suas alterações posteriores, dentre elas a IN nº 27, de 2/5/08.

2. O ano marítimo existe em razão da jornada de trabalho diferenciada, e o tempo de 25 anos para aposentadoria especial, em razão da insalubridade a que se submetem os marítimos e os trabalhadores das demais categorias consideradas atividades insalubres.

3. A aposentadoria do autor data de 1987. Assim, cabível a contagem do seu tempo de serviço considerando-se o ano marítimo de 255 dias e a concessão da aposentadoria especial, uma vez comprovado o exercício de atividade especial por tempo superior ao mínimo exigido pelo Decreto 83.080/79.

4. Ação rescisória julgada procedente.

(AR 3349/PB, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/02/2010, DJe 23/03/2010)

Dessa maneira, possível a cumulação entre a contagem diferenciada do ano marítimo e o reconhecimento da especialidade do labor, devendo ser mantida a sentença no ponto.

Assim, mantida a sentença em relação ao tempo de labor especial, comum e às conversões cabíveis, impõe-se sua confirmação também quanto ao reconhecimento do direito da parte autora à concessão da aposentadoria especial, desde a DER (14/02/2008).

Da necessidade de afastamento da atividade especial

No julgamento do Tema 709, em sede de embargos de declaração julgados em 23/02/2021, o STF fixou a seguinte tese:

"I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.

II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão"

Definida, em decisão com efeitos vinculantes, a questão da constitucionalidade da norma que veda a percepção de aposentadoria especial pelo segurado que permanece em atividade classificada como especial ou que a ela retorna, e estabelecida a eficácia da decisão, impõe-se assegurar à Autarquia previdenciária a possibilidade de proceder à verificação quanto à permanência do segurado no exercício de atividade classificada como especial ou quanto ao seu retorno. Uma vez verificada a continuidade ou o retorno do labor especial, poderá cessar (suspender) o pagamento do benefício previdenciário em questão, sem prejuízo do pagamento dos valores vencidos desde o termo inicial do benefício até a data da cessação.

Ressalte-se que, nos casos específicos de profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J, da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, encontram-se suspensos os efeitos do decidido pelo STF no caso, nos termos da decisão liminar proferida pelo Exmo. Min. Relator Dias Toffoli. Em tais casos, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.

Dessa forma, cumprindo com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito:

- à implementação do benefício de aposentadoria especial desde a data do requerimento;

- ao pagamento das parcelas vencidas.

Transcorridos menos de cinco anos entre a DER (14/02/2008) e o ajuizamento da demanda (10/07/2012), não incide, no caso, a prescrição quinquenal.

Consectários e provimentos finais

- Correção monetária e juros de mora

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.

Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 13, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Honorários advocatícios

Em 26/08/2020, foi afetado pelo STJ o Tema 1059, com a seguinte questão submetida a julgamento: "(Im) Possibilidade de majoração, em grau recursal, da verba honorária fixada em primeira instância contra o INSS quando o recurso da entidade previdenciária for provido em parte ou quando o Tribunal nega o recurso do INSS, mas altera de ofício a sentença apenas em relação aos consectários da condenação."

Ciente da existência de determinação de suspensão nacional dos feitos em que se discute essa matéria, e considerando a necessidade de evitar prejuízo à razoável duração do processo, a melhor alternativa, no caso, é diferir, para momento posterior ao julgamento do tema, a decisão sobre a questão infraconstitucional afetada, sem prejuízo do prosseguimento do feito quanto aos demais temas, evitando-se que a controvérsia sobre consectários possa produzir impactos à prestação jurisdicional principal.

Assim, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.

Tutela específica - implantação do benefício

Possível desde logo a determinação de implantação do benefício, sem prejuízo da respectiva cessação, caso o INSS verifique que o segurado permaneceu ou retornou ao exercício de atividade especial, nos termos da decisão do STF no tema 709.

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.

Dados para cumprimento: (X) Concessão ( ) Restabelecimento ( ) Revisão

NB

143.472.813-4

Espécie

Aposentadoria por tempo de contribuição (42)

DIB

14/02/2008 (DER)

DIP

No primeiro dia do mês da implantação do benefício

DCB

Não se aplica

RMI

a apurar

Observações

Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

Conclusão

Parcialmente provida a apelação do INSS para adequar os critérios de juros de mora e de correção monetária. Diferida a possibilidade de majoração da verba honorária. Nos demais pontos, mantida a sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003162882v8 e do código CRC e43fff4f.Informações adicionais da assinatura:
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5004671-49.2012.4.04.7101
40003162882.V8


Conferência de autenticidade emitida em 13/05/2022 04:01:04.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5004671-49.2012.4.04.7101/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: IZAIR SILVA DOS PASSOS (AUTOR)

ADVOGADO: FERNANDA ALMEIDA VALIATTI (OAB RS062876)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. tempo de serviço urbano. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS frio e umidade. categoria profissional. pescador. ANO MARÍTIMO. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO EM RELAÇÃO A UM MESMO PERÍODO DA CONTAGEM DIFERENCIADA COM O RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.

1. Comprovado o labor urbano na condição de pescador profissional, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço.

2. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.

3. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

4. A exposição a frio e umidade enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial.

5. As atividades de pescador e de trabalhador embarcado exercida até 28-04-1995 devem ser reconhecidas como especiais em decorrência do enquadramento por categoria profissional previsto à época da realização do labor.

6. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente.

7. É possível a contagem diferenciada do ano marítimo (convertendo o tempo de embarcado para tempo de serviço em terra pelo fator 1,41) até 16/12/1998, sendo que apenas o período de navegação por travessia não permite a contagem diferenciada. Precedentes.

8. O ano marítimo, de 255 dias, foi implantado pelo Decreto 22.872/33, que criou o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), com o intuito de compensar os trabalhadores marítimos pelo confinamento em embarcações de longo curso e o regime especial do marítimo embarcado encontra-se regulamentado no art. 54, § 1º, do Decreto 83.080/79 e art. 57, parágrafo único, dos Decretos 611/1992 e 2.172/97, sendo admitido e regulado pelo INSS na Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45/2010, arts. 111 a 113.

9. Além do cálculo diferenciado do ano marítimo, o trabalhador faz jus ao reconhecimento do tempo especial laborado em tais atividades.

10. O ano marítimo existe em razão do confinamento e da jornada de trabalho diferenciada, e o tempo de 25 anos para aposentadoria especial, ou para a conversão do tempo especial em comum, em razão da insalubridade a que se submetem os marítimos, e os trabalhadores de construção e reparos navais, consideradas atividades insalubres. A interpretação que melhor se harmoniza com o alto significado das normas de proteção ao trabalhador no Direito brasileiro é a de que é possível que um mesmo período como marítimo tenha contagem diferenciada em razão da jornada e seja reconhecido como especial. Precedentes do STJ e desta Corte Regional.

11. Não se aplicam ao trabalhador marítimo, para fins do cômputo do ano marítimo, as disposições da Lei n.º 9.032, de 29/04/95, que extinguiu o enquadramento por categoria profissional. Essa contagem diferenciada é possível até a edição da EC 20, de 15/12/1998, que impôs a observância do art. 40, § 10, da CF/88, o qual veda o tempo de contribuição fictício.

12. Implementados mais de 25 anos de tempo de atividade sob condições nocivas e cumprida a carência mínima, é devida a concessão do benefício de aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do § 2º do art. 57 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91.

13. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos.

14. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.

15. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.

16. A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, nos termos do art. 3º da EC 113/2021, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 04 de maio de 2022.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003162883v3 e do código CRC c677378f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 5/5/2022, às 18:24:22


5004671-49.2012.4.04.7101
40003162883 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 13/05/2022 04:01:04.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 04/05/2022

Apelação Cível Nº 5004671-49.2012.4.04.7101/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: IZAIR SILVA DOS PASSOS (AUTOR)

ADVOGADO: FERNANDA ALMEIDA VALIATTI (OAB RS062876)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 04/05/2022, na sequência 439, disponibilizada no DE de 25/04/2022.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 13/05/2022 04:01:04.

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