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PREVIDENCIÁRIO. TEMPO EM GOZO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA E TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. POSSIBILIDADE. INTERCALAÇÃO COM PERÍODOS ...

Data da publicação: 15/08/2024, 07:01:07

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO EM GOZO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA E TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. POSSIBILIDADE. INTERCALAÇÃO COM PERÍODOS CONTRIBUTIVOS. 1. Conforme entendimento desta Corte, o período em que o segurado usufruiu do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez pode ser computado como carência e tempo de contribuição, desde que intercalado com períodos de atividade laborativa ou recolhimento de contribuições (art. 55, II, da Lei nº 8.213/91; súmula nº 73 da TNU; súmula nº 102 deste TRF4 e Tema nº 1.125 do STF). 2. Apesar de o STF, no julgamento do Tema 1.125, ter mencionado a necessidade de intercalação com períodos de "atividade laborativa", extrai-se das razões de decidir do julgado que o período em gozo de benefício por incapacidade pode ser intercalado com outros em que haja "recolhimento de contribuições", como reconhecido no acórdão recorrido. Assim, o recolhimento efetuado como segurado facultativo pode ser considerado para caracterizar o período de recebimento de benefício por incapacidade como intercalado por períodos contributivos e incluí-lo na contagem de carência e tempo de contribuição. Precedentes desta Corte. 3. Por ausência de previsão legal, não cabe ao intérprete fixar um número mínimo de contribuições para que o período de afastamento seja considerado intercalado com períodos contributivos, tampouco exigir que tenham sido recolhidas imediatamente antes ou após o benefício por incapacidade, ou antes de enventual perda da qualidade de segurado. Precedentes da TNU e deste TRF4. (TRF4, AC 5003924-39.2021.4.04.7213, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 08/08/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003924-39.2021.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: Lucia Dutra Dechering (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta em face de sentença, publicada em 19/11/2022, que acolheu parcialmente os pedidos autorais, nas seguintes letras (ev. 14.1):

Ante o exposto, acolho em parte o pedido, de modo a resolver o mérito com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:

a) reconhecer o direito da parte autora ao cômputo, já no processo administrativo atinente ao NB 177.554.943-4 (DER 07/07/2016), dos períodos de 30/12/1975 a 31/12/1981 e de 01/01/1982 a 31/10/1991 como de atividade rural em regime de economia familiar (segurada especial), exceto para fins de carência;

b) determinar o cômputo, como tempo de contribuição e carência no NB 177.554.943-4, dos hiatos de 04/03/2004 a 04/06/2004 e de 09/02/2006 a 09/05/2006, em que a parte autora esteve em gozo de benefícios por incapacidade;

c) determinar ao INSS que conceda à parte autora o benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição NB 177.554.943-4, desde a data do requerimento administrativo (07/07/2016);

d) condenar a parte requerida a pagar à parte autora os valores vencidos, observada a prescrição quinquenal, por requisição de pagamento, com juros de mora e atualização monetária. Os juros serão contados desde a citação (Súmula n. 204 do Superior Tribunal de Justiça) e iguais ao índice de remuneração da caderneta de poupança. A correção monetária incidirá desde a data em que eram devidos os valores, segundo o INPC. Por força do art. 3º da EC 113/2021, a contar de 09/12/2021, a aplicação da SELIC, uma única vez, englobará correção monetária e juros moratórios.

Em conformidade com os art. 85, § 3º, I, e 86, parágrafo único, do CPC, condeno o INSS ao pagamento de honorários de 10% do valor atualizado das parcelas vencidas até a publicação desta sentença (Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

O INSS é isento das custas (art. 4º, I, da Lei n. 9.289/1996).

Sentença NÃO sujeita a reexame necessário, pois embora não seja certo o valor da condenação, é evidente, quer pelo valor da causa, quer pelo direito aqui discutido, que a condenação/proveito econômico não ultrapassará o patamar estabelecido no art. 496, 3º, I, do CPC.

Havendo recurso de apelação tempestivo, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões no prazo legal e, decorrido o prazo, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

Em suas razões recursais, a autarquia previdenciária busca, em síntese, a suspensão do feito até o julgamento definitivo do Tema 1.125 pelo STF e, no mérito, seja rejeitada a possibilidade de cômputo dos períodos em gozo de benefício por incapacidade como carência (ev. 23.1).

Não foram apresentadas contrarrazões (ev. 26).

Subiram os autos a esta Corte para julgamento.

Era o que cabia relatar.

VOTO

1. Da preliminar de suspensão do feito. Desnecessidade. Tema 1.125 do STF. Trânsito em julgado

A autarquia previdenciária sustenta, preliminarmente, a necessidade de suspensão do feito até o julgamento definitivo do Tema 1.125 do STF.

Ocorre que o referido Tema já fora julgado, com a rejeição dos embargos de delcaração interpostos e trânsito em julgado em 20/09/2023.

Assim, rejeito a preliminar.

2. Da possibilidade de cômputo do(s) período(s) em gozo de benefício por incapacidade para fins de carência e tempo de contribuição, desde que intercalado(s) com períodos contributivos

A regra contida no art. 55, inciso II, da Lei nº 8.213/91 assim dispõe:

Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:

(...)

II - o tempo intercalado em que esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez;

De igual modo, a teor do art. 60, inciso III, do Decreto nº 3.048/99, "Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros, (...) o período em que o segurado esteve recebendo auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, entre períodos de atividade".

Sobre o tema, a TNU editou a Súmula nº 73, nos seguintes termos: "O tempo de gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez não decorrentes de acidente de trabalho só pode ser computado como tempo de contribuição ou para fins de carência quando intercalado entre períodos nos quais houve recolhimento de contribuições para a previdência social".

Demais disso, especificamente para fins de cômputo do período como carência, este Regional editou a Súmula nº 102, com a seguinte redação: "É possível o cômputo do interregno em que o segurado esteve usufruindo benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) para fins de carência, desde que intercalado com períodos contributivos ou de efetivo trabalho" (grifei).

Assim, esta Corte vinha reconhecendo a possibilidade de computar como tempo de contribuição e carência, o período em que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade, desde que intercalado com períodos contributivos. Veja-se:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. PERÍODO INTERCALADO COM PERÍODOS DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA. O intervalo de tempo em que o segurado usufruiu de benefício por incapacidade pode ser computado como carência e tempo de contribuição, desde que intercalado com períodos em que houve o recolhimento de contribuições. (TRF4, AC 5001360-37.2019.4.04.7123, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 24/12/2020)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PERÍODO EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. APROVEITAMENTO PARA FINS DE CARÊNCIA E TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. O período em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez deve ser computado para efeito de carência e tempo de contribuição, desde que intercalado com períodos contributivos. (TRF4, AC 5040801-06.2019.4.04.7000, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 30/09/2020)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. COMPROVAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E/OU AUXÍLIO-DOENÇA. CÔMPUTO COMO PERÍODO DE CARÊNCIA PARA A PERCEPÇÃO DE OUTRO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE, DESDE QUE INTERCALADO COM INTERVALOS DE CONTRIBUIÇÃO. (...). 2. O tempo em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, desde que intercalado com períodos de efetiva contribuição, deve ser computado como tempo de serviço e para efeito de carência, consoante RE n. 583.834, da Relatoria do Ministro Ayres Britto, julgado pelo Plenário do STF em sede de repercussão geral, publicado no DJe de 14-02-2012, bem como em face do REsp n. 1.410.433, da Relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado pela Primeira Seção do STJ em 11-12-2013, como recurso repetitivo. (...) (TRF4 5005613-92.2014.4.04.7204, NONA TURMA, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 04/12/2018)

PREVIDENCIÁRIO. PERÍODO EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENCA. CÔMPUTO COMO TEMPO DE SERVIÇO E PARA FINS DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. AUXÍLIO-ACIDENTE. CÔMPUTO COMO CARÊNCIA E TEMPO DE SERVIÇO PARA CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O período em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença deve ser computado para efeito de tempo de serviço e de carência, desde que intercalado com períodos contributivos. (...). (TRF4, AC 5019104-65.2015.4.04.7000, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 23/05/2017)

Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 1.298.832 (Tema 1.125), reconheceu a repercussão geral da questão constitucional e, no mérito, reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria, para firmar a tese jurídica de que "É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalado com atividade laborativa." (Plenário, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 24/02/2021).

Oportunamente, destaco que não há divergência material entre os entendimentos mencionados ao norte, ainda que o STF tenha feito referência à necessidade de intercalação dos períodos com "atividade laborativa". No julgamento do Tema 1.125, o STF iniciou transcrevendo o voto condutor do acórdão objeto do recurso extraordinário (RE 1.298.832):

De acordo com a Súmula nº 73 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, entendimento que se alinha a precedente do Supremo Tribunal Federal, ‘ o tempo de gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez não decorrentes de acidente de trabalho só pode ser computado como tempo de contribuição ou para fins de carência quando intercalado entre períodos nos quais houve recolhimento de contribuições para a previdência social

(...)

Por oportuno, saliento que a Turma Nacional de Uniformização, em julgamento realizado no dia 25.04.2019, nos autos do processo n. 0000042- 31.2107.4.02.5151/RJ, de Relatoria do Juiz Federal Sérgio de Abreu Brito, tratou especificamente do tema em discussão. Colhe-se do voto do Relator: '...é irrelevante se houve ou não o efetivo exercício de atividade laborativa, até porque é possível a realização de contribuições como segurado facultativo, que sabidamente não exerce labor remunerado. Também não estabelece a legislação previdenciária, para fins de cômputo do auxílio-doença intercalado como carência, número mínimo de recolhimentos de contribuições após a cessação do benefício por incapacidade.'

(...)

Assim, uma vez intercalado com o recolhimento de contribuições, perfeitamente cabível o cômputo, para fins de carência, dos períodos de auxílio-doença fruídos pela parte autora.

O referido acórdão foi mantido integralmente pelo STF, resultando no desprovimento do recurso extraordinário interposto pelo INSS. Ou seja, o Supremo, no voto condutor do acórdão, manteve o entendimento de que os períodos em gozo de benefícios por incapacidade, para que sejam computados, devem ser intercalados com períodos de "recolhimento contributivo", não obstante tenha feito menção a "atividade laborativa" quando da redação da tese.

Assim, tenho que deve prevalecer a ratio decidendi do julgado, mantendo-se o cômputo dos períodos em gozo de benefícios por incapacidade, tanto para fins de carência como para tempo de contribuição, desde que após a sua cessação a parte continue contribuindo para o sistema previdenciário, mantendo ativo seu vínculo com o regime.

Ora, eventual exclusão do contribuinte facultativo para fins de cômputo do tempo intercalado em que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade caracterizaria uma discriminação injustificada, não prevista em lei. Isso porque, ao deixar de complementar o termo "tempo intercalado", o legislador deixa implícito que o tempo em questão seria intercalado com o "tempo de serviço" previsto no caput do artigo 55, o qual - por força do inciso III do mesmo dispositivo - compreende "o tempo de contribuição efetuada como segurado facultativo" (nesse sentido: TRF4 5015212-03.2019.4.04.7003, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 12/05/2022; no mesmo sentido: TRF4, AC 5010880-62.2020.4.04.7001, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 11/05/2022).

Diante do entendimento firmado pelas Cortes Superiores, bem como por este Tribunal, tenho que o salário-de-benefício da prestação previdenciária por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) poderá ser considerado para efeito de tempo de contribuição e carência se o benefício for intercalado com períodos de trabalho remunerado e/ou contribuição previdenciária.

Além disso, não há previsão legal acerca da "quantidade mínima" de contribuições para que o período seja considerado intercalado. Nesse sentido, a TNU já havia fixado a tese de que "o tempo de gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez não decorrentes de acidente do trabalho deve ser computado para fins de tempo de contribuição e carência, quando intercalado com períodos de contribuição, independentemente do número de contribuições vertido e o título a que realizadas" (grifei) (TNU, PUIL nº 0000805-67.2015.4.03.6317/SP, Rel. Juíza Federal Taís Vargas Ferracini de Campos Gurgel, julgado em 25.04.2019). Destaco que tal entendimento foi reafirmado recentemente por aquele órgão (Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 5000453-62.2019.4.04.7220, GUSTAVO MELO BARBOSA - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO, 21/06/2021).

No âmbito desta 9ª Turma, já se decidiu que "A exigência de contribuições antes e após os períodos em que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade não implica a necessidade de um número determinado de contribuições, tampouco que essas tenham sido recolhidas imediatamente antes ou após o benefício por incapacidade" (grifei) (TRF4, AC 5007520-80.2020.4.04.7208, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 15/02/2022). Entendimento reiterado recentemente: TRF4, AC 5023299-02.2020.4.04.7200, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 27/11/2022.

Demais disso, destaco que no caso julgado pelo STF no Tema 1.125 (RE 1.298.832), a situação envolvia hipótese de uma segurada que gozou de benefício por incapacidade entre 21/11/2003 e 02/03/2018 e, em 12/04/2018, recolheu uma única contribuição (referente à competência 03/2018). Veja-se trecho do voto condutor do acórdão do Tema 1.125 (transcrição do acórdão recorrido):

(...) No caso concreto, os benefícios de auxílio-doença fruídos pela parte autora (de 28/04/2003 a 30/06/2003 e de 21/11/2003 a 02/03/2018) foram intercalados com período contributivo, conforme se observa da Guia da Previdência Social anexada no Evento n. 15, não havendo óbice à consideração do recolhimento efetuado em 12/04/2018 (referente à competência de 03/2018) para esse propósito.

A Turma Recursal de origem considerou que se tratava de período intercalado e que poderia ser computado para fins de carência, ainda que o segurado tenha feito apenas uma contribuição. Como já mencionado, o acórdão recorrido foi mantido pelo Pretório Excelso, negando-se provimento ao recurso extraordinário interposto pelo INSS.

No mais, destaco que a questão envolvendo o princípio do equilíbrio atuarial e financeiro e da prévia fonte de custeio fora objeto de discussão no âmbito do Pretório Excelso (Tema 1.125), não tendo sido capaz de alterar a conclusão pela tese firmada.

Não é demais dizer que o STF julgou os embargos de declaração opostos em face do Tema 1.125, rejeitando a alegação da autarquia previdenciária acerca da necessidade de distinção entre os Temas 88 e 1.125. Colhe-se do voto condutor do acórdão:

(...)

Ademais, ao contrário do alegado pela parte embargante, o acórdão ora hostilizado não foi omisso quanto à distinção entre o Tema 88 da repercussão geral (RE 583.834) e a hipótese de cômputo, também para fins de carência, do tempo de gozo de auxílio-doença intercalado com períodos de atividade em que há recolhimento de contribuição. Por oportuno, transcrevo trecho do acórdão embargado:

"Com efeito, a matéria aqui suscitada possui densidade constitucional suficiente para o reconhecimento da existência de repercussão geral, competindo a esta Suprema Corte manifestar-se sobre a aplicabilidade, também para fins de carência , do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento de mérito do RE 583.834 (Rel. Min. Ayres Britto, Tema 88 da Repercussão Geral). Reforça essa conclusão a existência de entendimento sumulado da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, que dispõe: ‘O tempo de gozo de auxíliodoença ou de aposentadoria por invalidez não decorrentes de acidente de trabalho só pode ser computado como tempo de contribuição ou para fins de carência quando intercalado entre períodos nos quais houve recolhimento de contribuições para a previdência social.’ (Súmula 73 da TNU, grifei).

(...)

O Supremo Tribunal, na apreciação do mérito do RE 583.834, da Relatoria do Ministro Ayres Britto, Plenário, DJe de 14/2/2012, Tema 88 da Repercussão Geral, assentou que, muito embora seja de natureza contributiva, o regime geral de previdência social admite, sob o ângulo constitucional, a exceção contida no artigo 29, § 5º, da Lei 8.213/1991, o qual prevê o cômputo dos períodos de afastamento, desde que intercalados com períodos de atividade. (...) (...) Observo que esse entendimento [...] vem sendo aplicado pela Corte também aos casos em que se discute o cômputo do período de auxílio-doença, intercalado por atividade laborativa, também para efeito de carência . ”

Ressalto que foram mencionados diversos julgados na esteira da jurisprudência dominante no âmbito desta Suprema Corte que sustentam a tese fixada, tal como reafirmado pelo acórdão embargado. Nesse diapasão, cito os seguintes julgados, dentre outros tantos referidos: RE 816.470-AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, DJe de 7/2/2018; ARE 890.591-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe de 10/2/2016; ARE 746.835-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe de 7/10/2014. Acrescento, ainda, o RE 1.281.588-AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe de 27/8/2021, o RE 771.577-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe de 30/10/2014, o ARE 823.977-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 17/2/2016 e o ARE 809.959-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe de 23/2/2015.

Deveras, o acórdão embargado não incorreu em omissão, tendo o órgão julgador decidido, fundamentadamente, todos os pontos colocados em debate, nos limites necessários ao deslinde do feito. Ademais, a contradição que autoriza a oposição do recurso declaratório deve ser interna à decisão, verificada entre os fundamentos do julgado e sua conclusão, o que não ocorreu no caso em tela. Da mesma forma, a decisão não é obscura, pois a ela não faltam clareza nem certeza quanto ao que foi decidido. Por fim, também é certo que não há no julgado nenhum erro material a ser corrigido.

(...)

Por último, entendo que a eventual perda da qualidade de segurado não influencia o raciocínio ao norte. Com efeito, o entendimento esposado pelo Supremo Tribunal Federal não faz tal exigência, até porque o que importa para fins de intercalação (e para o cômputo do período em gozo de benefício por incapacidade) é a superveniência de período contributivo, por meio de atividade laboral e/ou recolhimento(s) autônomo(s) pelo segurado. Realmente, esta Corte vem entendendo que as contribuições não precisam ocorrer imediatamente antes e/ou depois do benefício por incapacidade, não se fazendo a exigência que sejam feitas antes de eventual perda da qualidade de segurado.

Oportunamente, pondero que a situação é diversa daquela em que o segurado realiza o pagamento com atraso de determinada competência, hipótese na qual, realmente, a respectiva competência só poderá ser computada para fins de carência se não houver a perda da qualidade de segurado.

Feitas tais considerações, passo à análise do caso concreto.

A parte autora esteve em gozo de benefício por incapacidade de 04/03/2004 a 04/06/2004 e 09/02/2006 a 09/05/2006, sendo que do extrato de seu CNIS é possível perceber que existem períodos de contribuição anteriores e posteriores (ev. 1.5).

Assim, tenho que é possível computar o(s) período(s) de 04/03/2004 a 04/06/2004 e 09/02/2006 a 09/05/2006 tanto para fins de carência quanto para fins tempo de contribuição, pois intercalado(s) com períodos de atividade e/ou de contribuições.

Por consequência, não merece reparos a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos autorais e reconheceu o direito à "Aposentadoria por Tempo de Contribuição NB 177.554.943-4, desde a data do requerimento administrativo (07/07/2016)".

3. Dos consectários

3.1 Correção monetária

A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelo índice oficial e aceito na jurisprudência, qual seja:

- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp nº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-10-2019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.

3.2 Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula nº 204 do STJ), até 29/06/2009.

A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema nº 810 da repercussão geral (RE nº 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe nº 216, de 22/09/2017.

3.3 Atualização monetária a partir de 09/12/2021

A partir de 09/12/2021, data da publicação da Emenda Constitucional nº 113/2021, aplicável a previsão contida no seu art. 3º, in verbis:

Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.

3.4 Honorários advocatícios

Mantida a sentença quanto ao mérito, não vislumbro motivos para alterar a conclusão acerca da sucumbência mínima da parte autora, pelo que caberá ao INSS arcar com a integralidade das verbas inerentes (art. 86, p. ú., do CPC).

Assim sendo, considerando as variáveis do art. 85, § 2º, incisos I a IV, do CPC, vai fixada a verba honorária da fase de conhecimento em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas (súmula nº 111 do STJ).

Na eventualidade de o montante da condenação ultrapassar 200 salários mínimos, sobre o excedente deverão incidir os percentuais mínimos estipulados nos incisos II a V do § 3º do art. 85, de forma sucessiva, na forma do § 5º do mesmo artigo.

A jurisprudência do STJ assentou o entendimento de que é devida a majoração de verba honorária sucumbencial, nos termos do artigo 85, § 11, do CPC, quando presentes os seguintes requisitos de forma concomitante: a) decisão recorrida publicada a partir de 18/03/2016, data da vigência do novo Código de Processo Civil; b) recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente (vide Tema 1.059 do STJ); e c) condenação em honorários advocatícios desde a origem no feito em que interposto o recurso (vide jurisprudência em teses do STJ, edição nº 129, tese 4).

Satisfeitos todos os requisitos exigidos pelo Tribunal da Cidadania, majoro a verba honorária devida para 15% (quinze por cento) sobre a base de cálculo fixada.

3.5 Custas processuais

O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

4. Da tutela específica. Implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB1775549434
ESPÉCIEAposentadoria por Tempo de Contribuição
DIB07/07/2016
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES(*) Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada. (*) Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Requisite a Secretaria da 9ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

5. Conclusão

Sentença mantida quanto à possibilidade de cômputo do(s) período(s) em gozo de benefício por incapacidade (04/03/2004 a 04/06/2004 e 09/02/2006 a 09/05/2006) tanto para fins de carência quanto para fins de tempo de contribuição.

Verba honorária devida pelo INSS majorada na forma do art. 85, § 11, do CPC.

6. Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo e determinar a imediata implantação do benefício, via CEAB.



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5003924-39.2021.4.04.7213
40004559218.V3


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003924-39.2021.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: Lucia Dutra Dechering (AUTOR)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO EM GOZO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA E TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. POSSIBILIDADE. INTERCALAÇÃO COM PERÍODOS CONTRIBUTIVOS.

1. Conforme entendimento desta Corte, o período em que o segurado usufruiu do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez pode ser computado como carência e tempo de contribuição, desde que intercalado com períodos de atividade laborativa ou recolhimento de contribuições (art. 55, II, da Lei nº 8.213/91; súmula nº 73 da TNU; súmula nº 102 deste TRF4 e Tema nº 1.125 do STF).

2. Apesar de o STF, no julgamento do Tema 1.125, ter mencionado a necessidade de intercalação com períodos de "atividade laborativa", extrai-se das razões de decidir do julgado que o período em gozo de benefício por incapacidade pode ser intercalado com outros em que haja "recolhimento de contribuições", como reconhecido no acórdão recorrido. Assim, o recolhimento efetuado como segurado facultativo pode ser considerado para caracterizar o período de recebimento de benefício por incapacidade como intercalado por períodos contributivos e incluí-lo na contagem de carência e tempo de contribuição. Precedentes desta Corte.

3. Por ausência de previsão legal, não cabe ao intérprete fixar um número mínimo de contribuições para que o período de afastamento seja considerado intercalado com períodos contributivos, tampouco exigir que tenham sido recolhidas imediatamente antes ou após o benefício por incapacidade, ou antes de enventual perda da qualidade de segurado. Precedentes da TNU e deste TRF4.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao apelo e determinar a imediata implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 08 de agosto de 2024.



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5003924-39.2021.4.04.7213
40004559219 .V3


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 01/08/2024 A 08/08/2024

Apelação Cível Nº 5003924-39.2021.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: Lucia Dutra Dechering (AUTOR)

ADVOGADO(A): DAVID EDUARDO DA CUNHA (OAB SC045573)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/08/2024, às 00:00, a 08/08/2024, às 16:00, na sequência 140, disponibilizada no DE de 23/07/2024.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO APELO E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



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