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TRIBUTÁRIO. COVID. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI Nº 14. 151/21, ALTERADA PELA LEI Nº 14. 311/22. OMISSÃO LEGISLATIVA. RESPONSABILIDADE P...

Data da publicação: 31/07/2024, 11:01:00

EMENTA: TRIBUTÁRIO. COVID. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI Nº 14.151/21, ALTERADA PELA LEI Nº 14.311/22. OMISSÃO LEGISLATIVA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DO SALÁRIO. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE, PARA FINS DE COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO EMPREGADOR. IMPOSSIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. 1. Não é possível o enquadramento, como salário-maternidade, dos pagamentos realizados às empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus, em face da Lei nº 14.151/2021, enquanto durar o afastamento, para fins de compensação de tais valores com parcelas futuras de contribuições previdenciárias e devidas pela empresa. 2. A Lei nº 14.151/2021, posteriormente alterada pela Lei nº 14.311/2022, foi editada para regular situação excepcional, emergencial e temporária, e não trata de licença de trabalho ou percepção de salário-maternidade, não configurando o benefício previdenciário disciplinado pela Lei nº 8.213/1991. 3. A concessão de benefício sem previsão legal e sem indicação da fonte de custeio viola o equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência (art. 201 da CF). Entendimento firmado pelas duas Turmas de competência tributária do Superior Tribunal de Justiça. 4. Mantida a sentença de improcedência, e desprovido o apelo da parte autora, deve ser fixada a sucumbência recursal, com a majoração da verba honorária estipulada em desfavor da demandante (artigo 85, § 11, do CPC). (TRF4, AC 5003663-10.2021.4.04.7008, PRIMEIRA TURMA, Relator LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, juntado aos autos em 23/07/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gab. Desembargadora Federal Luciane A. Corrêa Münch - 5º andar - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3222 - Email: gluciane@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5003663-10.2021.4.04.7008/PR

RELATORA: Desembargadora Federal LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH

APELANTE: POSTO ROQUE VERNALHA LTDA (AUTOR)

APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação de procedimento comum proposta por POSTO ROQUE VERNALHA LTDA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS visando a afastar as empregadas gestantes de suas atividades, em razão da impossibilidade de realização de seu trabalho à distância, e compensar (deduzir) o valor dos salários-maternidade quando do pagamento das contribuições sociais previdenciárias (evento 1, INIC1).

A parte autora alega na inicial, em síntese, que atribuir a responsabilidade ao empregador pela remuneração das empregadas gestantes, durante todo o período de pandemia, sem que estejam à disposição para o trabalho, viola o disposto nos artigos 196, 201, inciso II, e 227 da CF e na Convenção n° 103 da OIT, que estabelecem que é responsabilidade do Estado a proteção à maternidade, e o princípio da livre iniciativa, na forma do artigo 170 da CF e da preservação da empresa. Aponta que, ao onerar o empregador a responsabilidade pela remuneração das empregadas gestantes, sem poder se valer do disposto na legislação previdenciária, há ofensa ao princípio da preservação da empresa, dado que a atividade econômica não acarreta vantagens apenas ao empresário ou à sociedade empresária, mas gera retorno para toda a sociedade. Logo, a situação gerada pelas omissões contidas na Lei nº 14.151/21 deve ser solucionada pelo Poder Judiciário, uma vez que sua função é garantir a supremacia da Constituição Federal de 1988.

A tutela de urgência foi indeferida.

Em emenda à inicial, a parte autora requereu a substituição das partes processuais, para figurar como parte ré a União - Fazenda Nacional.

O Juízo a quo reconheceu a ilegitimidade passiva do INSS para responder à ação, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC, excluindo o INSS e incluindo a União - Fazenda Nacional no polo passivo.

A União apresentou contestação, alegando preliminarmente, sua ilegitimidade passiva ad causam quanto à concessão de salário-maternidade. No mérito, requreu a improcedência da demanda.

Foi proferida sentença de improcêdencia, nos seguintes termos (evento 72, SENT1):

"ANTE O EXPOSTO, afasto a preliminar e, no mérito, julgo improcedente o pedido, com fulcro no artigo 487, inciso I, do CPC.

Por sucumbente, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC."

Apela a parte autora (evento 78, APELAÇÃO1), requerendo a reforma integral da sentença, condenando a União a: a) enquadrar como salário-maternidade os valores pagos às trabalhadoras gestantes contratadas pela parte autora e afastadas por força da Lei nº 14.151/21, nos termos do art. 394-A, § 3º, da CLT e art. 72, caput e § 1º, da Lei nº 8.213/91; b) excluir os pagamentos feitos à gestante afastada por força da Lei nº 14.151/21 da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à Previdência Social e aos Terceiros, no período de afastamento decorrente da Lei nº 14.151/21, permitindo à autora deduzir o valor dos salários-maternidade cujos pagamentos tenham sido feitos à gestante a esse título, quando do pagamento das contribuições sociais previdenciárias, nos termos do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91.

Sustenta que a proteção à maternidade é de responsabilidade do Estado, de forma que, como contrapartida do recolhimento do salário-maternidade pelo empregador, o montante pago pode ser compensado (deduzido) dos valores correspondentes às contribuições previdenciárias devidos pela empresa, para evitar prejuízos financeiros. Argumenta que, com a publicação da Lei nº 14.151/21, não ficou estabelecido como se daria o afastamento das empregadas gestantes que não pudessem realizar suas atividades à distância e sobre o responsável pelo pagamento da remuneração destas, como é o caso da autora que exerce ramo de atividades que, por sua natureza, não admite a prestação de forma remota. Aponta que o Brasil ratificou, por meio do Decreto nº 10.088/2019, a Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), cujo status normativo é supra legal, que estabelece regras ao amparo à maternidade, prevendo que "em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega".

Apresentadas contrarrazões pela União Federal.

Vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Legitimidade passiva

No caso dos autos, a parte autora visa à declaração do reconhecimento dos salários pagos às suas empregadas gestantes, afastadas em decorrência da Lei nº 14.151/21, como salário-maternidade, além da compensação dos valores, nos termos do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91.

O objeto principal discutido na lide, portanto, envolve o tratamento tributário de verbas pagas pelo empregador às empregadas gestantes impossibilitadas de exercer seu trabalho na forma remota, de forma que sejam tais verbas enquadradas como salário-maternidade, para fins de compensação com outras contribuições junto à SRFB. A matéria já foi julgada por esta Corte: CC nº 5046295-26.2021.4.04.0000, Corte Especial, Relator Des. Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, juntado aos autos em 25/02/2022.

Neste sentido, esta Turma já decidiu: AC nº 5000241-84.2022.4.04.7107/RS, Rel. Des. Federal LEANDRO PAULSEN, por unanimidade, j. 19/10/2022 e AI nº 5049782-04.2021.4.04.0000/RS, 1ª T., Rel. Juiz Federal MARCELO DE NARDI por unanimidade, j. 26/10/2022.

Mérito

Busca a parte autora, na presente ação, seja a União - Fazenda Nacional responsabilizada pela remuneração devida às empregadas gestantes afastadas por força das disposições contidas na Lei nº 14.151, de 12 de maio de 2021, que previa o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante a emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus (Covid), nos seguintes termos, em sua redação original:

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.

Parágrafo único. A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.

Com o advento da Lei nº 14.311, de 09 de março de 2022, assim ficou a redação do dispositivo:

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o referido agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI), deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial. (Redação dada pela Lei nº 14.311, de 2022)

§ 1º A empregada gestante afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição do empregador para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, sem prejuízo de sua remuneração. (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022)

§ 2º Para o fim de compatibilizar as atividades desenvolvidas pela empregada gestante na forma do § 1º deste artigo, o empregador poderá, respeitadas as competências para o desempenho do trabalho e as condições pessoais da gestante para o seu exercício, alterar as funções por ela exercidas, sem prejuízo de sua remuneração integral e assegurada a retomada da função anteriormente exercida, quando retornar ao trabalho presencial. (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022)

(...)

A controvérsia diz com a omissão legislativa acerca da responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada das atividades presenciais em face da emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota - ponto acerca do qual a lei silenciou.

No caso, o INSS foi excluído do feito, tendo à ação sido integrada a União - Fazenda Nacional.

Pois bem.

Esta Primeira Turma vinha decidindo pelo enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o referido período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações fossem compensadas, conforme o artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91.

Desta forma, o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às colaboradoras gestantes, afastadas por força legal e pelos efeitos da pandemia da Covid-19, enquanto durasse o afastamento, estava embasado pela especial proteção à maternidade conferida pela Constituição Federal, em seus artigos 7º, inciso XVIII e 201, inciso II, e com a Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho, razão por que a solução dada pela jurisprudência pátria para estas ações era no sentido de que o custo da proteção social preconizada pela Lei nº 14.151/2021 seria suportado pela coletividade, e não pelo empregador.

Isto porque as Leis nº 14.151/2021 e nº 14.311/2022, normas temporárias, criadas para que fossem aplicadas durante este excepcional período de saúde pública decorrente da pandemia de COVID-19, continham omissão normativa no que se refere à hipótese em que o trabalho remoto não se mostre possível, devido às atividades desenvolvidas pela empregada.

Nesta direção, os julgados desta Turma: TRF 4ª R.: AI nº 5050375-33.2021.4.04.0000/PR, Relator Desembargador Federal LEANDRO PAULSEN, 1ª T., por maioria, julgado em 20/04/2022 e AI nº 5039945-22.2021.4.04.0000/SC, Relatora Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, 1ª Turma, por maioria, j. 18 de maio de 2022.

Ocorre que, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça exarou orientação diversa, pela impossibilidade de enquadrar a situação tratada nos autos como salário-maternidade, benefício previdenciário regulamentado pelos artigos 71 a 73 da Lei nº 8.213/1991, ainda que o empregador não consiga alocar a empregada gestante em teletrabalho, sob pena de conceder benefício previdenciário sem previsão legal, sem a correspondente indicação da fonte de custeio (artigo 195, § 5º, da Constituição Federal) e em desrespeito ao equilíbrio financeiro e atuarial (artigo 201 da CF), conforme tem sido reiteradamente alegado pela União - Fazenda Nacional nestes processos.

Veja-se o seguinte precedente daquela Corte superior:

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E DE TERCEIROS. EPIDEMIA DE COVID. EMPREGADA GESTANTE. TRABALHO PRESENCIAL. AFASTAMENTO. REMUNERAÇÃO DEVIDA. BASE DE CÁLCULO. EXCLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça adotou o entendimento de que a Lei n. 14.151/2021 determina apenas o afastamento da gestante do trabalho presencial, não se tratando de suspensão ou interrupção do contrato de trabalho, mas de alteração na sua forma de execução, não sendo possível a compensação de valores pagos pelo empregador a título de remuneração à empregada com parcelas de contribuição previdenciária e de contribuição parafiscal, como se fosse salário-maternidade. 2. Agravo interno desprovido. (grifos) (STJ, AgInt no REsp nº 2.098.376/SC, Relator Ministro GURGEL DE FARIA, 1ª T., por unanimidade, j. em 13/05/2024, DJe 15/05/2024)

É o que se verifica dos recentes julgados das duas Turmas do STJ de competência tributária:

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E DE TERCEIROS. EPIDEMIA DE COVID. EMPREGADA GESTANTE. TRABALHO PRESENCIAL. AFASTAMENTO. REMUNERAÇÃO DEVIDA. BASE DE CÁLCULO. EXCLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. É impossível o enquadramento, como salário-maternidade, dos pagamentos realizados às empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, segundo as hipóteses da Lei 14.151/2021, enquanto durar o afastamento, para fins de compensação de tais valores com parcelas futuras de contribuições previdenciária e parafiscal devidas pela empresa. Com efeito, o referido diploma legal, posteriormente alterado pela Lei 14.311/2022, estabeleceu uma simples modificação extraordinária no modo de execução do contrato de trabalho, e não sua suspensão ou interrupção. 2. Entendimento firmado pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos REsps 2.038.269/PR, 2.053.818/CE, 2.081.467/SC e 2.095.404/SC. 3. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no REsp nº 2.118.735/PR, Relator Ministro SÉRGIO KUKINA, 1ª Turma, julgado em 27/5/2024, DJe de 3/6/2024)

TRIBUTÁRIO E PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS.
AFASTAMENTO DE EMPREGADAS GESTANTES DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19. NÃO CONFIGURAÇÃO DE LICENÇA-MATERNIDADE. INAPLICABILIDADE DO ART. 394-A, § 3º, DA CLT. COMPENSAÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. (...) 2. Ação originária movida para declarar a não incidência de contribuições destinadas à previdência social ou a terceiros durante o afastamento de empregadas gestantes e para reconhecer o direito ao salário-maternidade e sua compensação nas contribuições previdenciárias. 3. Lei 14.151/2021 determina o afastamento das empregadas gestantes das atividades presenciais, assegurando teletrabalho ou trabalho remoto durante a emergência de saúde pública, sem prejuízo da remuneração, permitindo a realocação em funções executáveis remotamente, sem prejuízo da remuneração. 4. Não enquadramento como licença-maternidade. A situação tratada não configura benefício previdenciário disciplinado pelos artigos 71 a 73 da Lei n. 8.213/1991. A concessão do benefício sem previsão legal e sem indicação da fonte de custeio viola o equilíbrio financeiro e atuarial (art. 201, CF). 5. A mencionada lei foi promulgada em resposta a uma situação excepcional, emergencial e temporária, e não trata de licença de trabalho ou percepção de salário-maternidade. 6. Durante a licença-maternidade ocorre a suspensão ou interrupção do contrato de trabalho, enquanto, na situação prevista pela Lei 14.311/2022, exige-se apenas adaptação na forma de execução das atividades. 7. As adaptações exigidas pela pandemia devem ser suportadas também pela iniciativa privada, justificando a medida prevista pela Lei 14.311/2022. 8. Agravo Interno provido para conhecer do Recurso Especial e dar-lhe provimento. (STJ, AgInt no REsp nº 2.099.021/PR, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, 2ª T., unânime, j. 18/06/2024, DJe 08/07/2024)

AGRAVO INTERNO. AFASTAMENTO. EMPREGADA GESTANTE. LEI N. 14.151/2021. ENQUADRAMENTO. LICENÇA MATERNIDADE. IMPOSSIBILIDADE.

I - Na origem, trata-se de mandado de segurança impetrado com a finalidade de ver reconhecido o direito de enquadrar, como salário-maternidade, os valores pagos às empregadas gestantes afastadas por força do disposto na Lei n. 14.151/2021, enquanto durar o respectivo afastamento, bem como o direito a não incidência de contribuições sobre a remuneração paga às gestantes afastadas, em razão da ausência de prestação de serviço.

II - A Fazenda Nacional logrou êxito em apontar de forma adequada a violação perpetrada pelo acórdão de origem. Outrossim, inaplicável ao caso a Súmula n. 7/STJ, além de estarem prequestionados dispositivos legais suficientes para a apreciação do recurso especial, em especial o art. 1º da Lei n. 14.151/2021.

III - A Lei n. 14.151/2021 teve como objetivo propor solução, durante a emergência de saúde pública decorrente da pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2, à situação das grávidas gestantes, determinando que ficassem em teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho à distância, sem prejuízo da remuneração. Posteriormente, a referida norma foi alterada pela Lei n. 14.311/2022, limitando o afastamento às grávidas gestantes que não tivessem completado o ciclo vacinal contra o agente infeccioso, assim como permitiu que aquelas que ainda não pudessem voltar ao trabalho presencial fossem realocadas em funções exequíveis por meio do trabalho remoto, também sem prejuízo à remuneração.

IV - Não é possível enquadrar a situação tratada nos autos na hipótese de licença-maternidade, benefício previdenciário disciplinado pelos arts. 71 a 73 da Lei n. 8.213/1991, ainda que pontualmente o empregador não consiga alocar a empregada gestante em teletrabalho, sob pena de conceder benefício previdenciário sem previsão legal, sem a correspondente indicação da fonte de custeio (art. 195, §5º, CF) e em desrespeito ao equilíbrio financeiro e atuarial (art. 201, CF). Ademais, a LC 101/2000, em seu art. 24, impede a concessão de benefício relativo à seguridade social, sem a devida indicação da fonte de custeio total.

V - O afastamento do trabalho presencial determinado pela Lei n. 14.311/2022 não se confunde com a licença-maternidade concedida às seguradas em razão da proximidade do parto ou da sua ocorrência, visto que nessa hipótese as empregadas efetivamente são afastadas de suas atividades, sejam elas presenciais ou não. Ou seja, durante a licença-maternidade ocorre a suspensão ou a interrupção do contrato de trabalho, enquanto na situação prevista pela Lei n. 14.311/2022 se exige apenas uma adaptação quanto à forma da execução das atividades pela empregada gestante.

VI - São inquestionáveis os desgastes sofridos por toda a sociedade em decorrência da pandemia provocada pelo vírus SARS-CoV-2, exigindo uma série de adaptações. As consequências e as adaptações são, por óbvio, indesejadas, mas devem ser suportadas tanto pela iniciativa privada quanto pelo Poder Público, e não exclusivamente por este, de modo que a providência determinada pela Lei n. 14.311/2021 é medida justificável e pertinente, sendo plenamente possível a sua implementação, sobretudo com o advento da possibilidade de alteração das funções exercidas pelas empregadas gestantes.

VII - Precedentes da Primeira do Turma do Superior Tribunal de Justiça: AgInt no REsp n. 2.098.376/SC, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 13/5/2024, DJe de 15/5/2024; REsp n. 2.038.269/PR, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 12/12/2023, DJe de 31/1/2024.

VIII - Agravo interno provido para conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento.

(STJ, AgInt no Recurso Especial nº 2.109.930/PR, 2ª T., Relator Ministro FRANCISCO FALCÃO, por unanimidade, julgado em 04/062024, DJ 06/06/2024)

Assim, curvo-me a este entendimento, passando a adotar a orientação exarada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Neste sentido, decidiu a sentença apelada, verbis:

"Pretende a parte autora a declaração do direito de enquadrar os afastamentos de empregadas gestantes de que trata a Lei nº 14.151/2021 como salário-maternidade, permitindo a compensação dos valores correspondentes na forma do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/1991.

A Lei nº 14.151/2021 não atribuiu à União a responsabilidade pelo pagamento da remuneração da empregada gestante no período de afastamento das atividades de trabalho presencial.

(...)

Não há, portanto, previsão legal para ampliar o enquadramento do salário-maternidade além dos 120 (cento e vinte) dias, tal como concebido no artigo 71 da Lei nº 8.213/91 ou no artigo 394-A da CLT, de modo a estender o benefício ao período de afastamento das atividades de trabalho presencial previsto na Lei nº 14.151/2021.

O que se verifica é que o objetivo da Lei nº 14.151/2021 foi regular as relações de trabalho, sem qualquer efeito previdenciário.

Quanto às incompatibilidades de realização das atividades laborais pelas empregadas gestantes em teletrabalho, tal questão deve ser resolvida no âmbito das relações de trabalho. Em não sendo possível o exercício de atividades à distância pela empregada gestante, o ônus deve ser suportado pelo empregador.

Nesse passo, não é possível o analogismo de comparar a situação ora analisada ao pagamento de salário maternidade para todo o período de afastamento, haja vista se tratar de situações completamente diversas.

Com efeito, as gestantes possuem o direito ao afastamento para a efetiva gestação da criança próximo ao parto.

Assim, não se afigura possível o pagamento do benefício previdenciário, com ressarcimento ao empregador, durante todo o período do afastamento pandêmico às gestantes, por ausência de legalidade quanto à concessão do salário maternidade fora dos parâmetros do artigo 71 da Lei nº 8.213/91.

O risco social, no caso, é do empregador, não havendo previsão legal que permita acolher a tese exposta na petição inicial de ampliação das hipóteses de salário maternidade às funcionárias gestantes.

Por fim, considerando que o valor pago à empregada gestante afastada de sua atividade presencial possui natureza remuneratória, aliado ao disposto no artigo 22, inciso I, da Lei nº 8.212/1991, resulta que há incidência sobre este valor de contribuição previdenciária e daquela devida a terceiros.

Dessa forma, o afastamento das empregadas gestantes em decorrência da pandemia não enseja a desoneração do pagamento das contribuições sociais relativas às remunerações."

Deve, portanto, ser mantida a sentença recorrida, com a improcedência do pedido, restando desprovido o apelo da parte autora.

Prequestionamento

O enfrentamento das questões apontadas em grau de recurso, e a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as embasam. Basta a apreciação das questões pertinentes de fato e de direito que lhe são submetidas (artigo 489, II, CPC) com argumentos jurídicos suficientes, ainda que não exaurientes.

Deixo de aplicar os dispositivos legais tidos como aptos a obter pronunciamento jurisdicional diverso do que até aqui foi declinado. Dessa forma, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa (artigo 1.026, § 2º, do CPC).

Ônus sucumbenciais

A sentença, no caso, condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC.

Nesta Corte, o apelo da autora foi desprovido.

Sucumbência recursal

Em razão do § 11 do artigo 85 do CPC, majoro em 10% o montante dos honorários advocatícios fixados em primeiro grau.

Exemplifico: tendo a verba honorária sido fixada pela sentença em 10%, os honorários serão de 11%.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004559199v57 e do código CRC 85dd9267.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH
Data e Hora: 23/7/2024, às 13:49:41


5003663-10.2021.4.04.7008
40004559199.V57


Conferência de autenticidade emitida em 31/07/2024 08:00:59.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gab. Desembargadora Federal Luciane A. Corrêa Münch - 5º andar - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3222 - Email: gluciane@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5003663-10.2021.4.04.7008/PR

RELATORA: Desembargadora Federal LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH

APELANTE: POSTO ROQUE VERNALHA LTDA (AUTOR)

APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)

EMENTA

TRIBUTÁRIO. COVID. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI Nº 14.151/21, ALTERADA PELA LEI Nº 14.311/22. OMISSÃO LEGISLATIVA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DO SALÁRIO. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE, para fins DE COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO EMPREGADOR. imPOSSIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.

1. Não é possível o enquadramento, como salário-maternidade, dos pagamentos realizados às empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus, em face da Lei nº 14.151/2021, enquanto durar o afastamento, para fins de compensação de tais valores com parcelas futuras de contribuições previdenciárias e devidas pela empresa.

2. A Lei nº 14.151/2021, posteriormente alterada pela Lei nº 14.311/2022, foi editada para regular situação excepcional, emergencial e temporária, e não trata de licença de trabalho ou percepção de salário-maternidade, não configurando o benefício previdenciário disciplinado pela Lei nº 8.213/1991.

3. A concessão de benefício sem previsão legal e sem indicação da fonte de custeio viola o equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência (art. 201 da CF). Entendimento firmado pelas duas Turmas de competência tributária do Superior Tribunal de Justiça.

4. Mantida a sentença de improcedência, e desprovido o apelo da parte autora, deve ser fixada a sucumbência recursal, com a majoração da verba honorária estipulada em desfavor da demandante (artigo 85, § 11, do CPC).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 22 de julho de 2024.



Documento eletrônico assinado por LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004559200v11 e do código CRC 6d669145.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH
Data e Hora: 23/7/2024, às 13:49:41


5003663-10.2021.4.04.7008
40004559200 .V11


Conferência de autenticidade emitida em 31/07/2024 08:00:59.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/07/2024 A 22/07/2024

Apelação Cível Nº 5003663-10.2021.4.04.7008/PR

RELATORA: Desembargadora Federal LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH

PRESIDENTE: Desembargador Federal MARCELO DE NARDI

PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO

APELANTE: POSTO ROQUE VERNALHA LTDA (AUTOR)

ADVOGADO(A): PRISCILA ALVES SEQUINEL DE ALMEIDA (OAB PR052956)

APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/07/2024, às 00:00, a 22/07/2024, às 16:00, na sequência 148, disponibilizada no DE de 01/07/2024.

Certifico que a 1ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 1ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH

Votante: Desembargadora Federal LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH

Votante: Juiz Federal ANDREI PITTEN VELLOSO

Votante: Desembargador Federal MARCELO DE NARDI

MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 31/07/2024 08:00:59.

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