Apelação Cível Nº 5040791-21.2017.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: TARCICIO MARQUES CARDOZO (AUTOR)
ADVOGADO: ERNANI PERES DOS SANTOS
APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada em face da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, postulando a parte autora a declaração de inexistência de relação jurídico-tributária que a obrigue ao pagamento de imposto de renda sobre as contribuições adicionais pagas à Fundação Banrisul de Seguridade Social, bem como a repetição do indébito tributário.
Sobreveio sentença cujo dispositivo contou com o seguinte teor:
Ante o exposto, julgo improcedente o pedido e extingo o processo com resolução do mérito, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora a arcar com as custas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios em favor da ré, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa pelo IPCA-E, com fundamento no art. 85, §§3º e 4º, III, do CPC.
Publique-se. Intimem-se.
Recorre a parte autora, sustentando, em síntese: que é indevida a incidência de imposto de renda sobre valores que não chegam a integrar o seu patrimônio, pois retidos na fonte.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
Sentença não sujeita à remessa necessária.
É o relatório.
VOTO
Conforme relatado na sentença: "O autor é aposentado e recebe benefício complementar pago pela Fundação Banrisul de Seguridade Social, entidade fechada de previdência privada. Apesar de receber o benefício, que foi custeado com as contribuições normais, está obrigado ao pagamento das contribuições extraordinárias para o suprimento do déficit, entendendo indevida a incidência de imposto de renda sobre valores que não chegam a integrar o seu patrimônio, pois retidos na fonte."
A sentença foi exarada nos seguintes termos:
O art. 19 da LC 109/01, que dispõe sobre o regime de previdência complementar, ao tratar do plano de benefícios das entidades fechadas de previdência privada, prevê que as contribuições destinadas à constituição de reservas terão como finalidade prover o pagamento de benefícios de caráter previdenciário, classificando-as em contribuições normais e extraordinárias (incisos I e II). As normais são destinadas ao custeio dos benefícios previstos no plano, enquanto as extraordinárias são direcionadas ao custeio de déficits, serviço passado e outras finalidades não incluídas nas contribuições normais.
O imposto de renda incide sobre o rendimento bruto auferido, ressalvadas as deduções previstas em lei (art. 3º, da Lei 7.713/88).
O art. 69 da LC 109/01 estabelece que "as contribuições vertidas para as entidades de previdência complementar, destinadas ao custeio dos planos de benefícios de natureza previdenciária, são dedutíveis para fins de incidência de imposto sobre a renda, nos limites e nas condições fixadas em lei" e que sobre as mesmas não incidem tributação (§1º).
O art. 4º, inciso V, da Lei 9.250/95, dispõe que, na determinação da base de cálculo sujeita à incidência mensal do imposto de renda, poderão ser deduzidas "as contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social".
Por sua vez, a base de cálculo do imposto de renda devido no ano-calendário corresponde à diferença entre as somas "de todos os rendimentos percebidos durante o ano-calendário, exceto os isentos, os não-tributáveis, os tributáveis exclusivamente na fonte e os sujeitos à tributação definitiva" das deduções relativas, entre outras, "às contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social" (art. 8º, II, alínea "e", da Lei 9.250/95).
Nos termos do art. 33 da Lei 9.250/95, "sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte e na declaração de ajuste anual os benefícios recebidos de entidade de previdência privada, bem como as importâncias correspondentes ao resgate das contribuições".
As deduções relativas às contribuições para entidades de previdência privada, no entanto, estão limitadas a 12% do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos, nos termos do que estabelece o art. 11 da Lei 9.532/97.
A limitação de 12% não é para os rendimentos auferidos da entidade de previdência privada, mas sim sobre o total dos rendimentos tributáveis recebidos.
Não existe bis in idem.
Num primeiro momento, o imposto incide sobre o rendimento total bruto auferido, podendo haver a dedução das contribuições extraordinárias vertidas, observado o limite dedutível. As contribuições extraordinárias não se destinam a constituir um fundo que reverterá na forma de benefícios ou resgate para o participante, sendo passível de nova incidência tributária. As contribuições extraordinárias destinam-se a cobrir o saldo negativo do plano. Tampouco importa se o plano está ou não obrigado ao pagamento de imposto de renda sobre as contribuições extraordinárias recebidas. As relações jurídicas são diversas, assim como os sujeitos passivos, a base material tributável e as alíquotas. O que é despesa para um sujeito passivo poderá, a critério do legislador, constituir renda tributável de outro.
Na verdade, o que a parte autora pretende é que sejam integralmente deduzidas do seu rendimento bruto as contribuições extraordinárias vertidas ao plano de previdência privada, o que depende de lei específica, nos termos do art. 150, §6º, da Constituição Federal, inexistente na espécie.
Por fim, afasto a alegação de que indevida a incidência de imposto de renda sobre determinado percentual descontado que não foi e não será convertido em renda para o autor. O autor optou por aderir a plano de previdência complementar por vontade própria, sendo incabível eximir-se do pagamento de imposto de renda incidente sobre verbas que decidiu aplicar em fundo de previdência complementar.
Ademais, a legislação não faz distinção entre os valores pagos a título de contribuição normal ou extraordinária para fins de incidência do imposto de renda. Assim, ultrapassado o limite dedutível de 12%, o restante deve ser normalmente tributado, sob pena de afronta ao princípio da estrita legalidade que rege o direito tributário, em especial as isenções.
Em caso análogo ao dos autos, decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA DAS PESSOAS FÍSICAS. RENDIMENTOS RECEBIDOS DE ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. PRETENSÃO DE SER CONSIDERADO SOMENTE O LÍQUIDO. DESCABIMENTO. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE A TOTALIDADE DOS RENDIMENTOS. POSSIBILIDADE APENAS DE DEDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO FORMADA POR TODOS OS RENDIMENTOS TRIBUTÁVEIS DAS CONTRIBUIÇÕES À ENTIDADE, OBSERVADO O LIMITE LEGAL DE 12% DO TOTAL DE RENDIMENTOS TRIBUTÁVEIS. 1. A pretensão da entidade autora é incluir na base de cálculo do imposto de renda somente o valor liquído recebido da entidade privada. 2. Os benefícios recebidos de entidades de previdência privada compõem a base de cálculo do imposto de renda, por se enquadrarem na regra geral do art. 8º, I, da Lei 9.250/95 e expressa previsão específica do art. 33 da mesma lei. 3. Os rendimentos tributáveis são incluídos base de cálculo do imposto de renda pelo seu valor bruto (art. 8º, I, da Lei 9.250/95 c/c art. 3º da Lei 7.713/88). 4. Inexiste fundamento legal para os benefícios serem considerados pelo seu líquido, ou seja, deduzidos das contribuições à própria entidade de previdência privada. 5. Redução da base de cálculo sem previsão legal seria inconstitucional, a teor do art 150, § 6º, da Constituição: "qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g". 6. Uma vez somados os benefícios da entidade de previdência privada aos demais rendimentos tributáveis, a base de cálculo do imposto de renda poderá ser reduzida pela dedução das contribuição a entidades de previdência privada, nos termos do art. 8º, II, "e", da Lei 7.713/88, desde que respeitado o limite de 12% dos rendimentos computados na base de cálculo (art. 11 da Lei 9.532/97). 6. Recurso Especial não provido. (REsp 1354409/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 01/06/2016) (grifei)
Não há razões para alteração do entendimento fixado na sentença, cuja fundamentação adoto como razões de decidir.
Em face do disposto no artigo 85, § 11, do novo Código de Processo Civil, majoro em 1% os honorários advocatícios fixados na sentença, devendo tal montante ser atualizado pelo IPCA-E a partir desta data.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por ALCIDES VETTORAZZI, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000371832v5 e do código CRC 9ffa6315.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5040791-21.2017.4.04.7100/RS
RELATOR: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI
APELANTE: TARCICIO MARQUES CARDOZO (AUTOR)
APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
VOTO DIVERGENTE
Trata-se de ação em que a parte autora requer a declaração de inexistência de relação jurídico-tributária que a obrigue ao pagamento de imposto de renda sobre as contribuiçõesextraordinárias pagas à Fundação Banrisul de Seguridade Social que superem o limite dedutível de 12%, bem como a repetição do indébito tributário.
O pedido foi julgado improcedente.
Recorre a parte autora postulando a reforma da decisão sob o argumento de que a contribuição extraordinária suportada pelo participante de plano de previdência complementar, em decorrência de apuração de déficits atuariais, nada mais é do que a recomposição da reserva matemática prejudicada pelas intempéries do mercado financeiro, de modo que haveria a ocorrência de bis in idem. Referiu, ainda, ser inviável que os participantes de fundo de pensão paguem imposto de renda sobre déficits do plano, uma vez que não haveria o acréscimo patrimonial exigido para a caracterização da hipótese de incidência do imposto de renda.
Passo à análise.
Da necessidade de acréscimo patrimonial para a incidência de IR
A competência atribuída ao legislador ordinário para instituir o Imposto de Renda abrange os fatos que importem na percepção de "renda e proventos de qualquer natureza" - art. 153, inciso III, da Constituição Federal.
A exemplo dos demais conceitos empregados para outorgar competências impositivas, os de renda e proventos de qualquer natureza, utilizados no artigo 153, III, são conceitos constitucionais, que devem ser determinados mediante a exegese da Lei Maior, efetivada pela doutrina ou pelo legislador, com a ressalva de que a interpretação acolhida sempre estará sujeita a controle pelo Poder Judiciário.
Para a determinação desses conceitos há um aspecto de extremo relevo: tanto a renda quanto os proventos pressupõem, necessariamente, a existência de acréscimo patrimonial. Não há renda e tampouco proventos de qualquer natureza sem acréscimo patrimonial (STF, Pleno, RE 117.887, rel. Min. Carlos Velloso, 2.1993), ou seja, sem alteração positiva do patrimônio (num determinado lapso temporal).
Conscientes de tal fato, os elaboradores do Código Tributário Nacional acabaram por reconduzir os conceitos de renda e proventos de qualquer natureza ao de acréscimo patrimonial, ao definirem "renda" como "o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos" e "proventos de qualquer natureza" como "os acréscimos patrimoniais não compreendidos" na noção de renda(art. 43, I e II), in verbis:
Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
E, cabe recordar, a expressão "proventos de qualquer natureza" constitui "fórmula ampla de que lançou mão o constituinte para evitar controvérsias sobre o conceito de renda" (BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11ª ed. Atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 283), fato que confere importância ainda maior à correlação estabelecida pelo CTN entre, de um lado, a renda e os proventos de qualquer natureza e, de outro, os acréscimos patrimoniais.
A doutrina, ao investigar o conteúdo dos conceitos constitucionais de renda e de proventos de qualquer natureza, vem a corroborar a compatibilidade das definições do CTN (inspiradas na teoria do acréscimo patrimonial) com a Constituição. Como preleciona Ricardo Lobo Torres: "O que se não puder definir como renda, dentro do conceito lato que a entende como acréscimo do patrimônio em determinado lapso de tempo, não poderá constituir fato gerador do tributo, ainda que o eleja o legislador" (Sistemas constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 267). De acordo com Roque Carrazza: "renda e proventos de qualquer natureza são disponibilidades de riqueza nova, vale dizer, acréscimos patrimoniais experimentados pelo contribuinte num dado período" (Curso de Direito Constitucional Tributário. 18ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 611, nota 194). Hugo de Brito Machado, nessa linha, afirma que: "Não há renda, nem provento, sem que haja acréscimo patrimonial, pois o CTN adotou expressamente o conceito de renda como acréscimo" (Curso de direito tributário. 21ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 274). E, finalmente, Henry Tilbery arremata asseverando que a adoção da abrangente fórmula "proventos de qualquer natureza" representa, "sem sombra de dúvida, a aplicação da teoria do acréscimo patrimonial" (in: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Comentários ao Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 1998. v. 1, p. 268).
Tais ponderações permitem que, mesmo sem adentrar na querela acerca dos conteúdos específicos dos conceitos constitucionais de renda e proventos de qualquer natureza, o intérprete parta de uma premissa de extrema valia para a solução dos casos práticos, que já foi indicada anteriormente: não haverá renda e tampouco proventos se não houver acréscimo patrimonial (ou, se se preferir, riqueza nova). Consequentemente, será ilegítima qualquer pretensão de cobrança do IR se não houver acréscimo patrimonial num dado período.
Da contribuição extraordinária para a Fundação Banrisul de Seguridade Social
A sentença recorrida entendeu que o benefício auferido pela parte autora consubstancia, em sua integralidade, acréscimo patrimonial, de modo que o imposto de renda pode incidir sobre o rendimento bruto, e as contribuições vertidas ao plano - inclusive a extraordinária - são despesas dedutíveis, mas apenas dentro do limite legal de 12%.
De fato, a legislação pátria estabelece que as contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no país são despesas dedutíveis da base de cálculo do imposto de renda, até o limite de 12% (doze por cento) do total dos rendimentos computados na determinação de tal base de cálculo:
LEI Nº 9.250, DE 26 DE DEZEMBRO DE 1995
Art. 8º A base de cálculo do imposto devido no ano-calendário será a diferença entre as somas:
I - de todos os rendimentos percebidos durante o ano-calendário, exceto os isentos, os não-tributáveis, os tributáveis exclusivamente na fonte e os sujeitos à tributação definitiva;
II - das deduções relativas:
(...)
e) às contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social;
LEI Nº 9.532, DE 10 DE DEZEMBRO DE 1997:
Art. 11. As deduções relativas às contribuições para entidades de previdência privada, a que se refere a alínea e do inciso II do art. 8o da Lei no 9.250, de 26 de dezembro de 1995, e às contribuições para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual - Fapi, a que se refere a Lei no 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da própria pessoa física, ficam condicionadas ao recolhimento, também, de contribuições para o regime geral de previdência social ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observada a contribuição mínima, e limitadas a 12% (doze por cento) do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos. (Redação dada pela Lei nº 10.887, de 2004)
A previsão legal decorre de opção legislativa de se tributar o valor que será recebido posteriormente a título de benefício, ao invés da contribuição destinada à formação da reserva matemática.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o imposto de renda deve incidir sobre a totalidade dos rendimentos recebidos de entidades de previdência privada, admitindo-se a dedução da base de cálculo das contribuições vertidas à entidade, respeitado o limite de 12%:
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA DAS PESSOAS FÍSICAS. RENDIMENTOS RECEBIDOS DE ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. PRETENSÃO DE SER CONSIDERADO SOMENTE O LÍQUIDO. DESCABIMENTO. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE A TOTALIDADE DOS RENDIMENTOS. POSSIBILIDADE APENAS DE DEDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO FORMADA POR TODOS OS RENDIMENTOS TRIBUTÁVEIS DAS CONTRIBUIÇÕES À ENTIDADE, OBSERVADO O LIMITE LEGAL DE 12% DO TOTAL DE RENDIMENTOS TRIBUTÁVEIS.
1. A pretensão da entidade autora é incluir na base de cálculo do imposto de renda somente o valor liquído recebido da entidade privada.
2. Os benefícios recebidos de entidades de previdência privada compõem a base de cálculo do imposto de renda, por se enquadrarem na regra geral do art. 8º, I, da Lei 9.250/95 e expressa previsão específica do art. 33 da mesma lei.
3. Os rendimentos tributáveis são incluídos base de cálculo do imposto de renda pelo seu valor bruto (art. 8º, I, da Lei 9.250/95 c/c art. 3º da Lei 7.713/88).
4. Inexiste fundamento legal para os benefícios serem considerados pelo seu líquido, ou seja, deduzidos das contribuições à própria entidade de previdência privada.
5. Redução da base de cálculo sem previsão legal seria inconstitucional, a teor do art 150, § 6º, da Constituição: "qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g".
6. Uma vez somados os benefícios da entidade de previdência privada aos demais rendimentos tributáveis, a base de cálculo do imposto de renda poderá ser reduzida pela dedução das contribuição a entidades de previdência privada, nos termos do art. 8º, II, "e", da Lei 7.713/88, desde que respeitado o limite de 12% dos rendimentos computados na base de cálculo (art. 11 da Lei 9.532/97).
6. Recurso Especial não provido.
(REsp 1354409/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 01/06/2016)
A situação em apreço, contudo, é diversa.
As contribuições para os planos de entidades de previdência privada objetivam, como regra, a formação de uma reserva matemática para o pagamento dos benefícios. São os casos da "contribuição normal" e da "contribuição adicional" (arts. 19, I a IV, do Regulamento do Plano de Benefícios I, da Fundação Banrisul de Seguridade Social - disponível em http://www.fbss.org.br/dados/docs/regulamento_PBI_mudanca_PREVIC.pdf).
Por outro lado, a contribuição extraordinária para a Fundação Banrisul de Seguridade Social, prevista nos artigos 19, VII, e 26 do Regulamento do Plano de Benefícios I, é destinada "ao custeio de déficits, serviço passado e outras finalidades não incluídas na contribuição normal" (art. 1º, parágrafo segundo, do Regulamento do Plano de Benefícios I, da Fundação Banrisul de Seguridade Social).
No caso dos autos, discute-se exatamente a hipótese de contribuição extraordinária cobrada em razão dos déficits apresentados pelo plano, que encontra previsão também no art. 21 da Lei Complementar 109/2001:
Art. 21. O resultado deficitário nos planos ou nas entidades fechadas será equacionado por patrocinadores, participantes e assistidos, na proporção existente entre as suas contribuições, sem prejuízo de ação regressiva contra dirigentes ou terceiros que deram causa a dano ou prejuízo à entidade de previdência complementar.
§ 1o O equacionamento referido no caput poderá ser feito, dentre outras formas, por meio do aumento do valor das contribuições, instituição de contribuição adicional ou redução do valor dos benefícios a conceder, observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador.
§ 2o A redução dos valores dos benefícios não se aplica aos assistidos, sendo cabível, nesse caso, a instituição de contribuição adicional para cobertura do acréscimo ocorrido em razão da revisão do plano.
§ 3o Na hipótese de retorno à entidade dos recursos equivalentes ao déficit previsto no caput deste artigo, em conseqüência de apuração de responsabilidade mediante ação judicial ou administrativa, os respectivos valores deverão ser aplicados necessariamente na redução proporcional das contribuições devidas ao plano ou em melhoria dos benefícios.
Trata-se, portanto, de quantia que não visa à formação de reserva matemática, mas à mera recomposição da parcela que foi perdida. Em verdade, configura, por via transversa, redução temporária do benefício percebido, já que a simples redução de valores é vedada pelo art. 21, § 2º, da LC 109/2001.
Reforça esse entendimento o fato de a contribuição extraordinária ser descontada na folha de pagamento do benefício, de modo que o assistido não possui disponibilidade econômica nem jurídica do numerário.
Por todo o exposto, afigura-se evidente que a quantia paga à Fundação Banrisul de Seguridade Social a título de contribuição extraordinária instituída em razão de déficit do plano não configura acréscimo patrimonial, de modo que os contribuintes possuem direito à dedução do valor correlato da base de cálculo do imposto de renda.
Portanto, o recurso interposto pela parte autora merece provimento, a fim de reformar a sentença recorrida e julgar procedentes os pedidos iniciais para:
(a) declarar a impossibilidade de inclusão na base de cálculo do imposto de renda das quantias pagas à Fundação Banrisul de Seguridade Social a título de contribuição extraordinária instituída em razão de déficit do plano, independentemente do limite de 12%;
(b) condenar a parte ré à restituição do imposto de renda pago sobre essas quantias, observados a prescrição quinquenal e os limites do pedido.
O indébito deverá ser atualizado pela SELIC, desde a data do recolhimento.
A restituição deverá ocorrer mediante precatório ou requisição de pequeno valor, nos termos do art. 100 da Constituição da República.
Na liquidação, deverá ser levada em conta eventual dedução das contribuições extraordinárias já realizada com base no art. 8º, II, alínea "e", da Lei 9.250/1995 c/c o art. 11 da Lei 9.532/1997.
Ademais, eventual restituição administrativa, total ou parcial, deverá ser considerada na fase de cumprimento, consoante a ratio da Súmula 394 do STJ ("É admissível, em embargos à execução, compensar os valores de imposto de renda retidos indevidamente na fonte com os valores restituídos apurados na declaração anual").
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso.
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Apelação Cível Nº 5040791-21.2017.4.04.7100/RS
RELATOR: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI
APELANTE: TARCICIO MARQUES CARDOZO (AUTOR)
ADVOGADO: ERNANI PERES DOS SANTOS
APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
EMENTA
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA pessoa física. RENDIMENTOS RECEBIDOS DE ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. dedução da base de cálculo das contribuições vertidas à entidade. AFASTAMENTO DO LIMITE LEGAL DE 12%. CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA. POSSIBILIDADE.
1. A competência atribuída ao legislador ordinário para instituir o Imposto de Renda abrange os fatos que importem na percepção de "renda e proventos de qualquer natureza" - art. 153, inciso III, da Constit.uição Federal.
2. Tanto a renda quanto os proventos pressupõem, necessariamente, a existência de acréscimo patrimonial. Não há renda e tampouco proventos de qualquer natureza sem acréscimo patrimonial (STF, Pleno, RE 117.887, rel. Min. Carlos Velloso, 2.1993), ou seja, sem alteração positiva do patrimônio (num determinado lapso temporal).
3. A legislação pátria - art. 11 da Lei nº 9.532/97 c/c art. 8º da Lei nº 9.250/95 - estabelece que as contribuições para as entidades de previdência privada domiciliadas no país são despesas dedutíveis da base de cálculo do imposto de renda, até o limite de 12% (doze por cento) do total dos rendimentos computados na determinação de tal base de cálculo.
4. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o imposto de renda deve incidir sobre a totalidade dos rendimentos recebidos de entidades de previdência privada, admitindo-se a dedução da base de cálculo das contribuições vertidas à entidade, respeitado o limite de 12% (REsp 1354409/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 01/06/2016).
5. As contribuições para os planos de entidades de previdência privada objetivam, como regra, a formação de uma reserva matemática para o pagamento dos benefícios A situação dos autos mostra-se diversa, já que se discute a hipótese de contribuição extraordinária cobrada em razão dos déficits apresentados pelo plano.
6. A contribuição extraordinária é quantia que não visa à formação de reserva matemática, mas à mera recomposição da parcela que foi perdida. Em verdade, configura, por via transversa, redução temporária do benefício percebido, já que a simples redução de valores é vedada pelo art. 21, § 2º, da LC 109/2001.
7. Afigura-se evidente que a quantia paga à Fundação Banrisul de Seguridade Social a título de contribuição extraordinária não configura acréscimo patrimonial, de modo que os contribuintes possuem direito à dedução do valor correlato da base de cálculo do imposto de renda independentemente do limite de 12%.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, vencido o relator, decidiu DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, VENCIDO TAMBÉM O DES. FEDERAL RÔMULO PIZZOLATTI, NOS TERMOS DO VOTO DO JUIZ FEDERAL ANDREI PITTEN VELLOSO, QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de julho de 2018.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/06/2018
Apelação Cível Nº 5040791-21.2017.4.04.7100/RS
RELATOR: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI
PRESIDENTE: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI
PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO
APELANTE: TARCICIO MARQUES CARDOZO (AUTOR)
ADVOGADO: ERNANI PERES DOS SANTOS
APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/06/2018, na seqüência 464, disponibilizada no DE de 04/06/2018.
Certifico que a 2ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Após o voto do Relator no sentido de negar provimento à apelação, no que foi acompanhado pelo Des. Federal Rômulo Pizzolatti, e da divergência inaugurada pelo Juiz Federal ANDREI PITTEN VELLOSO no sentido de dar provimento ao recurso, foi sobrestado o julgamento para cumprimento do art. 942 do CPC, em sessão a ser designada, com o quórum legal.
Votante: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI
Votante: Juiz Federal ANDREI PITTEN VELLOSO
Votante: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Secretária
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/07/2018
Apelação Cível Nº 5040791-21.2017.4.04.7100/RS
RELATOR: Juiz Federal ALCIDES VETTORAZZI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES
SUSTENTAÇÃO ORAL: ERNANI PERES DOS SANTOS por TARCICIO MARQUES CARDOZO
APELANTE: TARCICIO MARQUES CARDOZO (AUTOR)
ADVOGADO: ERNANI PERES DOS SANTOS
APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído no 1º Aditamento do dia 05/07/2018, na seqüência 21, disponibilizada no DE de 22/06/2018.
Certifico que a 2ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Prosseguindo no julgamento, a 2ª Turma, por maioria, vencido o relator, decidiu DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, VENCIDO TAMBÉM O DES. FEDERAL RÔMULO PIZZOLATTI, NOS TERMOS DO VOTO DO JUIZ FEDERAL ANDREI PITTEN VELLOSO, QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Secretária
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