APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000268-90.2015.4.04.7114/RS
RELATOR | : | OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA |
APELANTE | : | HUBERTO KIRCHHEIM |
ADVOGADO | : | RALF WERNER KIRCHHEIM |
APELANTE | : | UNIÃO - FAZENDA NACIONAL |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
TRIBUTÁRIO. IRPF. PERCEPÇÃO ACUMULADA DE RENDIMENTOS. REGIME DE COMPETENCIA. JUROS DE MORA. NATUREZA INDENIZATORIA. DANO MORAL. INOCORRENCIA.
1. A tributação dos valores que são pagos de uma só vez não pode se dar sobre o montante total acumulado, sob pena de ferir os princípios constitucionalmente garantidos da isonomia tributária (art. 150, II, da CF/88) e da capacidade contributiva (§ 1º do art. 145 da CF/88).
2. Os juros de mora incidentes sobre parcelas reconhecidas judicialmente não estão sujeitos ao imposto de renda, consoante entendimento consolidado pela Corte Especial deste Tribunal, nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade nº 5020732-11.2013.404.0000/TRF, em sessão de 24-10-2013, quando, por maioria, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/1988 e do art. 43, inciso II, § 1º, do Código Tributário Nacional, Lei nº 5.172/1966.
3. Não restando comprovada a ocorrência de dano moral e sua extensão, não há como se presumir a sua existência.
4. Remessa oficial e apelação da União desprovidas, provido parcialmente o apelo da parte autora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da União e à remessa oficial e dar parcial provimento ao apelo da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 12 de abril de 2016.
Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8210547v3 e, se solicitado, do código CRC 3559E4FC. | |
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Signatário (a): | Otávio Roberto Pamplona |
Data e Hora: | 13/04/2016 15:42 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000268-90.2015.4.04.7114/RS
RELATOR | : | OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA |
APELANTE | : | HUBERTO KIRCHHEIM |
ADVOGADO | : | RALF WERNER KIRCHHEIM |
APELANTE | : | UNIÃO - FAZENDA NACIONAL |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada em face da União, questionando a parte autora a incidência do imposto de renda sobre os valores recebidos acumuladamente em ação judicial previdenciária, objeto da execução fiscal n.º 5006369-51.2012.4.04.7114, com a exclusão do seu nome do CADIN e a concessão de danos morais.
Sentenciando, o magistrado a quo assim decidiu:
Ante o exposto, nos termos da fundamentação, julgo PROCEDENTE EM PARTE o pedido formulado pela parte autora, nos termos do art. 269, inciso I do CPC, para o efeito de:
a) declarar direito da parte autora à aplicação do regime de competência no cálculo de eventual imposto de renda devido, incidente sobre os valores recebidos de forma acumulada na ação previdenciária n.º 2004.71.00.033336-9/RS (principal e juros de mora) e, desse modo, promover à retificação do crédito objeto da CDA nº 00112002191-76 (Execução Fiscal 5006369-51.2012.404.7114), observando-se os parâmetros estabelecidos na fundamentação e utilizados os elementos disponíveis nos autos, sem prejuízo de diligências complementares, a cargo do Fisco;
b) condenar a União - Fazenda Nacional a retificação do crédito objeto da CDA nº 00112002191-76 (Execução Fiscal 5006369-51.2012.404.7114), devendo o Imposto de Renda Pessoa Física - IRPF eventualmente devido sobre a quantia recebida em atraso ser calculado nos termos do decidido nesta sentença, com a aplicação, caso pertinente, da multa de ofício pela omissão de rendimentos, nos termos da fundamentação.
Traslade-se cópia desta sentença à execução fiscal 5006369-51.2012.404.7114, que, ad cautelam, deverá permanecer suspensa até o trânsito em julgado desta ação.
Considerando o proveito econômico deste feito e o trabalho desenvolvido nos autos, condeno a União ao pagamento de honorários advocatícios em favor da autora, os quais fixo em 5% (cinco por cento) do valor da causa, atualizado pelo IPCA-E, forte no art. 20, § 4º, do CPC, considerando a sucumbência parcial, mas não equivalente.
Espécie sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 475, inciso I, do CPC.
A União apela, defendendo a adoção do regime de caixa, ao argumento de que Não se pode negar que a demandante somente teve estas verbas disponibilizadas quando da liberação do alvará nos autos da reclamatória proposta, não obstante as mesmas correspondessem a valores mensais que lhe deixaram de ser pagos. São situações às quais a legislação tributária dá tratamento diferenciado, pela simples razão de que o fato gerador do tributo, em cada uma delas, ocorreu em momentos distintos. Não há falar, pois, em violação ao princípio constitucional da igualdade. Postula a reforma da sentença, com a exclusão dos honorários advocatícios, na esteira da legislação de regência e dos precedentes que colaciona.
A parte autora também recorre, postulando o reconhecimento do direito à não incidência do imposto de renda sobre os juros moratórios, dada a sua natureza remuneratória; a ocorrência de dano moral, ao argumento de que Danos morais: não vão contra o exercício regular do direito, mas sim ao total desconhecimento do autor sobre sua notificação, sobre o conhecimento de que possui pendenga junto à Receita Federal e o que poderia ocasionar, nada tendo sido comunicado, passando vergonha em agência bancária do Banco do Brasil em Lajeado, eis que havia problemas na emissão de cheques e, ainda mais grave, problemas e humilhações sofridos e surgidos entre familiares, inclusive, quando da não possibilidade de venda de terreno por herdeiros do falecido sogro devido a seus problemas, eis que dinheiro para compra, conforme já contratado pelo comprador, seria proveniente do programa Minha Casa Minha Vida junto à CEF de Roca Sales e agente. Dinheiro este já aprovado para aquele negócio. Ressalte-se ainda que o recorrente é pessoa de bem e correta e por demais conhecida na pequena localidade, até por ser pastor aposentado e tendo sido pastor presidente da IECLB, sede em Porto Alegre, por oito anos, fato que repercutiu no mei comunitário de forma que o deixou envergonhado e profundamente abalado; a majoração dos honorários advocatícios, pleiteando a reforma da sentença.
Foram juntadas contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Constou da sentença:
A execução fiscal relacionada tem por objeto a realização de crédito de IRPF retratado na CDA n. 00112002191-76, insurgindo-se o contribuinte quanto à incidência do imposto de renda com a aplicação do regime de caixa, sobre os rendimentos recebidos acumuladamente em ação previdenciária.
Analisando os documentos anexados aos autos, percebe-se que a parte autora recebeu em janeiro/2008, judicialmente, a quantia de R$ 48.074,30 (evento 50 - OUT2 - pg. 22), valores levantados em 31/01/2008 (R$ 48.197,22, com retenção de IR R$ 1.445,92 - e50-OUT2-pg. 26).
Por ocasião da declaração do IR, o montante recebido na ação previdenciária de revisão de aposentadoria foi informado na declaração de ajuste como isento (R##data###160;41.931,50 - Evento13/PROCADM3/fl. 20), o que foi entendido pelo Fisco como omissão de rendimentos tributáveis e ocasionando a constituição do crédito tributário de R$ 21.416,04, consubstanciado na Notificação de Lançamento n.º 2009/355053539159697, fato que deu origem ao crédito tributário hostilizado.
E conforme documento juntado no evento 13/PROCADM3/fls. 89/88, o autor recebeu intimação da Receita Federal para pagamento do valor de R$ 21.669,19, com vencimento em 30/03/2012, decorrente do débito apurado no ano base 2008, exercício 2009. Verifica-se, ainda, que o autor apresentou impugnação ao auto de infração ou notificação de lançamento 2009/355053539159697 sustentando a (a) não ocorrência de omissão, (b) não incidência do IR sobre juros moratórios, (c) aplicação da Instrução Normativa 1.127/2011, (d) aplicação das decisões do STJ e STF sobre aplicação do IR regime de competência. O recurso não foi conhecido e o débito foi encaminhado para inscrição em dívida ativa.
Da prescrição
Considerando que a declaração realizada pelo autor se refere ao ano-calendário/exercício 2008/2009, a notificação do lançamento se deu em 31/01/2012, a inscrição em dívida ativa em 12/06/2012 e o ajuizamento da execução fiscal em 09/08/2012, não há falar em prescrição.
Da incidência mês a mês do imposto de renda
Referentemente à incidência do imposto de renda sobre a totalidade dos rendimentos recebidos acumuladamente, assim dispõe o art. 43 do CTN:
" Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II, § 1º e 2º - (Omissis)."
O art. 46 da Lei nº 8.541/92, por seu turno, ao tratar do IRPF, determina:
" Art. 46. O imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos pagos em cumprimento de decisão judicial será retido na fonte pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento, no momento em que, por qualquer forma, o rendimento se torne disponível para o beneficiário.
§ 1º (Omissis).
§ 2° Quando se tratar de rendimento sujeito à aplicação da tabela progressiva, deverá ser utilizada a tabela vigente no mês de pagamento."
Por sua vez, os artigos 12 da Lei n. 7.713/88 e 56 do Decreto nº 3.000/1999 estabelecem que, quando os rendimentos forem recebidos acumuladamente, o imposto incidirá no mês do recebimento ou crédito, sobre o total dos rendimentos.
Não obstante a literalidade destes últimos dispositivos, devem estes ser interpretados em consonância com os princípios insculpidos na Constituição Federal.
No caso em tela, percebe-se que a parte autora percebeu seus rendimentos de forma acumulada, em valor que não representa a sua renda mensal. Em razão de tal circunstância, acabou sofrendo tributação maior do que a de seus pares, os quais obtiveram as parcelas integrais de seus salários na época correta.
Ora, todos os referidos contribuintes encontravam-se ou, ao menos, deveriam se encontrar em situação análoga, o que não poderia dar ensejo a um tratamento tributário distinto, discriminatório inclusive do sujeito já outrora lesado pelo Poder Público.
Dessa forma, a incidência do imposto de renda tal como pugnado pela Fazenda Nacional ofende o princípio da isonomia tributária, insculpido no art. 150, II, da CF.
Por outro lado, cumpre observar que o IRPF deve ser calculado de forma graduada, por força do princípio da capacidade contributiva, que, conforme ensina Regina Helena Costa, "expressa aquela aptidão de contribuir na medida das possibilidades econômicas de determinada pessoa" (COSTA, Regina Helena. Imposto de Renda e Capacidade contributiva. In: VELLOSO, Carlos Mário da Silva; ROSAS, Roberto e do AMARAL, Antônio Carlos Rodrigues. Princípios Constitucionais Fundamentais. São Paulo: Lex, 2005, p. 876).
Não é o que ocorreu no caso dos autos, em que o montante tributado não corresponde à capacidade contributiva da parte autora.
Sobre o tema, faço referência às palavras do douto Hugo de Brito Machado:
"O beneficiário do pagamento feito de uma só vez, de rendimentos mensais que se acumularam contra a sua vontade, em decorrência de ato ilícito praticado pela fonte pagadora, evidentemente não tem capacidade contributiva maior do que aquela que teria se houvesse recebido, mês a mês, os seus rendimentos. Nada justifica, portanto, o agravamento do ônus.
(Machado, Hugo de Brito. Imposto de Renda na Fonte e Rendimentos mensais acumulados. In Martins, Ives Gandra da Silva e Peixoto, Marcelo Magalhães. Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza - questões pontuais do curso da APET. São Paulo: MP, 2006, p. 181)
Assim, a tributação dos valores referentes à concessão de valores que são pagos de uma só vez não pode se dar sobre o montante total acumulado, sob pena de ferir os princípios constitucionalmente garantidos da isonomia tributária (art. 150, II, da CF/88) e da capacidade contributiva (§ 1º do art. 145 da CF/88).
Este tem sido o entendimento tanto do Superior Tribunal de Justiça quanto deste Tribunal, in verbis:
TRIBUTÁRIO - AGRAVO REGIMENTAL - IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA - BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO PAGO EM ATRASO - REGIME DE COMPETÊNCIA - ENTENDIMENTO CONSOLIDADO EM RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (RESP 1.118.429/SP) - REPERCUSSÃO GERAL - SOBRESTAMENTO DO FEITO - IMPOSSIBILIDADE - RESERVA DE PLENÁRIO - INAPLICABILIDADE.
1. Em se tratando de benefício previdenciário pago a destempo e acumuladamente, a incidência do imposto de renda deve observar as tabelas e alíquotas vigentes à época em que os valores deveriam ter sido adimplidos, não sendo legítima a cobrança do IR com parâmetro no montante global pago extemporaneamente. Entendimento consolidado em recurso repetitivo (REsp 1.118.429/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 24.3.2010, DJe 14.5.2010).
2. Decidida a questão jurídica sob o enfoque da legislação federal, sem qualquer juízo de incompatibilidade vertical com a Constituição Federal, é inaplicável a regra da reserva de plenário prevista no art. 97 da Carta Magna. Precedentes.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 325.171/RO, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/10/2013, DJe 24/10/2013)
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. INCIDÊNCIA SOBRE JUROS DE MORA. PERCEPÇÃO ACUMULADA DE RENDIMENTOS. REGIME DE COMPETÊNCIA E NÃO DE CAIXA. 1. O imposto de renda pessoa física somente incide sobre rendimentos ou proventos, ou seja, sobre a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica que não tenha natureza indenizatória. 2. Os juros de mora decorrentes de decisão judicial condenatória possuem natureza indenizatória, pelo que não incide o imposto de renda. 3. A incidência do imposto de renda sobre valores recebidos de forma acumulada, por força de decisão judicial, não se dá pelo total percebido, indiscriminadamente. Nessa hipótese aplicam-se as tabelas e as alíquotas da época em que o contribuinte deveria ter recebido as parcelas correspondentes. Precedentes do STJ e desta Corte. 4. O imposto de renda pessoa física - IRPF é tributo cujo fato gerador é complexivo, motivo por que impõe a lei a obrigatoriedade da declaração de ajuste pelo contribuinte. Nessa sistemática, as retenções na fonte são meras antecipações do pagamento do imposto presumivelmente devido, a ser apurado em declaração de ajuste anual, apresentada sempre no exercício financeiro seguinte ao da percepção dos rendimentos. 5. Para fins de identificar o imposto de renda sobre a verba recebida acumuladamente (por força de decisão judicial, como reclamatória trabalhista ou ação previdenciária) pelo "regime de competência" (e não pelo "regime de caixa"), a incidência do tributo deve ocorrer nas datas respectivas, obedecidas as faixas e alíquotas da tabela progressiva do IRPF da época, apurando-se o valor do imposto de renda através do refazimento da declaração de ajuste anual do exercício respectivo. E este valor do imposto de renda, apurado pelo regime de competência e em valores originais (porque a base de cálculo também está em valores originais), deve ser corrigido (até a data da retenção na fonte sobre a totalidade de verba acumulada) pelo mesmo fator de atualização monetária dos valores recebidos acumuladamente (como, em ação trabalhista, o FACDT - fator de atualização e conversão dos débitos trabalhistas; em ação previdenciária, pelo índice nesta fixado), como forma de preservar a expressão monetária da verba percebida e evitar uma distorção indevida na tributação do imposto de renda. 6. Em outras palavras. A base de cálculo do imposto de renda não se altera pela decisão judicial que determinou que a incidência do IRPF se dê pelo "regime de competência" e não pelo "regime de caixa". Apenas se distribui o valor recebido acumuladamente (em valores originais) aos exercícios respectivos. E o IRPF apurado (também em valores originais), conforme as declarações de ajuste anual respectivas, deve sofrer a mesma correção monetária aplicada à verba acumulada (até a data da retenção na fonte sobre a totalidade de verba acumulada). (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5013768-13.2011.404.7100, 2ª TURMA, Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 01/04/2013)
IMPOSTO DE RENDA. PESSOA FÍSICA. JUROS MORATÓRIOS. NATUREZA INDENIZATÓRIA. Tem o contribuinte do imposto de renda pessoa física o direito de obter a restituição do que recolhido a título de imposto de renda sobre juros moratórios legais recebidos pelo atraso no pagamento de verbas remuneratórias, salariais ou previdenciárias, em razão da sua natureza indenizatória, conforme entendimento assentado pela Corte Especial deste Tribunal na Argüição de Inconstitucionalidade nº 5020732-11.2013.404.0000. IMPOSTO DE RENDA. PESSOA FÍSICA. VALORES RECEBIDOS ACUMULADAMENTE. REGIME DE COMPETÊNCIA. Tem o contribuinte do imposto de renda pessoa física o direito de recalcular o imposto de renda sobre os valores recebidos acumuladamente, a título de verbas trabalhistas, observado o "regime de competência", para efeito de obter a restituição do que foi recolhido a mais por força da aplicação do "regime de caixa" ou pela sistemática de cálculo prevista no art. 12-A, da Lei nº 7.713, de 1988. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5014748-62.2013.404.7108, 2ª TURMA, Des. Federal RÔMULO PIZZOLATTI, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 13/05/2014)
Refira-se, por oportuno, decisão proferida pela Corte Especial deste Tribunal que, em sessão de 22/10/2009, apreciou a Arguição de Inconstitucionalidade nº 2002.72.05.000434-0/SC, in verbis:
ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. TRIBUTÁRIO. ART. 12 DA LEI N° 7.713/88. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IMPOSTO DE RENDA. RETENÇÃO NA FONTE. PERCEPÇÃO ACUMULADA. INCIDÊNCIA MENSAL. PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. REGIME DE COMPETÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE SEM REDUÇÃO DE TEXTO. 1. Arguição de Inconstitucionalidade da regra insculpida no art. 12 da Lei n° 7.713/88 acolhida em parte, no tocante aos rendimentos recebidos acumuladamente decorrentes de remuneração, vantagem pecuniária, proventos e benefícios previdenciários, como na situação vertente, recebidos a menor pelo contribuinte em cada mês-competência e cujo recolhimento de alíquota prevista em lei se dê mês a mês ou em menor período. 2. Incidência mensal para o cálculo do imposto de renda correspondente à tabela progressiva vigente no período mensal em que apurado o rendimento percebido a menor - regime de competência - após somado este com o valor já pago, pena afronta aos princípios da isonomia e capacidade contributiva insculpidos na CF/88 e do critério da proporcionalidade que infirma a apuração do montante devido. Arts. 153, § 2°, I e 145, § 1°, da Carta Magna. 3. Afastado o regime de caixa, no caso concreto, situação excepcional a justificar a adoção da técnica de declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto ou interpretação conforme a constituição, diante da presunção de legitimidade e constitucionalidade dos atos emanados do Poder Legislativo e porque casos símeis a este não possuem espectro de abrangência universal. Considerada a norma hostilizada sem alteração da estrutura da expressão literal. (TRF4, ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2002.72.05.000434-0, Corte Especial, Des. Federal ÁLVARO EDUARDO JUNQUEIRA, POR UNANIMIDADE)
Dessarte, as tabelas e as alíquotas do imposto de renda aplicáveis devem ser aquelas vigentes no momento em que a parte autora deveria ter recebido as parcelas correspondentes, fazendo ela jus à restituição dos valores pagos a maior, devidamente corrigidos pela taxa SELIC desde cada recolhimento indevido.
Registre-se, por oportuno, ser desnecessária a determinação de juntada do inteiro teor da referida arguição, porquanto o acórdão respectivo foi publicado no diário oficial da Justiça, sendo de fácil obtenção pela parte interessada, inclusive por meio de acesso ao site deste Tribunal, em link específico para consulta de precedentes da Corte Especial. Ademais, constitui ônus da parte interessada providenciar a sua juntada caso entenda indispensável à interposição de recurso.
Dos juros moratórios
Os juros moratórios são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito, e como tal conceituados no artigo 404 do atual Código Civil Brasileiro (Lei 10.406, de 10/01/2002):
Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.
Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar.
Outro não era o tratamento dado à matéria pelo artigo 1.061 do Código Civil de 1916:
Art. 1.061. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, consistem nos juros da mora e custas, sem prejuízo da pena convencional.
A única inovação trazida pelo Código Civil de 2002 foi a possibilidade de o juiz conceder indenização suplementar caso os juros de mora não cubram o prejuízo do credor - o que vem, mais uma vez, ressaltar o caráter indenizatório desses juros.
A mora no pagamento de verba trabalhista, cuja natureza é notoriamente alimentar, impõe ao credor a privação de bens essenciais, podendo ocasionar até mesmo o seu endividamento a fim de cumprir os compromissos assumidos. A indenização, por meio dos juros moratórios, visa à compensação das perdas sofridas pelo credor em virtude da mora do devedor. Essa verba, portanto, não possui qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda.
Nesse sentido o art. 43 do Código Tributário Nacional, na condição de lei complementar (art. 146, III, a, da CF/88), dispõe que é fato gerador do imposto de renda apenas a "aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica", desautorizando a incidência deste tributo sobre verba de natureza indenizatória, como os juros moratórios.
Tal entendimento restou consolidado pela Corte Especial deste Tribunal, nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade nº 5020732-11.2013.404.0000/TRF, em sessão de 24-10-2013, quando, por maioria, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/1988 e do art. 43, inciso II, § 1º, do Código Tributário Nacional, Lei nº 5.172/1966, de forma a afastar da incidência do Imposto de Renda os juros de mora legais recebidos, em acórdão assim ementado:
ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA SOBRE JUROS DE MORA. NÃO RECEPÇÃO DO ART. 16, § ÚNICO, DA LEI N. 4.506/64 PELA CF/88. INCONSTITUCIONALIDADE, SEM REDUÇÃO DE TEXTO, DO § 1º DO ART. 3º DA LEI Nº 7.713/88, DO ART. 16, § ÚNICO, DA LEI Nº. 4.506/64, E DO ART. 43, INCISO II E § 1º, DO CTN (LEI Nº 5.172/66), POR AFRONTA AO INCISO III DO ART. 153 DA CF/88.
1. O art. 16, § único, da Lei nº 4.506/64, ao tratar como 'rendimento de trabalho assalariado os juros de mora e quaisquer outras indenizações pelo atraso no pagamento das remunerações previstas neste artigo', contraria, frontalmente, o disposto no inciso III do art. 153 da CF/88, que é taxativo em só permitir a incidência do imposto de renda sobre 'renda e proventos de qualquer natureza'. Juros moratórios legais são detentores de nítida e exclusiva natureza indenizatória, e portanto não se enquadram no conceito de renda ou proventos. Hipótese de não-recepção pela Constituição Federal de 1988.
2. Inconstitucionalidade do art. 43, inciso II e § 1º, do CTN (Lei nº 5.172/66), sem redução de texto, originada pela interpretação que lhe é atribuída pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ, com efeito vinculante, de forma a autorizar que sobre verba indenizatória, in casu os juros de mora legais, passe a incidir o imposto de renda.
3. Inconstitucionalidade sem redução de texto reconhecida também com relação ao § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/88 e ao art. 43, inciso II e § 1º, do CTN (Lei nº 5.172/66).
4. Os juros legais moratórios são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito. A mora no pagamento de verba trabalhista, salarial e previdenciária, cuja natureza é notoriamente alimentar, impõe ao credor a privação de bens essenciais, podendo ocasionar até mesmo o seu endividamento a fim de cumprir os compromissos assumidos. A indenização, por meio dos juros moratórios, visa à compensação das perdas sofridas pelo credor em virtude da mora do devedor, não possuindo qualquer conotação de riqueza nova a autorizar sua tributação pelo imposto de renda.
Da indenização por dano moral
Pretende a autora a reforma da sentença referentemente ao ponto que rejeitou o pedido de reconhecimento do direito à indenização por danos morais.
No tocante à pretensão indenizatória, assim dispôs a sentença:
Quanto ao pleito de indenização por dano moral, tenho que a inscrição em dívida ativa e o posterior ajuizamento de execução fiscal na busca de crédito tributário considerado devido caracterizam-se como exercício regular de um direito, mormente considerando-se que o lançamento tributário é atividade vinculada e que, no caso vertente, foi precedido de processo administrativo no qual foi dada oportunidade à contribuinte de insurgir-se contra a exação.
O reconhecimento judicial de determinada ilegalidade praticada pela Administração por si só não caracteriza dano moral passível de reparação. Entender o contrário implicaria concluir que sempre que acolhidos embargos do devedor para extinguir-se a execução fiscal nasceria um direito à indenização por dano moral, o que não corresponde ao nosso direito vigente:
'ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. DANO MATERIAL. APREENSÃO DE VEÍCULO. AJUIZAMENTO DE MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO FAVORÁVEL AO IMPETRANTE. AUSÊNCIA DE ILICITUDE. Uma vez reconhecido em juízo que o veículo não deveria ter sido apreendido, deve se analisar o dano material do autor decorrente da indevida apreensão. No caso dos autos, o único lucro cessante efetivamente comprovado decorre dos valores que o autor deixou de receber pela locação do veículo, pois ficou demonstrado que o lucro que o veículo apreendido lhe dava decorria tão-somente da referida locação. O reconhecimento judicial de determinada ilegalidade praticada pela Administração por si só não caracteriza dano moral passível de reparação. Há que se constatar um abuso de direito por parte da União para que se possa concluir por uma possível indenização, hipótese diversa da dos autos.' (TRF4, AC 5013228-31.2012.404.7002, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Candido Alfredo Silva Leal Junior, juntado aos autos em 11/09/2014)
Nesta linha de entendimento:
'ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MORAL. ATO ILÍCITO E DANO GRAVE INDENIZÁVEL. NÃO COMPROVAÇÃO. Inexistindo prova de conduta ilícita por parte dos entes públicos, é infundado o pleito de indenização por danos morais. Tanto a comunicação dos fatos apurados pelo Município de Umuarama, como a instauração de procedimento administrativo pelo Ministério Público Federal, do qual resultou a instauração de inquérito policial, constituem atos inerentes ao exercício de funções institucionais, não estando configurados dolo ou má-fé, tampouco a prática de abuso de autoridade.' (TRF4, AC 5003686-17.2011.404.7004, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 07/04/2015)
TRIBUTÁRIO. IRPF. DÉBITO FISCAL EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO FISCAL. DANO MORAL. INOCORRENCIA. 1. O reconhecimento judicial de determinada ilegalidade praticada pela Administração por si só não caracteriza dano moral passível de reparação. Entender o contrário implicaria concluir que sempre que acolhidos embargos do devedor para extinguir-se a execução fiscal nasceria um direito à indenização por dano moral, o que não corresponde ao nosso direito vigente. 2. Ademais, a Fazenda Nacional somente procedeu à inscrição em dívida ativa à míngua da entrega da DIRF por parte da empresa retentora do tributo. 3. Apelações desprovidas. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5054113-84.2012.404.7100, 2ª TURMA, Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 08/10/2015)
Não restando comprovada a ocorrência de dano moral e sua extensão, não há como se presumir a sua existência, devendo ser mantida a sentença por seus próprios fundamentos quanto ao ponto.
Ônus sucumbenciais
Considerando o disposto no art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC, o valor da causa (R$ 26.650,30) e os precedentes majoritários desta Turma, resta a União condenada ao pagamento dos honorários advocatícios, que são fixados em 10% sobre o valor da causa, os quais deverão ser corrigidos monetariamente pelo IPCA-E, desde o ajuizamento desta ação, não se aplicando o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, em face do que decidido pelo STF na ADI 4.357 (Relator o Ministro Luiz Fux, Plenário, DJe n. 59/2013, de 2.4.2013).
Relativamente às custas processuais, verifica-se que a União Federal é isenta do seu pagamento em Foro Federal por força do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, competindo-lhe, porém, o reembolso dos valores adiantados pela parte adversa a esse título (art. 4º, parágrafo único).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da União e à remessa oficial e dar parcial provimento ao apelo da parte autora, nos termos da fundamentação.
Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA
Relator
Documento eletrônico assinado por Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8210546v5 e, se solicitado, do código CRC 9E1B40D1. | |
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Data e Hora: | 13/04/2016 15:42 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 12/04/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000268-90.2015.4.04.7114/RS
ORIGEM: RS 50002689020154047114
RELATOR | : | Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA |
PRESIDENTE | : | OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA |
PROCURADOR | : | Dr. PAULO LEIVAS |
APELANTE | : | HUBERTO KIRCHHEIM |
ADVOGADO | : | RALF WERNER KIRCHHEIM |
APELANTE | : | UNIÃO - FAZENDA NACIONAL |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 12/04/2016, na seqüência 270, disponibilizada no DE de 29/03/2016, da qual foi intimado(a) UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 2ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO E À REMESSA OFICIAL E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA |
: | Des. Federal RÔMULO PIZZOLATTI | |
: | Juíza Federal CLÁUDIA MARIA DADICO |
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Secretária de Turma
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