Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. REQUISITOS. TRF4. 5045531-40.2021.4.04.0000...

Data da publicação: 26/03/2022, 07:00:58

EMENTA: TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. REQUISITOS. Para a concessão da tutela provisória de urgência, há a exigência concorrente de dois pressupostos, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300 do CPC). (TRF4, AG 5045531-40.2021.4.04.0000, SEGUNDA TURMA, Relator ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA, juntado aos autos em 18/03/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5045531-40.2021.4.04.0000/RS

RELATOR: Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA

AGRAVANTE: LANCHERIA REUNIDAS LTDA

ADVOGADO: GRAZIELLA DE CASSIA DA FRE SOUZA (OAB RS067600)

AGRAVANTE: PAPOO LANCHES E REFEICOES EIRELI

ADVOGADO: GRAZIELLA DE CASSIA DA FRE SOUZA (OAB RS067600)

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por LANCHERIA REUNIDAS LTDA e PAPOO LANCHES E REFEICOES EIRELI contra decisão que, nos autos do Procedimento Comum 5070560-35.2021.4.04.7100/RS, indeferiu pedido de tutela de urgência visante a "afastar as empregadas gestantes de suas atividades empresa, em razão da impossibilidade de realiza trabalho à distância; determinar o pagamento maternidade em favor das empregadas gestantes todo o período de Covid-19 aplicando às gravidezes vindouras durante o período de emergência e pandêmico e compensar (deduzir) o valor dos salários maternidade pagos pela empresa às gestantes quando do pagamento das contribuições sociais previdenciárias, nos termos do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91, artigo 94 do Decreto nº 3.048/99 e artigo 86 da Instrução Normativa RFB nº 971/09."

Em suas razões, as agravantes alegaram que: (1) é imperiosa a declaração do direito de: a) afastar as empregadas gestantes de suas atividades na empresa em razão da impossibilidade de realização de seus trabalhos à distância b) determinar o pagamento dos salários maternidade pelas Rés em favor das empregadas gestantes durante todo o período de emergência de saúde pública decorrente da Covid -19, e c) compensar (deduzir) o valor dos salários maternidade já pagos pela empresa quando do pagamento das contribuições sociais previdenciárias, e (2) o perigo no dano está demonstrado pelo elevado custo que os agravantes (empresas de pequeno porte) terão que suportar até uma decisão definitiva. Atualmente são 2 trabalhadoras grávidas afastadas de seus postos de trabalho, o que é um número significativo e pode inclusive aumentar. Com base nesses fundamentos, requereu a antecipação dos efeitos da tutela, para (a) afastarem as empregadas gestantes de suas atividades na empresa, em razão da impossibilidade de realização de seu trabalho à distância; (b) determinar o pagamento pelas rés dos salários maternidade em favor das empregadas gestantes, durante todo o período de emergência de saúde pública decorrente da Covid-19 aplicando-se ta determinação inclusive em relação às gravidezes vindouras durante o período de emergência e pandêmico, e (c) compensar (deduzir) o valor dos salários maternidade já pagos pela empresa às gestantes quando do pagamento das contribuições sociais previdenciárias, nos termos do artigo 72, § 1º, da Lei nº 8.213/91, artigo 94 do Decreto nº 3.048/99 e artigo 86 da Instrução Normativa RFB nº 971/09. Ao final, pugnaram pelo provimento do recurso.

O pedido de antecipação da tutela recursal foi indeferido.

Com contrarrazões, vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

A decisão liminar foi assim fundamentada:

[...]

Ao apreciar o tema, o eminente Desembargador Federal Luís Alberto D Azevedo Aurvalle proferiu decisão, com o seguinte teor (agravo de instrumento n.º 5028306-07.2021.4.04.0000/SC):

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Plansul Planejamento e Consultoria Eireli, contra decisão proferida pelo Juízo Federal da 4ª VF de Florianópolis/SC que indeferiu pedido de tutela de urgência cujo objetivo é "possibilitar à Autora enquadrar como salário maternidade os valores pagos às empregadas gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/21 enquanto durar o afastamento, nos termos do art. 394-A da CLT e art. 72 da Lei nº 8.213/91, aplicando-se tal determinação inclusive em relação às gravidezes vindouras durante o período de emergência e pandêmico", bem como "para excluir os pagamentos feitos às gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/21 da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à previdência social e aos terceiros (Sistema S)" .

Eis o relatório do Magistrado a quo, o qual peço vênia para transcrever:

A Autora é pessoa jurídica cuja atividade baseia-se no fornecimento e gestão de recursos humanos para terceiros, elaboração e implantação de cadastro técnico municipal, organização de sistemas e serviços de processamento de dados, serviços de digitação e digitalização, serviços de tecnologia da informação, tratamento de dados, hospedagem na internet, limpeza e conservação, prestação serviços de locação de mão de obra, serviços de escritório e apoio administrativo, instalação de máquinas e equipamentos, manutenção e reparação de máquinas e equipamentos, instalações elétricas, hidráulicas em construção, atividades de teleatendimento, operação de telemarketing, pesquisa de mercado e opinião pública, atividades de rádio, televisão, radiodifusão sonora e de sons e imagens, impressão, serviços de préimpressão e acabamentos gráficos, edição de livros, jornais e revistas.

Nestas atividades, a Autora é uma terceirizada que presta serviços que são promovidos de forma presencial. Os contratos firmados, pela Autora, com seus tomadores, têm como pressuposto a prestação do serviço presencial como regra.

Informa que recentemente foi editada a Lei nº 14.151/21, estabelecendo que:

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.

Parágrafo único. A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Aduz que a lei acima, originária do Projeto de Lei nº 3.932/2020, foi editada com o objetivo de proteger a vida das mulheres grávidas em razão dos riscos decorrentes da morte materna por Covid-19, como se pode constatar do seguinte trecho da justificativa:

A fim de proteger as mulheres gestantes de forma mais ampla e efetiva, propomos aqui que elas sejam afastadas do trabalho, enquanto durar a pandemia de Covid-19.

A lei visa promover um serviço à vida e à maternidade, sem sombras de dúvidas, ao proteger a grávida em um dos momentos em que presta um serviço relevante à humanidade, que é a gestação de um novo ser humano. A norma também visa resguardar o nascituro.

Sobre o objetivo zeloso da norma e os fundamentos de sua existência a Requerente compreende ser absolutamente correta, pois toda a forma possível de preservação da vida ou de sua geração está a serviço da humanidade e da manutenção da raça humana.

O objeto da norma se alinha a princípios e fundamentos da Constituição Federal e tratados internacionais firmados pelo Brasil.

Ocorre que há uma omissão normativa quanto a quem deve arcar com o custo decorrente de tal afastamento dos trabalhos, pois as atividades exercidas pelas empregadas grávidas da Autora são, em regra, prestadas presencialmente, sem condições de afastamento sem que isso implique em duro e irrecuperável prejuízo ao serviço.

A Requerente não questiona o afastamento estabelecido pela lei. Como já salientado, compreende correto que tanto as gestantes como todos os que tenham riscos maiores de mortalidade sejam tratados de forma especial neste momento da pandemia e enquanto durar o período emergencial.

Oportuno, entretanto, que este tratamento especial esteja alinhado a outros princípios garantidos na Constituição Federal, em tratados internacionais e legislação ordinária, sob pena de trazer reflexos danosos e insustentáveis para aquele que, indevidamente e ilegitimamente, é obrigado a suportar o ônus ou encargo, neste caso, o empregador.

Vale salientar que, em relação aos serviços em que era possível ser prestado remotamente ou por rodízio, a Requerente já estava promovendo, mesmo antes da legislação acima transcrita, em relação aos quadro de funcionários de sua administração.

Ocorre que agora, em relação à maioria dos serviços prestados à terceiros, em razão da peculiaridade e por conta das empregadas terem sido contratadas especificamente para a atividade que desempenham mediante cessão de mão de obra, não há possibilidade de afastamento sem que haja, de fato, prejuízo à prestação do serviço. Nestes casos, o que ocorre é que a Autora se obriga a contratar alguém, que não tenha o impedimento vertido na lei transcrita, com o objetivo de cumprir com a obrigação contratual que lhe incumbe em relação aos seus tomadores.

Veja que a lei impede inclusive a realocação entre os tomadores, o que mesmo que pudesse, já seria muito difícil de realizar ante a especificidade de contratação que a cessão de mão de obra exige.

Nestes casos, parece não ser razoável imputar o custo decorrente deste afastamento ao empregador, onerando-o demasiadamente, ainda mais em um momento econômico em que todos têm suas atividades duramente impactadas em razão da pandemia COVID-19.

O objeto da presente demanda é garantir que a responsabilidade financeira recaia sobre a União Federal, em relação à remuneração paga às empregadas gestantes por forma do que dispõe a Lei nº 14.151/21.

Inegável salientar a importância da norma como meio de salvaguarda da maternidade e do filho que está em fase gestacional.

No caso da Requerente são xxxx colaboradoras que serão afastadas por força da lei sem que seja possível atribuir a estas gestantes uma alternativa de prestação de serviço, seja porque este seja obrigatoriamente prestado presencialmente, seja porque o custo decorrente de estrutura para trabalho remoto tornaria a atividade inviável para o tomador.

[...]

Uma questão que não ficou clara ao ser editada a Lei nº 14.151/21 é a responsabilidade sobre o ônus financeiro decorrente do afastamento da gestante. Inobstante a legislação pátria trate do assunto de forma esparsa, a lei citada não evidenciou claramente os efeitos decorrentes do afastamento e, por isso, a Autora se socorre no Poder Judiciário a fim de ver resguardado seu direito de tratar o tema de uma forma que preserve sua própria saúde financeira, não lhe cause prejuízos e nem impacte numa forma discriminatória de participação do custeio de benefícios sociais ou mesmo de tratamento das mulheres gestantes.

Repetindo, em síntese, os argumentos da inicial, sustenta que, enquanto perdurar o afastamento de que trata a Lei nº 14.151/21, sem que haja efetiva prestação de serviço, as verbas pagas não podem ser oneradas tributariamente. Alega que o Supremo Tribunal Federal publicou a seguinte orientação sobre o Tema 72 (RE 576.967): É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade. Defende que, uma vez caracterizado o pagamento do salário maternidade, não há incidência de tributos sobre tal verba, seja os destinados à previdência social ou aos terceiros (Sistema S); que mesmo que não se considere como salário maternidade, o que só se cogita para fins argumentativos, também não seria possível a incidência de tributos sobre a massa salarial paga às gestantes grávidas, uma vez que não estaria caracterizada a contraprestação ao serviço prestado; que o art. 195 da CF/88 estabelece a materialidade sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados à pessoa física que lhe preste serviço, o que não seria o caso das empregadas gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/21 e cujo serviço não pode ser prestado remotamente; que, enquanto perdurar o período emergencial, não seria possível submeter à incidência tributária, uma vez que não há durante tal período contraprestação de serviço ou prestação de serviço por parte da empregada. Aduz que a probabilidade do direito restou demonstrada, na medida em que se vê a legislação previdenciária, a CLT, a Constituição Federal e tratado internacional, distribuindo o custo da remuneração da trabalhadora grávida ao Estado, e, também, que se mostra presente o perigo de dano pelo elevado custo que a Agravante terá que suportar até uma decisão definitiva, uma vez que, no momento da interposição deste agravo, são 86 trabalhadoras grávidas afastadas de seus postos de trabalho, o que é um número significativo e pode inclusive aumentar. Requer, pois, seja concedida a antecipação de tutela recursal, de sorte que seja garantido à agravante o direito de: 1 - enquadrar como salário maternidade os valores pagos às trabalhadoras gestantes, contratadas pela Agravante, afastadas por força da Lei nº 14.151/21 enquanto durar o afastamento, nos termos do art. 394-A da CLT, art. 72 da Lei nº 8.213/91, o art. 201, II, e 203, I, da Constituição Federal e item 8 da Convenção nº 103 da OIT (Decreto nº 10.088/19), aplicando-se tal determinação inclusive em relação às gravidezes vindouras durante o período de emergência e pandêmico e enquanto perdurar os efeitos da lei; e 2 - a concessão de tutela provisória de urgência para excluir os pagamentos feitos às gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/21 da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à previdência social e aos terceiros (Sistema S); e, ao final,seja dado provimento ao agravo.

Relatei.

Decido.

O deferimento total ou parcial da pretensão recursal, em antecipação da tutela, por decisão monocrática do relator, é cabível quando estiverem evidenciados, de um lado, a probabilidade do direito (que, no caso, consiste na probabilidade de provimento do recurso), e, de outro, o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 1.019-I, c/c art. 300).

No caso dos autos, entendo que deve ser deferido o pedido de tutela de urgência requerido.

A Lei nº 14.151, de 12 de maio de 2021, que "dispõe sobre o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus", assim reza:

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.

Parágrafo único. A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.

Veja-se que o dispostivo retro referido determina o afastamento da empregada gestante do trabalho presencial sem prejuízo de sua remuneração, enquanto perdurar essa pandemia do coronavírus, devendo ficar a empregada à disposição do empregador para o exercício das atividades por meio da modalidade de trabalho à distância ou teletrabalho.

Ocorre que, como referido pela agravante, existem trabalhos, funções que não se coadunam com a prestação que não a presencial. Em relação à maioria dos serviços prestados a terceiros, em razão da peculiaridade e por conta das empregadas terem sido contratadas especificamente para a atividade que desempenham mediante cessão de mão de obra, não há possibilidade de afastamento sem que haja, de fato, prejuízo à prestação do serviço.

E, com efeito, embora a Lei referida pretenda dar maior proteção à mulher grávida, para que não seja discriminada, ela não definiu a quem compete o pagamento da remuneração da trabalhadora gestante, quando a sua área de atuação seja incompatível com o trabalho remoto.

Diante desse impasse, importa observar que a Constituição estabeleceu especial proteção à saúde, à maternidade, à família e à sociedade, conforme artigos 196, 201, II, 226 e 227, bem como estabeleceu a previsão expresa do dever do Estado em promover ações e políticas sociais e econômicas para alcançar tais fins, especialemente por meio do Sistema de Seguridade Social.

Nessa linha, peço vênia para agregar a estas razões de decidir, os fundamentos da Juíza Federal Noemi Martins de Oliveira, Juíza Federal da 14ª VFCível de São Paulo, em decisão proferida em processo análogo (5006449-07.2021.4.03.6183, juntada aos autos no evento 2), in verbis:

A Saúde, a Previdência Social e a Assistência Social foram eleitas pelo Constituinte Originário como principais instrumentos de efetivação do Estado de Direito Social, a fim de garantir bem-estar e justiça sociais, por meio da redução de desigualdades sociais e regionais, objetivo fundamental do Estado Democrático de Direito, consoante prevê o artigo 3º, inciso III, da Constituição.

Ou seja, ao Estado compete a consecução do bem público, sendo essa a justificativa da existência do Estado: a promoção do bem público.

A justiça social concretiza-se por meio do princípio constitucional da solidariedade, que, no âmbito da Previdência Social, atua na promoção da dignidade da pessoa humana, de modo a atender, equitativamente, as necessidades vitais de cada indivíduo.

A solidariedade social pressupõe a interdependência entre cada indivíduo com os demais membros da sociedade e com a própria sociedade e caracteriza-se pela cooperação mútua, igualdade de oportunidades e consecução do bem-estar comum.

O princípio da solidariedade, na essência, fundamenta e garante o cumprimento do dever coletivo da sociedade de financiar, direta ou indiretamente, a Seguridade Social, possibilitando o acesso e o atendimento dos cidadãos aos benefícios da Seguridade Social.

Para tanto, e com base no princípio da solidariedade, todas as pessoas jurídicas são contribuintes da Seguridade Social, conforme determinam os artigos 194 e 195, “caput” e inciso I, da Constituição, havendo fundamentos e condições econômicas e financeiras suficientes, para fazer frente à necessidade de custeio e cobertura de sinistros, inclusive de eventos não previstos, no caso, decorrentes da crise emergencial causada pela Pandemia de Covid-19.

(...)

Assim, diante deste caso semelhante àquele, onde incide a determinação legal de que não haverá prejuízo dos vencimentos para a empregada gestante, pelo afastamento das suas atividades profissionais, em razão do risco à gravidez (art. 1º, L. 14.151/2021) causado pelo coronavírus, não pode a empregadora ser obrigada a arcar com tais encargo. Em face de todo conjunto constitucional, legal e infralegal que regulamenta a proteção social, em especial, o custeio, por toda a sociedade, dos benefícios previdenciários, como corolário do princípio da solidariedade social, verifica-se que não pode ser outra a natureza dos valores devidos à empregada gestante em casos que tais, a não ser a natureza de benefício previdenciário.

Oportuno destacar, ainda, na mesma ordem de ideias, que "nos termos do artigo 4º, §8º, da Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho Relativa ao Amparo à Maternidade, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto nº 10.088/2019, “Em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega”.

Imputar-se aos empregadores o custo de tais encargos seria um ônus demasiado pesado em um contexto tão complexo e já repleto de dificuldades,com o aumento de despesas e dminuição de oportunidades de tabalho para as mulheres.

Entendo, também, que os valores referentes à remuneração das empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais, em razão da incidência da Lei 14.151/2021, devem, sim, ser compensados, nos termos do artigo 72, §1º, da Lei nº 8.213/91:

“Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral. § 1º Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço”.

Diante de tais fundamentos, e tomando-se em conta que a Lei nº 14.151/2021 não estabeleceu a efetiva responsabilidade da empresa pelo pagamento dos salários no período do afastamento das empregadas gestantes, impossibilitadas de trabalhar à distância pela própria natureza das suas atividades, também entendo que não é incompatível com o ordenamento jurídico vigente o pagamento do salário-maternidade, durante o período de afastamento, em razão do risco para a gravidez, ocasionado pela Pandemia de Covid-19.

Assim, julgo estarem presentes os requisitos necessários para o a concessão da tutela recursal.

Defiro, portanto, a tutela de urgência para enquadrar como salário maternidade os valores pagos às trabalhadoras gestantes, contratadas pela agravante e afastadas por força da Lei nº 14.151/21 enquanto durar o afastamento, nos termos do art. 394-A da CLT, art. 72 da Lei nº 8.213/91, o art. 201, II, e 203, I, da Constituição Federal e item 8 da Convenção nº 103 da OIT (Decreto nº 10.088/19), aplicando-se tal determinação inclusive em relação às gravidezes vindouras durante o período de emergência e pandêmico e enquanto perdurar os efeitos da lei; bem como para excluir os pagamentos feitos às gestantes afastadas por força da Lei nº 14.151/21 da base de cálculo das contribuições previdenciárias patronais destinadas à previdência social e aos terceiros (Sistema S).

Comunique-se ao juízo de origem.

Dê-se vista ao Ministério Público Federal.

Após, voltem para julgamento pelo Colegiado.

Em sentido semelhante, a decisão proferida pelo eminente Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti, no agravo de instrumento n.º 5040521-15.2021.4.04.0000:

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de antecipação da tutela recursal, interposto por La Vie Comércio de Veículos Ltda. contra decisão do MM. Juiz Federal Paulo Cristovao de Araujo Silva Filho, da 2ª Vara Federal de Joinville-SC, que, nos autos do Procedimento Comum nº 5016683-71.2021.4.04.7201/SC, a pretexto de inexistir perigo da demora, indeferiu pedido de tutela de urgência visante a que os salários pagos às funcionárias gestantes durante o período de pandemia fossem equiparados a salário-maternidade, com possibilidade de compensação com créditos de contribuição previdenciária (evento 11 do processo originário).

Sustenta a parte agravante, em síntese, que há funcionárias cujas atribuições são incompatíveis com o trabalho remoto, de modo que a aplicação da Lei nº 14.151, de 2021, deve considerar essa contingência, mediante equiparação do salário ao salário-maternidade. Requer a reforma da decisão agravada para que seja concedida a liminar, a fim de que o pagamento dos salários seja equiparado ao salário-maternidade, viabilizada a compensação, além afastar os valores da incidência da contribuição previdenciária patronal.

É o relatório.

Tudo bem visto e examinado, passo a decidir.

Em que pesem as alegações da parte agravante, não se verificam os requisitos para a concessão da tutela provisória de urgência no procedimento comum de origem.

Com efeito, quanto ao perigo da demora, a parte autora não indica o impacto financeiro produzido pelo pagamento de salários a funcionárias grávidas, de modo que não ficou sequer evidenciado que represente repercussão que comprometa o caixa da empresa. O próprio valor da causa em R$ 35 mil e a indicação de que há apenas uma funcionária nessa condição reforçam essa conclusão. Enfim, a proposta da parte agravante de que os valores sejam utilizados posteriormente em compensação implica a que os salários de qualquer forma sejam pagos, ficando para momento posterior a possibilidade do aproveitamento do valor para as finalidades indicadas pela agravante.

Por outro lado, a própria solução proposta pela parte agravante para a insatisfação gerada pela edição da Lei nº 14.151, de 2021, aparenta ser incompatível de ser concedida, uma vez que a compensação se faz rigorosamente dentro dos termos da lei (cf. CTN, art. 170), sendo em princípio indevidas as aproximações e extensões pretendidas pela parte agravante, assim entendidas a equiparação com o salário-maternidade e a subsequente compensação tributária, caso em que tampouco a probabilidade do direito está evidenciada nos autos, ressalvada conclusão diversa por ocasião da sentença.

Assim, porque inexistentes os requisitos legais, não foram apresentados motivos suficientes à reforma da decisão agravada, que indeferiu a concessão da tutela de urgência (CPC, art. 300).

Ausente a relevância da fundamentação do recurso, necessária à antecipação da tutela recursal.

Ante o exposto, indefiro o pedido de antecipação da tutela recursal.

Intime-se a parte agravada para contrarrazões.

Ainda que se admita a probabilidade do direito alegado, não se vislumbra a urgência da prestação jurisdicional, uma vez que é pretendido o enquadramento como salário maternidade dos valores pagos a duas trabalhadoras gestantes (uma de cada empresa), não restando evidenciado o risco de comprometimento da saúde financeira das agravantes, a justificar a imediata intervenção judicial, com preterição do devido contraditório.

Ante o exposto, indefiro o pedido de antecipação de tutela recursal, nos termos da fundamentação.

Não tendo sido noticiados fatos novos, tampouco deduzidos argumentos suficientemente relevantes ao convencimento em sentido contrário, mantenho a decisão proferida por seus próprios fundamentos.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003043889v2 e do código CRC a1d39369.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA
Data e Hora: 18/3/2022, às 2:54:52


5045531-40.2021.4.04.0000
40003043889.V2


Conferência de autenticidade emitida em 26/03/2022 04:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5045531-40.2021.4.04.0000/RS

RELATOR: Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA

AGRAVANTE: LANCHERIA REUNIDAS LTDA

ADVOGADO: GRAZIELLA DE CASSIA DA FRE SOUZA (OAB RS067600)

AGRAVANTE: PAPOO LANCHES E REFEICOES EIRELI

ADVOGADO: GRAZIELLA DE CASSIA DA FRE SOUZA (OAB RS067600)

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

EMENTA

TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. REQUISITOS.

Para a concessão da tutela provisória de urgência, há a exigência concorrente de dois pressupostos, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300 do CPC).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 15 de março de 2022.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003043890v3 e do código CRC 5991a4d4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA
Data e Hora: 18/3/2022, às 2:54:52


5045531-40.2021.4.04.0000
40003043890 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 26/03/2022 04:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 08/03/2022 A 15/03/2022

Agravo de Instrumento Nº 5045531-40.2021.4.04.0000/RS

RELATOR: Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA

PRESIDENTE: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI

PROCURADOR(A): CLAUDIO DUTRA FONTELLA

AGRAVANTE: LANCHERIA REUNIDAS LTDA

ADVOGADO: GRAZIELLA DE CASSIA DA FRE SOUZA (OAB RS067600)

AGRAVANTE: PAPOO LANCHES E REFEICOES EIRELI

ADVOGADO: GRAZIELLA DE CASSIA DA FRE SOUZA (OAB RS067600)

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 08/03/2022, às 00:00, a 15/03/2022, às 16:00, na sequência 1148, disponibilizada no DE de 23/02/2022.

Certifico que a 2ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 2ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA

Votante: Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA

Votante: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI

Votante: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 26/03/2022 04:00:58.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora