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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE DO TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS PREENCHIDOS. DESCONTINUIDADE. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA. TRF4. 5000152-47.2024.4.04.9999

Data da publicação: 15/03/2024, 07:00:59

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE DO TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS PREENCHIDOS. DESCONTINUIDADE. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA. - O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea. - Não havendo qualquer comprovação nos autos acerca da indispensabilidade do labor rural da parte autora para a subsistência da entidade familiar, e nem especificação de que a renda proveniente da atividade urbana exercida pelo cônjuge tenha sido a fonte de renda preponderante, não resta descaracterizada a condição de segurado especial da postulante no período controverso. - Havendo prova da atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento por tempo significativo, que comprove que a parte autora passou a sobreviver da agricultura, deve ser admitido o direito à aposentadoria rural por idade com o cômputo de períodos anteriores descontínuos (artigos 24 e 143 da Lei n.º 8.213/91) para fins de implemento de carência. - Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus a concessão da aposentadoria por idade do trabalhador rural. - Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implantar o benefício concedido, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5000152-47.2024.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 07/03/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51) 3213-3000 - www.trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5000152-47.2024.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GENI TEREZINHA PRESTES

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade do trabalhador rural, em regime de economia familiar, desde a data do requerimento administrativo, formulado em 23/09/2020 (evento 1, DOC12, p. 01), mediante o reconhecimento do exercício de atividade rural no tempo de carência necessário, nos seguintes termos:

ISSO POSTO, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos feitos por GENI TEREZINHA PRESTES em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para o fim de: conceder à autora o benefício de aposentadoria por idade rural, em valor equivalente a um salário-mínimo nacional, desde da data do requerimento administrativo (NB 197.986.398-6); e condenar o réu ao pagamento das parcelas atrasadas, que deverão observar os consectários legais abaixo fixados.

Em suas razões, o INSS alega que, em razão da existência de trabalho urbano no período de carência, não é possível a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

A controvérsia recursal diz respeito à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, mediante o reconhecimento do exercício de atividade rural por parte da autora.

Da aposentadoria por idade do trabalhador rural

Dispõe o art 201, §7º, inciso II, da CF, que é assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal, aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher.

Os requisitos para a aposentadoria por idade rural, para os filiados ao RGPS à época da edição da Lei nº 8.213/91, estão dispostos nos §§ 1º e 2º do art. 48 e no art. 39, I, da LB, que exigem:

(a) idade mínima de 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher (art. 48, § 1.º ); e

(b) o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, independente do recolhimento de contribuições.

Para o segurado que implementar o requisito etário combinado com o tempo de serviço necessário após 2011, a teor do art. 25, II, 142 e 143 da LB, o tempo de serviço rural exigido será de 180 meses.

Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.

Desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento1.

Cumpre destacar que a reforma da Previdência Social (EC 103/2019) não alterou as regras para a concessão da aposentadoria por idade rural.

O cálculo do benefício será efetuado na forma do art. 26 da EC 103/2019, ou, se for computado unicamente tempo de serviço rural em regime de economia familiar, prevalecerá o disposto no art. 39, I, da Lei nº 8.213/91 (RMI de 01 salário mínimo).

Requisitos para a aposentadoria por idade rural
Idade Mínima60 anos para homem e 55 anos para mulher.
Efetivo exercício de atividade ruralAinda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, independente do recolhimento de contribuições.
Carência necessária(i) Se implementados os todos requisitos anteriores antes de 2011 - observar a tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91.
(ii) Se implementados os todos requisitos após 2011 - 180 contribuições
Categorias de seguradoEmpregado rural; Trabalhador eventual (boia-fria); Segurado especial; e Contribuinte individual rural ou garimpeiro, em regime de economia familiar.
Cálculo do valor do benefícioConforme art. 26 da EC 103/2019, ou, se for computado unicamente tempo de serviço rural em regime de economia familiar, RMI de 01 salário mínimo.

Da condição de segurado especial

Consoante art. 195, §8º, da Constituição Federal, o segurado especial é aquele que exerce a atividade rural, em regime de economia familiar e sem empregados permanentes, laborando em pequena produção da qual extrai a subsistência de seu núcleo familiar.

Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes2.

De outra banda, não será considerado segurado especial aquele que possui outra fonte de rendimento, porquanto não exerce a atividade rurícola para fins de subsistência, excetuadas as hipóteses do §9º do art. 11 da Lei de Benefícios.

Ainda, ressalta-se que é facultado ao segurado especial contribuir em caráter facultativo, na forma do §1º do art. 25 da Lei de Custeio3.

Da demonstração da atividade rural

De acordo com o art. 55, §3º da Lei n.º 8.213/91 a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea4.

A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos como início de prova material quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar5.

Para tanto, deve ser levado em consideração as particularidades do meio rural e a dificuldade do interessado, que não raras vezes é pessoa humilde de pouca instrução, em obter documentos para ver comprovado o tempo de labor rural controvertido.

No que toca à necessidade de início de prova material, pertinente referir os seguintes entendimentos sumulados:

Súmula n.º 73 deste Regional: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

Súmula n.º 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.

Também devem ser observados os precedentes vinculantes do STJ, nos temos das seguintes teses firmadas:

Tema 532: O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).

Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria". "O STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)

Tema 629: A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.

Tema 642: O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.

O §1.º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros.

Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, salvo quando o integrante passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana6.

Por outro lado, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afasta, necessariamente, a condição de segurado especial da parte interessada, desde que esta disponha de início de prova material independente do integrante, salvo se comprovada a prescindibilidade do labor rural.

Não há necessidade de que a prova material abarque todo o período de trabalho rural, uma vez que se deve presumir a continuidade do labor rural, sendo inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. As provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural7.

A partir da Lei nº 13.846/2019, o segurado especial comprovará o tempo de exercício de atividade rural por meio de autodeclaração ratificada por órgãos públicos e entidades públicas credenciadas, consoante art. 38-B, §2º, da LB. Na ausência da referida ratificação, deverá ser complementada com a apresentação de início de prova material, nos termos do §4º do referido dispositivo.

Fixados os parâmetros de valoração da prova, cumpre realizar o exame da situação específica dos autos.

Do caso concreto

Da idade e da carência

No caso em tela, observa-se que a parte autora preencheu o requisito etário (55 anos) em 03/04/2015, pois nascida em 03/04/1960 (evento 1, DOC3).

Uma vez que requereu o benefício na via administrativa em 23/09/2020 (evento 1, DOC12, p. 01)​, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses imediatamente anteriores ao implemento da idade mínima ou à entrada do requerimento administrativo, ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.

Da comprovação do trabalho rural

Visando à demonstração do exercício da atividade rural, na condição de segurado especial, foram juntados aos autos os seguintes documentos:

- Autodeclaração de segurado especial - rural, referente ao período de 03/04/1976 a 30/05/2006, na qual declarou ter trabalhado nas lidas campesinas em regime de economia familiar, com seu companheiro, no cultivo de fumo, feijão e milho, sendo os produtos destinados à subsistência e à venda. Declara, ainda, que não possui empregados e que nunca exerceu outra atividade remunerada - evento 1, DOC6.​​​​​​, p. 01 a 03;

- Autodeclaração de segurado especial - rural, referente ao período de 01/07/2019 a 25/04/2022, na qual declarou ter trabalhado nas lidas campesinas em regime de economia familiar, com seu companheiro, no cultivo de fumo, feijão e milho, sendo os produtos destinados à subsistência e à venda. Declara, ainda, que não possui empregados e que nunca exerceu outra atividade remunerada - evento 1, DOC6.​​​​​​, p. 04 a 06;

- Cadastro domiciliar e territorial do SUS, referente ao imóvel rural Sítio Alto, situado no Quinto Distrito, município de Arroio do Tigre/RS, datado de 24/08/2018 - evento 1, DOC7, p. 01 e 02;

- Cadastros individuais do SUS, no qual a autora e seu companheiro afirmam ser agricultores, datado de 24/08/2018 - ​evento 1, DOC7​, p. 03 a 06;

- Certificado de casamento religioso na Igreja Evangélica Missão e Resgate da autora com Canisio Meier, datado de 12/10/2013 - evento 1, DOC9;

- CTPS da parte autora com vínculos urbanos de 01/06/2006 a 31/10/2011, como serviços gerais - evento 1, DOC12, p. 09 a 13;

- Certidão de nascimento da filha da parte autora, qualificando-a como agricultora e sem registro do pai, datada de 30/01/1992 - ​evento 1, DOC12​, p. 14;

- Certidão de nascimento da filha da parte autora, qualificando-a como agricultora e sem registro do pai, datada de 02/08/1988 - ​evento 1, DOC12​, p. 15;

​​- Certidão de nascimento da filha da parte autora, qualificando-a como do lar e sem registro do pai, datada de 05/08/1976 - ​evento 1, DOC12​, p. 16;

- Notas fiscais e contranotas de comercialização de produção agrícola em nome do marido da parte autora, datadas de 2018, 2020 e 2022 - evento 1, DOC11 e ​evento 1, DOC12​, p. 20 a 25;

- Contrato de parceria agrícola firmado entre a parte autora e Mariuzete da Silveira Oliveira, relacionado a uma porção de terra com área 01 ha, em Arroio do Tigre/RS, em que a autora reside no local e cultiva produtos primários, sendo divididos em 50% as despesas e lucros entre os parceiros, com prazo de três anos, datado de 25/02/2019 - ​evento 1, DOC12, p. 26 e 27;

- Certidão de Matrícula de Imóvel no Registro de Imóveis de Arroio do Tigre/RS, nº 13.099, com área total de cerca de 8,95 ha e de propriedade da parceira agrícola da autora, adquirido em 05/11/2018 - ​evento 1, DOC12, p. 28 e 29;

- Extrato CNIS em nome do marido da autora, com vínculos empregatícios de 01/12/2003 a 24/08/2004, de 02/04/2007 a 29/06/2007, de 01/11/2003 a 30/06/2019 e de 19/02/2014 a 17/09/2014 - ​evento 1, DOC12​, p. 34 e 35;

​​- Notas fiscais e contranotas de comercialização de produção agrícola em nome do marido da parte autora, datadas de 1996 a 1999, de 2019 e de 2020 - ​​​​​​evento 34, DOC2 ​​.

​​​​​​Os documentos juntados aos autos, porque contemporâneos aos períodos almejados, bem como por terem sido emitidos em nome próprio e de integrantes do seu grupo familiar, constituem início razoável de prova material quanto aos períodos de 02/08/1988 a 31/05/2006 e de 01/11/2011 a 23/09/20208.

Além disso, do extrato do CNIS juntado aos autos, observa-se que a parte autora não possui registro de vínculos empregatícios no período compreendido pelas provas, fortalecendo-se a indicação de que, de fato, sobrevive unicamente das lides rurais neste intervalo.

Cumpre salientar que os registros de atividade urbana do cônjuge não são incompatíveis com a concessão da aposentadoria pleiteada.

Com efeito, não há qualquer comprovação nos autos de que o labor rural da autora era dispensável para a subsistência do grupo familiar, e nem especificação de que o trabalho urbano do cônjuge seria a fonte de renda preponderante.

A hipótese fática do inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, que utiliza o conceito de economia familiar, somente será descaracterizada se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural seja tal que dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar:

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. Precedentes do STJ. (TRF4, EINF 5009250-46.2012.404.7002, TERCEIRA SEÇÃO, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 12/02/2015)

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. DOCUMENTOS DE TERCEIROS. COMPROVAÇÃO. TRABALHO URBANO DE UM INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL NÃO DESCARACTERIZADA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental. (Súmula n.º 73 deste Regional.) 2. Não havendo qualquer comprovação nos autos acerca da indispensabilidade do labor rural da parte autora para a subsistência da entidade familiar, e nem especificação de que a renda proveniente da atividade urbana exercida pelo cônjuge tenha sido a fonte de renda preponderante, não resta descaracterizada a condição de segurado especial da postulante. 3. Admite-se a extensão da prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro, se o exercício da atividade de natureza urbana pelo cônjuge for concomitante com o labor rurícola. 4. Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço. 5. É devida a aposentadoria por idade mediante conjugação de tempo rural e urbano durante o período aquisitivo do direito, a teor do disposto na Lei n. 11.718/08, que acrescentou § 3.º ao art. 48 da Lei n. 8.213/91, contanto que cumprido o requisito etário de 60 (sessenta) anos para mulher e de 65 (sessenta e cinco) anos para homem e a carência mínima exigida. (TRF4, AC 5000212-54.2023.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 23/05/2023)


PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AVERBAÇÃO. TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS. NÃO COMPROVADOS. DESCONTINUIDADE. PERDA DA CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. LABOR URBANO DO CÔNJUGE. 1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. 2. Tem direito à aposentadoria por idade rural a contar da data de entrada do requerimento administrativo, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, que implementa os requisitos: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias. 3. Hipótese em que a descontinuidade promovida na atividade rural, superior a 20 anos, assemelha-se à retirada definitiva do campo, restando descaracterizada a condição de segurado especial. 4. O labor urbano do cônjuge, por si só, não é óbice ao reconhecimento da atividade rural desempenhada pela requerente, quando não demonstrada a dispensabilidade das lides rurais. 5. Assegura-se a parte autora o direito à averbação dos períodos rurais reconhecidos, para fim de obtenção de futuro benefício previdenciário. (TRF4, AC 5001383-64.2021.4.04.7138, SEXTA TURMA, Relator para Acórdão PAULO PAIM DA SILVA, juntado aos autos em 22/05/2023)

Assim sendo, a renda de trabalho urbano do cônjuge não prejudica a condição de rural da parte autora na interpretação do § 9º do art. 11 da LB.

O trabalho rural efetivamente exercido pelo segurado não pode ter seu valor esvaziado pelo fato de seu cônjuge exercer atividade urbana, bastando estar demonstrado que a atividade rural exercida, em alguma medida, seja importante para a subsistência do núcleo familiar e, principalmente, para o próprio trabalhador rural, que não pode ser considerado um simples dependente do cônjuge pelo fato de este eventualmente ter renda decorrente de atividade urbana um pouco superior.

Neste contexto, não há falar em desconsideração dos elementos probatórios emitidos em nome do cônjuge da parte autora para fins de comprovação da carência necessária ao benefício pretendido.

Ademais, no tocante a alegação do INSS, mesmo o afastamento superior a 4 (quatro) meses do labor rurícola não afasta a possibilidade de concessão da aposentadoria por idade rural, sendo possível o cômputo de períodos remotos para o deferimento do benefício. Inclusive, neste sentido é a tese firmada no Tema nº 301 da Turma Nacional de Uniformização deste TRF4:

Cômputo do Tempo de Trabalho Rural

I. Para a aposentadoria por idade do trabalhador rural não será considerada a perda da qualidade de segurado nos intervalos entre as atividades rurícolas. Descaracterização da condição de segurado especial

II. A condição de segurado especial é descaracterizada a partir do 1º dia do mês seguinte ao da extrapolação dos 120 dias de atividade remunerada no ano civil (Lei 8.213/91, art. 11, § 9º, III);

III. Cessada a atividade remunerada referida no item II e comprovado o retorno ao trabalho de segurado especial, na forma do art. 55, parag. 3o, da Lei 8.213/91, o trabalhador volta a se inserir imediatamente no VII, do art. 11 da Lei 8.213/91, ainda que no mesmo ano civil.

Ato contínuo, as provas testemunhais são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente9.

Da prova testemunhal

Na audiência de instrução, foram ouvidas três testemunhas, as quais foram uníssonas ao declarar que a autora, durante toda sua vida, laborou na lides campesinas, com seus genitores, irmãos e esposo, em regime de economia familiar.

Inicialmente, o Sr. Lerindo José afirma que a autora trabalha até os dias atuais no campo, no Sítio Alto, município de Arroio do Tigre. Complementa afirmando que, antes de constituírem terras próprias, a autora e seu marido trabalhavam no meio rural em Sítio Baixo, em forma de parceria.

Em sequência, o Sr. Leomar Silveira alega que a requerente trabalha desde os dezesseis anos até os dias de hoje na agricultura, em terras localizadas no Arroio do Tigre/RS.

Por fim, o Sr. Cláudio Giovane Meili afirma que tem ciência de que a autora trabalhou na agricultura, em sítio localizado em Arroio do Tigre/RS, não trabalhando em outras atividades.

A prova testemunhal, portanto, é precisa e convincente quanto ao labor rural desempenhado pela demandante no período controverso.

Desta forma, comprovado o labor rurícola pelo período de 02/08/1988 a 31/05/2006 e de 01/11/2011 a 23/09/2020, pelo início de prova material corroborado pela prova testemunhal, resta preenchida a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria postulado, consoante art. 48, §§1º e 2º, e art. 55, §3º, ambos da Lei nº 8.213/91.

Nestes termos, merece desprovimento o apelo do INSS.

Da verba honorária

Estando preenchidos os requisitos estabelecidos pela Segunda Seção do STJ no julgamento do AgInt nos EREsp 1.539.725/DF (não conhecimento integral ou desprovimento do recurso interposto pela parte já condenada ao pagamento de honorários na origem, em decisão publicada na vigência do CPC/2015), o percentual dos honorários advocatícios devidos pelo INSS deverá ser majorado em 50% sobre o valor fixado pelo Juízo a quo, em razão do improvimento do recurso.

Conclusão

Apelação do INSS

Desprovido.

Apelação da parte autora
Não interpôs recurso.
Observação

SUCUMBÊNCIA: Mantida a sentença, fica mantida a verba honorária nos termos definidos pelo Juízo singular. Honorários advocatícios devidos pelo INSS majorados em 50% sobre o valor fixado pelo Juízo a quo, em razão do improvimento do recurso.

Da Tutela Específica

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC/2015, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo, o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à CONCESSÃO do benefício titularizado pela parte autora.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB
ESPÉCIEAposentadoria por Idade
DIB23/09/2020
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.

Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 30 (trinta) dias.

Do Prequestionamento

A fim de possibilitar o acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas no recurso, nos termos dos fundamentos do voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou havidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do que está declarado.

Do Dispositivo

Frente ao exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão via CEAB.



Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004312532v23 e do código CRC 96e74f1c.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Data e Hora: 7/3/2024, às 16:21:10


1. STF, RE 631.240, com repercussão geral, Plenário, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).
2. Art. 11, §1º, da Lei nº 8.213/91 e art. 12, §1º da Lei nº 8.212/91
3. TRF4, AC 5004941-31.2020.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 18/06/2020
4. Recurso Especial Repetitivo n.º 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13-12-2010, DJe 15-04-2011
5. STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012
6. Tema 533: A extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
7. Tema 638/STJ - Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal.
8. De acordo com as diretrizes traçadas no REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia
9. Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos

5000152-47.2024.4.04.9999
40004312532.V23


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300 - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51) 3213-3000 - www.trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5000152-47.2024.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GENI TEREZINHA PRESTES

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE DO TRABALHADOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS PREENCHIDOS. DESCONTINUIDADE. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA.

- O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea.

- Não havendo qualquer comprovação nos autos acerca da indispensabilidade do labor rural da parte autora para a subsistência da entidade familiar, e nem especificação de que a renda proveniente da atividade urbana exercida pelo cônjuge tenha sido a fonte de renda preponderante, não resta descaracterizada a condição de segurado especial da postulante no período controverso.

- Havendo prova da atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento por tempo significativo, que comprove que a parte autora passou a sobreviver da agricultura, deve ser admitido o direito à aposentadoria rural por idade com o cômputo de períodos anteriores descontínuos (artigos 24 e 143 da Lei n.º 8.213/91) para fins de implemento de carência.

- Comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus a concessão da aposentadoria por idade do trabalhador rural.

- Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implantar o benefício concedido, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e determinar o cumprimento imediato do acórdão via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 06 de março de 2024.



Documento eletrônico assinado por RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004318300v4 e do código CRC 5a33c6c7.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Data e Hora: 7/3/2024, às 16:20:36


5000152-47.2024.4.04.9999
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 28/02/2024 A 06/03/2024

Apelação Cível Nº 5000152-47.2024.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GENI TEREZINHA PRESTES

ADVOGADO(A): CRISTINA DIAS FERREIRA (OAB RS076951)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 28/02/2024, às 00:00, a 06/03/2024, às 16:00, na sequência 170, disponibilizada no DE de 19/02/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO VIA CEAB.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Votante: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA

Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



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