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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. TRF4. 5009345-33.2022.4.04.7000

Data da publicação: 28/12/2023, 07:01:12

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL. Nos termos do artigo 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, o cômputo de tempo de serviço de segurado trabalhador rural, anterior à data de início de sua vigência, é admitido para concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. Para o período ulterior à Lei de Benefícios (competência de novembro de 1991, conforme disposto no artigo 192 do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social aprovado pelo Decreto nº 357/91), o aproveitamento condiciona-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, de acordo com o artigo 39, inciso II, da Lei n° 8.213/91 e Súmula 272 do Superior Tribunal de Justiça. Para a comprovação do tempo de atividade rural é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal. Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição a partir da data do requerimento administrativo, respeitada eventual prescrição quinquenal. (TRF4, AC 5009345-33.2022.4.04.7000, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 20/12/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5009345-33.2022.4.04.7000/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ELZA PEREIRA BARBOSA (AUTOR)

RELATÓRIO

A parte autora propôs ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) pretendendo a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a Data de Entrada do Requerimento - DER, mediante o reconhecimento de atividade laboral rural no período de 10/08/1973 a 31/10/1991 e de atividade comum urbana no período de 07/02/2017 a 05/06/2017.

Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 11/10/2022, cujo dispositivo tem o seguinte teor (evento 118, SENT1):

Ante o exposto, julgo extinto o processo sem exame do mérito em relação ao pedido de reconhecimento do período urbano de 07/02/2017 a 05/06/2017 e rural de 10/08/1973 a 31/10/1991, com fulcro no artigo 485, incisos IV e VI, do Código de Processo Civil.

Julgo, ainda, improcedente o pedido de reafirmação da DER e concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, extinguindo o processo com resolução do mérito, a teor do art. 487, inciso I, do CPC.

Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelos artigo 85, § 3°, do Código de Processo Civil, tomando-se por base as prestações pretendidas desde a DER.

Interposta apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões, por 15 dias. Com ou sem elas, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4º Região, conforme artigo 1.010, §3°, do CPC.

Em que pese ilíquida a sentença, o valor da condenação claramente é inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Assim, dispensado o reexame necessário, nos termos do artigo 496, §3°, I, do CPC.

Intimem-se.

A parte autora apela alegando que apresentou matrícula de imóvel rural familiar, documentos qualificando o genitor como lavrador e comprovante de frequência em escola rural, os quais constituem início de prova material do labor rural de 10/08/1973 a 31/10/1991. Defende que o indeferimento da prova testemunhal configura cerceamento de defesa, pugnando pela reabertura da instrução processual e pelo reconhecimento do período rural. Subsidiariamente, pugna pela extinção sem resolução de mérito (evento 29, APELAÇÃO1).

Na sessão de 22/11/2022 a 29/11/2022 esta Corte deu provimento ao apelo da parte autora, determinando a reabertura da instrução processual para produção de prova testemunhal acerca do tempo rural. O respectivo acórdão restou assim ementado (evento 7, ACOR1):

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHADOR RURAL. PROVA TESTEMUNHAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE.

1. A ausência da coleta de prova testemunhal em juízo, sob o argumento de ausência de início de prova material, configura cerceamento de defesa, quando se trata de prova indispensável para a instrução e julgamento do pedido, na presença de elementos que configuram início de prova documental.

2. Anulação da sentença com retorno dos autos à origem para conclusão da instrução e oitiva de testemunhas, bem como nova decisão.

Novamente processado o feito, sobreveio nova sentença, publicada em 03/09/2023, cujo dispositivo tem o seguinte teor (evento 68, SENT1):

Ante o exposto, julgo extinto o processo sem exame do mérito em relação ao pedido de reconhecimento do período comum de 07/02/2017 a 05/06/2017, com fulcro no artigo 485, incisos IV e VI, do Código de Processo Civil.

No mérito, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, resolvendo o processo com análise de mérito, a teor do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:

1) reconhecer o trabalho rural no período de 10/08/1977 a 31/10/1991, que deverá ser averbado independentemente do recolhimento de contribuições;

2) determinar a concessão do benefício previdenciário de aposentadoria (integral por tempo de contribuição OU nos termos do art. 15 OU 17 das regras de transição da EC 103/2019), com DIB em 18/03/2020, data de entrada do requerimento administrativo NB 196.421.658-0; e

CONCEDO a antecipação dos efeitos da tutela.

Intime-se desde logo o INSS para que apresente simulações de renda e atrasados em relação a cada hipótese da fundamentação. Após, intime-se a parte autora para que opte pela hipótese que reputar mais vantajosa, que deverá ser implantada pelo INSS, com DIP no primeiro dia do mês desta sentença, no prazo de 20 (vinte) dias.

3) condenar o réu a PAGAR por meio de requisição de pagamento, após o trânsito em julgado, os valores dos atrasados devidos desde a DIB até a DIP, atentando-se que:

i) deve ser observada a prescrição quinquenal;

ii) as parcelas pretéritas deverão ser atualizadas pelo INPC, com juros moratórios calculados segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança (Lei nº 11.960/2009), conforme decidido pelo STJ no REsp 1.495.146-MG (Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/02/2018, Informativo 620). A partir de dezembro de 2021, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente (art.3º, EC 113/2021).

4) Considerando a sucumbência recíproca, mas em menor parte pelo autor, aplica-se a hipótese do artigo 86 do Código de Processo Civil, distribuindo-se, na proporção de 70% (setenta por cento) para o autor e 30% (trinta por cento) para o INSS, os honorários advocatícios, fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelos artigo 85, § 3°, do Código de Processo Civil, sendo vedada sua compensação, nos termos do artigo 85, §14, Código de Processo Civil. A base de cálculo será o valor da condenação, limitado ao valor das parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111, STJ; Súmula 76, TRF4). Fica suspensa a execução dos valores devidos pelo autor enquanto perdurar o benefício da justiça gratuita, nos termos e prazos dos art. 98 do CPC.

Sem custas a restituir pela parte autora, em virtude da gratuidade de justiça.

DEFIRO o destacamento de honorários apenas no que diz respeito ao percentual devido a título de atrasados, devendo demais valores serem objeto de acerto diretamente entre os contratantes.

Interposta apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões, por 15 dias. Com ou sem elas, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4º Região, conforme artigo 1.010, §3°, do CPC.

Em que pese ilíquida a sentença, o valor da condenação claramente é inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Assim, dispensado o reexame necessário, nos termos do artigo 496, §3°, I, do CPC.

Intimem-se.

O INSS apelou alegando que não foram acostados documentos contemporâneos capazes de servir como início de prova material, razão pela qual afirma ser inviável o reconhecimento da atividade rural no intervalo de 10/08/1977 a 31/10/1991. (evento 79, APELAÇÃO1)

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

Peço dia para julgamento.

VOTO

Mérito

Atividade Rural (Segurado Especial)

O art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, bem como o art. 127, V, do Decreto nº 3.048/99, expressamente autorizam o aproveitamento do tempo de serviço rural trabalhado até 31/10/1991, sem que se faça necessário o recolhimento das contribuições previdenciárias para a averbação de tempo de contribuição, exceto no que se refere à carência.

Ainda, o art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91, estendeu a condição de segurado a todos os integrantes do grupo familiar que laboram em regime de economia familiar, sem a necessidade de recolhimento das contribuições quanto ao período exercido antes da Lei nº 8.213/91 (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10-11-2003).

Tratando-se de trabalhador rural e de pescador artesanal, a jurisprudência atenuava a exigência de prova material, flexibilizando a Súmula n° 149 do Superior Tribunal de Justiça, que impedia a concessão do benefício com base apenas em prova oral. Contudo, a 1ª Seção daquele Tribunal, ao julgar o Tema n° 297 de seus Recursos Repetitivos, reafirmou a Súmula, e afastou o abrandamento ao decidir com força vinculante que: "a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário".

Acerca do termo inicial da prova documental, de acordo com a tese elaborada no Tema n° 638 dos Recursos Repetitivos do Superior Tribunal de Justiça: "Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório". Teor similar tem a Súmula n° 577 do Superior Tribunal de Justiça: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório". Assim, não há necessidade de que o início da prova material abranja integralmente o período postulado, sendo suficiente que seja contemporâneo ao reconhecimento que se pretende, desde que ampliada por prova testemunhal convincente.

O uso de provas documentais em nome de outras pessoas do grupo familiar é permitido, com ressalvas, de acordo com o Tema n° 533 dos Recursos Repetitivos do STJ: "Em exceção à regra geral (...), a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana".

Ademais, sobre o labor urbano de integrante do grupo familiar e a investigação da descaracterização - ou não - do trabalho do segurado especial, o STJ estabeleceu no Tema n° 532 dos Recursos Repetitivos: "O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ)".

O rol de documentos descrito no art. 106 da Lei nº 8.213/91 é exemplificativo, admitindo-se a inclusão de documentos em nome de terceiros, integrantes do grupo familiar, conforme a Súmula nº 73 desta Corte: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".

Não havendo início de prova documental do exercício de atividade rural, nem prova de que a parte requerente tenha exercido atividade diversa no período controvertido, cabível a extinção do processo sem resolução do mérito, assegurando a possibilidade de formulação de novo requerimento administrativo instruído e, se necessário, o ajuizamento de nova ação, na forma do Tema 629/STJ:

A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.

No caso dos autos, foi reconhecido o tempo de serviço rural 10/08/1977 a 31/10/1991.

O INSS, conforme relatado, apelou alegando que não foram acostados documentos contemporâneos capazes de servir como início de prova material, razão pela qual afirma ser inviável o reconhecimento da atividade rural no intervalo de 10/08/1977 a 31/10/1991.

Sem razão, contudo.

A sentença, da lavra do MM. Juiz Federal, Dr. ERICO SANCHES FERREIRA DOS SANTOS, examinou e decidiu com precisão todos os pontos relevantes da lide, devolvidos à apreciação do Tribunal, assim como o respectivo conjunto probatório produzido nos autos. As questões suscitadas no recurso não têm o condão de ilidir os fundamentos da decisão recorrida. Evidenciando-se a desnecessidade da construção de nova fundamentação jurídica, destinada à confirmação da bem lançada sentença, transcrevo e adoto como razões de decidir os seus fundamentos, in verbis:

Tempo de serviço rural

Pretende a parte autora o reconhecimento do trabalho rural na qualidade de segurado especial no período de 10/08/1973 a 31/10/1991.

Conforme art. 38-B da Lei nº 8.213/91, “o segurado especial comprovará o tempo de exercício da atividade rural por meio de autodeclaração ratificada por entidades públicas credenciadas, nos termos do art. 13 da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, e por outros órgãos públicos, na forma prevista no regulamento." Complementarmente, na forma do art. 106, da Lei 8.213/91, outros documentos poderão ser utilizados, desde que contemporâneos e que permitam concluir pela vinculação da pessoa interessada ao meio rural.

Em resumo, a comprovação do tempo rural pode ocorrer de duas formas: a) autodeclaração ratificada por dados constantes de órgãos governamentais; e b) autodeclaração corroborada por documentos que possam demonstrar a vinculação do indivíduo ao meio rural. 

Nesse contexto, os servidores do INSS, por meio do  Ofício-Circular nº 46, Dirben-INSS, e agora por meio da IN 128/2022, foram orientados a como proceder em relação a análise da comprovação da condição de segurado especial e o respectivo cômputo dos períodos. Um primeiro ponto de destaque é que, nesse documento, não foi estabelecida distinção entre prova plena (art. 47, IN 77) e início de prova material (art. 54, IN 77/15), de modo que todos os documentos se consubstanciam em prova suficiente do exercício de atividade rural.

Outro ponto a ser destacado diz respeito à eficácia temporal e subjetiva atribuída aos documentos apresentados por parte do INSS, exposta na Portaria DIRBEN/INSS nº 990, de 28 de março de 2022 (art. 94). Quanto a eficácia temporal, em síntese,  temos o seguinte cenário: 

a) para a aposentadoria por idade, deverá ser apresentado um instrumento ratificador para cada metade da carência exigida no benefício. Se declarar período superior ao da carência, este também poderá ser reconhecido, desde que corroborado por documentos contemporâneos;

b) para os benefícios aposentadoria por idade híbrida e a aposentadoria por tempo de contribuição, será necessário um instrumento ratificador contemporâneo para cada metade da carência exigida no benefício. Caso o instrumento ratificador não seja suficiente para todo o período autodeclarado, deverá ser computado o período mais antigo dentro do limite temporal de carência.

c) para os demais benefícios,  como a pensão por morte,  salário-maternidade,  auxílio-acidente, o auxílio por incapacidade temporária, a aposentadoria por incapacidade permanente e o auxílio-reclusão, deverá ser apresentado um instrumento ratificador anterior ao fato gerador.

Anoto, ainda, que, nos termos da IN 128/2022, se o instrumento ratificador for anterior ao período de carência, sua utilização será viável, desde que seja contemporâneo aos fatos nele indicados e complementado por instrumento ratificador contemporâneo ao período de carência, caso não haja elemento posterior que descaracterize a continuidade do labor rural (art. 116, § 2º, inc. II).

Além disso, em se tratando de documentos de caráter permanente, como documentos de propriedade, posse, ou um dos tipos de outorga, são válidos até sua desconstituição, até mesmo para caracterizar todo o período de carência.

Quanto à extensão do instrumento de ratificação em relação aos demais membros do grupo familiar, a orientação aos servidores consolidou a possibilidade de utilização dos meios de prova em nome de um membro a todos os demais (inc. III).

Em 02/06/20, foi publicada a Nota Técnica Conjunta nº 01/20, dos Centros de Inteligência Locais da Justiça Federa da 4ª Região, ou seja, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Seu objetivo é o de orientar os magistrados acerca da possibilidade de dispensa da prova oral, considerando-a uma medida possível, porém excepcional, a depender da suficiência dos elementos de prova apresentados à luz dos critérios adotados administrativamente. Além disso, no referido estudo, o grupo de trabalho concluiu pela aplicação dos parâmetros do Ofício Dirben 46, reproduzidos na IN 128/2022 e na Portaria nº 990/2022, também para os trabalhadores boias-frias.

Por fim, em relação ao termo inicial do labor rural, é possível seu reconhecimento mesmo se realizado antes de o segurado ter completado 12 anos, conforme entendimento do STJ (Agravo Regimental no AI nº 922625 2007.01.62357-8, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJ 29/10/07) e da TNU (Processo nº 00021182320064036303, Juiz Federal Frederico Augusto Leopoldino Koehler, DOU 10/06/2016). No mesmo sentido, o  TRF4, nos autos da Ação Civil Pública nº 5017267-34.2013.4.04.7100, determinou ao INSS que se abstenha de fixar idade mínima para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição, especialmente no caso do trabalho rural.

Feitas essas considerações, passo ao caso concreto.

No caso dos autos, visando atender à exigência de prova material, foram apresentados, entre outros, os seguintes documentos:​

1- matrícula de imóvel rural no Município de Santa Cecília do Pavão/PR, de propriedade do pai desde 1968 (1.14);

2- histórico escolar, informando frequência na Escola Rural Municipal José Maria Leite, Município de Santa Cecília do Pavão/PR, nos anos de 1974 a 1977 (1.17, página 53);​​

3- histórico escolar de um irmão, informando frequência na Escola Municipal Rural José Maria Leite, Município de Santa Cecília do Pavão/PR, nos anos de 1988 a 1992 (1.12, página 6).

Os demais documentos não podem ser aproveitados por ausência de previsão legal, por não serem relativos ao grupo familiar ao qual pertencia o autor à época ou por não serem contemporâneos ao período de prova, não atendendo às exigências da sistemática exposta na fundamentação supra.

Além da prova documental, a parte autora apresentou autodeclaração (1.8), na qual se lê que trabalhou na lavoura com os pais e irmãos em terras próprias no município de Santa Cecília do Pavão/PR. Segundo informou, plantavam algodão para venda e milho, arroz, feijão e trigo para subsistência e venda do excedente. Informou ainda que não possuíam empregados, e que não havia outra fonte de renda além do trabalho rural.

Em relação à prova oral, a parte autora disse que iniciou a atividade rural ainda criança, aos sete anos, nas terras da família de cinco alqueires em Santa Cecília do Pavão, com os pais e sete irmãos. A autora era a quarta filha. Plantavam principalmente algodão para venda, além de milho e feijão para subsistência. Não trocavam dias de serviço, nem contratavam terceiros. Autora estudou em escola rural até a quarta série do ensino fundamental, no horário matutino. Ia a pé para a escola. Ao terminar a quarta série, ficou um tempo sem estudar e voltou a frequentar a escola à noite. Ficou na lavoura até 1991, quando foi, juntamento com os irmão, para Curitiba (62.1).

A testemunha Gabriel João de Andrade foi vizinho de sítio da autora, permaneceu na localidade até 2002. Soube citar os nomes dos irmãos e confirmou a atividade rural desde a infância, no cultivo de algodão, feijão e milho. Afirmou que a escola rural ficava perto das propriedades. Afirma que a autora saiu da cidade em 1991 (62.3).

A testemunha Valdecir Aparecido Cordeiro, oito anos mais novo do que a autora, foi seu vizinho de sítio. Saiu de Santa Cecília do Pavão em 1996, depois da autora. Confirmou a atividade rural da autora até a saída da cidade, depois de adulta. Plantavam principalmente algodão, além de mandioca, milho e arroz para subsistência, sem maquinário ou a contratação de terceiros (62.4).

A testemunha Givaldo Vitor de Oliveira tinha um avô vizinho de sítio da família da autora. Viu a autora trabalhar o meio rural até 1981, pois nesse ano a testemunha foi morar no meio urbano de Santa Cecília do Pavão. Parentes contaram que a autora foi para Curitiba em 1994. Afirmou que a autora começou a trabalhar com sete anos e que a família cultivava algodão, feijão, milho, batata e arroz (62.5).

A respeito do trabalho rural anterior aos 12 anos de idade, em tese aceito, entendo que seu reconhecimento demanda prova robusta, sob pena de transformar em regra a exceção. Não se ignora que não é raro que no meio rural o trabalho inicie em idade inferior àquela prevista constitucionalmente. Todavia, o reconhecimento demanda a existência de prova contundente, não produzida nestes autos, devendo eventual colaboração da criança neste ponto ser considerado como mero auxílio aos demais familiares. Ressalto que, dos oito aos doze anos, a autora frequentou escola rural no período matutino.

Deste modo, na linha do entendimento exposto acima, entendo que as informações prestadas na autodeclaração encontram ratificação nos documentos apresentados, atendendo às exigências de prova para o período de 10/08/1977 a 31/10/1991.

Pelo exposto, reconheço o labor rural exercido pela parte autora no período de 10/08/1977 a 31/10/1991, o qual deverá ser averbado pelo INSS como tempo de serviço independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei de Benefícios.

Ressalte-se que o referido período não será computado para fins de carência, de acordo com o referido § 2º do artigo 55 da Lei n. 8.213/91.

Dessa forma, não merece prosperar o apelo do INSS.

Honorários Advocatícios

Os honorários advocatícios são devidos, em regra, no patamar de 10%, observados os percentuais mínimos previstos em cada faixa do § 3º do art. 85 do Código de Processo Civil para as condenações proferidas a partir de 18.03.2016, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e nº 76 deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região, respectivamente:

Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença.

Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.

Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt. nos EREsp. 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017).

Improvido o apelo do INSS, observa-se que o Juízo de origem fixou os honorários nos percentuais mínimos de cada faixa prevista no art. 85, § 3º, do Código de Processo Civil, os quais, por conta da sucumbência na fase recursal, são majorados, na forma do § 11 do art. 85 do Código de Processo Civil, em 50% sobre o valor a que foi condenado na origem, considerando as variáveis do art. 85, § 2º, I a IV, os limites dos §§ 3º e 5º, do mesmo Código, e o entendimento desta Turma em casos símeis:

PREVIDENCIÁRIO. (...) CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. (...) 6. Nas ações previdenciárias os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos das Súmulas 111 do STJ e 76 do TRF/4ª Região. Confirmada a sentença, majora-se a verba honorária, elevando-a para 15% sobre o montante das parcelas vencidas, consideradas as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC. (...) (TRF4, AC 5004859-05.2017.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, j. 27.02.2019)

Tutela Antecipada

Presente a tutela antecipada deferida pelo Juízo a quo, determinando a implantação do benefício, confirmo-a, tornando definitivo o amparo concedido, e, caso ainda não tenha sido implementada, que o seja no prazo de 45 dias.

Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário inacumulável, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

Prequestionamento

Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.

Conclusão

- apelação do INSS: improvida;

- confirmada a tutela antecipada anteriormente deferida.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo do INSS e confirmar a tutela antecipada deferida.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004224478v3 e do código CRC 010e65ca.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 20/12/2023, às 7:45:24


5009345-33.2022.4.04.7000
40004224478.V3


Conferência de autenticidade emitida em 28/12/2023 04:01:11.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5009345-33.2022.4.04.7000/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ELZA PEREIRA BARBOSA (AUTOR)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL.

Nos termos do artigo 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, o cômputo de tempo de serviço de segurado trabalhador rural, anterior à data de início de sua vigência, é admitido para concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. Para o período ulterior à Lei de Benefícios (competência de novembro de 1991, conforme disposto no artigo 192 do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social aprovado pelo Decreto nº 357/91), o aproveitamento condiciona-se ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, de acordo com o artigo 39, inciso II, da Lei n° 8.213/91 e Súmula 272 do Superior Tribunal de Justiça.

Para a comprovação do tempo de atividade rural é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal.

Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição a partir da data do requerimento administrativo, respeitada eventual prescrição quinquenal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao apelo do INSS e confirmar a tutela antecipada deferida, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 19 de dezembro de 2023.



Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004224479v3 e do código CRC 8bace7ec.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
Data e Hora: 20/12/2023, às 7:45:24


5009345-33.2022.4.04.7000
40004224479 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 28/12/2023 04:01:11.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 12/12/2023 A 19/12/2023

Apelação Cível Nº 5009345-33.2022.4.04.7000/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): DANIELE CARDOSO ESCOBAR

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ELZA PEREIRA BARBOSA (AUTOR)

ADVOGADO(A): ELISANGELA DE FREITA (OAB PR100064)

ADVOGADO(A): MARLON ALEXANDRE DE SOUZA WITT (OAB PR049672)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/12/2023, às 00:00, a 19/12/2023, às 16:00, na sequência 1470, disponibilizada no DE de 30/11/2023.

Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E CONFIRMAR A TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

MARIANA DO PRADO GROCHOSKI BARONE

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 28/12/2023 04:01:11.

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