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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL DO RETORNO À AGRICULTURA APÓS VÍNCULO URBANO. TEMA 629/STJ. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. TRF4. 5003461-18.2020.4.04.9999

Data da publicação: 18/04/2024, 07:01:06

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL DO RETORNO À AGRICULTURA APÓS VÍNCULO URBANO. TEMA 629/STJ. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. 1. Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea. O início de prova material não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental. 2. Hipótese em que o conjunto probatório coligido não é seguro quanto ao retorno da parte autora à agricultura após vínculo de trabalho urbano. 3. No caso de não ser produzido contexto probatório suficiente à demonstração do trabalho rural, aplicável o Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça, em que firmada a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz para instruir o pedido implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários. 4. O recolhimento de contribuições previdenciárias com o NIT errado não implica desconsideração das contribuições em favor do segurado. 5. Hipótese em que, mesmo computados os períodos de tempo rural e urbanos reconhecidos, o autor não alcança tempo suficientes à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4, AC 5003461-18.2020.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 10/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003461-18.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

APELANTE: JOSE SEMBALISTA NETO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interpostas em face de sentença que julgou procedente em parte o pedido, nos seguintes termos (evento 2, SENT82):

Do exposto, resolvo o mérito julgando parcialmete procedente o pedido deduzido na petição inicial (art. 487, I, do CPC), quanto ao(s) acionante(s) José Sembalista Neto (CPF 218.853.629-00), para:

a) declarar que o requerente laborou na condição de segurado especial no período de 06.01.1965 a 28.02.1973 e de 01.04.1974 a 02.10.1975; e,

b) declarar que o requerente verteu contribuição como contribuinte individual no mês de outubro de 1987.

O INSS sustenta, em suas razões, que o efetivo exercício da atividade rural em regime de economia familiar deve ser comprovado por meio de notas fiscais de vendas de produtos agrícolas, contratos de arrendamento ou outros documentos contemporâneos ao período que se quer provar. Alega a impossibilidade de utilização de período de trabalho rural anterior a 11/1991 como carência. Assevera a inviabilidade de ser reconhecido o período de labor rural por menor de 14 anos anterior a 1967. Sustenta que deve ser apresentada prova material robusta para comprovar o retorno ao meio rural após o vínculo urbano. Registra que a competência de 10/1987, por não constar do CNIS, demanda documentos de prova do vínculo de emprego. Requer, por fim, a improcedência dos pedidos, e, caso mantida a sentença, seja aplicada a TR como índice de correção monetária (evento 2, PET87).

A parte autora sustenta, preliminarmente, a nulidade da sentença em face da decisão surpresa, uma vez que a decisão foi proferida após a produção de prova testemunhal sem qualquer ato decisório que encerrasse a instrução. Alega também o cerceamento do direito de produzir provas, uma vez que a sentença inadmitiu os períodos de contribuição recolhidos sob um código NIT equivocado. No mérito, alega que as guias de contribuição recolhidas sob o NIT 1.093.670.659-4 pertencem ao autor, e que as guias recolhidas em favor do NIT 1.098.037.323-9 foram pagas por ele e devem ser revertidas em seu próprio benefício. Argui que somados os períodos de atividade rural admitidos na sentença às contribuições recolhidas durante toda a sua vida contributiva, preenche os requisitos para aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER. Subsidiariamente, requer a concessão da aposentadoria por idade, pelo princípio da fungibilidade, mesmo que mediante reafirmação da DER (evento 2, APELAÇÃO89).

Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de Admissibilidade

Os apelos preenchem os requisitos de admissibilidade.

Preliminares - Nulidade da sentença

Sustenta a parte autora a nulidade da sentença, uma vez que proferida sem qualquer ato decisório que encerrasse a instrução.

O art. 10 do Código de Processo Civil estabelece que "O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.

A sentença, todavia, não infringiu o art. 10 do Código de Processo Civil, e não se configurou o alegado julgamento surpresa, pois os fundamentos jurídicos adotados basearam-se em provas submetidas ao contraditório.

A respeito, o Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou no seguinte sentido:

RECURSO ESPECIAL. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM QUE ADOTOU FUNDAMENTO DIVERSO DO ADOTADO PELA SENTENÇA, COM BASE EM NOVA SITUAÇÃO DE FATO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. ART. 10 DO CPC/2015. OCORRÊNCIA. ANULAÇÃO PARA OITIVA DA PARTE. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. 1. "O 'fundamento' ao qual se refere o art. 10 do CPC/2015 é o fundamento jurídico - circunstância de fato qualificada pelo direito, em que se baseia a pretensão ou a defesa, ou que possa ter influência no julgamento, mesmo que superveniente ao ajuizamento da ação -, não se confundindo com o fundamento legal (dispositivo de lei regente da matéria). A aplicação do princípio da não surpresa não impõe, portanto, ao julgador que informe previamente às partes quais os dispositivos legais passíveis de aplicação para o exame da causa. O conhecimento geral da lei é presunção jure et de jure" (EDcl no Resp n° 1.280.825/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 27/6/2017, DJe 1/8/2017.) 2. O art. 933 do CPC/2015, em sintonia com o multicitado art. 10, veda a decisão surpresa no âmbito dos tribunais, assinalando que, seja pela ocorrência de fato superveniente, seja por vislumbrar matéria apreciável de ofício ainda não examinada, deverá o julgador abrir vista, antes de julgar o recurso, para que as partes possam se manifestar. 3. Não há falar em decisão surpresa quando o magistrado, diante dos limites da causa de pedir, do pedido e do substrato fático delineado nos autos, realiza a tipificação jurídica da pretensão no ordenamento jurídico posto, aplicando a lei adequada à solução do conflito, ainda que as partes não a tenham invocado (iura novit curia) e independentemente de oitiva delas, até porque a lei deve ser do conhecimento de todos, não podendo ninguém se dizer surpreendido com a sua aplicação. [...] 7. Recurso especial provido (REsp n. 1.755.266/SC, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 18/10/2018, DJe de 20/11/2018.)

Alega, ainda, o cerceamento do direito de produzir provas, uma vez que a decisão não admitiu os períodos de contribuição recolhidos sob um código NIT equivocado.

Verifica-se que o juízo a quo intimou as partes para produção de prova oral e documental (evento 2, DEC38) e o processo foi regularmente instruído.

Dessa forma, devem ser afastadas as preliminares arguidas.

Mérito

Do Tempo de Serviço Rural

Acerca do reconhecimento de tempo de serviço rural, o art. 55, §§ 2º e 3º, da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 13.846/2019, exige a apresentação de início de prova material (documental):

Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:

[...]

§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.

§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

A jurisprudência a respeito da matéria encontra-se pacificada, retratada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, que possui o seguinte enunciado: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de benefício previdenciário.

O reconhecimento do tempo de serviço rural exercido em regime de economia familiar aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da Lei 8.213/1991 (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU 10/11/2003).

A relação de documentos referida no art. 106 da Lei 8.213/1991 para comprovação do tempo rural é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar, em conformidade com o teor da Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental." (DJU, Seção 2, de 02/02/2006, p. 524).

Ainda sobre a extensão do início de prova material em nome de membro do mesmo grupo familiar, “o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar”, mas, “em exceção à regra geral (...) a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana” (Temas nº 532 e 533, respectivamente, do Superior Tribunal de Justiça, de 19/12/2012).

O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011; TRF4, EINF 0016396-93.2011.4.04.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).

No mesmo sentido, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".

De ressaltar que a ausência de notas fiscais de comercialização de gêneros agrícolas não impede o reconhecimento de atividade rural como segurado especial, não apenas porque a exigência de comercialização dos produtos não consta da legislação de regência, mas também porque, num sistema de produção voltado para a subsistência, é normal que a venda de eventuais excedentes aconteça de maneira informal (TRF4, 3ª Seção, EIAC 199804010247674, DJU 28/01/2004, p. 220).

Idade mínima para exercício de atividades laborais

A Constituição Brasileira de 1946 estabeleceu a idade mínima de 14 anos para o trabalho no país (art.157, IX). O limite foi reduzido para 12 anos pela Constituição Federal de 1967 (art. 158, X). Com a promulgação da Constituição de 1988, foi restabelecido o limite de 14 anos (art. 7º, XXXIII), o qual foi alterado para 16 anos pela Emenda Constitucional nº 20/1998, atualmente vigente, que assim dispõe:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;

Em que pese o art. 11, VII, da Lei 8.213/1991, na sua redação original, prever o limite etário de 14 anos para fins de reconhecimento da qualidade de segurado especial, a jurisprudência firmou o entendimento de que é possível o reconhecimento de atividade rural, no período anterior à vigência da Lei 8.213/1991, pois as normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para não prejudicá-lo. Nesse sentido: STF, RE 600616 AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, j. 26/08/2014) e a Súmula 5 da TNU: A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciário.

Do Caso Concreto

O ponto controvertido cinge-se ao reconhecimento do tempo rural no intervalo de 06/01/1965 (12 anos) a 28/02/1973 e de 01/04/1974 a 02/10/1975, com vínculo de emprego entre os períodos reconhecidos, de 01/03/1973 e 31/03/1974, no cargo de mateiro em uma Madeireira.

No caso, a sentença reconheceu o labor rural exercido pela parte autora nos períodos aludidos, conforme segue:

Aplicando tais orientações ao caso concreto, verifico que a qualidade rural no regime individual ou familiar foi comprovada mediante início de prova material [i) certidão/ficha de alistamento militar que designa o requerente como lavrador (p. 40-41); ii) comprovante de alienação de imóvel rural pelos pais do requerente (p. 44); iii) certidão de nascimento do autor e de seus irmãos, que qualificam o pai como lavrador (p. 45-46); iv) ficha do sindicato rural, onde consta a profissão de lavrador do pai do autor (47); v) reconhecimento administrativo de parte do período de trabalho rural necessário à concessão de benefício em favor da mãe do requerente (p.49-50)] corroborado pelo substrato oral colhido na audiência de instrução e julgamento (p. 244).

Assim, verifico que o autor trabalhou na condição de segurado especial no período de 6.1.1965 até 28.2.1973 e de 1.4.1974 até 2.10.1975.

Para comprovar o exercício de atividade rural, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais cito:

a) Carteira de Trabalho e Previdência Social emitida em 03/07/1972, com registro de primeiro vínculo de emprego em 01/03/1973, no cargo de mateiro (evento 2, OUT6, p. 2-4);

b) ficha e certidão de alistamento militar em 1971 em que consta a profissão do autor como lavrador (evento 2, OUT7, p. 1 e 2);

c) certidão de casamento dos pais do autor em 1950 em que o genitor está qualificado como lavrador (​evento 2, OUT7​, p. 4);

d) registro de imóvel rural em nome do pai do autor, com data de aquisição em 27/06/1969 e de alienação em 13/07/1978 (​evento 2, OUT7​, p. 5);

e) certidão de nascimento da irmã do autor em 1960 em que o genitor está qualificado como lavrador (​evento 2, OUT7​, p. 6);

f) certidão de nascimento do irmão do autor em 1955 em que o genitor está qualificado como lavrador (evento 2, OUT8, p. 1);

g) ficha do sindicato dos trabalhadores rurais em nome do pai do autor, datada de 16/02/1974, constando a profissão do genitor como lavrador (​evento 2, OUT8​, p. 2).

Na audiência de instrução e julgamento, foram inquiridas três testemunhas.

A testemunha Ana Bilesk (evento 5, VIDEO1) disse, em seu depoimento, que era vizinha do autor e sua família quando os conheceu. Eles plantavam milho, feijão, arroz, fumo de corda e tinham criação de tudo, pois eram agricultores. Apenas a família deles trabalhava nas terras. Eram os pais e seis irmãos. O autor começou a trabalhar lá desde pequeno. Não tinham maquinários mas tinham carroças. Não lembra quando o autor saiu da roça, mas depois que saiu os pais continuaram trabalhando como agricultores.

O Sr. Eugênio Malinoski (evento 5, VIDEO2), ouvido como informante por ser amigo do autor, disse que o conheceu quando ele tinha por volta de uns 17, 18 anos e trabalhava na lavoura plantando feijão, milho, tinha criação de porco e galinhas. Disse que só a família trabalhava lá e eles eram oito. Não havia maquinários. Não soube dizer a quem pertenciam as terras e o seu tamanho.

A testemunha Nicolau Karpen Sobrinho (evento 5, VIDEO3) disse que conheceu o autor e seus pais mais ou menos de 1963 a 1966. Afirmou que eles tinham um terreno, trabalhavam na roça e plantavam de tudo, fumo de corda, milho e feijão. Só a família trabalhava lá. Não usavam maquinários, era só trabalho manual. As terras eram do pai do autor. Via o autor trabalhando lá pois morava perto.

Com relação ao intervalo de 06/01/1965 a 28/02/1973, o início de prova material, consubstanciado nos documentos contemporâneos ao período controvertido - em especial a certidão de alistamento militar em 1971 em que consta a profissão do autor como lavrador, os registros civis qualificando o genitor como lavrador, bem como o registro de imóvel rural -, corroborados pelos depoimentos testemunhais, são suficientes para comprovar o exercício da atividade rural no período em questão.

Como já ressaltado anteriormente, são admitidos como meio de prova material do tempo rural quaisquer documentos que indiquem o exercício da atividade campesina no período controvertido, inclusive registros civis e registros de propriedade de imóvel rural.

Nesse sentido, não é necessária a apresentação de notas fiscais da produção rural ou contratos de arrendamento em nome da parte autora, mormente quando os outros elementos de prova coligidos demonstram suficientemente a origem campesina da família e o efetivo exercício da atividade rural no período controvertido.

Considerando que a parte autora manteve vínculo urbano no período de 01/03/1973 e 31/03/1974, houve descontinuidade do labor rural.

Pondero que toda a vez que o segurado se afasta das lides campesinas, a ideia de continuidade do labor perde sentido. Vale dizer, surge com o trabalho urbano um panorama de manutenção do segurado na cidade, sendo necessária a apresentação de documentos que voltem a atrelá-lo ao exercício da atividade rurícola. A simples ausência de vínculo urbano entre dois períodos não garante o cômputo de tempo rural, mormente em virtude da possibilidade de trabalhos informais.

Não se olvida que no julgamento do IRDR 21 esta Corte firmou o entendimento de que é viável a consideração, como início de prova material, dos documentos emitidos em nome de terceiros integrantes do núcleo familiar, após o retorno do segurado ao meio rural, quando corroborada por prova testemunhal idônea.

Contudo, o conjunto probatório não é seguro quanto ao retorno à casa dos pais e em que termos tal fato ocorreu.

O labor urbano ocorreu em município diverso (Rio do Sul/SC) e distante do terreno rural da família (Papanduva/SC), bem como as testemunhas nada referiram a respeito de afastamento e retorno da parte autora à agricultura em razão do vínculo urbano.

Com efeito, não há nos autos nenhum documento em nome da autora que demonstre o exercício de atividade rural após o período de trabalho urbano.

Nesse sentido, tendo em vista a ausência de comprovação do efetivo retorno às lides campesinas após o vínculo urbano em questão, é inviável o reconhecimento do período de 01/04/1974 a 02/10/1975 como tempo de labor rural.

No caso, quanto ao período, aplica-se a tese firmada no Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça, de que a ausência de conteúdo probatório eficaz para instruir o pedido implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.

Registro que o tempo de serviço rural anterior a 10/1991 não é computado para efeito de carência, nos termos do § 2º do art. 55 da Lei 8.213/1991.

Tempo Urbano

Períodos de 10/1987, 11/1993 a 02/1996 e de 04/1996 a 03/1999

Com relação às contribuições relativas às competências de 10/1987 (​evento 2, OUT11​), 11/1993 a 02/1996, 04/1996 a 03/1999 (evento 2, OUT13, evento 2, OUT14, evento 2, OUT15 e evento 2, OUT16, evento 2, OUT17, evento 2, OUT18 e evento 2, OUT19), tendo em vista a comprovação do pagamento mediante as guias com autenticação bancária em nome do autor, possível o reconhecimento do tempo de serviço urbano dos períodos em questão.

Destaco que o recolhimento de contribuições com o NIT errado não implica na desconsideração das contribuições em favor da parte autora.

Ainda que a obrigação no preenchimento das guias/carnês de recolhimento para o contribuinte individual, assim como em relação ao pagamento, seja do contribuinte, não há como desconsiderar as contribuições feitas pelo autor, sob pena de enriquecimento ilícito da parte contrária.

Nesse sentido, esta Corte já decidiu:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECOLHIMENTOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. 1. O recolhimento de contribuições previdenciárias com o NIT errado não implica desconsideração das contribuições em favor do segurado. 2. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4, AC 5009310-19.2017.4.04.7107, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 25/04/2023)

Assim, além da competência de 10/1987, já reconhecida na sentença, as contribuições correspondentes aos períodos de 11/1993 a 02/1996 e de 04/1996 a 03/1999 devem ser incluídas ao tempo de serviço do autor.

​Período de 05/2003 a 06/2004 e de 09/2004 a 05/2005

No CNIS não constam recolhimentos vinculados ao NIT do segurado nos meses de 05/2003 a 06/2004 e de 09/2004 a 05/2005 (evento 11, CNIS1).

As guias de pagamento colacionadas, por sua vez, apresentam o código de recolhimento 2003 (Simples - CNPJ) em nome da empresa Sembalista e Veículos Ltda. - ME - CNPJ 05.608.899/0001-43 (evento 2, OUT20 e evento 2, OUT21).

Assim, por se tratar de recolhimentos da pessoa jurídica, não servem como comprovação do pagamento da contribuição previdenciária relativa à pessoa física, na condição de contribuinte individual.

A respeito, dispõe a Lei Complementar 123/2006:

Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:

[...]

§ 1o O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:

[...]

X - Contribuição para a Seguridade Social, relativa à pessoa do empresário, na qualidade de contribuinte individual;

Reitero. Não basta o pagamento relativo à empresa - que no caso do SIMPLES engloba as contribuições sociais especificadas nos incisos I a VIII, do art. 13 da LC nº 123-2006.

Para o cômputo do tempo de contribuição e carência é indispensável a comprovação do recolhimento da contribuição previdenciária própria do empresário (pessoa física), nos termos do artigo acima transcrito. Assim, a parte autora não faz jus ao cômputo das contribuições referidas.

Requisitos para Aposentadoria

De acordo com o art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, vigente até a edição da Emenda Constitucional 103/2019 (13/11/2019), o filiado ao Regime Geral da Previdência Social tinha direito à aposentadoria quando completados 35 anos de tempo de contribuição, se homem, e 30 anos, se mulher.

Com a reforma da previdência (EC 103-2019), para a concessão de aposentadoria é necessária idade mínima de 65 anos para o homem e 62 para mulher. Até que seja editada nova lei, o tempo mínimo de contribuição é de 20 anos para o homem e de 15 anos para a mulher (arts. 1º e 19).

Para os filiados ao Regime Geral de Previdência Social antes de 13/11/2019 foram asseguradas regras de transição, previstas nos arts. 15 a 18 da referida Emenda Constitucional.

No que refere à carência, o art. 25, inciso II, da Lei 8.213/1991, que não sofreu alteração em razão da reforma previdenciária, exigia e exige, em regra, 180 meses de carência para a concessão do benefício postulado, que pode ser reduzida nos moldes do art. 142, da mesma Lei.

O INSS apurou, na DER, 15 anos, 2 meses e 28 dias de tempo de contribuição e 182 meses de carência (evento 2, OUT32, p. 12).

Considerando o tempo rural reconhecido (06/01/1965 a 28/02/1973), bem como o tempo urbano (10/1987, 11/1993 a 02/1996, 04/1996 a 03/1999, tem-se que o autor implementa 28 anos, 9 meses e 21 dias de contribuição, não fazendo jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição até a DER (11/08/2010), conforme contagem a seguir:

CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

TEMPO DE SERVIÇO COMUM

Data de Nascimento06/01/1953
SexoMasculino
DER11/08/2010

- Tempo já reconhecido pelo INSS:

Marco TemporalTempoCarência
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998)0 anos, 0 meses e 0 dias0 carências
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999)0 anos, 0 meses e 0 dias0 carências
Até a DER (11/08/2010)15 anos, 2 meses e 28 dias183 carências

- Períodos acrescidos:

Nome / AnotaçõesInícioFimFatorTempoCarência
1rural (Rural - segurado especial)06/01/196528/02/19731.008 anos, 1 meses e 25 dias0
2contribuinte individual01/10/198731/10/19871.000 anos, 1 meses e 0 dias1
3contribuinte individual01/11/199328/02/19961.002 anos, 3 meses e 28 dias28
4contribuinte individual01/04/199631/03/19991.003 anos, 0 meses e 0 dias36

Marco TemporalTempo de contribuiçãoCarênciaIdadePontos (Lei 13.183/2015)
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998)13 anos, 3 meses e 9 dias6245 anos, 11 meses e 10 diasinaplicável
Pedágio (EC 20/98)6 anos, 8 meses e 8 dias
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999)13 anos, 6 meses e 23 dias6546 anos, 10 meses e 22 diasinaplicável
Até a DER (11/08/2010)28 anos, 9 meses e 21 dias24857 anos, 7 meses e 5 diasinaplicável

- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição

Em 11/08/2010 (DER), o segurado não tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98), porque não preenche o tempo mínimo de contribuição de 35 anos. Ainda, não tem interesse na aposentadoria proporcional por tempo de contribuição (regras de transição da EC 20/98) porque o pedágio da EC 20/98, art. 9°, § 1°, inc. I, é superior a 5 anos.

Tendo em vista a ausência de vínculos de emprego ou contribuições previdenciárias após o requerimento administrativo, não há que se falar em reafirmação da DER.

Custas processuais

O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça Federal, nos termos do art. 4º, I, a Lei 9289/1996, e na Justiça Estadual de Santa Catarina (Lei Complementar Estadual 755/2019).

Honorários Recursais

Não há majoração dos honorários (§ 11 do art. 85 do CPC), pois ela só ocorre se o recurso for integralmente desprovido (Tema STJ 1.059).

Prequestionamento

No que concerne ao prequestionamento, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.

Conclusão

Dado parcial provimento ao recurso do INSS para afastar o reconhecimento do período rural de 01/04/1974 a 02/10/1975 e julgar extinto o processo sem resolução do mérito no ponto, de acordo com a tese fixada no Tema 629 do STJ.

Dado parcial provimento ao recurso da parte autora para reconhecer os períodos de tempo urbano de 11/1993 a 02/1996 e de 04/1996 a 03/1999.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento aos recursos do autor e do INSS.



Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004377263v61 e do código CRC a3b02f28.Informações adicionais da assinatura:
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5003461-18.2020.4.04.9999
40004377263.V61


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003461-18.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

APELANTE: JOSE SEMBALISTA NETO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. aposentadoria por TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. tempo rural. regime de economia familiar. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL DO RETORNO À AGRICULTURA APÓS VÍNCULO URBANO. TEMA 629/STJ. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL.

1. Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea. O início de prova material não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental.

2. Hipótese em que o conjunto probatório coligido não é seguro quanto ao retorno da parte autora à agricultura após vínculo de trabalho urbano.

3. No caso de não ser produzido contexto probatório suficiente à demonstração do trabalho rural, aplicável o Tema 629 do Superior Tribunal de Justiça, em que firmada a tese de que a ausência de conteúdo probatório eficaz para instruir o pedido implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários.

4. O recolhimento de contribuições previdenciárias com o NIT errado não implica desconsideração das contribuições em favor do segurado.

5. Hipótese em que, mesmo computados os períodos de tempo rural e urbanos reconhecidos, o autor não alcança tempo suficientes à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento aos recursos do autor e do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 10 de abril de 2024.



Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004377264v7 e do código CRC 6a4f554b.Informações adicionais da assinatura:
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5003461-18.2020.4.04.9999
40004377264 .V7


Conferência de autenticidade emitida em 18/04/2024 04:01:05.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/04/2024 A 10/04/2024

Apelação Cível Nº 5003461-18.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO

APELANTE: JOSE SEMBALISTA NETO

ADVOGADO(A): THIAGO BUCHWEITZ ZILIO (OAB SC029884)

ADVOGADO(A): THIAGO BUCHWEITZ ZILIO

ADVOGADO(A): JOSE EMILIO BOGONI

ADVOGADO(A): LUIZ CARLOS SABADIN

ADVOGADO(A): RODRIGO LUIS BROLEZE

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/04/2024, às 00:00, a 10/04/2024, às 16:00, na sequência 743, disponibilizada no DE de 20/03/2024.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS DO AUTOR E DO INSS.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 18/04/2024 04:01:05.

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