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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS RUÍDO E HIDROCARBONETOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. TRF4. 5019013-86.2021.4.04.9999

Data da publicação: 22/04/2023, 07:01:15

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS RUÍDO E HIDROCARBONETOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 3. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos e a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância vigentes à época da prestação do labor enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 4. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição. 5. Corrigido erro material no somatório do tempo de serviço da autora. (TRF4 5019013-86.2021.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 14/04/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5019013-86.2021.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: MARISE REGINA BRAUN

ADVOGADO(A): VILMAR LOURENÇO (OAB RS033559)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra sentença publicada na vigência do CPC/2015, com o seguinte dispositivo:

Diante do exposto, declaro extinto o processo com fulcro no art. 487, I do CPC, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados por MARISE REGINA BRAUN em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, para o fim de condenar o demandado a:

a) reconhecer e averbar a especialidade da atividade desenvolvida pela parte autora nos períodos de 23/01/1984 a 28/08/1985, 19/02/1986 a 08/02/1988, 04/04/1988 a 12/06/1990, 09/09/1999 a 20/05/2019;

b) conceder o benefício da aposentadoria por tempo de contribuição, devendo ser reconhecido o período de contribuição de 30 anos, 06 meses e 20 dias desde a data do requerimento administrativo (20/05/2019 – Evento 01);

c) condenar o requerido ao pagamento do valor mensal apurado para o benefício da aposentadoria, assim como do abono anual respectivo, corrigidas nos termos da fundamentação acima, respeitada a prescrição quinquenal, valores a serem liquidados na fase de cumprimento de sentença.

CONDENO o réu ao pagamento das custas processuais por metade, em face da previsão do art. 11 da Lei Estadual nº 8.121, de 30 de dezembro de 19851, e ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, incidindo tão-somente sobre a diferença das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região2), excluídas as parcelas vincendas (Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça3).

Decisão sujeita a reexame necessário, nos termos do art. 496, I, do Código de Processo Civil.

Os embargos de declaração opostos pela autora foram rejeitados.

Apelou a autora sustentando a existência de erro material na sentença quanto ao somatório do tempo de contribuição, pois o INSS computou administrativamente 27 anos, 01 mês e 07 dias, e acrescido o tempo reconhecido na sentença totaliza 32 anos, 02 meses e 10 dias de tempo de contribuição, e não 30 anos como constou na sentença. Alegou que no dispositivo da sentença não constou o comando para o INSS converter pelo fator 1,2 os períodos especiais reconhecidos. Sustentou, também, que o dispositivo da sentença foi omisso quanto ao início dos efeitos financeiros, que devem retroagir à DER. Pediu, ainda, que o período de labor na Calçados Nubra Ltda., reconhecido como especial por exposição a agentes químicos, também seja reconhecido por sujeição a ruído acima do limite de tolerância legal. Por fim, pediu o afastamento das Súmulas 76/TRF4 e 111/STJ na fixação dos honorários avocatícios, por incompatíveis com o CPC/2015.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

Remessa oficial

O Código de Processo Civil de 2015, no art. 496, §3º, I previu que as sentenças prolatadas sob sua égide estariam sujeitas a reexame necessário apenas quando condenassem a Fazenda Pública ou garantissem proveito econômico à parte adversa em valores superiores a 1000 salários mínimos.

Embora ainda não tenha sido calculado o valor exato da renda mensal implantada ou revisada por força da sentença, é possível estimar, a partir da remuneração que vinha sendo auferida pela parte, e considerado o número de meses correspondentes à condenação até a data da sentença, que o proveito econômico obtido resultará em valor manifestamente inferior ao limite legal para o reexame obrigatório.

Consoante já decidido pelo STJ, ao afastar a aplicação da súmula 490, “a sentença que defere benefício previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos, os quais são expressamente previstos na lei de regência e são realizados pelo próprio INSS (...) ainda que o benefício previdenciário seja concedido com base no teto máximo, observada a prescrição qüinqüenal, com o acréscimos de juros, correção monetária e demais despesas de sucumbência, não se vislumbra, em regra, como uma condenação na esfera previdenciária venha a alcançar os mil salários mínimos (...)” (REsp 1.735.097/RS, Rel. Min Gurgel de Faria, DJe 11/10/2019).

Sendo a condenação do INSS fixada em valor manifestamente inferior a mil salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório.

Dessa forma, não conheço da remessa oficial.

Omisão e erro material

Não há a alegada omissão quanto ao termo inicial dos efeitos financeiros, pois o dispositivo da sentença é claro ao conceder o benefício desde a DER.

De outro lado, há efetivamente omissão quanto ao fator de conversão do tempo especial em comum no dispositivo da sentença, que deve ser suprido.

Ainda, conforme o resumo de documentos para cálculo de tempo de serviço/contribuição, o INSS computou em favor da autora, na DER (20/05/2019), 27 anos, 1 mês e 7 dias (evento 18, ANEXO2).

A sentença reconheceu a especialidade dos períodos de 23/01/1984 a 28/08/1985, 19/02/1986 a 08/02/1988, 04/04/1988 a 12/06/1990, 09/09/1999 a 20/05/2019, convertidos em tempo comum pelo fator 1,20, somando 30 anos, 06 meses e 20 dias.

Ocorre que o resultado da conversão de tais períodos em tempo comum pelo fator 1,2 acresce ao tempo reconhecido administrativamente (27 anos, 1 mês e 7 dias) 5 anos, 1 mês e 5 dias, o que totaliza 32 anos, 2 meses e 12 dias, e não como constou.

Portanto, o apelo merece provimento para sanar a omissão no dispositivo da sentença, fazendo constar o fator 1,2 para a conversão do tempo especial reconhecido em tempo comum, e para corrigir o somatório do tempo de serviço da autora na DER.

MÉRITO

Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:

- ao reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas no período de 09/09/1999 a 20/05/2019 por exposição a ruído superior ao limite de tolerância legal;

- aos honorários advocatícios.

Tempo de serviço especial

O tempo de serviço especial é disciplinado pela lei vigente à época em que exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova, cuja previsão legislativa expressa se deu com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99. Nesse sentido é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003).

Isso assentado, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) no período de trabalho até 28-04-1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto quanto à exposição a ruído e calor, em que necessária sempre a aferição de seus níveis (decibéis/ºC IBUTG), por meio de parecer técnico trazido aos autos ou, simplesmente, referido no formulário padrão emitido pela empresa;

b) a partir de 29-04-1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13-10-1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14-10-1996, que a revogou expressamente, de modo que, no interregno compreendido entre essas datas e 05-03-1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;

c) após 06-03-1997, quando vigente o Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

Essa interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).

Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).

Agente Nocivo Ruído

Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, o Quadro Anexo do Decreto n. 53.831, de 25-03-1964, o Quadro I do Decreto n. 72.771, de 06-09-1973, o Anexo I do Decreto n. 83.080, de 24-01-1979, o Anexo IV do Decreto n. 2.172, de 05-03-1997, e o Anexo IV do Decreto n. 3.048, de 06-05-1999, alterado pelo Decreto n. 4.882, de 18-11-2003, consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, respectivamente, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1, nos termos abaixo:

Até 05-03-1997:

1. Anexo do Decreto n. 53.831/64 - Superior a 80 dB;

2. Quadro I do Decreto n. 72.771/73 e Anexo I do Decreto n. 83.080/79 - Superior a 90 dB.

De 06-03-1997 a 06-05-1999:

Anexo IV do Decreto n. 2.172/97 - Superior a 90 dB.

De 07-05-1999 a 18-11-2003:

Anexo IV do Decreto n. 3.048/99, na redação original - Superior a 90 dB.

A partir de 19-11-2003:

Anexo IV do Decreto n. 3.048/1999 com a alteração introduzida pelo Decreto n. 4.882/2003 - Superior a 85 dB.

Decidiu o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do tema 694, que devem prevalecer, no reconhecimento da atividade especial, os estritos parâmetros legais vigentes em cada época:

“O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC).”

Assim, esta Corte revisou sua jurisprudência, em observância ao referido precedente e à segurança jurídica, passando a entender que a atividade será reconhecida como especial se houverem sido superados os respectivos limites de pressão sonora, segundo perícia técnica trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.

Considero necessário, porém, em atenção ao princípio da primazia da realidade, pontuar que se, atualmente, a exposição do trabalhador a ruído acima de 85dB é reconhecida como prejudicial à saúde, o que motivou a alteração normativa, para sua melhor proteção, é imperativo concluir que a situação de trabalho anterior à mudança era ainda mais gravosa, nada justificando a aplicação de um limiar maior de tolerância. A evolução da tecnologia tende a produzir melhoria nas condições de trabalho, seja com o desenvolvimento de máquinas mais silenciosas, seja com redução de riscos ou com o desenvolvimento de equipamentos ou sistemas de proteção mais eficientes. Em tais condições, não identifico qualquer justificativa para desconhecer que, no período entre 06-03-1997 e 18-11-2003, o trabalhador que exerceu atividades com sujeição a ruído acima de 85 dB, esteve sob condições nocivas à saúde, portanto, em atividade que deveria ser reconhecida como especial.

Diante do avanço no conhecimento científico a respeito do que é efetivamente nocivo ao trabalhador, a cobertura do risco social previdenciário resulta incompleta quando não protege o segurado que, no mundo dos fatos, já esteve exposto a agente nocivo que passou a ter sua especialidade enfim reconhecida nos normativos. Tal fenômeno pode ser observado quando descoberta a nocividade de um agente até então desconhecido, mas também no que diz respeito ao nível de tolerância aos agentes que admitem quantificação, como é o caso do ruído.

Não raramente, analisam-se casos em que, ao longo da vida laboral, o segurado exerceu sempre a mesma atividade, invariavelmente sujeito a ruído, por vezes em uma mesma empresa, operando as mesmas máquinas. São casos em que a prova técnica aponta que o segurado esteve exposto a ruído entre 85dB e 89,9dB, nos quais, apesar da identidade de situação fática, mais de seis anos de tempo especial acabam sendo suprimidos de sua vida laboral, para fins previdenciários, pelo mero efeito da escolha de alguns técnicos, que, ao longo dos anos, mudaram de ideia quanto ao grau de tolerância a ruído pelos trabalhadores, traduzindo sua oscilação nos normativos que disciplinaram o tema.

Feito o registro como sinalização (technique of signaling), especialmente para que a questão possa eventualmente, no futuro, ser revisitada pela Corte superior, adoto a solução estabelecida no precedente originado do tema 694 do STJ, por razões de segurança jurídica.

Ademais, "O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço." (Tema STJ 1083).

Quanto ao método de aferição do agente nocivo ruído, esta Corte Regional tem posicionamento segundo o qual a utilização de metodologia diversa da prevista na NHO-01 da FUNDACENTRO não inviabiliza o reconhecimento da especialidade, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto (AC 5015224-47.2015.4.04.7200, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, em 19/09/2019; AC 5001695-25.2019.4.04.7101, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, em 06/08/2020; AC 5003527-77.2017.4.04.7129, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, em 08/07/2020).

Exame do tempo especial no caso concreto

Passo, então, ao exame do período controvertido, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.

Período: 09/09/1999 a 20/05/2019

Empresa: Calçados Nubra Ltda.

Atividade/função: preparadeira

Agente nocivo: hidrocarbonetos aromáticos; ruído de 85,6 dB(A)

Prova: PPP - Perfil profissiográfico previdenciário (evento 1 - procadm7, pp. 40/41); PPRA - Programa de prevenção de riscos ambientais (evento 1 - procadm8, pp. 1/14); laudo pericial judicial (evento 46 - laudo1)

Enquadramento legal: itens 1.0.3 (benzeno e seus compostos tóxicos) e 1.0.19 (outras substâncais químicas) do Anexo IV do Dec. n. 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99.

Conclusão: os agentes nocivos aos quais estava exposta a parte autora estão elencados como especiais, e a prova é adequada. Conquanto haja divergências quando ao nível de ruído, pois o formulário refere ruído de 60 dB(A), o PPRA de 2004 refere que o ruído de fundo não ultrapassa o limite de 85 dB(A), e a perícia judicial realizada em 08/2020 apurou ruído de 85,6 dB(A), tenho que essa medição é que deve ser considerada, uma vez que a perícia foi in loco, acompanhada pelo proprietário da empresa, e atestou nível de ruído que é superior ao limite de tolerância legal a partir de 18/11/2003. Se a perícia feita em 2020 apurou um ruído de 85,6 decibeis, é viável sua utilização para atestar a especialidade do período anterior, pois não há indícios de que tenha havido piora nas condições de trabalho ao longo do tempo. Inclusive a tendência é de que o autor trabalhasse sob condições mais prejudiciais, pois a regra é o avanço de tecnologias protetivas, inovações tecnológicas e mesmo da medicina do trabalho, redundando em melhores condições laborais aos trabalhadores. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser parcialmente reformada a sentença no ponto, para reconhecer a especialidade do período de 18/11/2003 a 20/05/2019 também por ruído excessivo.

Direito à aposentadoria no caso concreto

No caso em exame, considerado o presente provimento judicial, a parte autora alcança, na DER (20/05/2019), 32 anos, 2 meses e 12 dias de tempo de serviço.

A carência necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2019 (art. 142 da Lei n.º 8.213/91) restou cumprida, tendo em vista que a parte autora possuía mais de 180 contribuições na DER.

Dessa forma, cumprindo com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito:

- à implementação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do requerimento;

- ao pagamento das parcelas vencidas.

Transcorridos menos de cinco anos entre a DER (20/05/2019) e o ajuizamento da demanda (18/10/2019), não incide, no caso, a prescrição quinquenal.

Consectários e provimentos finais

- Correção monetária e juros de mora

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.

Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 113, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Honorários advocatícios

Com relação ao disposto na Súmula 111/STJ, em 13/09/2021, o próprio Superior Tribunal de Justiça afetou a questão no âmbito da sistemática dos recursos repetitivos, estando a controvérsia consolidada no(s) seguinte(s) Tema(s):

Tema STJ 1105 - Definição acerca da incidência, ou não, da Súmula 111/STJ, ou mesmo quanto à necessidade de seu cancelamento, após a vigência do CPC/2015 (art. 85), no que tange à fixação de honorários advocatícios nas ações previdenciárias.

Todavia, não há determinação de sobrestamento dos processos pelo Tema 1105 nesta fase processual, mas apenas nos casos de recurso especial em segunda instância.

A fim de evitar a paralisação da marcha processual e considerando-se tratar de questão acessória, fica diferida a análise da questão para a fase de cumprimento de sentença, adequando-se ao que vier a ser decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento da questão submetida à sistemática dos recursos repetitivos.

Tutela específica - implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.

Dados para cumprimento: (X) Concessão ( ) Restabelecimento ( ) Revisão

NB

189.316.607-1

Espécie

42 - aposentadoria por tempo de contribuição

DIB

20/05/2019

DIP

No primeiro dia do mês da implantação do benefício

DCB

Não se aplica

RMI

a apurar

Observações

-

Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

Conclusão

Remessa oficial não conhecida. Apelação parcialmente provida, para suprir omissão no dispositivo da sentença quanto ao fator de conversão do tempo especial em comum e para corrigir erro material no somatório do tempo de serviço, para reconhecer a especialidade do período de 18/11/2003 a 20/05/2019 também por ruído excessivo, bem como para diferir a análise quanto à incidência da Súmula 111/STJ ao que vier a ser decidido no Tema 1105 do STJ. Adequados os critérios de juros de mora e de correção monetária.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento à apelação da autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003806224v9 e do código CRC b5fca3ca.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
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5019013-86.2021.4.04.9999
40003806224.V9


Conferência de autenticidade emitida em 22/04/2023 04:01:15.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5019013-86.2021.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: MARISE REGINA BRAUN

ADVOGADO(A): VILMAR LOURENÇO (OAB RS033559)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS RUÍDO E HIDROCARBONETOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO.

1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.

2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

3. A exposição a hidrocarbonetos aromáticos e a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância vigentes à época da prestação do labor enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial.

4. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.

5. Corrigido erro material no somatório do tempo de serviço da autora.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento à apelação da autora e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 13 de abril de 2023.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003806225v3 e do código CRC 0990aa89.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 14/4/2023, às 19:19:17


5019013-86.2021.4.04.9999
40003806225 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 22/04/2023 04:01:15.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/04/2023 A 13/04/2023

Apelação/Remessa Necessária Nº 5019013-86.2021.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS

APELANTE: MARISE REGINA BRAUN

ADVOGADO(A): VILMAR LOURENÇO (OAB RS033559)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/04/2023, às 00:00, a 13/04/2023, às 16:00, na sequência 524, disponibilizada no DE de 23/03/2023.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 22/04/2023 04:01:15.

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