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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VULNERABILIDADE SOCIAL COMPROVADA. BENEFÍCIO RESTABELECIDO. TRF4. 5001170-78.2022.4.04.7217

Data da publicação: 01/03/2024, 11:01:07

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VULNERABILIDADE SOCIAL COMPROVADA. BENEFÍCIO RESTABELECIDO. 1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 2. No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência. Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica. 3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal. 4. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados. Portanto, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima. 5. Hipótese em que o exame do conjunto probatório demonstra que a parte autora possui condição de deficiência, bem como encontra-se em situação de vulnerabilidade, necessitando de cuidados permanentes para sobreviver com dignidade. 6. Recurso da parte autora parcialmente provido para reformar a sentença para restabelecer o BPC desde a indevida cessaão, descontados os valores pagos a título de antecipação de tutela, e o apelo do INSS para obeter os valores tidos como indevidos resta prejudicado. . (TRF4, AC 5001170-78.2022.4.04.7217, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 22/02/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001170-78.2022.4.04.7217/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: DAVI MARCELINO (AUTOR)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de recursos de apelação interpostos por DAVI MARCELINO e o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face da sentença publicada em 16-07-2023 que julgou parcialmente procedente demanda de restabelecimento de benefício assistencial (e.100.1):

TUTELA DE URGÊNCIA

Diante do indeferimento do pedido de restabelecimento do benefício assistencial pela cognição exauriente do caso, revogo a tutela de urgência concedida apenas em relação à reativação do BPC/LOAS (evento 73).

III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, afasto a preliminar de renúncia, acolho a prejudicial de prescrição quinquenal e, no mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para declarar a inexistência de débito em relação aos valores recebidos a título de benefício assistencial NB 87/549.263.795-5, no total de R$ 50.946,04 (cinquenta mil, novecentos e quarenta e seis reais e quatro centavos), cancelando o débito em tela.

Diante da sucumbência recíproca, condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor do INSS, fixando-os em 10% sobre 50% do valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º e §3º do CPC. Cabe a autora, ainda, o ressarcimento dos honorários periciais. Obrigação suspensa enquanto perdurar os efeitos do deferimento da assistência judiciária gratuita à parte autora. Condeno, ainda, o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, fixando-os em 10% do valor do débito cobrado da autora, ora declarado inexigível.

O autor aduz que preenche todos os requisitos necessários para o restabelecimento do benefício assistencial (e.104.1).

O INSS, a seu turno, sustenta que o autor estaria recebendo os valores do benefício assistencial de má-fé e requereu fosse a demanda julgada totalmente improcedente (e.109.1).

Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte para julgamento.

A Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo provimento do recurso da parte autora e desprovimento do recurso do INSS (e.5.1).

É o relatório.

VOTO

A controvérsia recursal cinge à comprovação da vulnerabilidade social da parte autora, uma vez que não houve contestação quanto a sua deficiência.

Destaca-se, a propósito, o seguinte excerto da sentença (e.100.1).

"No caso, a renda familiar é de R$ 1.302,00, que corresponde à pensão recebida pela genitora. Logo, a renda per capita familiar é de R$ 651,00, superando um quarto do salário-mínimo (R$ 330,00). E esses valores correspondem aos ganhos para manutenção da família, sem mais contabilizar a presença e os ganhos do irmão Lucas Arminda Marcelino.

Ainda, quanto às condições de vida do autor, a perícia socioeconômica (evento 81, LAUDO1) constatou que o demandante vive em casa própria, de alvenaria, com boas condições de moradia, mobiliado, e situado em bairro com infraestrutura, apesar de longe de órgãos públicos.

Dessa forma, a situação financeira da família não permite que se conceda o benefício.

Registre-se que o objetivo do BPC/LOAS consiste em subsidiar a pessoa inválida ou idosa que sobrevive de forma precária, em estado de miserabilidade, sem qualquer condição de viver por si só ou por seus familiares.

Portanto, a concessão do benefício ajuda a fornecer padrões mínimos de qualidade de vida e propicia uma subsistência minimamente digna, o que não é o caso do autor, conforme demonstram o laudo social.

Desse modo, não estando presente o requisito exigido pelo artigo 20, §3º, da Lei 8.742/93, deve ser julgado improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial".

Pois bem. Conforme perícia social realizada ao longo do feito, a renda do núcleo famíliar do autor é de é de R$ 1.302,00 (e.81.1):

"2) Qual a composição do núcleo familiar que vive sob o mesmo teto? Periciando: Davi Marcelino, 26 anos de idade, ensino médio com segundo professor, portador do CPF nº 099.803.479-70 e RG nº 6.774.228. Sem renda. Sra. Ediete Arminda Marcelino, 51 anos de idade, brasileira, viúva, pensionista, do lar, ensino fundamental incompleto, portadora do CPF nº 006.336.709-28e RG nº 3.912.148. R$ 1.302. (mãe do periciando) Total da Renda: 1.302,00".

Outrossim, em que pese o valor da renda per capita seja superior ao previsto em lei, é necessário avaliar a situação fática do autor, uma vez que trata-se de pessoa deficiente devido à sequelas de doenças cerebrovasculares, o que pode exigir gastos excepcionais para a manutenção de suas necessidades básicas. No referido laudo, observa-se que o gasto para o autor manter uma vida digna é superior àquele auferido pelo seu núcleo familiar, totalizando R$ 1.855,00, somado aos R$ 350,00 em em consultas semestrais (e.81.1):

"9) Indicar se possui fornecimento de água e/ou luz, bem como o valor gasto, em caso afirmativo.

R: Despesas com Energia: R$ 120,00; Despesas com água 55,00; gás de Cozinha R$130,00; vestis, calçados, uma estimativa se tivesse que comprar R$ 100,00, mensal, mas relatam que usam o que amigos doam nesse momento, Despesas com Internet R$ 100,00; Despesas com deslocamento R$ 100,00 somente quando é necessário. R$ 605,00.

10) Indicar o valor que gasta com alimentação: mensal, quinzenal ou semanalmente, bem como se há doações, de quem e qual o valor.

R: Relata a genitora em torno de R$ 900,00.

11) Em caso de zona rural, indicar quais os alimentos que plantam. R: PREJUDICADO.

12) Indicar as despesas com saúde, descrevendo os medicamentos que faz uso, a quantidade e o custo de cada um.

R: Relata a genitora que seu filho faz uso de medicações a Unidade de Saúde fornece, mas quando está em falta necessita custear R$ 200,00. A genitora também faz uso de medicações, quando está em falta na Unidade de Saúde. R$ 150,00. Relata a genitora que por mês gasta em média de R$ 350,00 de medicações. Consultas com especialistas R$ 350,00 a cada 6 meses".

Dessarte, diante do conjunto probatório, é de rigor a reforma da sentença, bem como o restabelecimento do benefício assistencial a fim de garantir ao autor a manutenção de suas necessidades básicas para uma vida digna e plena, sendo descabido privá-lo do BPC em razão da renda de pessoa que não integra o núcleo familiar, consoante muito bem assinalou a a Procuradoria Regional da República da 4ª Região (e. 5.1):

O estudo social apurou que o autor reside com a sua mãe, logo, não pode ser considerada a renda do irmão no cálculo da renda familiar. A casa própria é construída em alvenária, com cinco cômodos, guarnecida com imóveis básicos (Evento 81). Descreve que há gastos em medicamentos, comprovados pelo anexo juntado (evento 07 - OUT2 ). O relatório da condição de moradia e as fotos que o acompanham apresenta uma condição que aparentemente não se compatibiliza com a renda auferida. Apesar de não se tratar de residência luxuosa, demonstra condições dignas de moradia, conforme destacado na sentença. Todavia, considerando que o benefício assistencial não exige miserabilidade extrema, pode ser realizado o enquadramento do autor na condição de vulnerabilidade social.

O INSS não conseguiu se desincubir do ônus proibatório para contrariar a presunção da necessidade do benefício assistencial. A justificativa para a suspensão administrativa foi a renda de Lucas Arminda Marcelino (evento 01 - PROCADM8, p. 18). Todavia, referida pessoa não reside na casa com o autor, conforme destaca o Cadastro NIS e o estudo socioeconômico realizado. Pela análise objetiva da renda se percebe o enquadramento do autor nas condições de concessão do benefício. De acordo com o laudo extrai-se que a única renda do núcleo familiar é decorrente de pensão por morte recebida pela mãe do autor, valor de R$ 1.300,00. Em razão da flexibilização do critério de renda per capita, o autor atende ao critério econômico, conforme se depreende: [...]

Diante da análise das condições especifícas do núcleo familiar, é possível considerar a vulnerabilidade social do autor. Deve ser restabelecido o benefício, desde a data de cessação.

No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência.

Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica:

“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.

3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).

4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.

5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.

6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.

7. Recurso Especial provido (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).

Com efeito, no que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal (v.g. AC 5001745-37.2018.4.04.7214, 9ª TURMA, de minha Relatoria, juntado aos autos em 13/12/2019; AC 5014437-21.2019.4.04.9999, 9ª TURMA, Relator Des. Federal CELSO KIPPER, juntado aos autos em 12/12/2019; AC 5018881-97.2019.4.04.9999, 10ª TURMA, Relator Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 04/02/2020; AC 5025288-22.2019.4.04.9999, 10ª TURMA, Relator Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 07/02/2020; AC 5001203-69.2019.4.04.9999, 6ª TURMA, Relator Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 17/10/2019; AC 5005447-10.2017.4.04.7122, 5ª TURMA, Relator Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 26/08/2019).

Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora (v.g. medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico) podem ser levadas em consideração na análise da condição de vulnerabilidade da família da parte demandante.

A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.

Registre-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.

Este TRF, aliás, já vinha julgando no sentido da desconsideração da interpretação restritiva do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.

Assim, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita. Diante disso, sobreveio a Portaria nº1.282, de 22 de março de 2021, do NSS:

Art. 1º Estabelecer que não será computado para o cálculo da renda per capita familiar o benefício previdenciário de até um salário-mínimo ou o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS) concedido a idoso, acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, ou a pessoa com deficiência, para a concessão do BPC/LOAS, diante do disposto no § 14 do art. 20 da Lei nº 8.742, 7 de dezembro de 1993, incluído pela Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020.

Conclusão quanto ao direito da parte autora no caso concreto

Dessarte, o exame do conjunto probatório demonstra que a parte autora possui condição de deficiência, bem como encontra-se em situação de vulnerabilidade, necessitando de cuidados permanentes para sobreviver com dignidade. Portanto, deve ser reconhecido o direito restabelecimento do benefício assistencial, desde 30-08-2016 (DCB - e. 1.8), descontando-se os valores pagos a título de antecipação de tutela no período entre a concessão de antecipação de tutela no AI nº 5032657-86.2022.4.04.0000 (e. 51.1) e a sua posterior revogação na sentença (e. 100.1), impondo-se a reforma da sentença.

Por conseguinte, sendo devido o restabelecimento, resta prejudicado o apelo do INSS.

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

Correção monetária

Em relação aos benefícios assistenciais, devem ser observados os seguintes critérios de correção monetária, porquanto não afetados pela decisão do STJ no Tema 905:

- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).

- IPCA-E (a partir de 30-06-2009, conforme decisão do STF na 2ª tese do Tema 810 (RE 870.947), j. 20/09/2017, ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22-09-2017, com eficácia imediata nos processos pendentes, nos termos do artigo 1.035, § 11, do NCPC e acórdão publicado em 20-11-2017, cuja modulação foi rejeitada pela maioria do Plenário do STF por ocasião do julgamento dos embargos de declaração em 03-10-2017).

Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.

A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.

SELIC

A partir de dezembro de 2021, a variação da SELIC passa a ser adotada no cálculo da atualização monetária e dos juros de mora, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021:

"Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente."

Honorários advocatícios

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 111 do STJ), considerando as variáveis previstas no artigo 85, § 2º, incisos I a IV do CPC.

Custas Processuais

O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

Tutela específica - implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTORestabelecer Benefício
NB5492637955
ESPÉCIE
DIB01/09/2016
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da parte autora e julgar prejudicado o apelo do INSS, bem como determinar o restabelecimento do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004292503v14 e do código CRC 6ca90f66.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 22/2/2024, às 18:20:52


5001170-78.2022.4.04.7217
40004292503.V14


Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:01:06.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001170-78.2022.4.04.7217/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: DAVI MARCELINO (AUTOR)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL à pessoa com deficiência. vulnerabilidade social comprovada. benefício restabelecido.

1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.

2. No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência. Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica.

3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal.

4. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados. Portanto, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima.

5. Hipótese em que o exame do conjunto probatório demonstra que a parte autora possui condição de deficiência, bem como encontra-se em situação de vulnerabilidade, necessitando de cuidados permanentes para sobreviver com dignidade.

6. Recurso da parte autora parcialmente provido para reformar a sentença para restabelecer o BPC desde a indevida cessaão, descontados os valores pagos a título de antecipação de tutela, e o apelo do INSS para obeter os valores tidos como indevidos resta prejudicado.

​.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da parte autora e julgar prejudicado o apelo do INSS, bem como determinar o restabelecimento do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 21 de fevereiro de 2024.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004292504v4 e do código CRC 4ae3f999.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 22/2/2024, às 18:20:52


5001170-78.2022.4.04.7217
40004292504 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:01:06.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/02/2024 A 21/02/2024

Apelação Cível Nº 5001170-78.2022.4.04.7217/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PROCURADOR(A): DANIELE CARDOSO ESCOBAR

APELANTE: DAVI MARCELINO (AUTOR)

ADVOGADO(A): RICHARDSON DELFINO GONCALVES (OAB SC038605)

ADVOGADO(A): CRISTIANA DAGOSTIN RECCO (OAB SC034899)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/02/2024, às 00:00, a 21/02/2024, às 16:00, na sequência 304, disponibilizada no DE de 31/01/2024.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA E JULGAR PREJUDICADO O APELO DO INSS, BEM COMO DETERMINAR O RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:01:06.

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