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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE ESTUDO SOCIAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. TRF4. 5008223-43.2021.4.04.9999

Data da publicação: 13/10/2022, 16:43:38

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE ESTUDO SOCIAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO. 1. A realização de estudo social para comprovar a situação de miserabilidade da parte autora é essencial para a análise do direito à concessão do benefício assistencial. 2. Determinada a reabertura da fase instrutória para realização de estudo socioeconômico. (TRF4, AC 5008223-43.2021.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 21/07/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal Penteado - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90019-395 - Fone: (51)3213-3282 - www.trf4.jus.br - Email: gpenteado@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5008223-43.2021.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

APELANTE: KARINA CARNEIRO DA SILVA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de ação em que a parte autora pretende a concessão de benefício assistencial à pessoa deficiente, a contar da data do requerimento administrativo, formulado em 04/09/2018.

Sentenciando em 01/03/2021, o MM. Juiz julgou improcedente o pedido por não atendimento ao requisito da deficiência, e condenou a parte ao pagamento das custas despesas processuais e honoráios advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, com exigibilidade suspensa em razão da concessão de assistência judiciária gratuita.

Apela a parte autora, requerendo a reforma da sentença para que se prossiga com a determinação de reabertura da instrução do processo e realização de análise da situação socioeconômica. Alega, em síntese, que é portadora de autismo infantil, disturbio de atenção e epilepsia, constituindo obstáculo para sua participação na sociedade em igualdade de condições, tendo em vista a situação socioeconômica e as informações do laudo médico.

Transcorrido in albis, o prazo para contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL

O benefício assistencial encontra-se previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06/07/2011, e nº 12.470, de 31/08/2011.

O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: (a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou de idoso (nesse caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e (b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.

Saliente-se, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei nº 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).

Desse modo, a delimitação da incapacidade para a vida independente deve observar os seguintes aspectos: (a) não se exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.

No que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admitiu, em sede de Recurso Repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar fosse superior a ¼ do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 3ª Seção, DJe 20/11/2009). Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18/04/2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.

Assim, forçoso reconhecer que as despesas necessárias ao cuidado da parte autora como decorrentes de compra de medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família da parte demandante.

A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.

Registre-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário 580.963/PR, em 17/04/2013, declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelecia que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e àquelas portadoras de deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.

Dessa forma, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso, com 65 anos ou mais, a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima, ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC nº 2004.04.01.017568-9/PR, 3ª Seção, Relator Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI, unânime, D.E. de 02/07/2009). Ressalte-se que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.

CASO CONCRETO

No processo em tela, a perícia médica do evnto 67, acerca dos quesitos, indica que a parte autora, mulher, 19 anos, tem epilepsia desde os dois anos de idade, autismo e transtorno de déficit de atenção. Conclui, com base em exame físico e histórico médico, que ela não pode ter participação plena em igualdade de condições com as demais pessoas. Ademais, seu quadro clínico é permanente, caracterizando, assim, impedimento de longo prazo.

O Juízo a quo julgou improcedente a ação, extinguindo-a com resolução do mérito ao argumento de que a parte autora não atendeu ao requisito da deficiência ou incapacidade laboral, portanto não haveria necessidade de análise da sua situação socioeconômica.

Contudo, o laudo médico claramente indica que há deficiência que implica impedimentos de longo prazo (67.1):

A) DO JUÍZO – EVENTO 38.2

a) A parte possui alguma doença incapacitante/deficiência? Quando se iniciou?

R. Epilepsia desde os dois anos de idade e diagnóstico de autismo com transtorno de déficit de atenção.

b) Caso positivo, tal quadro impede a autora de ter participação plena na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas? É permanente ou temporário?

R. Os documentos acostados aos autos (1.7) demonstram que a periciada não pode ter participação plena em igualdade de condições com as demais pessoas. O quadro clínico é permanente.

B) DO REQUERIDO – EVENTO 42.1

2. Esclareça o perito qual a causa da deficiência, descrevendo a moléstia e a CID. Esclareça a origem da doença; se congênita, por complicações no parto, por doença, por acidente/violência, dependência química, etc.

R. Epilepsia. G40. Tem como causa provável lesão por toxoplasmose congênita (segundo informações da genitora. Não se identificou documentos nos autos que confirmem a informação).

3. A deficiência implica impedimentos de longo prazo? (Igual ou superior a 2 anos)

R. Os documentos médicos acostados aos autos demonstram haver impedimento de longo prazo

Em relação à alegada deficiência, verifica-se que a parte autora foi diagnosticada com autismo, além de epilepsia e déficit de atenção, condição que, segundo avaliação pericial, lhe impedem ter participação plena em igualdade de condições com as demais pessoas.

Portanto, indispensável a realização do estudo social. Ademais, é consabido o entendimento desta Corte no sentido de que em ações objetivando benefício de prestação continuada o julgador firma seu convencimento, em regra, na perícia médica e estudo social produzidas em juízo.

Neste contexto, deve ser oportunizada análise do estudo social a fim de averiguar a condição socioeconômica do grupo familiar, haja vista que a caracterização de obstáculo para a participação social em igualdade de condições depende também do contexto e condições de vida e habitação.

Assim, entendo que deve ser, excepcionalmente, anulada a sentença e reaberta a instrução com a realização de perícia médica e estudo social.

CONCLUSÃO

Apelação da parte autora provida para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução para realização estudo social.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003264260v18 e do código CRC c8698270.Informações adicionais da assinatura:
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5008223-43.2021.4.04.9999
40003264260.V18


Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 13:43:38.

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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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Apelação Cível Nº 5008223-43.2021.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

APELANTE: KARINA CARNEIRO DA SILVA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE ESTUDO SOCIAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO.

1. A realização de estudo social para comprovar a situação de miserabilidade da parte autora é essencial para a análise do direito à concessão do benefício assistencial.

2. Determinada a reabertura da fase instrutória para realização de estudo socioeconômico.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 19 de julho de 2022.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003264261v4 e do código CRC a211d228.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 12/07/2022 A 19/07/2022

Apelação Cível Nº 5008223-43.2021.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART

APELANTE: KARINA CARNEIRO DA SILVA

ADVOGADO: PAULO PEREIRA BICHARA (OAB PR085283)

ADVOGADO: MONICA MARIA PEREIRA BICHARA (OAB PR016131)

ADVOGADO: MERABE MONICE PEREIRA BICHARA (OAB PR102254)

ADVOGADO: ANDRÉ LUÍS PEREIRA BICHARA (OAB PR069751)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/07/2022, às 00:00, a 19/07/2022, às 16:00, na sequência 156, disponibilizada no DE de 01/07/2022.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 13:43:38.

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