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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE NÃO DEMONSTRADA. PREVALÊNCIA DO LAUDO PERICIAL. PERÍCIA COM ESPECIALISTA. DESNECESSIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS EM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE. TEMA 692 DO STJ. TRF4. 5015632-07.2020.4.04.9999

Data da publicação: 23/04/2024, 15:01:33

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE NÃO DEMONSTRADA. PREVALÊNCIA DO LAUDO PERICIAL. PERÍCIA COM ESPECIALISTA. DESNECESSIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS EM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE. TEMA 692 DO STJ. 1. Nos benefício por incapacidade, o julgador firma a sua convicção, em regra, por meio da prova pericial. 2. Perícia conclusiva quanto à ausência de incapacidade do(a) segurado(a). 3. Saliente-se que o laudo pericial apresentado pelo perito do Juízo, em razão de sua imparcialidade e isenção, deve prevalecer ante as conclusões dos atestados médicos anexados pela parte autora. 4. No que concerne à necessidade de designação de médico especialista, o entendimento desta Corte é no sentido de que, em regra, mesmo que o perito nomeado pelo Juízo não seja expert na área específica de diagnóstico e tratamento da doença em discussão, não haveria de se declarar a nulidade da prova por se tratar de profissional médico e, portanto, com formação adequada à apreciação do caso. 5. Não há necessidade de renovação da prova pericial, uma vez que a matéria está suficientemente esclarecida pelo laudo técnico para o convencimento do Juízo e deslinde do feito (art. 480 do CPC/2015). 6. Na linha do decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, há obrigatoriedade de a parte autora devolver os valores do benefício previdenciário que recebeu por força da antecipação da tutela revogada nos autos. 7. Embora não se possa, desde já, autorizar a devolução dos valores, fica assegurado à Autarquia o direito de buscar essa restituição nestes mesmos autos. (TRF4, AC 5015632-07.2020.4.04.9999, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relator ANA CRISTINA FERRO BLASI, juntado aos autos em 15/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015632-07.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: ELENICE MARIA SOARES FARIAS

ADVOGADO(A): LUCIANA TEREZA GULARTE (OAB SC024269)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

ELENICE MARIA SOARES FARIAS ajuizou ação ordinária em 11/11/2016, objetivando a concessão de benefício por incapacidade, inclusive em sede de tutela de urgência, desde o requerimento administrativo, ocorrido em 10/06/2016 (NB 614.678.512-5). Assevera que a sua incapacidade decorre de moléstia ortopédica.

A tutela provisória foi deferida em 06/12/2016 (evento 8, OFIC1).

Sobreveio sentença de improcedência, contendo o seguinte dispositivo (evento 97, OUT1):

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente Ação Previdenciária proposta por ELENICE MARIA SOARES FARIAS em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS.

Em consequência, REVOGO a tutela antecipada deferida nos autos.

CONDENO a Autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, restando suspensa sua cobrança por ser beneficiária da justiça gratuita.

Expeça-se alvará em favor da perita judicial para o levantamento dos valores inerentes aos honorários periciais.

Transitada em julgada, certifique-se e, não havendo manifestação das partes no prazo de 30 (trinta) dias, arquivem-se, anotando-se as devidas baixas.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Ambas as partes recorrem:

O INSS requer a devolução dos valores recebidos por força de tutela antecipada e posteriormente revogada, independentemente de comprovação de boa-fé no recebimento.

A parte autora, em suas razões, sustenta que a perícia médica judicial foi realizada por médico clínico geral, que desprezou as provas produzidas por médicos especialistas na doença que acomete a parte autora e que a acompanham de longa data. Relata que seu quadro de saúde vem se agravando, sendo inviável realizar o labor sem sentir dor e sem piorar suas patologias. Pede a anulação da sentença, com o retorno dos autos à origem para realização de perícia com especialista em Ortopedia/Traumatologia ou a reforma da sentença, com a concessão do benefício pretendido. Requer, ademais, que sejam arbitrados honorários advocatícios em observância ao disposto no artigo 85, §11 do CPC/2015.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O(s) apelo(s) preenche(m) os requisitos legais de admissibilidade.

Preliminar de cerceamento de defesa

No que concerne à necessidade de designação de médico especialista, o entendimento desta Corte é no sentido de que, em regra, mesmo que o perito nomeado pelo Juízo não seja expert na área específica de diagnóstico e tratamento da doença em discussão, não haveria de se declarar a nulidade da prova.

Não se pode exigir sempre a participação de especialista na área afeta a cada caso, sob pena de inviabilizar-se as possibilidades de perícia em cidades de menor porte. Ademais, trata-se de profissional legalmente habilitado e, conforme órgão normativo da categoria, apto a atuar em qualquer área médica; não lhe cabe prescrever ou acompanhar o tratamento da parte autora, mas sim constatar a existência, ou não, de incapacidade decorrente da(s) moléstia(s) para o exercício da ocupação habitual. Caso entenda necessário, poderá indicar a submissão da parte autora à perícia específica (art. 157 do CPC).

Ademais, a divergência quanto às conclusões da perícia judicial, ainda que baseada em laudos médicos particulares, não implica, por si só, realização de nova perícia ou complementação do procedimento. Caso os documentos emitidos por médico(s) assistente(s), ainda que especialista(s) na(s) área(s) da(s) moléstia(s), fossem suficientes para a comprovação de incapacidade laborativa, não haveria judicialização dos benefícios previdenciários que versam sobre auxílio-doença, auxílio-acidente e aposentadoria por invalidez.

Na hipótese, não vislumbro necessidade de renovação da prova pericial, uma vez que a matéria está suficientemente esclarecida pelo laudo técnico para o convencimento do Juízo e deslinde do feito (art. 480 do CPC/2015).

Observa-se, outrossim, que a impugnação adveio somente após o resultado da perícia, e não por ocasião da nomeação do perito.

Portanto, afasto a preliminar arguida.

Auxílio-doença e Aposentadoria por invalidez

São quatro os requisitos para a concessão desses benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no artigo 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS; (c) existência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).

Caso Concreto

Trata-se de segurada que conta com 56 anos de idade, e que possui atividade habitual como auxiliar de produção. Recebeu benefício de auxílio-doença nos períodos de 17/06/2013 a 01/07/2013 e de 19/02/2015 a 07/04/2015.

Foi realizada perícia médica judicial em 20/09/2018, com especialista em perícias médicas, tendo o expert apresentado a seguinte conclusão (evento 60, OUT1):

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

Trata-se de pericianda com 51 anos de idade, que compareceu desacompanhada, a perícia médica judicial previamente agendada.

A autora, informou na anamnese (entrevista clínica), que trabalhava como auxiliar de produção, vinculada a Supermercados Imperatriz Ltda, com início 22/07/2011 e saída e, 12/08/2015. Trabalhou por um dia como balconista, vinculada Copal Alimentos Ltda, com início em 31/03/2016 e saída no mesmo dia.

Ao ser perguntado, respondeu que atualmente encontra-se afastada de suas atividades laborais, desde o ano de 2016 e usufruindo de benefício previdenciário auxílio doença (espécie 31) a partir de dezembro de 2016, mediante liminar.

Sua queixa clínica atual refere-se a dor e limitação funcional sobre a coluna lombar. Relatou que iniciou com sintomas desde o ano de 2013 com posterior agravamento do quadro nos anos subsequentes.

Procurou atendimento médico, em caráter particular, na Clínica Ciência, no município de Palhoça, com o médico ortopedista Dr. Paulo de Oliveira Machado – CRM/SC 16.604, conforme atestado médico, assinado pelo mesmo, datado de 31/07/2018, apresentado por ocasião da prova técnica.

Realizou tratamento conservador (não cirúrgico), com o uso de medicações analgésicas (para dor) e anti-inflamatórias e fisioterapias (asseverou ter realizado aproximadamente 10 sessões).

Na atualidade, informou realizar acompanhamento médico ambulatorial, com o mesmo médico anteriormente nominado.

Realizou o exame subsidiário de imagem de ressonância magnética de coluna lombar, de 24/07/2018, cujo laudo identificou discopatia degenerativa mais evidente em L4-L5 com leve abaulamento discal circunferencial em L3-L4, com diminutas hérnias central e foraminais bilaterais , maior à esquerda, leve proeminência disco-osteofitárias em L4-L5, com componentes foraminais, maior à esquerda, onde toca a raiz de L4, leve abaulamento discal circunferencial em L5-S1 com diminutas hérnias central e foraminal esquerda que apenas apaga a gordura epidural, leves alterações degenerativas interapofisárias mais evidentes em L3-L4 e L4-L5, discretos sinais de sobrecarga mecânica no ligamento interespinhoso de L4-L5.

Não apresentou confirmação atual ou pretérita da presença de comorbidades clínicas como diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica crônica ou alterações da tireoide.

Atualmente, utiliza o medicamento sertralina 50mg (1cp/dia), via oral, de forma continuada.

De antecedentes obstétricos teve duas gestações, sendo ambas resolvidas através de partos cesáreas, há 23 e 29 anos.

De outros antecedentes cirúrgicos mencionou apendicectomia (retirada de apêndice cecal), há 10 anos.

Ao ser solicitado, apresentou CNH (Carteira Nacional de Habilitação), categoria “B”, renovada em 10/01/2018, sem observações.

Em termos de benefício previdenciário, teve concedido auxílio doença previdenciário (espécie 31), nos períodos de 17/06/2013 a 01/07/2013, de 19/02/2015 a 07/04/2015.

Efetivamente, ocorreram três indeferimentos administrativos, pelo INSS (Instituto Nacional do seguro Social), no pedido de auxílio doença, segundo o CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais), que é o objeto do pedido na presente lide, não tendo sido concedida a benesse.

Ingressou com a presente demanda em 10/11/2016, com antecipação de tutela concedida a partir de 06/12/2016 (benefício em vigência).

Postula-se na presente lide a concessão do benefício previdenciário auxílio doença ou aposentadoria por invalidez, a partir de 10/06/2016.

Apresentou-se em bom estado geral, calma e cooperativa, lúcida, atenta e orientada, humor mantido, raciocínio lógico e coerente, memória preservada para dados, datas, fatos recentes e antigos.

Em termos de exame físico, a biometria referida foi de 78kg, e estatura de 1,68m, com IMC (índice de massa corpórea) de 28, classificado como sobrepeso.

Os níveis pressóricos encontravam-se dentro da normalidade 140/80mmHg, assim como os demais sinais vitais.

As manobras semiológicas (de exame físico), estáticas e dinâmicas, sobre os segmentos anatômicos onde o suplicante apontava suas queixas álgicas (coluna lombar), não revelaram a presença de dados positivos, ou seja, dentro da normalidade.

Exibiu boa mobilidade de coluna em todos os seus segmentos.

A musculatura apresentou-se eutrófica (normal para a faixa etária) e simétrica em membros superiores e inferiores, não apresentando diferenças entre circunferências de braços e antebraços, bem como força muscular preservada, assim como os reflexos tendíneos, ausência de contratura muscular ou edema (inchaço).

A marcha é sem vícios sendo que senta e levanta normalmente.

A manobra clássica de LASEGUE, que objetiva a detecção da presença de radiculopatias ou compressão de raízes nervosas no segmento lombo-sacral da coluna vertebral, demonstrada em diagrama a seguir, foi negativa bilateralmente.

Sob o ponto de vista funcional, não há alterações dignas de nota, com especial atenção sobre a coluna lombar.

Pelo anteriormente arrazoado, sob o ponto de vista técnico (médico-pericial), considerando-se a história clínica, exame físico geral e segmentar e pela verificação do contido nas 142 páginas dos autos, essa perita conclui que não há incapacidade laborativa temporária ou permanente, atual assim como por ocasião da DER (10/06/2016), pela verificação dos documentos médicos disponibilizados nos autos e outros apresentados por ocasião da expertise médica judicial.

Como se pode observar do laudo pericial, a expert procedeu ao exame físico da parte autora, bem como analisou os documentos apresentados e anexados aos autos.

É cediço que, em se tratando de benefício por incapacidade, o julgador firma a sua convicção, em regra, por meio da prova pericial. Embora não esteja adstrito à perícia, é inquestionável que, tratando-se de controvérsia cuja solução depende de prova técnica, o magistrado somente poderá recusar a conclusão do laudo com amparo em robusto teor probatório, uma vez que o perito do juízo se encontra em posição equidistante das partes, mostrando-se imparcial e com mais credibilidade.

Em que pese a argumentação deduzida no recurso da parte autora, a documentação médica trazida ao feito não é apta a infirmar as conclusões dos peritos do juízo, as quais decorreram da anamnese e de criterioso exame físico e documental.

A divergência quanto às conclusões da perícia judicial, ainda que baseada em laudos médicos particulares, não implica, por si só, realização de nova perícia ou complementação do procedimento. Caso os documentos emitidos por médicos assistentes, especialistas ou não na área da moléstia em questão, fossem suficientes para a comprovação de incapacidade laborativa, não haveria necessidade de judicialização de casos em que se discute o direito aos benefícios por incapacidade.

Ademais, a autora recebeu benefício previdenciário por breves períodos, conforme se denota do CNIS.

Registre-se, por fim, que a existência de patologia ou lesão nem sempre significa incapacidade para o trabalho. Além disto, as restrições laborativas inerentes à faixa etária não autorizam a concessão dos benefícios por incapacidade.

Diante desse cenário, mostra-se indevida a concessão do benefício pretendido.

Da devolução dos valores recebidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada

No caso em exame, foi concedida tutela antecipada em 06/12/2016 (evento 8, OFIC1), e revogada por ocasião da prolação da sentença, em 29/05/2020 (evento 97, OUT1), tendo em vista que a incapacidade não restou comprovada.

A propósito do tema, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.401.560/MT, sob a sistemática dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese:

Tema 692. A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos.

O acórdão foi publicado no DJe de 13/10/2015. Os embargos de declaração contra ele opostos foram rejeitados. O recurso extraordinário não foi conhecido, assim como não foi provido o agravo interno que tinha por intento o seu processamento. O acórdão transitou em julgado em 10/03/2017.

Apresentada proposta de revisão do entendimento, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na sessão de julgamento de 11/05/2022, reafirmou a tese, efetuando acréscimos em sua redação, nos seguintes termos:

A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.

Desse modo, reafirmou-se o entendimento de que cabe a repetição dos valores recebidos por conta de antecipação de tutela posteriormente revogada, pois, além de tais montantes não serem definitivos, o segurado tem ciência da precariedade de seu recebimento, sabendo que as importâncias percebidas não integram seu patrimônio até o provimento final nos autos do processo.

De outro lado, quanto à devolução dos valores recebidos indevidamente por força da medida liminar, entendo cabível que a discussão seja travada nestes próprios autos, na fase de cumprimento da sentença, com fundamento no quanto restou decidido pela 3a Seção desta Corte no julgamento da Ação Rescisória no 5020232-32.2019.4.04.0000 (Rel. p/ acórdão Desembargador Federal Roger Raupp Rios, j. 26-4-2023), observados pelo Juízo de primeira instância os parâmetros também estabelecidos naquela assentada. Confira-se (destaques meus):

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO CITRA PETITA. TUTELA PROVISÓRIA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. TEMA 692 STJ. POSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL.

1. Sendo citra petita a decisão no feito originário, cabe a procedência da ação rescisória, em juízo rescindendo, e a análise do apelo em questão, tal como já fora feito no acórdão objeto de retratação.

2. Caso em que cabe efetivamente a aplicação do tema 692 do STJ, o que permite a retratação, porque, no juízo rescisório, está-se analisando o apelo interposto contra sentença que, no processo de conhecimento originário, obrigara a segurada, ora autora, a devolver os valores recebidos.

3. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 11/05/2022, acolheu questão de ordem para reafirmar a tese jurídica contida no Tema Repetitivo no 692, com acréscimo redacional, nos seguintes termos: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago".

4. Delimitado o âmbito de incidência do tema, resta examinar sua incidência e fundamentação. O que se decidiu no Tema n.o 692 diz respeito à obrigação do exequente, nos termos da legislação processual, de ressarcir prejuízos sofridos pelo executado decorrente de reforma de tutela provisória, dever que subsiste em virtude do artigo 15, III, da Lei n.o 8.213/1991, seja na sua redação original, seja na redação da Lei n.o 13.846/2019.

5. É diante de todo o ordenamento jurídico, em suas disposições materiais e processuais, a começar dos ditames constitucionais, que deve se orientar a aplicação do Tema n.o 692, contexto adequado e mais amplo em que se insere a responsabilidade pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa e o regime de ressarcimento de dano processual, quadro em que se ler o parágrafo único do artigo 302 do CPC (“a indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível.”).

6. Em suma, por (1) fundamentos constitucionais, relativos aos direitos à vida, à dignidade, à igualdade material e ao direito fundamental à previdência e à assistência social, cuja (2) repercussão nas normas processuais infraconstitucionais requer observância ao se definir o modo de sua aplicação, (3) em interpretação conforme a Constituição e interpretação sistemática do direito vigente, em harmonia com as diretrizes jurisprudenciais sedimentadas, (4) conclui-se que a correta aplicação do Tema n.o 692 do STJ, quanto ao modo de se exigir o cumprimento do dever de ressarcir valores percebidos a título de antecipação de tutela posteriormente revogada, nos próprios autos da ação julgada improcedente ou, ainda, em cumprimento de sentença a ela associada, requer que se preservem montantes capazes de guarnecer a dignidade do devedor e sua família, a serem demonstrados concretamente em cada litígio concreto; para tanto, o juízo processante há de proceder como entender de direito (por exemplo, oportunizando manifestação prévia do devedor à decisão sobre eventual pedido de desconto ou, acaso dispuser de elementos, desde o início afastando a pretensão, por constatada a imprescindibilidade dos valores para a subsistência digna do devedor e sua família).

7. Desde já, portanto, conclui-se pela impossibilidade de desconto quando se tratar de benefício de valor mínimo; na hipótese em que forem constatados recursos disponíveis além do mínimo existencial, a definição do percentual a ser descontado quando houver recursos disponíveis além do mínimo existencial, não deverá restringir desproporcionalmente o padrão de vida do segurado e sua família. Caso se trate de cumprimento de sentença de pagar quantia certa, na hipótese em que não houver benefício ativo, devem ser observadas as regras gerais de impenhorabilidade previstas na legislação processual.

8. Em juízo de retratação, a ação rescisória é parcialmente procedente para, em juízo rescindendo, rescindir o julgado por citra petita. E, em juízo rescisório, apelação da parte autora parcialmente provida nos autos originários, para reconhecer a repetibilidade dos valores recebidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, observada a necessidade de garantia do mínimo existencial.

Assim, a sentença deve ser reformada para declarar que os valores recebidos por força de tutela antecipada, posteriormente revogada devem ser ressarcidos.

Embora não se possa, desde já, autorizar a devolução dos valores, fica assegurado à Autarquia o direito de buscar essa restituição nestes mesmos autos.

Ônus da sucumbência

Sendo desacolhida a pretensão, a parte autora deverá arcar com o pagamento dos ônus sucumbenciais.

Uma vez que a sentença foi proferida após 18/3/2016 (data da vigência do CPC/2015), aplica-se a majoração prevista no artigo 85, §11, desse diploma, observando-se os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. Assim, majoro a verba honorária em 50% sobre o percentual mínimo da primeira faixa (art. 85, §3º, inciso I, do CPC), tendo em conta a pretensão máxima deduzida na petição inicial.

No entanto, resta suspensa a exigibilidade da referida verba, por força da gratuidade de justiça, cumprindo ao credor, no prazo assinalado no § 3º do artigo 98 do CPC/2015, comprovar eventual alteração da situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da benesse.

Prequestionamento

Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.

Conclusão

Reformada a sentença para declarar que os valores recebidos por força de tutela antecipada, posteriormente revogada devem ser ressarcidos ao erário.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do INSS e negar provimento à apelação da parte autora.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004385099v13 e do código CRC 1b745519.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA FERRO BLASI
Data e Hora: 12/3/2024, às 17:51:16


5015632-07.2020.4.04.9999
40004385099.V13


Conferência de autenticidade emitida em 23/04/2024 12:01:33.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015632-07.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: ELENICE MARIA SOARES FARIAS

ADVOGADO(A): LUCIANA TEREZA GULARTE (OAB SC024269)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. incapacidade não demonstrada. PREVALÊNCIA DO LAUDO PERICIAL. perícia com especialista. DESNECESSIDADE. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS EM ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE. TEMA 692 DO STJ.

1. Nos benefício por incapacidade, o julgador firma a sua convicção, em regra, por meio da prova pericial.

2. Perícia conclusiva quanto à ausência de incapacidade do(a) segurado(a).

3. Saliente-se que o laudo pericial apresentado pelo perito do Juízo, em razão de sua imparcialidade e isenção, deve prevalecer ante as conclusões dos atestados médicos anexados pela parte autora.

4. No que concerne à necessidade de designação de médico especialista, o entendimento desta Corte é no sentido de que, em regra, mesmo que o perito nomeado pelo Juízo não seja expert na área específica de diagnóstico e tratamento da doença em discussão, não haveria de se declarar a nulidade da prova por se tratar de profissional médico e, portanto, com formação adequada à apreciação do caso.

5. Não há necessidade de renovação da prova pericial, uma vez que a matéria está suficientemente esclarecida pelo laudo técnico para o convencimento do Juízo e deslinde do feito (art. 480 do CPC/2015).

6. Na linha do decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, há obrigatoriedade de a parte autora devolver os valores do benefício previdenciário que recebeu por força da antecipação da tutela revogada nos autos.

7. Embora não se possa, desde já, autorizar a devolução dos valores, fica assegurado à Autarquia o direito de buscar essa restituição nestes mesmos autos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS e negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 10 de abril de 2024.



Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004385100v4 e do código CRC 9fcdf55b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA FERRO BLASI
Data e Hora: 15/4/2024, às 16:45:37


5015632-07.2020.4.04.9999
40004385100 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 23/04/2024 12:01:33.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/04/2024 A 10/04/2024

Apelação Cível Nº 5015632-07.2020.4.04.9999/SC

RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELANTE: ELENICE MARIA SOARES FARIAS

ADVOGADO(A): LUCIANA TEREZA GULARTE (OAB SC024269)

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/04/2024, às 00:00, a 10/04/2024, às 16:00, na sequência 400, disponibilizada no DE de 20/03/2024.

Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS

LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 23/04/2024 12:01:33.

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