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EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPENHORABILIDADE DE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL TRABALHADA PELA FAMÍLIA. CABIMENTO DA ALEGAÇÃO EM EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. REQUISITOS EXIGIDOS PELO ART. 833, VIII, DO CPC DEMONSTRADOS PELA PARTE AGRAVANTE. RECURSO PROVIDO. TRF4. 5041424-79.2023.4.04.0000

Data da publicação: 26/04/2024, 07:02:35

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPENHORABILIDADE DE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL TRABALHADA PELA FAMÍLIA. CABIMENTO DA ALEGAÇÃO EM EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. REQUISITOS EXIGIDOS PELO ART. 833, VIII, DO CPC DEMONSTRADOS PELA PARTE AGRAVANTE. RECURSO PROVIDO. 1. A exceção de pré-executividade consiste em meio de defesa por intermédio do qual o executado submete ao conhecimento do juiz da execução, independentemente de penhora ou de embargos, matéria suscetível de conhecimento de ofício ou à nulidade do título que seja evidente e flagrante, isto é, nulidade cujo reconhecimento independa de contraditório ou de dilação probatória (matéria de ordem pública). Mostra-se adequado, portanto, o manejo do instrumento de defesa em questão para defender a impenhorabilidade de bem constrito nos autos. 2. "3. Para reconhecer a impenhorabilidade, nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (iii) que seja explorado pela família. (...)" (STJ, REsp n. 1913234/SP, Segunda Seção, Relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 08/02/2023). 3. A moradia dos devedores na pequena propriedade rural não constitui pressuposto para o reconhecimento da impenhorabilidade, pois o art. 833, VIII, do CPC não faz menção a essa circunstância (STJ, REsp nº 1.591.298/RJ, Terceira Turma, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, julgado em 14/11/2017). 4. Para a maioria da população brasileira, a manutenção de condições mínimas de subsistência impõe que se permaneça no mercado de trabalho mesmo após a aposentadoria. Assim, o fato de o devedor receber aposentadoria não significa, por si só, que aufira renda suficiente para manter o sustento da família sem o auxílio da produção rural gerada na propriedade, tornando-a penhorável. Negar a impenhorabilidade em razão da aposentadoria do proprietário rural equivaleria a puni-lo por receber direito social apropriado à sua idade e conquistado com anos de trabalho na terra. 5. "3. A jurisprudência das Turmas integrantes da Primeira Seção desta Corte entende que para o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel rural, existe a necessidade de comprovação, por parte daquele que pretende o reconhecimento da impenhorabilidade, de que a família retire sua subsistência da terra, ou ainda que a família não trabalhe diretamente na terra, comprovadamente, dela retire seu sustento, decorrente do arrendamento da propriedade (...)" (TRF4, AC n. 5034927-98.2018.404.9999, Primeira Turma, Relator Desembargador Federal Marcelo de Nardi, julgado em 14/06/2023) 6. A impenhorabilidade não é afastada pela necessidade de contratação de prestadores de serviços externos para auxiliar proprietários rurais idosos no trabalho da terra, já não possuem condições de lavorar sem a ajuda de terceiros. O fato de sua renda principal provir da propriedade independe de ser gerada pessoalmente pelos devedores ou por terceiros que lá trabalhem. 7. Recurso provido. (TRF4, AG 5041424-79.2023.4.04.0000, DÉCIMA SEGUNDA TURMA, Relator JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, juntado aos autos em 18/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5041424-79.2023.4.04.0000/PR

RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

AGRAVANTE: DEVANYR ROQUE EUGENIO

AGRAVANTE: DEVANYR ROQUE EUGENIO & CIA LTDA

AGRAVANTE: SIDNEY EGGER EUGENIO

AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF

RELATÓRIO

​Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por DEVANYR ROQUE EUGENIO, DEVANYR ROQUE EUGENIO & CIA LTDA e SIDNEY EGGER EUGENIO em face de decisão proferida nos autos de nº 5013495-63.2013.404.7003 (Cumprimento de Sentença), pela qual o juízo de origem rejeitou a exceção de pré-executividade originalmente apresentada pelos requeridos no processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 40, ANEXO3, pp. 210-218, e reiterada no processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 52, EXCPRÉEX1 para reanálise, em cumprimento à decisão proferida pelo TRF da 4a Região no agravo de instrumento n. 5016216-98.2020.404.0000.

Sustenta a parte agravante, em suma, que: a) restou incontroverso que o imóvel penhorado classifica-se como pequena propriedade rural para os fins previstos pelo art. 833, VIII, do CPC; b) o fato de a propriedade ser trabalhada pela família não é descaracterizado pela contratação de colaboradores externos para auxílio na produção, já que os requeridos têm idade avançada e não possuem condições de lavorar sem a ajuda de terceiros; c) a Lei não exige que os devedores residam na propriedade rural como pressuposto para o reconhecimento da impenhorabilidade desta; d) apesar de terem sido referidas como antigas na decisão agravada, as notas fiscais que instruíram a exceção de pré-executividade são-lhe contemporâneas, de modo que, caso pretendesse a apresentação de documentos recentes, o magistrado a quo deveria ter oportunizado sua apresentação aos requeridos para não incorrer em decisão-surpresa, nos termos dos arts. 6o, 10 e 11 do CPC; e) da mesma forma, a circunstância de o sustento principal da família advir do trabalho da terra não é afastada pelo fato de um dos executados ser aposentado; e f) o recurso comporta provimento, para reconhecer-se a impenhorabilidade do imóvel e determinar-se o cancelamento da penhora registrada na matrícula correspondente.

Postularam o deferimento de providência liminar.

O pedido de efeito suspensivo foi deferido no processo 5041424-79.2023.4.04.0000/TRF4, evento 3, DESPADEC1.

Contrarrazões da CEF no processo 5041424-79.2023.4.04.0000/TRF4, evento 15, PET1.

​​​​​​​​É o relatório.

VOTO

1. O Juiz Federal Convocado que apreciou o pedido de efeito suspensivo assim se manifestou sobre a controvérsia (processo 5041424-79.2023.4.04.0000/TRF4, evento 3, DESPADEC1):

"(...)

1. A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos (processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 60, DESPADEC1):

"Trata-se de Cumprimento de Sentença, inicialmente proposta como Execução Diversa pelo Banco Meridional, perante a 6ª Vara Cível da Comarca de Maringá.

O título executivo consiste num acordo homologado judicialmente na Justiça Estadual, firmado entre o Banco Meridional do Brasil S/A e os executados, garantido pela hipoteca do lote de terras n. 203-E, situado na gleba Anhumai, do Município de Alto Paraná, matriculado sob n. 1.798, do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Alto Paraná ( (evento 2, INIC1, p. 5/8 e 18/21).

Foi expedida carta precatória à Comarca de Alto Paraná/Paranavaí para citação e demais atos executórios em face da parte executada (evento 2, DESP2 e evento 2, PET3). O Juízo Estadual da Comarca de Alto Paraná comunicou a realização da penhora sobre o imóvel rural descrito na matrícula n. 1798 do CRI de Alto Paraná-Pr (evento 2, OUT7).

Informado que o crédito foi cedido à CEF, foi declinada a competência para a Justiça Federal (evento 2, PET18 ).

No despacho do ​evento 2, DESP34​, foi reconhecido por este Juízo que a Carta Precatória extraviou-se, mas que a citação da parte executada ocorreu, sendo mantida penhora efetuada sobre o imóvel descrito na matrícula n. 1798 do CRI de Alto Paraná-Pr e determinada a intimação, por carta de intimação com AR, da parte executada da penhora realizada sobre o referido imóvel e para pagamento do débito, nos termos do art. 475-J do CPC .

Intimados, os executados apresentaram impugnação à execução (evento 2, PET36) e a CEF se manifestou sobre a impugnação (evento 2, PET38 e evento 2, PET40).

A impugnação à execução foi rejeitada (evento 2, DESPADEC41). A parte executada interpôs apelação em relação a decisão, que não foi recebida (evento 2, DESP43, p. 1/2).

Foi expedida carta precatória para a Comarca de Alto Paraná para avaliação e alienação do imóvel penhorado (evento 2, DESP49).

O Juízo Deprecado enviou cópia do laudo de avaliação (evento 2, OUT53).

O executado Devanir discordou do laudo de avaliação e requereu a realização de nova avaliação por perito judicial (evento 2, PET59).

Foi devolvida a carta precatória e anexada aos autos no evento 40.

A parte executada opôs exceção de pré-executividade, "... para reconhecer e declarar que a pequena propriedade rural dos Devedores é absolutamente impenhorável, e, como corolário, extinguir a hipoteca sobre ele constituída" (evento 52, EXCPRÉEX1).

A CEF apresentou impugnação alegando que, nos termos do art. 833, VIII, do CPC, "... o imóvel apenas será impenhorável se adequado aos seguintes requisitos: se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e que seja explorado pela família"; a parte executada não comprovou o uso da propriedade como residência ao núcleo familiar e ser o único bem de família; o ônus da prova é da parte executada, devendo trazer indícios que a propriedade é essencial para o trabalho familiar, não servindo para tal desiderado a juntada somente de notas fiscais. Requer a improcedência da exceção de pré-executividade, com a condenação da parte executada em custas e honorários advocatícios (evento 55, RÉPLICA1). Junta planilha atualizada do débito (evento 58, PLAN2).

DECIDO.

1. Expedida carta precatória para a Comarca de Alto Paraná a fim de ser realizada a avaliação e alienação do imóvel matriculado sob n. 1.798, do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Alto Paraná-PR (evento 2, DESP49, p. 6 e evento 40), a parte executada apresentou exceção de pré-executividade no Juízo Deprecante em relação à penhora no Juízo Deprecante (evento 40, ANEXO3, p. 210/218), que foi analisada pelo Juiz Estadual, mas o TRF/4ª Região deu parcial provimento ao agravo de instrumento da parte executada "... para anular a decisão agravada, devendo a questão da impenhorabilidade do bem ser remetida ao juízo deprecante" (evento 40, ANEXO6, p. 132/136).

​No caso, já foi rejeitada a impugnação à execução de sentença apresentada pela parte executada, que transitou em julgado (​evento 2, DESPADEC41​e evento 2, DESP43 , p. 1/2 e 7).

​Observo que a penhora realizada sobre o imóvel ocorreu antes de a parte executada apresentar impugnação à execução de sentença (​evento 2, DESP34​).

A princípio, a insurgência em face da penhora deveria ter ocorrido na impugnação, conforme prevê o art. 525, parágrafo primeiro, inciso IV, do CPC:

Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.

§ 1º Na impugnação, o executado poderá alegar:

[...]

IV - penhora incorreta ou avaliação errônea;

Contudo, a Corte Especial do STJ, no julgamento dos Embargos de Divergência no Agravo em Recurso Especial 223.196/RS, firmou-se no sentido de que, à exceção do bem de família, compete à parte interessada suscitar a tese de impenhorabilidade absoluta, sob pena de preclusão: "A impenhorabilidade de bem arrolado no art. 649 do CPC, com exceção feita ao bem de família, deve ser arguida pelo executado no primeiro momento em que lhe couber falar nos autos, sob pena de preclusão. Precedentes" (EAREsp 223.196/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Rel. p/ Acórdão Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe 18/2/2014).

2. O instituto da exceção de pré-executividade não possui previsão legal. Contudo, em situações excepcionais admite-se a apresentação de exceção de pré-executividade, que consiste num incidente exercitado pelo devedor dentro do próprio processo executivo, permitindo a arguição de matéria suscetível de conhecimento de ofício ou de evidente nulidade do título, cujo reconhecimento independa de contraditório ou dilação probatória.

A matéria arguida, impenhorabilidade do bem penhorado é matéria de ordem pública, é cabível sua análise de ofício pelo Juízo. Todavia, oportunamente, será objeto de análise a questão da necessidade de dilação probatória para a comprovação das alegações da parte executada.

Fixada esta premissa, passo à análise do caso concreto.

Alega a parte executada a impenhorabilidade do lote de terras n. 203-E, situado na gleba Anhumai, do Município de Alto Paraná, matriculado sob n. 1.798, do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Alto Paraná-PR, com fundamento no art. 833, inciso VIII, do CPC:

Art. 833. São impenhoráveis:
(...)
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

O Juízo Estadual rejeitou a exceção de pré-executividade, porque o bem foi dado em garantia hipotecária na celebração do acordo ora executado, o que configuraria exceção à impenhorabilidade do bem de família, previsto no art. 3º, V, da Lei 8.009/90 (evento 40, ANEXO4, p. 104/106).

De fato, o bem imóvel objeto da penhora foi dado em hipoteca para garantia da dívida objeto do acordo judicial firmado entre as partes.

A hipoteca não foi objeto de anotação no registro de imóveis, conforme se verifica da matrícula do imóvel (evento 40, ANEXO3 , p. 223/224, e evento 40, ANEXO4, p. 1/6).

A ausência de registro imobiliário da hipoteca não afasta a exceção à regra da impenhorabilidade do bem de família. Neste sentido, cito o seguinte julgado do STJ:

CIVIL. DIREITO REAL DE GARANTIA. HIPOTECA. VALIDADE. AVERBAÇÃO NO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS. NÃO OCORRÊNCIA. BEM DE FAMÍLIA. EXCEÇÃO À REGRA DA IMPENHORABILIDADE. HIPÓTESE CONFIGURADA.

1. Nos termos do art. 3º, V, da Lei n. 8.009/90, ao imóvel dado em garantia hipotecária não se aplica a impenhorabilidade do bem de família na hipótese de dívida constituída em favor da entidade familiar. 2. A hipoteca se constitui por meio de contrato (convencional), pela lei (legal) ou por sentença (judicial) e desde então vale entre as partes como crédito pessoal. Sua inscrição no cartório de registro de imóveis atribui a tal garantia a eficácia de direito real oponível erga omnes. 3. A ausência de registro da hipoteca não afasta a exceção à regra de impenhorabilidade prevista no art. 3º, V, da Lei n. 8.009/90; portanto, não gera a nulidade da penhora incidente sobre o bem de família ofertado pelos proprietários como garantia de contrato de compra e venda por eles descumprido. 4. Recurso especial provido.

( 3ª T. do STJ, REsp 1455554 / RN RECURSO ESPECIAL 2014/0077399-4, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, unânime, data do julgamento: 14/06/2016).

Segundo precedentes das Turmas da 1ª Seção do STJ: "A jurisprudência do STJ firmou o entendimento de que a pequena propriedade rural trabalhada pela família é impenhorável, ainda que dada pelos proprietários em garantia hipotecária para financiamento da atividade produtiva, por força da garantia prevista no inc. XXVI do art. 5º da Constituição" (Apelação Cível nº 5029022-49.2017.4.04.9999/SC, 1ª Turma, j. em 07/12/2021). E "A pequena propriedade rural trabalhada pela família é impenhorável, inclusive para pagamento de débitos que não decorram de sua atividade produtiva, nos termos do art. 833, VIII, do Código de Processo Civil" (Apelação Cível nº 5004822-41.2019.4.04.7110/RS, 2ª Turma, j. em 14/09/2021).

No caso, a Cédula de Crédito Industrial que foi inadimplida pela parte executada e foi objeto de acordo judicial pelas partes, foi emitida pela empresa "Devanyr Roque Eugenio & Cia Ltda", CNPJ 79.449.526/0001-03 (nome de fantasia "Granja Triângulo" e encontra-se com situação cadastral baixada pela Receita Federal, desde 09/02/2015), e foi informado que o valor financiado seria destinado para "Capital de Giro" (evento 2, INIC1, p. 10)

Ao que tudo indica, o valor financiado e e, posteriormente, a quantia objeto do acordo judicial, foi destinado para financiamento da atividade produtiva do imóvel rural.

Mesmo que superada a questão da existência de hipoteca garantidora da dívida executada e aplicação do art. 3º, inciso V, da Lei n. 8.009/90, não há como se reconhecer a impenhorabilidade do imóvel por ser bem de família.

A impenhorabilidade da pequena propriedade rural encontra amparo em diversos dispositivos legais, a saber:

Constituição

Art. 5º:

(...)

XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;

Código de Processo Civil

Art. 833. São impenhoráveis:
(...)
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

Lei n. 8.009/90

Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.

(...)

Art. 4º (...)

(...)

§2º Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural.

O art. 4º, II, da Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra) assim define a propriedade familiar:

II - "Propriedade Familiar", o imóvel rural que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalho com a ajuda de terceiros;

Infere-se do texto constitucional e do Código de Processo Civil que a pequena propriedade rural é impenhorável, desde que trabalhada pela família. Nesse sentido, confiram-se precedentes da Corte Regional (destacou-se):

ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. MODULO RURAL. SUSTENTO DA FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE IMPENHORABILIDADE. 1. Por "pequena propriedade", nos termos do art. 4º, inciso II, alínea "a" da Lei nº 8.629/93, entende-se o imóvel rural (o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agro-industrial) de área compreendida entre 1 (um) e 4 (quatro) módulos fiscais. 2. Hipótese de penhora de imóvel rural inferior a quatro módulos fiscais (minifúndio), descrito na matrícula nº 5.704 do Registro de Imóveis da Comarca de Capanema/PR. 3. Para fins de comprovação da impenhorabilidade do bem faz-se necessário demonstrar que a propriedade é explorada pela entidade familiar e que dela a família retire seu sustento, o que restou provado nos autos. 4. Apelo desprovido. (TRF4, AC 5010557-25.2018.4.04.7002, DÉCIMA SEGUNDA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 09/03/2023)

ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DE IMÓVEL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. IMPENHORABILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte tem entendido que para caracterizar a impenhorabilidade do imóvel por se tratar de "pequena propriedade rural" devem ser verificados os seguintes requisitos: (1) que o imóvel se enquadre no conceito de pequena propriedade rural, assim compreendida como aquela com área de até quatro módulos fiscais, nos termos do art. 4º, II, 'a', da Lei nº 8.629/93; (2) que a área seja trabalhada pela família; e (3) que a dívida não seja relativa ao próprio bem. 2. Demonstrado o preenchimento dos requisitos acima descritos, deve ser reconhecida a impenhorabilidade da pequena propriedade rural. (TRF4, AC 5020210-22.2021.4.04.7107, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 01/03/2023)

No caso, sendo incontroverso que se trata de pequena propriedade rural (a propriedade rural em questão tem 0,2470 módulos fiscais - (evento 40, ANEXO4, p. 7), discute-se se o imóvel é efetivamente trabalhado pelo executado e sua família, requisitos cumulativos para que seja considerado impenhorável.

O imóvel não serve para sua residência ou de sua família, uma vez que os executados residem na cidade de Paranavaí (Rua Etore Giovine, n. 2806), cerca de 20 quilômetros de distância da propriedade penhorada (evento 40, ANEXO2 , p. 109/110; evento 40, ANEXO3, p. 207/210 e 219; evento 40, ANEXO6 , p. 11/; evento 27, SUBS2).

Pelo que se vê das fotos das edificações existentes no imóvel, feitas pelo avaliador judicial nomeado na carta precatória, aquelas que serviriam de residência não estão em condições de conservação que permitam o seu uso (evento 40, PRECATORIA1, p. 164/215 e evento 40, ANEXO2 , p. 1/13).

A parte executada anexou à Carta Precatória iniciais de reclamatórias trabalhistas ajuizada por supostos empregados da parte executada, pretendendo o pagamento de verbas trabalhistas devidas em razão do desempenho de trabalho rural no imóvel localizado na BR 376, KM 116, s/nº, Gleba Anhumai, CEP: 87.750-000, em Alto Paraná.

O trabalhador Paulo Cezar Martins informou na inicial da ação que exercia "a função de serviços gerais- extração florestal executava tais atividades: plantação de mudas, retirada de mudas, passava veneno, preparo das mudas para serem vendidas, atendimento a clientes, produzir adubo, mediante o pagamento das diárias efetivamente prestadas, ao preço de R$- 48,00 cada de segunda-feira à sexta-feira e R$- 60,00 cada aos sábados, domingos e feriados trabalhados, e remuneração mensal fixa de ..." (evento 40, ANEXO4, p. 15/16) .

A trabalhadora Solange Camilo Teixeira declarou na inicial "... que executava tais atividades: primeiramente trabalhava na empreita (enchendo saquinho), após esse período trabalhou na diária na plantação de mudas, retirada de mudas, enchia saquinho, passava veneno, preparo das mudas para serem vendidas, carregamento de caminhão, mediante o pagamento das diárias efetivamente prestadas (cujo valor estava fixada em R$- 48,00 reais por diária,de segunda a sexta feira e R$- 60,00 cada aos sábados e domingos trabalhados), contudo, o registro em CTPS se deu somente em 02 de agosto de 2013 totalizando um valor mensal de R$- 1.120,00, o recebimento do salário era mensal. MAIS fornecimento de parcelas in natura (moradia servida de água e energia elétrica). Trabalhou, continuamente, até 19 de agosto de 2014, quando foi demitida sumariamente, sem justa causa" (evento 40, ANEXO4 , p. 27 ).

Em ambas as reclamatórias trabalhistas foram realizados de acordos em audiência (​evento 40, ANEXO4​, p. 23/24 e 34/35).

Ou seja, ao que tudo indica, a área rural não é trabalhada exclusivamente pela família, e os terceiro(s) contratado(s) não desempenhavam trabalho eventual.

Também outro ponto a ser levantado é que os executados são pessoas idosas (evento 40, ANEXO3, p. 220/221) e, diante da idade avançada, dificilmente teriam condições de realizar o trabalho rural sem a contratação constante de mão-de-obra.

Quanto a utilização do imóvel rural para sua subsistência, a parte executada somente anexou na carta precatória notas fiscais de produtor dos meses de janeiro e fevereiro/2020. Tais documentos são insuficientes para demonstrar que a renda obtida com a exploração do imóvel rural é exclusiva para manutenção da família.

Ademais, na qualificação do executado Devanyr no substabelecimento do evento 27, SUBS2, foi declarado ser "aposentado".

Nessas circunstâncias, não ficou demonstrada a alegada impenhorabilidade do imóvel em questão.

Conforme já mencionado, incabível a dilação probatória no incidente de exceção de pré-executividade a fim de ser eventualmente dirimida eventual questão acerca do cumprimento dos requisitos para o reconhecimento do direito alegado.

Diante do exposto, rejeito a exceção de pré-executividade apresentada no evento 52, EXCPRÉEX1 .

Sem honorários advocatícios, ante o caráter de mero incidente processual da exceção proposta.

Intimem-se as partes desta decisão.

2. Verifico a existência de outras penhoras sobre o imóvel penhorado, anotadas no registro de imóveis, havendo a possibilidade de eventual alienação do bem em outro processo judicial.

Assim, concomitante à intimação do item 1, intime-se a CEF para anexar matrícula atualizada do imóvel penhorado. Prazo de 15 (quinze) dias.

3. Indispensável a reavaliação do imóvel penhorado, diante do longo tempo decorrido desde a avaliação realizada no Juízo Deprecado.

Assim, não tendo ocorrido a alienação do imóvel em outro processo judicial informado na matrícula do imóvel, expeça-se mandado de reavaliação do imóvel penhorado, a ser cumprido por Oficial de Justiça da Justiça Federal.

4. Cumprido o mandado, intimem-se as partes a se manifestarem sobre a avaliação e requererem o que de direito. Prazo de 15 (quinze) dias.

5. Havendo concordância das partes com a avaliação, venham-me conclusos para deliberar sobre a designação de praça para a venda do imóvel."

Pois bem.

O deferimento total ou parcial da pretensão recursal, em antecipação da tutela, por decisão monocrática do relator, é cabível quando estiverem evidenciados, de um lado, a probabilidade do direito (que, no caso, consiste na probabilidade de provimento do recurso), e, de outro, o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 1.019, I, c/c art. 300), vedada a intervenção judicial "quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão" (art. 300, § 3.º).

Com essas premissas deve ser examinado o pedido de tutela emergencial.

2. A exceção ou objeção de pré-executividade constitui medida defensiva restrita, podendo ser utilizada pela parte executada apenas e tão-somente diante de situações em que reste sobejamente evidenciada a impossibilidade do prosseguimento da marcha processual executiva. Cuida-se de instrumento hábil para a discussão de matérias de ordem pública, ou seja, trata-se de um incidente que "tem por finalidade impugnar questões que devam ser conhecidas de ofício pelo juiz, como as condições da ação, os pressupostos processuais e a liquidez do título executivo, não constituindo via adequada para examinar temas que demandam dilação probatória. Precedentes." (AgInt no AREsp 621.011/MG, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 06/04/2017, DJe 18/04/2017).

Partindo-se de tal premissa, esta 12ª Turma firmou entendimento de que a exceção de pré-executividade constitui medida jurisdicional excepcional, cabível nas hipóteses em que invocada matéria de ordem pública, cognoscível de ofício, sem necessidade de dilação probatória.

Confira-se:

"ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO BANCÁRIO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. DILAÇÃO PROBATÓRIA. REJEIÇÃO. AGRAVO IMPROVIDO.

1. A exceção de pré-executividade é meio de defesa cabível para submeter à apreciação do juízo da execução matérias que possam ser conhecidas de ofício e que dispensem dilação probatória.

2. Ainda que o ponto impugnado seja passível de conhecimento de ofício (inexigibilidade do título executivo), demanda a análise da matéria fática e dilação probatória, não sendo possível a apreciação com base apenas na prova documental existente.

3. Descabimento da exceção de pré-executividade.

4. Agravo de instrumento improvido."

(TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5030380-97.2022.4.04.0000, 12ª Turma, Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 15/12/2022)

"ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. CONSELHO PROFISSIONAL. ANOTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE TÉCNICA. ATIVIDADE BÁSICA. DISCUSSÃO NA VIA DA EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. NÃO CABIMENTO.

Ainda que se esteja diante de questão pacífica, onde usualmente se resolve a controvérsia pela análise documental, não é possível a discussão quanto à obrigatoriedade ou não da executada registrar-se ou manter profissional habilitado no Conselho profissional, na via estreita da exceção de pré-executividade, por implicar análise meritória. A discussão somente tem cabimento pela via adequada dos embargos à execução fiscal ou ação anulatória/declaratória, sob pena de desvirtuamento da utilização do incidente."

(TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000076-04.2012.4.04.7005, 12ª Turma, Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 17/11/2022)

Mostra-se adequado, portanto, o manejo do instrumento de defesa em questão para defender a impenhorabilidade de bem constrito nos autos.

No caso, o bem penhorado consiste no do lote de terras n. 203-E, situado na gleba Anhumai, Município de Alto Paraná/PR, registrado na matrícula n. 1.798 do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Alto Paraná-PR (processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 2, OUT7; processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 40, ANEXO3, pp. 223-225; e processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 40, ANEXO4, pp. 1-6). A parte agravante defende a impenhorabilidade de dito bem, sob o argumento de que consiste em pequena propriedade rural trabalhada pela família, amoldando-se, assim, à hipótese de impenhorabilidade prevista pelo art. 833, VIII, do CPC, que, conforme decisão proferida pelo STJ no REsp nº 1.591.298/RJ (Terceira Turma, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, julgado em 14/11/2017), não se limita aos débitos decorrentes de atividade produtiva dos devedores.

O atendimento do requisito de tratar-se de pequena propriedade rural resta incontroverso, pois foi reconhecido de forma expressa na decisão agravada. A insurgência refere-se, portanto, à existência ou não de provas sobre o trabalho exercido pela família sobre a propriedade, e à necessidade ou não de os devedores lá manterem sua residência.

Nesse contexto, assiste razão aos agravantes ao sustentar que a moradia dos devedores na pequena propriedade rural não constitui pressuposto para o reconhecimento da impenhorabilidade, pois o art. 833, VIII, do CPC não faz menção a essa circunstância. Também no acórdão do REsp nº 1.591.298/RJ, já acima referido, o STJ assentou que:

"RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL, DEFINIDA EM LEI E TRABALHADA PELA ENTIDADE FAMILIAR, COM ESCOPO DE GARANTIR A SUA SUBSISTÊNCIA. REJEIÇÃO, PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, SOB O FUNDAMENTO DE QUE O EXECUTADO NÃO RESIDE NO IMÓVEL E DE QUE O DÉBITO NÃO SE RELACIONA À ATIVIDADE PRODUTIVA. IRRELEVÂNCIA. RECONHECIMENTO. NECESSIDADE DE SE AFERIR, TÃO SOMENTE, SE O BEM INDICADO À CONSTRIÇÃO JUDICIAL CONSTITUI PEQUENA PROPRIEDADE RURAL, NOS TERMOS DA LEI DE REGÊNCIA, E SE A ENTIDADE FAMILIAR ALI DESENVOLVE ATIVIDADE AGRÍCOLA PARA O SEU SUSTENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO

(...)

3. O fundamento que orienta a impenhorabilidade do bem de família (rural) não se confunde com aquele que norteia a da pequena propriedade rural, ainda que ambos sejam corolários do princípio maior da dignidade da pessoa humana, sob a vertente da garantia do patrimônio mínimo. O primeiro, destina-se a garantir o direito fundamental à moradia; o segundo, visa assegurar o direito, também fundamental, de acesso aos meios geradores de renda, no caso, o imóvel rural, de onde a família do trabalhador rural, por meio do labor agrícola, obtém seu sustento.

3.1 As normas constitucional e infralegal já citadas estabelecem como requisitos únicos para obstar a constrição judicial sobre a pequena propriedade rural: i) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; e ii) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família. Assim, para o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, não se exige que o imóvel seja a moradia do executado, impõe-se, sim, que o bem seja o meio de sustento do executado e de sua família, que ali desenvolverá a atividade agrícola.

3.2 O tratamento legal dispensado à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, objeto da presente controvérsia, afigura-se totalmente harmônico com aquele conferido à impenhorabilidade do bem de família (rural). O art. 4º, § 2º, da Lei n. 9.008/1990, que disciplina a impenhorabilidade do bem de família, põe a salvo de eventual contrição judicial a sede da moradia, e, em se tratando de pequena propriedade rural, a área a ela referente.

(...)" (grifou-se)

(STJ, REsp nº 1.591.298/RJ, Terceira Turma, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, julgado em 14/11/2017)

Essa conclusão foi sedimentada pela Segunda Seção do STJ ao julgar o REsp n. 1913234/SP, sob a Relatoria da Ministra Nancy Andrighi, em 08/02/2023, quando restou assentado que "3. Para reconhecer a impenhorabilidade, nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (iii) que seja explorado pela família. (...)" (grifou-se).

Nesse contexto, a pretensão recursal afigura-se verossímil quanto à afirmação de que o local de residência dos devedores é irrelevante para configurar a impenhorabilidade discutida.

O mesmo se diz quanto à constatação de que o requerido Devanyr Roque Eugenio foi qualificado como aposentado nos autos. Presumir que seu benefício previdenciário seja suficiente para manter o sustento da família sem o auxílio da produção rural gerada na propriedade equivale a negar a realidade da maioria da população brasileira que, mesmo após aposentar-se, permanece trabalhando para auferir renda digna à sua subsistência. Além disso, negar a impenhorabilidade em razão da aposentadoria do proprietário rural equivaleria a puni-lo por receber direito social apropriado à sua idade e conquistado com anos de trabalho na terra, o que carece de razoabilidade.

Essa conclusão se estende à necessidade de contratação de prestadores de serviços externos para auxílio no trabalho rural, já que os requeridos têm idade avançada e não possuem condições de lavorar sem a ajuda de terceiros. O fato de sua renda principal provir da propriedade independe de ser gerada pessoalmente pelos devedores ou por terceiros que lá trabalhem, conforme se extrai da seguinte decisão recentemente proferida por esta Corte:

"TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. DISSOLUÇÃO IRREGULAR. SÓCIO-ADMINISTRADOR. SÚMULA 435 DO STJ. TEMA 981 DO STJ. PENHORA IMÓVEIS RURAIS. IMPENHORÁVEIS. COMPROVAÇÃO DO REGIME DE AGRICULTURA DE SUBSISTÊNCIA FAMILIAR.
1. Para a caracterização da dissolução irregular da pessoa jurídica, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça indica presumir-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-administrador (Súmula 435).
2. O quadro revela que a situação se amolda perfeitamente ao Tema 981 do Superior Tribunal de Justiça, na medida em que o recorrente era sócio na ocasião da dissolução irregular, mantendo a sua legitimidade passiva.
3. A jurisprudência das Turmas integrantes da Primeira Seção desta Corte entende que para o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel rural, existe a necessidade de comprovação, por parte daquele que pretende o reconhecimento da impenhorabilidade, de que a família retire sua subsistência da terra, ou ainda que a família não trabalhe diretamente na terra, comprovadamente, dela retire seu sustento, decorrente do arrendamento da propriedade (TRF4, Primeira Turma, AG 5042321-44.2022.4.04.0000, j. em 16fev.2023; no mesmo sentido: TRF4, Segunda Turma, AG 5016391-24.2022.4.04.0000, j. em 15jun.2022).
4. O ônus de comprovar a condição de impenhorabilidade, portanto, é da parte que alega ter direito ao benefício." (grifou-se)

(TRF4, AC n. 5034927-98.2018.404.9999, Primeira Turma, Relator Desembargador Federal Marcelo de Nardi, julgado em 14/06/2023)

Assim, quando dispõe que a impenhorabilidade da pequena propriedade rural demanda que seja "trabalhada pela família", o art. 833, VIII, do CPC não pode ser interpretado de forma literal, mas sim no sentido de que a produção gerada pelo imóvel, e não por seus proprietários, deve ser responsável pelo sustento familiar. Caso contrário, e nos termos dispostos na decisão agravada, chegar-se-ia ao contrassenso de jamais se admitir a impenhorabilidade de pequenas propriedades rurais pertencentes a pessoas idosas, seja porque seus proprietários não possuem mais condições de trabalhá-las "com as próprias mãos", seja porque auferem benefício previdenciário.

Por fim, afigura-se relevante o argumento de que as notas fiscais consideradas antigas pelo juízo a quo instruíram a exceção de pré-executividade apresentada nos autos em 30/07/2019, sendo-lhe, portanto, anteriores (processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 40, ANEXO3, pp. 210-218; e processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 40, ANEXO4, pp. 13). Se o juízo pretendia valorar negativamente esses documentos com base na data da decisão, proferida mais de quatro anos após a juntada da exceção de pré-executividade, deveria oportunizar aos devedores a complementação oportuna e contemporânea à data da análise. Como assim não se procedeu, mostra-se razoável que a apreciação da defesa ocorra de forma retroativa, pautando-se nas informações e documentos constantes nos autos em 30/07/2019, quando parecem demonstrar que a pequena propriedade rural penhorada de fato gerava sustento aos devedores.

Pelo exposto, e nesta análise não exauriente, constata-se a presença tanto da probabilidade de provimento do recurso quanto do risco de dano caso a decisão agravada tenha cumprimento em seus ulteriores termos. Nessa esteira, comporta deferimento o pedido de atribuição de efeito suspensivo à decisão impugnada.

Ante o exposto, defiro o pedido de efeito suspensivo.

Intimem-se, sendo que a parte agravada e os interessados, se houver, para contrarrazões, nos termos do art. 1.019, II do CPC.

Caso a(s) parte(s) agravada(s) tenha(m) sido devidamente intimada(s) em primeiro grau e não tenha(m) constituído advogado, dispenso a intimação para apresentação de contrarrazões."

Não sobrevieram nos autos elementos hábeis a alterar essa conclusão, que mantenho em sua integralidade.

Impõe-se, nessa medida, o provimento do presente recurso, para reconhecer a impenhorabilidade do imóvel consistente no lote de terras n. 203-E, situado na gleba Anhumai, Município de Alto Paraná/PR, registrado na matrícula n. 1.798 do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Alto Paraná-PR (processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 2, OUT7; processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 40, ANEXO3, pp. 223-225; e processo 5013495-63.2013.4.04.7003/PR, evento 40, ANEXO4, pp. 1-6), e determinar o cancelamento da penhora sobre ele incidente determinada nos autos de origem.

Ante o exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento.



Documento eletrônico assinado por JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004426528v5 e do código CRC 5abe900f.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5041424-79.2023.4.04.0000/PR

RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

AGRAVANTE: DEVANYR ROQUE EUGENIO

AGRAVANTE: DEVANYR ROQUE EUGENIO & CIA LTDA

AGRAVANTE: SIDNEY EGGER EUGENIO

AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF

EMENTA

DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. cumprimento de sentença. agravo de instrumento. impenhorabilidade de pequena propriedade rural TRABALHADA PELA FAMÍLIA. cabimento da alegação em exceção de pré-executividade. requisitos exigidos pelo ART. 833, viii, do cpc demonstrados pela parte agravante. recurso provido.

1. A exceção de pré-executividade consiste em meio de defesa por intermédio do qual o executado submete ao conhecimento do juiz da execução, independentemente de penhora ou de embargos, matéria suscetível de conhecimento de ofício ou à nulidade do título que seja evidente e flagrante, isto é, nulidade cujo reconhecimento independa de contraditório ou de dilação probatória (matéria de ordem pública). Mostra-se adequado, portanto, o manejo do instrumento de defesa em questão para defender a impenhorabilidade de bem constrito nos autos.

2. "3. Para reconhecer a impenhorabilidade, nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (iii) que seja explorado pela família. (...)" (STJ, REsp n. 1913234/SP, Segunda Seção, Relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 08/02/2023).

3. A moradia dos devedores na pequena propriedade rural não constitui pressuposto para o reconhecimento da impenhorabilidade, pois o art. 833, VIII, do CPC não faz menção a essa circunstância (STJ, REsp nº 1.591.298/RJ, Terceira Turma, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, julgado em 14/11/2017).

4. Para a maioria da população brasileira, a manutenção de condições mínimas de subsistência impõe que se permaneça no mercado de trabalho mesmo após a aposentadoria. Assim, o fato de o devedor receber aposentadoria não significa, por si só, que aufira renda suficiente para manter o sustento da família sem o auxílio da produção rural gerada na propriedade, tornando-a penhorável. Negar a impenhorabilidade em razão da aposentadoria do proprietário rural equivaleria a puni-lo por receber direito social apropriado à sua idade e conquistado com anos de trabalho na terra.

5. "3. A jurisprudência das Turmas integrantes da Primeira Seção desta Corte entende que para o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel rural, existe a necessidade de comprovação, por parte daquele que pretende o reconhecimento da impenhorabilidade, de que a família retire sua subsistência da terra, ou ainda que a família não trabalhe diretamente na terra, comprovadamente, dela retire seu sustento, decorrente do arrendamento da propriedade (...)" (TRF4, AC n. 5034927-98.2018.404.9999, Primeira Turma, Relator Desembargador Federal Marcelo de Nardi, julgado em 14/06/2023)

6. A impenhorabilidade não é afastada pela necessidade de contratação de prestadores de serviços externos para auxiliar proprietários rurais idosos no trabalho da terra, já não possuem condições de lavorar sem a ajuda de terceiros. O fato de sua renda principal provir da propriedade independe de ser gerada pessoalmente pelos devedores ou por terceiros que lá trabalhem.

7. Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 17 de abril de 2024.



Documento eletrônico assinado por JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004426529v7 e do código CRC df1f2f3b.Informações adicionais da assinatura:
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5041424-79.2023.4.04.0000
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 17/04/2024

Agravo de Instrumento Nº 5041424-79.2023.4.04.0000/PR

RELATOR: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

PROCURADOR(A): ORLANDO MARTELLO JUNIOR

AGRAVANTE: DEVANYR ROQUE EUGENIO

ADVOGADO(A): LUCIANO BIGNATTI NIERO (OAB PR049321)

AGRAVANTE: DEVANYR ROQUE EUGENIO & CIA LTDA

ADVOGADO(A): LUCIANO BIGNATTI NIERO (OAB PR049321)

AGRAVANTE: SIDNEY EGGER EUGENIO

ADVOGADO(A): LUCIANO BIGNATTI NIERO (OAB PR049321)

AGRAVADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 17/04/2024, na sequência 103, disponibilizada no DE de 08/04/2024.

Certifico que a 12ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 12ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

Votante: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

Votante: Desembargador Federal LUIZ ANTONIO BONAT

Votante: Desembargadora Federal GISELE LEMKE

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2024 04:02:34.

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