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EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR E BOIA-FRIA. TRABALHO RURAL. COMPROVAÇÃO. IDADE MÍNIMA. IMPLEMENTO. TEMPO EM GOZO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INTERCALADO COM PERÍODOS CONTRIBUTIVOS. CÔMPUTO PARA CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO. TRF4. 5015965-85.2022.4.04.9999

Data da publicação: 03/05/2024, 11:01:46

EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR E BOIA-FRIA. TRABALHO RURAL. COMPROVAÇÃO. IDADE MÍNIMA. IMPLEMENTO. TEMPO EM GOZO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INTERCALADO COM PERÍODOS CONTRIBUTIVOS. CÔMPUTO PARA CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO. 1. O tempo em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez intercalado com períodos de trabalho efetivo pode ser computado para fins de carência (Lei 8.213/91, art. 55, II), nos termos do tema 1.125 do STF. 2. Atingida a idade mínima exigida e comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, pelo período exigido em lei, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal consistente, o segurado faz jus à aposentadoria rural por idade. (TRF4, AC 5015965-85.2022.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 26/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015965-85.2022.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: VALDOMIRO ALVES DE OLIVEIRA

ADVOGADO(A): LAURO ANTONIO BRUN (OAB RS042424)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de ação previdenciária ajuizada em 12/09/2020 contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, postulando a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, na condição de trabalhador rural em regime de economia familiar, desde a DER (29/08/2019).

O juízo a quo, em sentença publicada em 07/07/2022, julgou parcialmente procedentes os pedidos, reconhecendo o exercício do labor rural no intervalo de 26/12/1997 a 08/04/1998. Condenou as partes ao pagamento de 50% dos honorários advocatícios, fixados em R$ 1.500,00 reais. Condenou o autor ao pagamento de 50% das custas processuais. Suspensa a exigibilidade do pagamento das verbas relativas ao autor, em virtude de gratuidade judiciária.

Apelou o autor sustentando que apresentou prova material, corroborada pela prova testemunhal, suficiente e capaz de comprovar o seu labor rural, em regime de economia familiar, pelo tempo necessário à concessão do benefício. Requereu ainda o reconhecimento como tempo de contribuição dos períodos em que esteve em gozo de auxílio-doença.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

Da aposentadoria por idade rural: considerações gerais

A apreciação de pedido de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei 8.213/91), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei 8.213/91. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondente à carência exigida nas aposentadorias em geral, sendo, porém, dispensável o recolhimento de contribuições.

Quanto ao ano a ser considerado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei 8.213/91, será aquele em que o segurado completa a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, nesse caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).

Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício seguirá a tabela progressiva do mencionado artigo.

Nos termos do tema 642 do STJ, “o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.”

Nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994, data da publicação da Medida Provisória 598 (posteriormente convertida na Lei 9.063/95), que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei 8.213/91, e sim a redação original do art. 143, II, da mesma lei, em respeito ao direito adquirido (STF, RE 168.191, Segunda Turma, Rel. Ministro Marco Aurélio, julgado em 01/04/1997).

Quanto aos segurados especiais que implementarem os requisitos para concessão do benefício após 31 de dezembro de 2010, não deve ser aplicado o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I, sem limite de data.

O trabalhador rural que atua como boia-fria, diarista ou volante, deve ser equiparado, para os fins da aposentadoria rural por idade, ao segurado especial, a ele se aplicando, em consequência, o disposto no art. 39, I, da Lei 8.213/91, sem as limitações temporais previstas no art. 143 da mesma lei. Não há o que justifique tratamento diferenciado, especialmente se considerada a maior vulnerabilidade social a que está sujeito o trabalhador rural sem vínculo empregatício e desprovido dos meios para, por conta própria, retirar seu sustento e de sua família do trabalho na terra.

Desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente esse, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STF, RE 631.240, com repercussão geral, Plenário, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).

Da comprovação do tempo de atividade rural

Com relação à prova do exercício da atividade rural, na condição de segurado especial, como regra geral, exige-se, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (STJ - REsp 1.348.633/SP, Primeira Seção, Rel.Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 28/08/2013).

O Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive o informal (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).

Além disso, o início de prova material não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.

Aliás, a relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012).

No entanto, segundo precedente do Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo, embora possível para fins de comprovação da atividade rural, a extensão de prova material em nome de um dos membros do núcleo familiar a outro, a extensibilidade da prova fica prejudicada no caso de o cônjuge em nome do qual o documento foi emitido passar a exercer labor incompatível com o trabalho rural, como no meio urbano (STJ, RESP 1.304.479/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).

Por outro lado, comprovado o desempenho de atividade rural por meio de documentos em nome do segurado ou de ente familiar que permaneça na lida rural, corroborado por prova testemunhal, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais. Assim, o fato por si só do cônjuge ter exercido labor urbano e hoje perceber aposentadoria de origem urbana ou permanecer trabalhando em atividade que não a rural, não afasta a condição de segurado especial, da parte interessada, desde que esta disponha de início de prova material independente do cônjuge.

Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.

Ressalte-se que não constituem início de prova material as declarações emitidas por sindicato de trabalhadores rurais quando não tiverem a homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), pois equivalem a meros testemunhos reduzidos a termo (STJ- EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.010.725/MS, Quinta Turma, Rel.Ministro Marco Aurélio Bellize, julgado em 06/11/2012; STJ, AgRg no REsp 1.291.466/MG, Quinta Turma, Rel. Ministro Newton Trisotto, julgado em 18/11/2014; STJ, AR 3.202/CE, Terceira Seção, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 23/04/2008).

Da comprovação do tempo de atividade rural e da prova da atividade na condição de diarista rural.

Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial e do boia-fria, o reconhecimento da atividade, nos períodos anteriores e posteriores ao advento da Lei 8.213/91 não pressupõe o recolhimento de contribuições.

Para a prova do exercício da atividade rural, na condição de segurado especial exige-se início de prova material (documental) (STJ - REsp 1.348.633/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 28/08/2013).

O Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive o informal (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).

O início de prova material não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.

Embora exigida prova documental indiciária também para os trabalhadores rurais do tipo boia-fria, trata-se de requisito que pode e deve ser abrandado, de acordo com a análise do caso concreto, considerando a informalidade com que é exercida a profissão de diarista no meio rural, sob pena de restar inviabilizado o direito fundamental à aposentadoria (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).

A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012).

Não constituem, porém, início de prova material as declarações emitidas por sindicato de trabalhadores rurais quando não tiverem a homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei 8.213/91), pois equivalem a meros testemunhos reduzidos a termo (STJ, EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.010.725/MS, Quinta Turma, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellize, julgado em 06/11/2012; STJ, AR 3.202/CE, Terceira Seção, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 23/04/2008).

Também não podem ser utilizados documentos emitidos em nome de membro do grupo familiar que tenha passado a exercer labor incompatível com o trabalho rural (STJ, RESP 1.304.479/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012). Em se tratando, porém, do trabalhador rural boia-fria, é necessário compatibilizar o entendimento do STJ com o adotado pela mesma corte superior no RESP 1321493/PR, no sentido de que a exigência de prova material do tempo de serviço deve ser abrandada, admitindo-se qualquer documento que indique vinculação ao meio rural. Assim, neste caso, ausentes outras possibilidades de prova material, não se deve desprezar documentos em nome de parente, que tenha passado à atividade urbana, desde que a prova oral produzida seja substancial (STJ, RESP 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).

Por outro lado, comprovado o desempenho de atividade rural, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais.

É de se ressaltar ainda que o exercício de pequenos períodos de labor urbano, não retira do interessado a condição de trabalhador rural. O exercício da atividade rural pode ser descontínuo (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 297.322/PB, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 13/08/2013).

Quanto à idade mínima para o exercício da atividade rural, observa-se o quanto decidido por esta Corte no julgamento da Ação Civil Pública 5017267-34.2013.404.710, segundo o qual, “apesar da limitação constitucional de trabalho do infante (art. 157, IX da CF/46, art. 165, X da CF/67 e art. 7º, XXIII, da CF/88), para fins de proteção previdenciária, não há como fixar também qualquer limite etário, pois a adoção de uma idade mínima ensejaria ao trabalhador dupla punição: a perda da plenitude de sua infância em razão do trabalho realizado e, de outro lado, o não reconhecimento, de parte do INSS, desse trabalho efetivamente ocorrido”.

Do caso concreto

A parte autora preencheu o requisito etário (60 anos) em 25/07/2019, pois nascida em 25/07/1959 (ev.1-OUT5). O requerimento administrativo foi apresentado em 29/08/2019 (ev.1-INDEFERIMENTO18). Dessa forma, deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 180 meses ainda que de forma descontínua, devendo estar em atividade no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário/requerimento administrativo.

Inicialmente verifico que o autor teve reconhecidos administrativamente os períodos de 09/04/1998 a 14/04/2003- 60 meses - e de 09/07/2018 a 15/05/2019 - 10 meses - (ev.1-PROCADM17, fls. 12-13). Em que pese o período de 09/07/2018 a 15/05/2019 conste como reconhecido no despacho 48617158 fornecido pelo Coordenação Geral de reconhecimento de direito, assiste razão ao autor, quando informa que o mesmo não foi incluído em seu extrato de dossiê previdenciário (ev.11-OUT3). Determino a regularização do mesmo com a inclusão do período de 09/07/2018 a 15/05/2019 ja comprovado. Da mesma forma, em consulta ao seu CNIS, verifica-se que não houve a averbação do período de 09/04/1998 a 14/04/2003, sendo necessária sua inclusão no cadastro.

O autor teve reconhecido em sentença o período de 26/12/1997 a 08/04/1998 (3 meses e 10 dias).

No caso concreto o requerente alega ter laborado na condição de diarista rural e em regime de economia familiar, também nos períodos de 25/07/1971 a 25/12/1997, 22/08/2017 a 08/07/2018 e 16/05/2019 a 29/08/2019. Postula ainda a inclusão dos períodos em que esteve em gozo de benefício por incapacidade (25/05/2003 a 31/10/2007, 25/02/2008 a 02/08/2012 e de 05/12/2012 a 21/08/2017 - ev. 55-APELAÇÃO1, fls. 11-13).

Para fazer prova do exercício de atividade rural, foram acostados os seguintes documentos:

- certidão de casamento do autor, qualificando-o como diarista, datda de 1985 (ev. 1-CERTCAS6);

- certidões de nascimento dos filhos do autor, qualificando-o como diarista, datadas de 1983 e 1986 (ev.1-CERTNASC7-8);

- notas fiscais de produtor rural, em nome do autor, datadas de 1998 a 2019 (ev.1-NFISCAL12-16);

- ficha de atendimento de saúde, em nome do autor e de sua esposa, qualificados como agricultores, datada de 1997 (ev.1OUT10);

- ficha de cadastro de microprodutor rural, em nome do autor, com data de início da vigência em 1997 e situação habilitado em 2019 (ev.1-OUT11);

Os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.

Conforme anteriormente mencionado o início de prova material relativamente aos trabalhadores rurais do tipo diarista, é requisito que pode e deve ser abrandado, de acordo com a análise do caso concreto, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, sob pena de frustrar a concessão do direito fundamental à aposentadoria.

Na audiência de instrução e julgamento, realizada em 26/05/2021, foram ouvidas as testemunhas Valdir Rodrigues da Silva e Alceu Bidin (ev.42-TERMOAUD1 e ev, 45-OUT1-2). A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente do labor rural da parte autora, por longa data, na condição de trabalhadora rural, em regime de economia familiar e diarista.

A testemunha Valdir Rodrigues da Silva declarou que conhece o autor desde criança, que ele sempre exerceu agricultura plantando para si em "cantinhos de terras pra lá e pra cá" e também na condição de diarista rural para diversos proprietários. Asseverou que o autor nunca teve terras próprias, que ele trabalha em terras cedidas. Declarou que o autor nunca se afastou da ativiadde rural, que sempre retirou seu sustento da lavoura, que ele não sabe fazer outra coisa. Citou um proprietário onde o autor planta atualmente.

A testemunha Alceu Bidin, por seu turno, declarou que conhece o autor há aproximadamente 30 anos, que ele é agricultor. Que ele planta em terras cedidas, tendo a testemunha uma época cedido um pedaço de terras para o autor, que em troca ele fazia serviços na condição de diarista rural, as vezes recebia também alguma gratificação pelo serviço. Asseverou que o autor "corre pra lá e pra cá", que sempre trabalhou na agricultura, que todos na região o conhecem. Citou um proprietário onde o autor planta atualmente.

Pela análise das notas fiscais juntadas aos autos, verifica-se que os períodos de produção e as quantidades de grãos comercializados são compatíveis com o tamanho da terra utilizada e com o número de pessoas que nela trabalha na lida campesina, sendo reconhecido, assim, a realização do cultivo em regime de economia familiar.

Também não há nos autos, qualquer referência de uso de empregados ou maquinário para cultivo das atividades rurais desempenhadas pelo autor.

Registro ainda que o regime de economia familiar tem por característica o trabalho da família, em sistema de mútua dependência e colaboração, voltado à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar. No caso dos autos, as testemunhas asseveraram que o demandante exercia o labor rural e que seu trabalho era necessário para a subsistência de todo o grupo familiar.

Restou comprovado pelos autos, que o autor, por toda sua vida laboral exerceu atividade rural, na qualidade de segurado especial, seja em pequenos pedaços de terra cedida, seja na condição de diarista rural para os proprietários da região.

Ainda, os benefícios por incapacidade concedidos ao autor nos períodos de 25/05/2003 a 31/10/2007, 25/02/2008 a 02/08/2012 e de 05/12/2012 a 21/08/2017 decorreram exatamente do reconehcimento, além da sua incapacidade, de sua qualidade de segurado especial.

Considerando os depoimentos prestados e a prova coligada aos autos, entendo ser possível o reconhecimento do período de labor rural do autor, a partir de 26/10/1985 (data da certidão de casamento, qualificando o autor como diarista) até 25/12/1997 (146 meses), bem como nos períodos de 22/08/2017 a 08/07/2018 e 16/05/2019 a 29/08/2019 (14 meses e 1 dia).

Computo de Período em Gozo de Auxílio-Doença - Carência

O tempo em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez só pode ser computado para fins de carência se intercalado com períodos de trabalho efetivo (Lei 8.213/91, art. 55, II).

A constitucionalidade do dispositivo legal foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmando-se a seguinte tese:

Tema STF 1.125 - É possível o cômputo do interregno em que o segurado esteve usufruindo benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) para fins de carência, desde que intercalado com períodos contributivos ou de efetivo trabalho.

O julgador a quo referiu, em sentença, que não houve postulação em tal sentido na inicial. Contudo, compulsando à petição inicial, verifico que o autor expressamente refere os intervalos em que esteve em gozo de auxílio-doença como integrantes de sua carência, podendo-se considerar presente a formulação do pedido de seu cômputo.

O autor teve comprovados, administrativamente/judicialmente os seguintes períodos de labor rural, na qualidade de segurado especial: de 26/10/1985 a 14/04/2003 (210 meses) e de 09/07/2018 a 15/05/2019 (10 meses). Recebeu auxílio-doença nos períodos de 25/05/2003 a 31/10/2007, 25/02/2008 a 02/08/2012 e de 05/12/2012 a 21/08/2017.

No caso, inconteste que o autor manteve-se no meio rurícola durante o período em que recebeu auxílio-doença, retornando ao desempenho das atividade rurícolas por ocasião da cessação dos benefícios por incapacidade. O que se comprova ainda pelas notas fiscais apresentadas (datas de 1998 a 2019).

Desta maneira, demonstrado, conforme já explicitado, o retorno do autor à atividade rurícola, é possível o cômputo dos intervalos de 25/05/2003 a 31/10/2007 (53 meses), 25/02/2008 a 02/08/2012 (53 meses) e de 05/12/2012 a 21/08/2017 (57 meses) como carência.

Considerando que a parte autora preencheu os requisitos necessários para a concessão da aposentadoria rural por idade concomitantemente (carência: 180 meses e idade mínima: 60 anos, em 25/07/2019), bem como comprovou que estava trabalhando no meio rural no período imediatamente anterior à DER (29/08/2019), faz jus ao benefício pleiteado.

Na hipótese dos autos, a parte autora implementou a idade/tempo de serviço rural após 31 de dezembro de 2010. Tratando-se, porém, de segurado especial/diarista rural (trabalhador equiparado a segurado especial), não se lhe aplica o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I.

Assim, atingida a idade mínima necessária à concessão do benefício pleiteado, bem como restando comprovada a atividade rural, em regime de economia familiar, pelo período de carência exigido, deve ser reconhecido o direito à aposentadoria por idade desde a data de entrada do requerimento, ou seja, 29/08/2019.

Consectários e provimentos finais

- Correção monetária e juros de mora

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.

Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 113, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Honorários Advocatícios

Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.

Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência, devidos exclusivamente pelo INSS, devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC. Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (acórdão).

Custas processuais

O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (art. 5º, inciso I, da Lei Estadual/RS nº 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais).

Tutela específica - implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB1873561250
ESPÉCIEAposentadoria por Idade
DIB29/08/2019
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

Conclusão

À vista do provimento do recurso da parte autora, alterada a sentença para: reconhecer os períodos de labor rural do autor de 26/10/1985 até 25/12/1997, 22/08/2017 a 08/07/2018 e 16/05/2019 a 29/08/2019; computar como carência os períodos em que recebeu auxílio-doença (25/05/2003 a 31/10/2007, 25/02/2008 a 02/08/2012 e de 05/12/2012 a 21/08/2017); e para conceder-lhe aposentadoria rural por idade desde a DER.

Alterados os ônus da sucumbência conforme fundamentação supra.

Nos demais pontos, mantida a sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do autor e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



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5015965-85.2022.4.04.9999
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015965-85.2022.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: VALDOMIRO ALVES DE OLIVEIRA

ADVOGADO(A): LAURO ANTONIO BRUN (OAB RS042424)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. regime de economia familiar e boia-fria. TRABALHO RURAL. comprovação. IDADE MÍNIMA. implemento. TEMPO EM GOZO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INTERCALADO COM PERÍODOS CONTRIBUTIVOS. CÔMPUTO PARA CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. concessão.

1. O tempo em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez intercalado com períodos de trabalho efetivo pode ser computado para fins de carência (Lei 8.213/91, art. 55, II), nos termos do tema 1.125 do STF.

2. Atingida a idade mínima exigida e comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, pelo período exigido em lei, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal consistente, o segurado faz jus à aposentadoria rural por idade.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do autor e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 24 de abril de 2024.



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5015965-85.2022.4.04.9999
40004398027 .V5


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/04/2024 A 24/04/2024

Apelação Cível Nº 5015965-85.2022.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL

APELANTE: VALDOMIRO ALVES DE OLIVEIRA

ADVOGADO(A): LAURO ANTONIO BRUN (OAB RS042424)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/04/2024, às 00:00, a 24/04/2024, às 16:00, na sequência 390, disponibilizada no DE de 08/04/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 03/05/2024 08:01:45.

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