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EMENTA: DIREITO DA SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE PASSIVA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. TRASTUZUMABE ENTANSINA. NEOPLASIA MALIGNA DE MAMA. EFICÁCIA EM CONCRETO. TEMA 793 DO STJ. DESCONTO APAC. INDEVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO EQUITATIVA. LIMITE MÍNIMO. TRF4. 5007366-27.2022.4.04.7100

Data da publicação: 01/05/2024, 15:01:15

EMENTA: DIREITO DA SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE PASSIVA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. TRASTUZUMABE ENTANSINA. NEOPLASIA MALIGNA DE MAMA. EFICÁCIA EM CONCRETO. TEMA 793 DO STJ. DESCONTO APAC. INDEVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO EQUITATIVA. LIMITE MÍNIMO. 1. A legitimidade passiva dos três entes federados nas demandas relativas à tutela da saúde no âmbito do SUS, havendo litisconsórcio passivo facultativo, motivo pelo qual cabe à parte autora escolher contra a qual órgão litigar, salvo quanto a natureza da prestação torne a presença de um dos entes necessária à solução da demanda. Caso em que, não demandado o ente municipal pela parte não sendo caso de composição necessária da lide, descabe sua integração à demanda. 2. Cabe ao impugnante comprovar que a presunção de hipossuficência que decorre da declaração firmada pela parte é superada de modo a haver suficiência de recursos, utilizando-se a baliza do IRDR 25 desta Corte. 3. O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas. 4. Observando as premissas elencadas no julgado Suspensão de Tutela Antecipada n. 175 (decisão da Corte Especial no Agravo Regimental respectivo proferida em 17 de março de 2010, Relator o Ministro Gilmar Mendes), quando da avaliação de caso concreto, devem ser considerados, entre outros, os seguintes fatores: (a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA (só podendo ser relevado em situações muito excepcionais, segundo disposto nas Leis n.º 6.360/76 e 9.782/99) e (d) a não configuração de tratamento experimental. 5. Ainda, justifica-se a atuação judicial para garantir, de forma equilibrada, assistência terapêutica integral ao cidadão na forma definida pelas Leis nº 8.080/90 e 12.401/2011 de forma a não prejudicar um direito fundamental e, tampouco, inviabilizar o sistema de saúde pública. 6. Comprovada a eficácia em concreto da medicação postulada, devem ser preservados os efeitos do medicamento postulado e usado por tempo significativo, podendo ser judicialmente deferida a dispensação do fármaco requerido. 7. Por conta da solidariedade, a responsabilidade pelo cumprimento da decisão judicial é igual entre os demandados, sendo o caso de se apontar o órgão responsável pelo cumprimento e o direito de ressarcimento, nos termos do Tema 793 do STF, ressalvado que o ressarcimento se há de processar na esfera administrativa. Precedente da Corte. 8. Descabe desconto de valores a serem repassados via APAC aos CACONs e UNACONS responsáveis pelo tratamento oncológico por caber ao ente administrar os referidos recursos. Ademais, é notória a insuficiência dos recursos repessados aos centros de tratamento para o custeio da atenção oncológica o que justifica o manejo do direito de ação para a satisfação do direito fundamental. 9. Os honorários advocatícios em matéria de direito à saúde são fixados de forma equitativa, nos termos do art. 85, §8º do CPC, respeitados os limites definidos no §8º-A do referido artigo, nos termos da Lei nº 14.365, de 2 de junho de 2022, preservando-se, todavia, a natureza equitativa da fixação. (TRF4, AC 5007366-27.2022.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relator ADRIANE BATTISTI, juntado aos autos em 23/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5007366-27.2022.4.04.7100/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5007366-27.2022.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

APELANTE: MARISETE DE OLIVEIRA FURTADO (AUTOR)

ADVOGADO(A): ARICIA CAROLINA ROSA DOS SANTOS (OAB RS103255)

ADVOGADO(A): MICHELLE CAMARGO FERREIRA (OAB RS124371)

ADVOGADO(A): MARCELA DUARTE (OAB RS116642)

ADVOGADO(A): MICHELLE AZEVEDO MAGADAN (OAB RS042991)

ADVOGADO(A): ARICIA CAROLINA ROSA DOS SANTOS

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação de sentença publicada em 28/08/2022 que julgou procedente o pedido (evento 57, SENT1), lançando o seguinte dispositivo:

Ante o exposto, julgo procedente o pedido para determinar aos réus que forneçam à parte autora o medicamento trastuzumabe entasina, 260mg a cada 21 dias, de forma endovenosa, de modo contínuo, ou conforme nova prescrição médica, enquanto perdurar a sua indicação.

O fornecimento do medicamento deverá ser feito na Farmácia do Estado ou no Almoxarifado Central.

Mantenho a antecipação de tutela deferida.

Não sendo fornecido o medicamento em espécie regularmente, fica desde já autorizado o bloqueio do valor suficiente para atendimento da assistência farmacêutica.

A parte autora deverá renovar a prescrição médica semestralmente, na via administrativa, juntamente com a informação sobre a efetividade do tratamento atestada pelo médico assistente vinculado ao CACON onde realiza o acompanhamento oncológico.

Em caso de cessação da necessidade do medicamento, as sobras deverão ser devolvidas ao ente público fornecedor dos itens, cf. orientações que forem repassadas administrativamente à parte autora. Em caso de descumprimento dessa determinação (devolução do excedente), a hipótese deverá ser noticiada a este juízo para as providências cabíveis.

Demanda sem custas.

Condeno os réus ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 4.000,00, a serem atualizados a partir desta data pelo IPCA-E, considerando que as demandas pretendendo o atendimento pelo SUS são de valor inestimável e não é cabível o arbitramento com base no valor atribuído à causa (art. 85 e parágrafo 8º do CPC). Cada réu arcará com 50% dos honorários. Quanto ao arbitramento de honorários de forma equitativa em demandas de saúde: "Nas ações que versam sobre fornecimento de medicamento, a fixação dos honorários advocatícios deve se dar de forma equitativa, uma vez que, tratando-se de tutela da saúde, a demanda tem valor econômico inestimável, sendo aplicáveis as disposições do art. 85, § 8º do CPC/15" (TRF4 5059628-22.2020.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 01/08/2022); e ainda, exemplificativamente, TRF4, AC 5006385-66.2021.4.04.7121, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 17/06/2022; TRF4, AC 5002434-70.2021.4.04.7119, QUINTA TURMA, Relator FRANCISCO DONIZETE GOMES, juntado aos autos em 26/07/2022.

Publique-se e registre-se.

Havendo recurso tempestivo, intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões, no prazo legal. Juntados os recursos e as respectivas respostas, remetam-se os autos ao TRF da 4ª Região.

Transitada em julgado esta sentença, e nada sendo requerido, dê-se baixa nos autos.

A União apela levantando preliminar de integração do ente municipal no polo passivo e de impugnação de assistência judiciária gratuita. No mérito, defendeu que é devida a reforma da sentença diante da existência de política pública de saúde adequada para o tratamento do autor, não havendo justificativa para o fornecimento de medicamento excepcional. Defende que devem ser respeitados os parâmetros legais para a incorporação de tecnologias ao SUS, a dispciplina do Tema 106 do STJ, da Súmula 101 desta Corte e observando o alto custo do tratamento postulado. Subsidiariamente, requer (evento 62, APELAÇÃO1):

c.1) seja determinado à parte ré arcar apenas com a diferença entre o valor do medicamento pleiteado e o valor correspondente a APAC mensal já repassada para o tratamento da doença pelo Ministério da Saúde, evitando-se o pagamento em dobro ao CACON/UNACON;

c.2) seja o cumprimento da decisão (aquisição, armazenamento, dispensação, acompanhamento do paciente, restituição em caso de sobras) dirigido ao ente que possui maior pertinência temática, no caso concreto o Estado, facultado eventual ressarcimento exclusivamente pela via administrativa, segundo os critérios de repartição pro rata, nos termos expostos;

c.3) a observância do PMVG (Preço Máximo de Venda ao Governo) com a utilização do CAP (Coeficiente de Adequação de Preços) na aquisição do medicamento

c.4) seja utilizada a Denominação Comum Brasileira (DCB) e não o nome comercial do medicamento;

c.5) sejam fixadas medidas de contracautela para o cumprimento da decisão, tais como:

- aquisição, armazenamento e dispensação a serem realizadas por instituição pública ou privada de saúde, vinculada ao SUS;

- dispensação periódica e fracionada, condicionada à apresentação de laudo médico atualizado, a cada período não superior a três meses; e

- estabelecimento de obrigação de devolução de medicamentos ao órgão em que foram retirados, em caso de cessação da necessidade, com cominação de penalidade.

d) Sejam arbitrados os honorários advocatícios de sucumbência por apreciação equitativa do Juízo, na forma do art. 85, § 8º, do CPC e assim a verba honorária deve ser reduzida para R$3.000, 00 pro rata para os reus conforme orientação deste Colendo Tribunal.

A parte autora apelou requerendo a reforma da sentença para que sejam arbitrados honorários sucumbenciais nos termos da Lei nº Lei 14.356/22 (evento 64, APELAÇÃO1).

O Estado do Rio Grande do Sul - ERGS postula a reforma da sentença (evento 65, APELAÇÃO1) por considerar não possuir responsabilidades na atenção oncológica do SUS. Subsidiariamente, requer o direcionamento do cumprimento da obrigação de fazer exclusivamente para o ente federal, bem como a sua condenação exclusiva nos ônus sucumbenciais.

Apresentadas contrarrazões (evento 70, CONTRAZAP1 e evento 71, CONTRAZ1), foram os autos encaminhados a esta Corte.

Foi requerida a subsituição do fármaco deferido (evento 2, PET1), o que foi impugnado pelas rés (evento 14, PET1 e evento 16, PET1).

Foi, ainda, requerida a gratuidade de justiça pela procuradora (evento 23, PET1), o que foi deferido, sem, todavia, isentar-lhe do recolhimento do preparo de custas (evento 25, DESPADEC1).

Recolhidas as custas (evento 83, CUSTAS1 e evento 84, CUSTAS1), retornaram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Recebimento do recurso

Importa referir que a apelação deve ser conhecida, por ser própria, regular e tempestiva.

Da integração do polo passivo

A responsabilidade dos entes estaduais e municipais decorre da legitimidade passiva dos entes para a causa, fundada na possui competência comum dos entes federados em matéria de saúde, além da responsabilidade solidária decorrente da gestão compartilhada do SUS entre os três entes federados:

Neste sentido:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SAÚDE. LEGITIMIDADE PASSIVA. SOLIDARIEDADE ENTRE OS MEMBROS FEDERATIVOS. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS EM ATOS NORMATIVOS DO SUS. POSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO FIRMADA NO RESP 1.657.156/RJ. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. 1. O Superior Tribunal de Justiça, em reiterados precedentes, tem decidido que o funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária dos entes federados, de forma que qualquer deles tem legitimidade para figurar no polo passivo de demanda que objetive o acesso a medicamentos. 2. Outrossim, "a iterativa jurisprudência desta Corte é no sentido de que, para análise dos critérios adotados pela instância ordinária que ensejaram a concessão, ou não, da liminar ou da antecipação dos efeitos da tutela, é necessário o reexame dos elementos probatórios a fim de aferir a 'prova inequívoca que convença da verossimilhança da alegação', nos termos do art. 273 do CPC, o que não é possível em recurso especial" (STJ, AgRg no AREsp 654.594/MA, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 30.9.2015). 3. No mérito, o Tribunal de origem lançou os seguintes fundamentos (fls. 120-123, e-STJ): "5. No mérito, trata-se de pessoa hipossuficiente, que não detém recursos financeiros para arcar com os custos da aquisição dos medicamentos de que necessita para a preservação de sua saúde e vida. (...) 6. Na espécie, a Apelada indicou na inicial que necessitava dos medicamentos, apresentando a receita de fls. 14/15, prescrita por médico da própria rede pública. Note-se que o relatório de fls. 13 justifica a necessidade da medicação indicada. Com efeito, está suficientemente demonstrado nos autos que a Apelada, diante da gravidade de seu estado clínico, necessita dos medicamentos solicitados. Observa-se que está suficientemente demonstrado nos autos que a Apelada necessita dos medicamentos para controle de sua enfermidade. 7. Também é certo que o profissional que atestou as enfermidades da autora e prescreveu os medicamentos possui formação acadêmica necessária, descabendo, no âmbito jurisdicional, discutir-se o conteúdo de tal prescrição. No mais, não se pode olvidar que, quanto ao tipo de medicamento sugerido, a conveniência ou não do uso de determinado fármaco é de competência exclusiva do médico que acompanha o enfermo (Resolução nº 1.246, de 8/1/88, do Conselho Federal de Medicina Código de Ética Profissional), sendo inadmissível limitar a indicação médica a eventual padronização da Secretaria de Saúde, tampouco questionar a efetividade dos medicamentos indicados para o tratamento da enfermidade de que sofre a apelada. (...) Desta forma, justificada a necessidade dos medicamentos pleiteados". 4. Nos termos da tese jurídica firmada no julgamento do REsp 1.657.156/RJ, submetido ao rito dos recursos repetitivos, "a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento." 5. Com efeito, mesmo que a cumulação de tais requisitos não seja exigível, nos termos da modulação de efeitos realizada por ocasião do julgamento do recurso repetitivo, mister destacar que o acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento da jurisprudência do STJ, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. Incide, in casu, o princípio estabelecido na Súmula 83/STJ: "Não se conhece do Recurso Especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida." 6. Cumpre ressaltar que a referida orientação é aplicável também aos recursos interpostos pela alínea "a", do inciso III, do art. 105 da Constituição Federal de 1988. Nesse sentido: REsp 1.186.889/DF, Segunda Turma, Relator Ministro Castro Meira, DJe de 2.6.2010. 7. Recurso Especial não provido. (RESP - RECURSO ESPECIAL - 1830241 2019.01.75485-3, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:11/10/2019 ..DTPB:.)

.PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. SAÚDE. PRESTAÇÃO DE MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE PASSIVA. SOLIDARIEDADE ENTRE OS MEMBROS FEDERATIVOS. 1. É solidária a responsabilidade da União, dos Estados-membros e dos Municípios em ação que objetiva a garantia do acesso a tratamento de saúde, razão pela qual o polo passivo da demanda pode ser ocupado por qualquer um deles, isolada ou conjuntamente. 2. Matéria pacificada pelo STF no julgamento do RE 855.178- RG/SE, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 16/3/2015, sob o rito da repercussão geral. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1010069 2007.02.80767-5, OG FERNANDES, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:11/10/2019 ..DTPB:.)

APELAÇÃO. PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS PELO PODER PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE N.º 855178/SE (TEMA 793). DEMONSTRAÇÃO DA (IM)PRESCINDIBILIDADE. RUXOLITINIBE (JAKAVI). SÍNDROME MIELOPROLIFERATIVA (CID D 46). NOMENCLATURA DO FÁRMACO. RESPONSABILIDADE FINANCEIRA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MULTA. REDUÇÃO. 1. A legitimidade passiva de todos os entes federativos para ações que envolvem o fornecimento ou o custeio de medicamento resulta da atribuição de competência comum a eles, em matéria de direito à saúde, e da responsabilidade solidária decorrente da gestão tripartite do Sistema Único de Saúde (artigos 24, inciso II, e 198, inciso I, da Constituição Federal de 1988). Sendo assim, os entes demandados têm legitimidade para figurar no polo passivo da ação, em litisconsórcio passivo facultativo, reconhecido o direito do cidadão de escolher com quem pretende litigar. Jurisprudência prevalente reafirmada pelo STF quando fixada a tese de repercussão geral (RE 855.178, Tema 793) no sentido de reconhecer a responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de direito à saúde. Nessa esteira, deve ser reconhecido que a UNIÃO é a responsável financeira pelo custeio de tratamentos oncológicos e de alto custo, nada obstante o medicamento e o serviço médico sejam exigíveis contra os réus solidariamente, e eventual ressarcimento que entenderem devido deverá ocorrer apenas na via administrativa. 2. O direito fundamental à saúde é assegurado nos artigos 6º e 196 da Constituição Federal de 1988 e compreende a assistência farmacêutica (artigo 6º, inc. I, alínea d, da Lei nº 8.080/90), cuja finalidade é garantir a todos o acesso aos medicamentos necessários para a promoção e tratamento da saúde. 3. Para fazer jus ao recebimento de medicamentos fora dos protocolos e listas dos SUS, deve a parte autora comprovar a imprescindibilidade do fármaco postulado e ser aquele medicamento requerido insubstituível por outro similar/genérico. In casu, a indicação do medicamento RUXOLITINIBE (Jakavi) partiu de profissional vinculado ao SUS, respaldada posteriormente pela Nota Técnica realizada judicialmente (NAT-JUS), confirmando a adequação do tratamento para superação da moléstia - SÍNDROME MIELOPROLIFERATIVA (CID D 46). 4. Outrossim, é certo que esse parecer técnico pode substituir a perícia direta realizada por médico especialista sem que se incorra em qualquer tipo de nulidade processual. Precedentes desta Corte. 5. Hipótese de redução da multa fixada para o caso de descumprimento, para o valor diário de R$ 100,00 (cem reais), a fim de se alinhar aos precedentes desta Corte. 6. No concernente ao deferimento do fármaco pela Denominação Comum Brasileira e não pelo nome comercial, cumpre esclarecer que, efetivamente, os medicamentos a serem adquiridos pelo SUS não ficam vinculados ao nome comercial, mas sim ao seu princípio ativo. Dessa forma, caso seja encontrada outra marca ou genérico do mesmo princípio ativo, poderá ser adquirido para cumprimento da decisão, desde que não cause prejuízo à eficácia do tratamento da parte autora. 7. A responsabilidade financeira final para tratamento oncológico é atribuída integralmente à UNIÃO. 8. Conforme orientação desta Turma, nas hipóteses em que é atribuída a responsabilidade financeira integral à UNIÃO por determinada prestação de saúde, à luz da causalidade, a condenação ao pagamento das despesas e dos honorários deve ser também direcionada ao ente federal. (TRF4, AC 5002352-73.2020.4.04.7119, SEXTA TURMA, Relator JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, juntado aos autos em 02/08/2022)

Todavia, o litisconsórcio dos entes federados é facultativo, devendo ser avaliada a opção de foro efetuada pela parte autora, ora também apelante, salvo quando evidenciada a necessidade de intervenção do ente diretamente responsável pela prestação requerida o que, em caso de fármaco oncológico demanda a composição do polo passivo pela União, mas deixa a parte o direito de optar pela inclusão ou não do ente municipal na demanda, quiçá considerando as reduzidas atribuições do município na atenção oncológica.

Não se configura, aqui, sequer a alegada agilidade e eficiência de eventual obrigação de entrega de medicação como alegado pela União, uma vez que a atenção oncológica é efetuada em CACONs e UNACONS, instituições de referência para o tratamento oncológico, cujo custeio é atribuído à União, nada interferindo o ente municipal neste trâmite, ainda que, no caso do Município de Porto Alegre haja gestão plena da saúde.

Alega o ERGS que por possuir reduzidas responsabilidades na atenção oncológica, também ele não deveria constar do pólo passivo. Entretanto, a opção da parte favoreceu o ente estadual, constante do pólo passivo desde o início da tramitação processual, não podendo ele furtar-se de atender à solidariedade passiva que decorre da competência constitucionalmente definida.

Assim sendo, resta firmada a responsabilidade do ERGS para constar do pólo passivo da demanda, afastada a inclusão do ente municipal, sendo o caso de rejeitar as preliminares manejadas pelo ente estadual e pela União.

Da gratuidade de justiça

A União impugna a concessão do amparo da gratuidade de justiça defendendo que é relativa a presunção de hipossuficiência de recursos que decorre da declaração firmada pela parte autora.

A gratuidade judiciária parcial ou integral, prevista nos artigos 98 a 102 do CPC, pode ser concedida àqueles que declaram não ter condições de arcar com as custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estabelecendo-se, em relação às pessoas físicas, uma presunção juris tantum de necessidade, admitida a produção de prova em contrário.

Embora não muito tempo atrás tenha se debruçado a técnica processual quanto à fixação de balizadores objetivos ao deferimento da gratuidade (alguns deles bem razoáveis como, por exemplo, o patrimônio móvel ou imóvel declarado, a renda média do trabalhador ou o valor teto para aposentadoria pelo RGPS), o tema restou dirimido neste TRF4 quando do julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) nº 25, nos seguintes termos:


INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. ACESSO À JUSTIÇA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DISTINÇÃO. CRITÉRIOS. 1. Conforme a Constituição brasileira, "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos". 2. Assistência jurídica integral configura gênero que abarca diferentes serviços gratuitos, a cargo do poder público, voltados a assegurar a orientação, a defesa e o exercício dos direitos. 3. A consultoria jurídica gratuita é prestada pelas Defensorias Públicas quando do acolhimento dos necessitados, implicando orientação até mesmo para fins extrajudiciais e que nem sempre redunda na sua representação em juízo. 4. A assistência judiciária gratuita é representação em juízo, por advogado não remunerado, realizada pelas defensorias públicas e também advogados conveniados com o Poder Público ou designados pelo juiz pro bono. 5. A gratuidade de justiça assegura a prestação jurisdicional independentemente da realização dos pagamentos normalmente exigidos para a instauração e o processamento de uma ação judicial, envolvendo, essencialmente, custas, despesas com perícias e diligências e honorários sucumbenciais. 6. Nos termos das Leis 9.099/95, 10.259/01 e 12.153/19, o acesso à primeira instância dos Juizados de pequenas causas é gratuito, o que aproveita a todos, indistintamente. 7. O acesso à segunda instância dos juizados, às Varas Federais e aos tribunais é oneroso, de modo que depende de pagamento ou da concessão do benefício da gratuidade de justiça. 8. A Corte Especial, por ampla maioria, definiu que faz jus à gratuidade de justiça o litigante cujo rendimento mensal não ultrapasse o valor do maior benefício do Regime Geral de Previdência Social, sendo suficiente, nessa hipótese, a presunção de veracidade da declaração de insuficiência de recursos, que pode ser afastada pela parte contrária mediante elementos que demonstrem a capacidade econômica do requerente. 9. Rendimentos mensais acima do teto do Regime Geral de Previdência Social não comportam a concessão automática da gratuidade de justiça. A concessão, em tais casos, exige prova a cargo do requerente e só se justifica em face de impedimentos financeiros permanentes. A par disso, o magistrado deve dar preferência ao parcelamento ou à concessão parcial apenas para determinado ato ou mediante redução percentual. (TRF4 5036075-37.2019.4.04.0000, Corte Especial Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 07/01/2022)

Com esses contornos, considerando que a parte possui rendimentos brutos inferiores ao teto da previdência, que era de R$ 5.645,80 em 2018, pois percebe aposentadoria por invalidez pelo INSS desde 02/09/2011 com rendimentos no valor bruto de R$ 4.367,74 em julho de 2018 (evento 1, INIC1, p. 31), presume-se a veracidade da declaração de hipossuficiência, não superada pela União que deixou de apresentar elementos capazes de levar à conclusão de suficiência de recursos.

Ademais, no caso, caberia à impugnante, levantando tal pedido em preliminar de apelação, atender ao ônus da impugnação específica (art. 932, inc. III c/c art. 1.010, inc. III e, ainda, art. 341 todos do Código de Processo Civil).

Ainda, cabe referir que a intervenção judicial para a instrução do feito, como solicitado é indevida, considerando que inexistem sinais externos de possibilidade econômico-financeira sendo, ademais, acompanhada por assistência judiciária gratuita do SAJU (Serviço de Assessoria Jurídica Universitária da UFRGS), atendida pelo Sistema Único de Saúde desde o início de seu tratamento e diante do valor da renda auferida pela autora.

Rejeito, pois, a preliminar.

Do direito da saúde

O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas.

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Não se trata de direito absoluto, uma vez que é desarrazoado exigir do Estado custear todo e qualquer tratamento de saúde aos cidadãos, sob pena de instaurar uma desordem administrativa e inviabilizar o funcionamento do SUS.

É certo que a atribuição de formular e implantar políticas públicas na defesa da saúde da população é do Executivo e do Legislativo, entretanto, não pode o Judiciário se furtar de seu múnus público quando chamado para apreciar alegações de desrespeito a direitos fundamentais individuais e sociais, entre eles o direito à saúde do cidadão.

O egrégio Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária de 17/03/2010, no Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada 175, definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde:

(a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente;

(b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente;

(c) a aprovação do medicamento pela ANVISA; e

(d) a não configuração de tratamento experimental.

Na mesma senda, o egrégio Superior Tribunal de Justiça estabeleceu (Tema 106) requisitos para fins de concessão de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (REsp 1657156/RJ, rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, DJe 04/05/2018).

O leading case está assim ementado:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 106. JULGAMENTO SOB O RITO DO ART. 1.036 DO CPC/2015. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO CONSTANTES DOS ATOS NORMATIVOS DO SUS. POSSIBILIDADE. CARÁTER EXCEPCIONAL. REQUISITOS CUMULATIVOS PARA O FORNECIMENTO.
1. Caso dos autos: A ora recorrida, conforme consta do receituário e do laudo médico (fls. 14-15, e-STJ), é portadora de glaucoma crônico bilateral (CID 440.1), necessitando fazer uso contínuo de medicamentos (colírios: azorga 5 ml, glaub 5 ml e optive 15 ml), na forma prescrita por médico em atendimento pelo Sistema Único de Saúde - SUS. A Corte de origem entendeu que foi devidamente demonstrada a necessidade da ora recorrida em receber a medicação pleiteada, bem como a ausência de condições financeiras para aquisição dos medicamentos.
2. Alegações da recorrente: Destacou-se que a assistência farmacêutica estatal apenas pode ser prestada por intermédio da entrega de medicamentos prescritos em conformidade com os Protocolos Clínicos incorporados ao SUS ou, na hipótese de inexistência de protocolo, com o fornecimento de medicamentos constantes em listas editadas pelos entes públicos. Subsidiariamente, pede que seja reconhecida a possibilidade de substituição do medicamento pleiteado por outros já padronizados e disponibilizados.
3. Tese afetada: Obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (Tema 106).
Trata-se, portanto, exclusivamente do fornecimento de medicamento, previsto no inciso I do art. 19-M da Lei n. 8.080/1990, não se analisando os casos de outras alternativas terapêuticas.
4. TESE PARA FINS DO ART. 1.036 DO CPC/2015 A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
(ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
(iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.
5. Recurso especial do Estado do Rio de Janeiro não provido. Acórdão submetido à sistemática do art. 1.036 do CPC/2015.

Cabe referir que, com a finalidade de criar uma diretriz institucional para a dispensação de medicamentos no âmbito do SUS, em especial diante da necessidade de incorporar novas tecnologias cuja eficácia e adequação fossem comprovadas, de modo a constituirem-se em parte da assistência terapêutica integral fornecida pelo SUS, foi alterada a Lei nº 8.080/90 pela Lei nº 12.401/2011, que criou um procedimento, a cargo do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS - CONITEC.

De especial interesse para a apreciação do caso concreto, os artigos 19-M e 19-Q, fornecem diretrizes para a dispensação medicamentosa que considero relevantes:

Art. 19-M. A assistência terapêutica integral a que se refere a alínea d do inciso I do art. 6o consiste em:

I - dispensação de medicamentos e produtos de interesse para a saúde, cuja prescrição esteja em conformidade com as diretrizes terapêuticas definidas em protocolo clínico para a doença ou o agravo à saúde a ser tratado ou, na falta do protocolo, em conformidade com o disposto no art. 19-P;

“Art. 19-P. Na falta de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, a dispensação será realizada:

I - com base nas relações de medicamentos instituídas pelo gestor federal do SUS, observadas as competências estabelecidas nesta Lei, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada na Comissão Intergestores Tripartite;

II - no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de forma suplementar, com base nas relações de medicamentos instituídas pelos gestores estaduais do SUS, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada na Comissão Intergestores Bipartite;

III - no âmbito de cada Município, de forma suplementar, com base nas relações de medicamentos instituídas pelos gestores municipais do SUS, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada no Conselho Municipal de Saúde.”

“Art. 19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS.

Observa-se que foi definido legalmente conceito de assistência integral de saúde de modo a equilibrar a necessidade do cidadão de um tratamento que seja mais eficaz e os limitados recursos do sistema de saúde para alcançar esta finalidade.

Considero que tais parâmetros encontram-se dentro daquilo que razoavelmente pode ser exigido do Estado pelo cidadão, levando em consideração o princípio da isonomia e os termos do princípio da reserva do possível. Ou seja, na dispensação medicamentosa deve-se levar em consideração o alcance do medicamento a todos os cidadãos em situação similar o que, no caso de medicamentos de alto custo, deve ser não somente possível, mas também sustentável.

A questão do custo da tutela da saúde, aliás, foi apreciada no julgamento do Tema 06 do Supremo Tribunal Federal (RE 566471, julgado em 11/03/2020, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, por maioria, vencido Min. Luiz Edson Facchin) que ressaltou a obrigação do Estado de fornecer medicamentos de alto custo, comprovada imprescindibilidade a hipossuficiência de recursos da parte.

Deste modo, a atuação do Judiciário se qualifica e justifica quando visa assegurar o efetivo fornecimento de medicamentos ou outras prestações de saúde integrados à política de saúde vigente e que não estejam sendo fornecidos ou, excepcionalmente, quando o SUS não fornece tratamento eficaz, não oferece qualquer tratamento ou, ainda, quando, especialmente quando se trata de aumento de sobrevida ou de qualidade de vida, apresentando o medicamento ou tratamento postulado eficácia diversa da opção indicada pelo SUS, sendo, de qualquer sorte, de se buscar observar as diretrizes da CONITEC, nos termos do art. 19-Q da Lei nº 8.080/90, naquilo que se revele adequado.

Observo, ainda, que a CONITEC, além de expedir Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) apresenta, no caso dos tratamentos oncológicos, as Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT), fundamentadas em evidências científicas, que nos termos do próprio site (http://conitec.gov.br/index.php/protocolos-e-diretrizes), constituem documento que não se restringe às tecnologias incorporadas no SUS, mas sim, ao que pode ser oferecido a este paciente, considerando o financiamento repassado aos centros de atenção e a autonomia destes na escolha da melhor opção para cada situação clínica.

Deste modo, é lastreado nas referidas diretrizes que o tratamento oncológico pelo SUS, em que os medicamentos são fornecidos pelos estabelecimentos de saúde credenciados pelo SUS, habilitados em oncologia, na qualidade de UNACON (Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia) e CACON (Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia), aos quais cabe prestar assistência especializada e integral ao paciente.

Não por outra razão foi editada a Súmula nº 99 desta Corte, que determina que a determinação judicial de dispensação de medicamento oncológico será feita exclusivamente por estabelecimentos credenciados à Rede de Atenção Oncológica, ou seja, através de CACONS ou UNACONS.

Todavia, para que se possa conferir se a prescrição médica se afeiçoa às diretrizes da Medicina Baseada em Evidências - MBE não basta a prescrição médica do assistente técnico da parte, ainda que ele seja médico vinculado a CACON/UNACON.

Isto porque o deferimento de tutela de saúde antecipadamente, exige a realização a produção de prova extreme de dúvida sobre a eficácia do medicamento ou tratamento para o caso concreto, na linha do entendimento firmado nesta Corte:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA PRÉVIA.
1. A judicialização da política pública de distribuição de medicamentos deve obedecer a critérios que não permitam que o Judiciário faça as vezes da Administração, bem como que não seja convertido em uma via que possibilite a um paciente burlar o fornecimento administrativo de medicamentos, garantindo seu tratamento sem que se leve em consideração a existência de outros cidadãos na mesma ou em piores circunstâncias.
2. O deferimento de tratamentos de saúde antecipadamente, sem a realização a produção de provas além das prescrições do médico assistente encontra óbice no entendimento desta Corte, contido no enunciado da Súmula 101.
3. Em que pese o laudo da médica que assiste à agravada tenha sido lavrado por profissional vinculado ao UNACON que a atende (evento 1 - LAUDO8), tenho que não há prova da verossimilhança das alegações a ponto de justificar o afastamento do entendimento unificado por esta Corte quanto à realização da perícia prévia para a análise da tutela antecipada, já determinada pelo juízo a quo.
4. Assim, não demonstrada a verossimilhança do pleito, ao menos em uma análise preliminar, prudente que se decida a respeito da antecipação após haver segurança nos autos de que a prescrição está amparada pela medicina baseada em evidências. (AG 5026134-97.2018.4.04.0000, rel. Des. Marga Inge Barth Tessler, 3ª Turma, julgado em 02/10/2018)

ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. PROVA PERICIAL.
- O direito fundamental à saúde é assegurado nos arts. 6º e 196 da Constituição Federal e compreende a assistência farmacêutica (art. 6º, inc. I, alínea d, da Lei n.º 8.080/90), cuja finalidade é garantir a todos o acesso aos medicamentos necessários para a promoção e tratamento da saúde.
- In casu, é indispensável a realização de perícia médica judicial para elucidar questões atinentes à real eficácia do medicamento e ao esgotamento das alternativas terapêuticas disponibilizadas pela rede pública. (AG 5019134-46.2018.4.04.0000, rel. Des. Vivian Josete Pantaleão Caminha, 3ª Turma, julgado em 19/09/2018)

Trata-se de orientação consolidada na Súmula 101 desta Corte: Para o deferimento judicial de prestações de saúde não inseridas em um protocolo pré-estabelecido, não basta a prescrição do médico assistente, fazendo-se necessária a produção de provas atestando a adequação e a necessidade do pedido.

Assentados esses pontos, passo a tratar do caso concreto.

A sentença assim tratou do caso:

A causa foi assim analisada na sentença proferida quando o feito ainda tramitava na justiça estadual (evento 1, INIC1, pp. 230-234):

Da Assistência à Saúde

A Constituição Federal, em seu art. 5º, caput, ao tratar dos direitos e garantias fundamentais da pessoa, garantiu o direito à vida e em seu art. 6º, que cuida dos direitos sociais, assegurou o direito à saúde, dentre outros. Não bastasse isso, o art. 196, que trata da ordem social, prescreveu o direito à saúde e o dever do Estado. A Lei 8.080/90, em seu art. 2º, reiterou que a saúde é um direito fundamental do cidadão, incumbindo ao Estado prover as condições ao seu pleno exercício, disciplinando o SUS – Sistema Único de Saúde -, e incumbindo aos entes públicos a prestação de serviços de saúde à população.

A Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, no mesmo sentido, em seu art. 241, preceitua que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, a se ofertada através de sua promoção, proteção e recuperação.

É firme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal reconhecendo o dever do Estado, lato sensu considerado, ou seja, modo indistinto por todos os seus entes federados – União, Estados, Distrito Federal e Municípios –, de assegurar o direito à saúde, na forma dos artigos 23, II e 196, ambos da Constituição Federal. Neste sentido: RE nº 557.548/MG, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJe 155, publicado em 05.12.2007.

O acesso à saúde é direito fundamental e as políticas públicas que o concretizam devem gerar proteção suficiente ao direito garantido, sendo passíveis de revisão judicial, sem que isso implique ofensa aos princípios da divisão de poderes, da reserva do possível ou da isonomia e impessoalidade. Nesse sentido a Apelação Cível Nº 70050003987, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 31/07/2012.

Por ocasião do julgamento do Tema Repetitivo nº 106, o STJ fixou a tese de que a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:

(i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;

(ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;

(iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.

Da prova da moléstia, da ineficácia dos medicamentos disponíveis no SUS e da necessidade do tratamento postulado

Vejamos, conforme o laudo médico das fls. 43/47, a parte autora, à época com 52 anos, tinha diagnóstico de neoplasia maligna de mama esquerda, desde 2010, e já realizou tratamentos quimioterápicos com doxorrubicina, ciclofosfamida e paclitaxel (2011); docetaxel (2015-2016); capecitabina (2016); vinorelbina (2017) e capecitabina + trastuzumabe (abril de 2017 a junho de 2018).

Outrossim, referiu o médico assistente que, mesmo em uso de trastuzumabe + capecitabina, a paciente apresentou nova progressão locorregional em exames de imagem de junho de 2018, confirmada por biópsia de pele realizada no mesmo mês, tratando-se de neoplasia de mana metastática, HER positivo, com receptores hormonais negativos. Disse, também, que naquele estado da doença a paciente tinha indicação de uso de trastuzumabe entansina, pois estudos demonstram aumento de sobrevida livre de progressão da doença e da sobrevida global, sem prejuízo da qualidade de vida; destacando que não existia indicação de uso das medicações disponíveis no SUS.

Salientou o médico que a patologia necessitava de medicação para controle da progressão, ressaltando que o não uso do fármaco prescrito implicaria em risco de morte por progressão e dor crônica intratável por doença metastática não controlada.

Por tais razões, a tutela antecipada foi parcialmente deferida.

O réu, por sua vez, alegou em sua resposta, em síntese, que o fármaco postulado não foi incorporado pelo SUS, mas não contestou a indicação terapêutica da medicação prescrita pelo médico assistente para o tratamento da doença que acomete a demandante, nem indicou expressamente quais outras alternativas terapêuticas adequadas estariam disponíveis na rede pública.

Não bastasse isso, intimado, o demandado dispensou a produção de outras provas.

Ainda, em sede probatória, a parte autora acostou laudo médico ( fl. 179) atestando que as últimas tomografias computadorizadas apontaram resposta ao tratamento com o fármaco trastuzumabe entansina, tendo a paciente indicação de manutenção do seu uso até progressão da doença ou toxicidade ao tratamento. Com vista do referido laudo, o demandado nada mais requereu.

Diante disso, resta evidente a necessidade da parte autora em receber o tratamento pleiteado, haja vista que é indispensável à manutenção de sua saúde.

O fato do tratamento de câncer ter sido atribuído aos CACONS – Centros de Alta Complexidade em Oncologia – não afasta, por si só, o referido direito da parte autora. Incabível que o Estado pretenda se eximir da responsabilidade sob o argumento de que o medicamento pretendido deveria ser fornecido pelo CACON.

Nesse sentido:

AGRAVO. CABIMENTO DO JULGAMENTO SINGULAR PELO RELATOR, DIANTE DA ORIENTAÇÃO DO STJ e STF. A existência de orientação do STJ e do STF, autorizava o Relator a proceder ao julgamento singular, salientando-se que o resultado do julgamento foi o mesmo que seria proferido na hipótese de o processo ser pautado para sessão, tratando-se de procedimento que visa uma jurisdição mais célere. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. CONSTITUCIONAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS A NECESSITADO. CACONS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. REMESSA À JUSTIÇA FEDERAL. DESNECESSIDADE. SÚMULA 150 DO STJ. O direito à saúde é assegurado a todos, devendo os necessitados receber do ente público os medicamentos e materiais necessários, detendo o Estado do Rio Grande do Sul legitimidade passiva para a ação, obrigação não afastada ante a existência dos CACONs (Centro de Alta Complexidade em Oncologia). Aplicação do artigo 196 da Constituição Federal. Interpretação da Súmula 150 do STJ, não se tratando de competência da Justiça Federal. Posição do 11º Grupo Cível. Precedentes do TJRGS, STJ e STF. Agravo desprovido. (Agravo Nº 70040457178, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 24/02/2011). (destaquei)

Do capacidade financeira

A autora é aposentada, com renda mensal de R$ 4.367,74 (fl. 31) e vem realizando o seu tratamento através do SUS (fl. 43). Tais fatos corroboram a sua alegação de incapacidade de custear o tratamento de alto custo de que necessita.

Do registro do fármaco na ANVISA

O fármaco postulado possui registro junto à ANVISA.

Do pedido genérico

Incabível, no entanto, o pedido genérico, no sentido de que, além do tratamento pretendido, lhe sejam fornecidos outros medicamentos que venham a ser prescritos para o tratamento da moléstia que lhe acomete.

Isso porque, assim agindo, se estaria a compelir o Estado ao fornecimento de tratamento em conformidade única e exclusivamente com o entendimento do médico da parte autora, sem qualquer outro tipo de análise, seja do próprio Estado, seja do fiscal da lei – Ministério Público –, seja do Juízo, o que conduziria, por consequência, a uma insegurança jurídica.

Então, fica afastado.

Do pedido de bloqueio de valores

Em consulta ao Sistema de Administração de Medicamentos do Estado (AME), cujas cópias vão acostadas, verifico que, efetivamente, o fármaco deferido ( trastuzumabe entansina) está indisponível no estoque da Farmácia do Estado.

Logo, cabível o deferimento do pedido de bloqueio de valores formulado pela parte autora, a fim de assegurar a continuidade do seu tratamento.

Contudo, para possibilitar a apreciação do referido pedido, faz-se necessário que a parte autora instrua o requerimento nos termos do despacho das fls. 150/151, destacando-se que, preferencialmente, o orçamento deverá ser emitido pelo próprio hospital onde a paciente realizará o tratamento, visto que se trata de fármaco de uso restrito hospitalar, ressaltando que o preço da medicação não poderá exceder o valor máximo tabelado pela ANVISA (Preço de Fábrica), nem conter qualquer tipo de taxa, uma vez que a paciente é assistida pelo SUS.

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por Marisete de Oliveira furtado contra o Estado do Rio Grande do Sul, para tornar definitivos os efeitos da tutela antecipada deferida nas fls. 63/65.

Realizada avaliação técnica neste juízo, a conclusão foi favorável à pretensão da autora, assim constando do parecer apresentado no evento 24, DOC1:

6.4 Conclusão técnica: favorável.

6.5 Justificativa:

O uso de trastuzumabe entansina como terapia sistêmica para pacientes com diagnóstico de carcinoma de mama HER2 positivo, previamente tratados com trastuzumabe, está embasado em um estudo de comparação com a combinação lapatinibe mais capecitabina, demonstrando benefícios clínicos nos desfechos de eficácia e segurança avaliados, com aumento marginal da sobrevida global (cerca de 6 meses) e sobrevida livre de progressão (cerca de 3 meses) (8). No entanto, o medicamento apresenta um custo excessivo e seu impacto orçamentário, mesmo em uma decisão isolada, é elevado. Apesar de não termos encontrado estudos econômicos para a realidade brasileira, se considerarmos os estudos previamente descritos para realidades de diferentes países, podemos observar que os valores da razão incremental de custo-efetividade estão sempre muito além do limite máximo desejado de três vezes o PIB per capita. Agências de incorporação de tecnologias de países de alta renda, como o Canadá e o Reino Unido, chegaram a razões incrementais de custo-efetividade muito elevadas, fazendo com que recomendassem seu uso apenas mediante acordo de redução de preço. É razoável ponderar que, em um país de média renda, como o Brasil, esse tratamento também não seja custo-efetivo com os valores atualmente praticados.

Em função da razão de custo-efetividade incremental, que ultrapassa o limite máximo desejado de três vezes o PIB per capita, o presente parecer técnico é desfavorável. Contudo, especificamente para o caso em tela, tem-se situação deveras complexa: o tratamento foi iniciado por meio de tutela antecipada, fornecida em 2019. Há repetidos relatos de boa resposta e tolerabilidade ao fármaco. O parecer desfavorável significaria, portanto, a retirada de um benefício adquirido e reiterado ao longo dos últimos três anos. Estima-se que tal retirada representaria dano imensurável à paciente e aos seus familiares.

A avaliação foi complementada no evento 47, DOC1:

Avaliamos nova intimação para esclarecimentos acerca da avaliação técnica realizada (Evento 24). Brevemente, a parte autora possui diagnóstico de câncer de mama desde 2010 (HER2 positivo). Desde 2016, realizou tratamento quimioterápico paliativo com múltiplos esquemas, inclusive trastuzumabe (Evento 1, INIC1, Página 41). Em 2019, encontrava-se em uso de trastuzumabe entansina com resposta ao tratamento (Evento 1, INIC1, Página 179), obtido por tutela antecipada. Em laudo recente, de fevereiro de 2022 (Evento 13, ATESTMED3, Página 1), reforça-se o uso de trastuzumabe entansina desde 2019 com boa tolerância e, desde então, doença estável, indicada por laudo de tomografias. Pleiteia em processo a continuidade de seu tratamento.

Trata-se de uma decisão complexa tendo em vista que, com base na razão de custo-efetividade incremental, que ultrapassa o limite máximo desejado de três vezes o PIB per capita, o presente parecer técnico seria desfavorável. Contudo, especificamente para o caso em tela, o tratamento foi iniciado por meio de tutela antecipada, fornecida em 2019. Há repetidos relatos de boa resposta e tolerabilidade ao fármaco. O parecer desfavorável significaria, portanto, a retirada de um benefício adquirido e reiterado ao longo dos últimos três anos. Estima-se que tal retirada representaria dano imensurável à paciente e aos seus familiares. Optou-se, portanto, pela recomendação favorável à manutenção do tratamento.

Em Evento 34 questiona-se se houve melhora no quadro clínico da autora após 03 (três) anos de uso da medicação e por quanto tempo ainda deverá fazer uso do fármaco requerido na inicial. Conforme consta em laudos anexos ao processo (Evento 1, INIC1, Página 179 e Evento 13, ATESTMED3, Página 1), obteve-se excelente resposta ao tratamento com trastuzumabe entansina tanto no que tange segurança (descreve-se boa tolerância à medicação) quanto eficácia (dado que, com base em laudo de tomografias, a doença manteve-se estável). Dessa forma, recomenda-se a continuidade do tratamento até progressão da doença ou intolerância aos eventos adversos associados ao medicamento.

Verificada a adequação do tratamento à enfermidade da autora e a indispensabilidade do medicamento para assegurar a sobrevida da paciente, a procedência da ação apresenta-se como medida imperativa.

Forma de cumprimento da obrigação

É conhecido o entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça sobre a competência solidária dos entes da Federação para a prestação de serviços públicos de saúde.

O Supremo fixou tese de repercussão geral abarcando a matéria, ao julgado RE 855178, Tema 793:

"Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro."

Ao fixar a tese para o Tema 793, o Supremo conferiu ao juiz a possibilidade de decidir e direcionar a forma de cumprimento da obrigação conforme as circunstâncias do caso concreto.

Em que pese a responsabilidade solidária dos réus na prestação dos serviços destinados a garantir a proteção à saúde, a execução da prestação deferida nestes autos deverá ficar a cargo do ente estadual, considerando que a SES/RS está aparelhada para a execução da prestação de saúde (aquisição e dispensação do medicamento pleiteado).

A União não possui órgão específico para tal finalidade. Esse é o modelo de repartição de responsabilidades verificado no âmbito do SUS.

Todavia, a União deve assumir o ônus financeiro da aquisição da medicação. Fica desde já estabelecido que a União deverá ressarcir administrativamente ao Estado do Rio Grande do Sul as despesas relacionadas ao tratamento oncológico, inclusive dos medicamentos já fornecidos em decorrência da tutela de urgência deferida porque é responsabilidade do ente federal o repasse de valores dessa natureza, conforme descrito no artigo 16, da Lei nº 8.080/90.

Cabe referir que o bloqueio de valores deverá recair sobre as contas da União e do Estado do Rio Grande do Sul, pelo valor total necessário, para ambas as contas. Positivo o bloqueio, deverá ser providenciada a imediata transferência do valor bloqueado a uma conta vinculada ao presente feito, na Caixa Econômica Federal, agência 0652.

No caso do Estado, o bloqueio será via Bacenjud. Da União, junto à Secretaria de Precatórios, mediante ofício à Presidência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, solicitando o sequestro do valor estornado ao erário (art. 37 da Resolução nº 458, de 04/10/2017, do CJF).

Após o bloqueio, a prioridade será a destinação dos valores para o objetivo da ação.

Eventual compensação será feita posteriormente. Reforço que cabe à União ressarcir ao Estado 100% do valor correspondente ao tratamento.

Aquisição do medicamento em espécie

Caso seja necessária a aquisição do medicamento a partir do bloqueio judicial de valor, considera-se aquisição a ser feita pelo poder público, ainda que por intermédio do hospital, pois o valor tem origem pública, e deve ser aplicado o CAP (Coeficiente de Adequação de Preço).

O CAP aplica-se não só a fabricantes, mas a quaisquer representantes, farmácias ou drogarias, nos termos da Resolução CMED n. 3, de 02/03/2011, uma vez que a origem da verba e o faturamento se dará em nome da União e aplica-se ao caso de medicamentos adquiridos em decorrência de determinação judicial:

Art. 1º As distribuidoras, as empresas produtoras de medicamentos, os representantes, os postos de medicamentos, as unidades volantes, as farmácias e drogarias, deverão aplicar o Coeficiente de Adequação de Preço - CAP ao preço dos produtos definidos no art. 2º desta Resolução, sempre que realizarem vendas destinadas a entes da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

§1º O CAP, previsto na Resolução nº. 2, de 5 de março de 2004, é um desconto mínimo obrigatório a ser aplicado sempre que forem realizadas vendas de medicamentos destinadas aos entes descritos no caput.

§2º A aplicação do CAP sobre o Preço Fábrica – PF resultará no Preço Máximo de Venda ao Governo – PMVG.

§3º O CAP será aplicado sobre o PF.

(...)

Art. 2º O CAP poderá ser aplicado ao preço de produtos, de acordo com decisão do Comitê Técnico-Executivo, nos seguintes casos:

I- Produtos que estejam ou venham a ser incluídos no “Programa de Componente Especializado da Assistência Farmacêutica”, conforme definido na Portaria nº. 2.981, de 26 de novembro de 2009;

II- Produtos que estejam ou venham a ser incluídos no Programa Nacional de DST/AIDS.

III- Produtos que estejam ou venham a ser incluídos no Programa de Sangue e Hemoderivados.

IV- Medicamentos antineoplásicos ou medicamentos utilizados como adjuvantes no tratamento do câncer.

V- Produtos comprados por força de ação judicial, independente de constarem da relação de que trata o § 1º deste artigo.

(...)

(grifou-se)

Nesse caso, a farmácia deverá conceder o desconto decorrente da incidência do coeficiente de adequação de preços (CAP) sobre o preço de fábrica (PF), respeitando assim o preço máximo de venda ao governo (PMVG), que, em geral, é consideravelmente inferior àquele adotado na venda a particular. A aquisição operacionalizada pelo hospital ou pelo particular em decorrência da inércia dos entes públicos não é razão para a não aplicação do CAP e o hospital ou o particular deverá informar ao juízo eventual recusa do fornecedor na aplicação do CAP, o que poderá ensejar a aplicação das sanções previstas na L. 10.742/2003 e na L. 8.078/90.

Caso seja necessária a realização de bloqueio judicial de valor, ele fica condicionado à apresentação de três orçamentos atualizados, conforme os termos da Resolução CMED n. 3, de 02/03/2011.

Tenho que a sentença merece confirmação por seus próprios fundamentos.

Isso porque a medicação postulada é comprovadamente eficaz para o caso da parte, sendo desfavorável a nota técnica inicial apenas diante de possível negativa de relação custo-efetividade, o que, considero, não pode pautar a tutela da saúde, em especial, quanto é tão controversa a adoção de parâmetros de custo-efetividade adequados para a realidade brasileira. Tal entendimento, sopeso, prevalece nesta Corte, uma vez que a avaliação da custo-efetividade de um medicamento é ato complexo que envolve uma avaliação socio-econômica nem sempre disponível para a realidade brasileira.

Neste sentido:

DIREITO DA SAÚDE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. EFICÁCIA DA MEDICAÇÃO. COMPROVAÇÃO. CUSTO-EFETIVIDADE. 1. Em relação aos pressupostos para a intervenção judicial, em matéria de fornecimento de tecnologias em saúde, estes foram sendo gradativamente definidos em precedentes dos tribunais superiores. Eles estão especialmente concentrados em julgados do STF (STA 175, RE 657718 - Tema 500, RE 855178 - Tema 793) e do STJ (REsp 1657159 - Tema 106). 2. Embora se deva buscar critérios mais claros e objetivos para análise de custo-efetividade na incorporação dos medicamentos, e embora se deva prestigiar as opções que venham a ser feitas, a partir desse prévio controle da discricionariedade administrativa, o fato é que ainda não foi definido um critério que seja capaz de incorporar os muitos elementos e particularidades que precisam ser tomados em consideração - que variam conforme os países e também conforme as muitas espécies de doenças - e, ao mesmo tempo, que possa evoluir com a rapidez necessária, diante do surgimento de novas tecnologias e dos seus efeitos sobre os custos no mercado. 3. Provimento ao agravo de instrumento, agravo interno prejudicado. (TRF4, AG 5046824-11.2022.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 24/03/2023)

Ademais, a própria nota técnica foi revista diante da eficácia em concreto da medicação, em uso e com efeitos consideráveis por mais de 3 anos.

Nestes casos, tenho firmado que prevalece a manutenção da medicação (vide AC 5000446-02.2016.4.04.7115, SEXTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 27/10/2022).

Deste modo, quanto ao pedido de fornecimento da medicação com recursos públicos, nega-se provimento às apelações das rés (ERGS e União).

Dos pedidos subsidiários

Desconto APAC

Indefiro o pedido, uma vez que cabe à União gerir os recursos repassados. Neste sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. TUTELA DE URGÊNCIA. DIREITO À SAÚDE. ATEZOLIZUMAB. TECENTRIQ. ADENOCARCINOMA DE PULMÃO. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS PELO PODER PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. DEMONSTRAÇÃO DA (IM)PRESCINDIBILIDADE. PRESENÇA DOS REQUISITOS DA TUTELA DE URGÊNCIA. 1. A legitimidade passiva de todos os entes federativos para ações que envolvem o fornecimento ou o custeio de medicamento resulta da atribuição de competência comum a eles, em matéria de direito à saúde, e da responsabilidade solidária decorrente da gestão tripartite do Sistema Único de Saúde (artigos 24, inciso II, e 198, inciso I, da Constituição Federal de 1988). Hipótese específica de participação, ainda, da parte GEAP AUTOGESTÃO EM SAÚDE (plano de saúde) no polo passivo da lide (litisconsórcio passivo facultativo), nos termos da orientação do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. 2. O direito fundamental à saúde é assegurado nos artigos 6º e 196 da Constituição Federal de 1988 e compreende a assistência farmacêutica (artigo 6º, inc. I, alínea d, da Lei nº 8.080/90), cuja finalidade é garantir a todos o acesso aos medicamentos necessários para a promoção e tratamento da saúde. 3. Para fazer jus ao recebimento de medicamentos fora dos protocolos e listas dos SUS, deve a parte autora comprovar a imprescindibilidade do fármaco postulado e ser aquele medicamento requerido insubstituível por outro similar/genérico. 4. Hipótese em que não há necessidade de se perquirir/apreciar/fixar contracautelas, que poderiam ser determinadas até mesmo de ofício, tendo em vista que o próprio julgador singular, ao proferir a decisão agravada, ao final, cuidou de referir, expressamente, que "após o período de 3 (três) meses, a continuidade do fornecimento fica condicionada a solicitação médica, devidamente justificada." Ou seja, o devido acompanhamento já está sendo feito perante o primeiro grau de jurisdição. 5. No tocante ao pedido de desconto dos valores repassados via APAC/ONCO, é descabido, uma vez que não se desconhece que o motivo para se pleitear judicialmente a medicação para tratamento de neoplasias é justamente a insuficiência de recursos, repassados via APAC/ONCO, para a aquisição do medicamento de alto custo, cabendo à União observar os repasses do valor da condenação para que não pague em dobro caso o montante tenha sido incluído no repasse via APAC, realizado periodicamente. (TRF4, AG 5046559-48.2018.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 24/04/2019)

Direcionamento da obrigação

Sobre a questão, não havendo dúvida quanto à legitimidade passiva dos réus e sendo solidária a responsabilidade destes na demanda, também são igualmente responsáveis pelo fornecimento e pelo ônus financeiro do serviço de saúde pleiteado e concedido. Cabe, todavia, direcionar o cumprimento da obrigação, nos termos do definido no Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, em 23.05.2019, em que restou fixada a seguinte tese de repercussão geral:

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.

Assim sendo, considerando-se que a incorporação de novas tecnologias ao SUS é matéria atribuída pela Lei nº 8.080/90 ao Ministério da Saúde, nos termos do art. 19-Q do referido diploma legal, é da União a responsabilidade de suportar o ônus financeiro da dispensação de medicamento que ainda não se encontra disponível na rede pública, ressalvado o direito de ressarcimento acaso se pactue em comissão tripartite, distribuição diversa de competências, caso em que a compensação deverá se efetuar na esfera administrativa.

Ademais, tendo em vista que na Portaria SAS/MS nº 346, de 23/06/2008, editada pela Secretaria de Atenção à Saúde, restou assentado que o financiamento dos tratamentos oncológicos ministrados nos CACON's e UNACON's são sustentados pelo Ministério da Saúde por meio das denominadas APACs ONCO, reforça-se a obrigação da União no custeio da referida medicação.

Caberá ao ERGS fornecer sua expertise na entrega da medicação ao agravado, de posse dos valores repassados pela União ou, a prudente critério do Juízo Singular, considerada a urgência do caso, fornecer o medicamento com recursos próprios, garantido, também neste caso, o ressarcimento administrativo dos valores dispendidos.

A decisão impugnada adotou, me linhas gerais, o supra expresso e não vislumbro motivos para sua alteração, sendo de apontar que a princial insurgência da União (direcionamento ao ente estadual), já havia sido deferida desde a decisão preambular.

Quanto ao pedido de direcionamento exclusivo da obrigação ao ente estadual incumbe-me, apenas, ressaltar a ausência de estrutura do órgão para a entrega direta de medicação tanto para os cidadãos quanto aos nosocômios, utilizando-se das secretarias estaduais mesmo quando é o caso de obrigação de compra direta da medicação pelo ente federal.

Da observância do PMVG e CAP

Deixo de conhecer do pedido diante do deferimento da referida limitação de preços pela sentença, inexistindo interesse processual da parte no pedido.

Do uso da Denominação Comum Brasileira

Não se conhece do pedido, uma vez que a decisão se utilizou da referida denominação.

Das contracautelas

Foram fixadas contracautelas na decisão, não tendo havido impugnação específica pela União, motivo pelo qual deixo de conhecer do pedido quanto ao ponto (CPC, art. 932, inc. III, c/c art. 1.013, inc. III e art. 341).

Honorários Advocatícios

Indefiro o pedido de redução da verba honorária postulado pela União.

Isso porque as causas relativas ao direito da saúde possuem conteúdo econômico inestimável. Assim, nos termos do art. 85, §8º-A, do Código de Processo Civil, com as alterações que lhe foram dadas pela Lei nº 14.365, de 2 de junho de 2022, os honorários advocatícios possuem limite mínimo balizado em, pelo menos, 10% do valor da causa ou no valor recomendado pela Seccional da OAB/RS, considerando o disposto no §2º do mesmo artigo, valor que considero mais adequado para manter a característica equitativa da fixação.

Deste modo, cabe prover em parte o pedido da parte autora para fixar os honorários advocatícios no no valor recomendado pela Seccional da OAB/RS para as causas de matéria cível, procedimento ordinário (https://www2.oabrs.org.br/honorarios/).

Majoro a verba honorária em 5% sobre o valor fixado supra em desfavor dos apelantes União e ERGS.

Tal fixação encontra amparo na tese firmada no julgamento do Tema 1.059 do STJ: "A majoração dos honorários de sucumbência prevista no artigo 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o artigo 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento e limitada a consectários da condenação". (Data de julgamento: 9/11/2023)

Custas Processuais

A União e o ERGS são isentos do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96).

Conclusão

Deixar de conhecer o recurso da União quanto aos pedidos subsidiários de fixação de contracautelas, diante da ausêncida de impugnação específica, de aplicação de PMVG e CAP e de utilização da denominação brasileira por ausência de interesse recursal.

Rejeitar as preliminares do apelo da União (integração do pólo passivo e gratuidade de justiça).

Rejeitar a preliminar da apelação do ERGS (integração do pólo passivo).

Dar parcial provimento à apelação da parte autora para aumentar o valor dos honorários advocatícios fixados.

Negar provimento às apelações do ERGS e da União.

Prequestionamento

Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelaçãos do ERGS e conhecer em parte da apelação da União, negando-lhe provimento na parte conhecida.



Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004389695v29 e do código CRC a88ccef6.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ADRIANE BATTISTI
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5007366-27.2022.4.04.7100
40004389695.V29


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5007366-27.2022.4.04.7100/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5007366-27.2022.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

APELANTE: MARISETE DE OLIVEIRA FURTADO (AUTOR)

ADVOGADO(A): ARICIA CAROLINA ROSA DOS SANTOS (OAB RS103255)

ADVOGADO(A): MICHELLE CAMARGO FERREIRA (OAB RS124371)

ADVOGADO(A): MARCELA DUARTE (OAB RS116642)

ADVOGADO(A): MICHELLE AZEVEDO MAGADAN (OAB RS042991)

ADVOGADO(A): ARICIA CAROLINA ROSA DOS SANTOS

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

DIREITO DA SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE PASSIVA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. TRASTUZUMABE ENTANSINA. NEOPLASIA MALIGNA DE MAMA. EFICÁCIA EM CONCRETO. tema 793 do STJ. desconto apac. indevido. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO EQUITATIVA. limite mínimo.

1. A legitimidade passiva dos três entes federados nas demandas relativas à tutela da saúde no âmbito do SUS, havendo litisconsórcio passivo facultativo, motivo pelo qual cabe à parte autora escolher contra a qual órgão litigar, salvo quanto a natureza da prestação torne a presença de um dos entes necessária à solução da demanda. Caso em que, não demandado o ente municipal pela parte não sendo caso de composição necessária da lide, descabe sua integração à demanda.

2. Cabe ao impugnante comprovar que a presunção de hipossuficência que decorre da declaração firmada pela parte é superada de modo a haver suficiência de recursos, utilizando-se a baliza do IRDR 25 desta Corte.

3. O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas.

4. Observando as premissas elencadas no julgado Suspensão de Tutela Antecipada n. 175 (decisão da Corte Especial no Agravo Regimental respectivo proferida em 17 de março de 2010, Relator o Ministro Gilmar Mendes), quando da avaliação de caso concreto, devem ser considerados, entre outros, os seguintes fatores: (a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA (só podendo ser relevado em situações muito excepcionais, segundo disposto nas Leis n.º 6.360/76 e 9.782/99) e (d) a não configuração de tratamento experimental.

5. Ainda, justifica-se a atuação judicial para garantir, de forma equilibrada, assistência terapêutica integral ao cidadão na forma definida pelas Leis nº 8.080/90 e 12.401/2011 de forma a não prejudicar um direito fundamental e, tampouco, inviabilizar o sistema de saúde pública.

6. Comprovada a eficácia em concreto da medicação postulada, devem ser preservados os efeitos do medicamento postulado e usado por tempo significativo, podendo ser judicialmente deferida a dispensação do fármaco requerido.

7. Por conta da solidariedade, a responsabilidade pelo cumprimento da decisão judicial é igual entre os demandados, sendo o caso de se apontar o órgão responsável pelo cumprimento e o direito de ressarcimento, nos termos do Tema 793 do STF, ressalvado que o ressarcimento se há de processar na esfera administrativa. Precedente da Corte.

8. Descabe desconto de valores a serem repassados via APAC aos CACONs e UNACONS responsáveis pelo tratamento oncológico por caber ao ente administrar os referidos recursos. Ademais, é notória a insuficiência dos recursos repessados aos centros de tratamento para o custeio da atenção oncológica o que justifica o manejo do direito de ação para a satisfação do direito fundamental.

9. Os honorários advocatícios em matéria de direito à saúde são fixados de forma equitativa, nos termos do art. 85, §8º do CPC, respeitados os limites definidos no §8º-A do referido artigo, nos termos da Lei nº 14.365, de 2 de junho de 2022, preservando-se, todavia, a natureza equitativa da fixação.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora e negar provimento à apelaçãos do ERGS e conhecer em parte da apelação da União, negando-lhe provimento na parte conhecida, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 17 de abril de 2024.



Documento eletrônico assinado por ADRIANE BATTISTI, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004389696v8 e do código CRC 3f5df46a.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/04/2024 A 17/04/2024

Apelação Cível Nº 5007366-27.2022.4.04.7100/RS

RELATORA: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI

PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE

APELANTE: MARISETE DE OLIVEIRA FURTADO (AUTOR)

ADVOGADO(A): ARICIA CAROLINA ROSA DOS SANTOS (OAB RS103255)

ADVOGADO(A): MICHELLE CAMARGO FERREIRA (OAB RS124371)

ADVOGADO(A): MARCELA DUARTE (OAB RS116642)

ADVOGADO(A): MICHELLE AZEVEDO MAGADAN (OAB RS042991)

ADVOGADO(A): ARICIA CAROLINA ROSA DOS SANTOS

APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/04/2024, às 00:00, a 17/04/2024, às 16:00, na sequência 772, disponibilizada no DE de 01/04/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃOS DO ERGS E CONHECER EM PARTE DA APELAÇÃO DA UNIÃO, NEGANDO-LHE PROVIMENTO NA PARTE CONHECIDA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI

Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



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