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PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. PPP E LAUDO OMISSOS. NULIDADE. TRF4. 5000712-24.2018.4.04.7113

Data da publicação: 10/03/2023, 11:00:58

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. PPP E LAUDO OMISSOS. NULIDADE. 1. Nos termos do art. 370 do Código de Processo Civil (CPC), caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar a produção das provas necessárias ao julgamento do mérito, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias. 2. Evidenciado prejuízo na falta de produção de prova pericial, que se faz imprescindível para o deslinde da controvérsia, acolhe-se alegação de cerceamento de defesa, determinando-se a anulação da sentença e a reabertura da instrução processual. (TRF4, AC 5000712-24.2018.4.04.7113, QUINTA TURMA, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, juntado aos autos em 02/03/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000712-24.2018.4.04.7113/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

APELANTE: SILVANO FONTANIVE (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

SILVANO FONTANIVE propôs ação de procedimento comum em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando a concessão do benefício de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, desde a data de entrada do requerimento - DER, mediante o reconhecimento da especialidade e a averbação de períodos laborados em condições especiais, com a sua respectiva conversão em tempo comum.

Sobreveio sentença (evento 31, SENT1) que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, nos seguintes termos:

III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, rejeito a preliminar e ponho fim à fase cognitiva do procedimento comum para,com resolução do mérito (art. 487, inciso I, do CPC), julgar procedentes em parte os pedidos veiculados para o fim de:

a) reconhecer a atividade especial, nos períodos de 09/03/1992 a 05/03/1997, 10/02/1998 a 10/06/1999, 01/10/2001 a 25/11/2001, 19/11/2003 a 30/09/2005, 26/04/2006 a 13/02/2007 e 21/02/2007 a 02/12/2007, garantida a sua conversão em tempo comum pelo multiplicador 1,4;

b) indeferir o reconhecimento da especialidade dos demais períodos postulados, bem como os pedidos de conversão de tempo comum em especial e de concessão da aposentadoria especial, seja na DER ou por meio de sua reafirmação;

c) reconhecer o direito do autor ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER (21/09/2016), com RMI de 100% do salário-de-benefício, calculando-a de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário;

d) condenar a autarquia previdenciária a pagar à parte autora, de uma só vez, todos os valores devidos pela concessão do benefício, desde a DER (21/09/2016) até a data da sua efetiva implantação, bem como a pagar as parcelas vincendas, com juros de mora e correção monetária conforme especificado na fundamentação.

Presente sucumbência recíproca, condeno cada parte ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, na proporção de 50% a ser devido a cada procurador, nos termos do art. 85, §3º, em montante a ser apurado em liquidação de sentença (art. 85, §4º, inciso II do CPC), observada a súmula nº 111 do STJ.

Condeno o autor ao pagamento de 50% das custas processuais. Não há custas a serem ressarcidas pelo INSS, considerando a gratuidade de justiça deferida à parte autora e a isenção legal da parte ré.

A exigibilidade das verbas sucumbenciais fica suspensa em razão da gratuidade de justiça.

A parte autora apelou arguindo preliminar de cerceamento de defesa, consistente no indeferimento do pedido de produção de prova pericial (evento 36, APELAÇÃO1). Alega, em síntese: a) que faz jus ao reconhecimento de atividade especial dos períodos de 06/03/1997 a 09/02/1998; 11/06/1999 a 30/09/2001; 26/11/2001 a 18/11/2003; 01/10/2005 a 25/04/2006; 14/02/2007 a 20/02/2007; 03/12/2007 até a DER (21/09/2016), laborados na Empresa Tramontina S.A. Cutelaria; b) ter direito à aposentadoria especial, desde a DER ou mediante a reafirmação desta para o momento em que implementados 25 anos de tempo de serviço especial.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

Recursos adequados e tempestivos. Apelantes isentos de custas, nos termos do art. 4º, I e II, da Lei 9.289/1996.

Cerceamento de Defesa

A parte autora argui preliminar de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, em razão do indeferimento do pedido de produção de prova pericial, quanto aos períodos de 06/03/1997 a 09/02/1998; 11/06/1999 a 30/09/2001; 26/11/2001 a 18/11/2003; 01/10/2005 a 25/04/2006; 14/02/2007 a 20/02/2007; 03/12/2007 até a DER (21/09/2016), laborados na Empresa Tramontina S.A. Cutelaria. Fundamenta sua pretensão no sentido de que os documentos técnicos não retratam, com fidelidade, as reais condições de labor prestadas no período.

A preliminar confunde-se com o mérito e, com ele, será analisada.

Atividade Especial

O reconhecimento da atividade laborativa como especial obedece à disciplina legal vigente à época em que esta foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU 23/6/2003 e REsp 491338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 200571000318245/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DE 18/11/2009; APELREEX 00008676820104049999/RS, Sexta Turma, Rel. Celso Kipper, DE 30/3/2010; APELREEX 00011268620084047201/SC, Sexta Turma, Rel. João Batista Pinto Silveira, DE 17/3/2010; APELREEX 200771000335227/RS; Quinta Turma, Rel. Fernando Quadros da Silva, DE 25/1/2010).

Feitas estas observações, tendo em vista a sucessão legislativa tratando da matéria é necessário definir inicialmente a legislação incidente no caso concreto, ou seja, qual estava em vigor no momento da prestação da atividade pelo segurado.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei 3.807/1960 (LOPS) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991 (LBPS), em sua redação original (arts. 57 e 58), era possível o reconhecimento da especialidade do trabalho mediante a comprovação do exercício de atividade prevista como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor/frio (STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 4/8/2008 e REsp 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 7/11/2005), quando então se fazia indispensável a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar a nocividade dos agentes envolvidos. Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e 83.080/79 (Anexo II);

b) a partir de 29 de abril de 1995, data da vigência da Lei 9.032/95, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, em razão das alterações introduzidas no art. 57 da LBPS, tornando-se necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional, nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e 83.080/79 (Anexo I);

c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da LBPS pela Medida Provisória 1.523/96 (convertida na Lei 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos 2.172/97 (Anexo IV) e 3.048/99.

d) a partir de 1º de janeiro de 2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) tornou-se indispensável para a comprovação do período cuja especialidade for postulada (art. 148 da IN 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que corretamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.

Registre-se, ainda, que é sempre possível a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGREsp 228832/SC, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).

Quanto à possibilidade de conversão do tempo especial em comum, a partir de 14 de novembro de 2019 restou vedada em relação ao labor posterior a essa data, nos termos do art. 25, §2º, da EC 103/2019.

Habitualidade e Permanência

A habitualidade e permanência (referidas no art. 57, §3º, da Lei 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. A exposição, no entanto, deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual ou ocasional. Interpretação diversa levaria à ineficácia da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (TRF4, EINF 00039295420084047003, Terceira Seção, Rel. Rogério Favreto, DE 24/10/2011; TRF$, EINF 200771000466887, Terceira Seção, Rel. Celso Kipper, DE 07/11/2011).

Outrossim, de acordo com a atividade desenvolvida, a exposição a determinado agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta ao reconhecimento da especialidade, porquanto a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes àquela atividade, não sendo razoável subtrair do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4 200572100003891, Terceira Seção, Rel. João Batista Pinto Silveira, DE 18/05/2011; TRF4, EINF 200871990022460, Terceira Seção, Rel. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DE 08/01/2010).

Equipamentos de Proteção Individual - EPI

A Medida Provisória 1.729/98 (convertida na Lei 9.732/98) alterou o §2º do art. 58 da Lei 8.213/1991, passando a determinar que o laudo técnico contenha i) informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância, e ii) recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Por essa razão, a utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) nas atividades exercidas no período anterior a 03/12/1998 (data da publicação da Medida Provisória anteriormente citada), é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador. O próprio INSS já adotou esse entendimento na IN 45/2010 (art. 238, §6º).

Após 03/12/1998, foi reconhecida a repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal quanto ao tema 555. No julgamento do ARE 664335 (Tribunal Pleno, Rel Min. Luiz Fux, DJe 12/02/2015), o Supremo fixou duas teses:

1) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial;

2) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

Assim, a exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites de tolerância sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI, ou de menção em laudo pericial à neutralização de seus efeitos nocivos, uma vez que os equipamentos de proteção eventualmente utilizados não são capazes de evitar a progressão das lesões auditivas decorrentes;

Em relação aos demais agentes nocivos, a utilização de EPIs obsta o reconhecimento da natureza especial da atividade, desde que esteja comprovado, no caso concreto, a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade e, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e fiscalizado pelo empregador.

A questão foi examinada por esta Corte no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas 5054341-77.2016.4.04.0000/SC (IRDR Tema 15). O acórdão foi assim ementado:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA. 1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. 3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. 5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. 5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. 7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s. (TRF4, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) 5054341-77.2016.404.0000, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Jorge Antônio Maurique, 11.12.2017)

Como se vê, prevaleceu nesta Corte o entendimento sobre a necessidade de comprovação da neutralização dos agentes agressivos, sendo relacionados ainda outras hipóteses em que a utilização de EPI não descaracteriza o labor especial (além do ruído, já afastado pela decisão do STF), consoante o seguinte trecho do voto condutor:

Cumpre ainda observar que existem situações que dispensam a produção da eficácia da prova do EPI, pois mesmo que o PPP indique a adoção de EPI eficaz, essa informação deverá ser desconsiderada e o tempo considerado como especial (independentemente da produção da prova da falta de eficácia) nas seguintes hipóteses:

a) Períodos anteriores a 3 de dezembro de 1998:

Pela ausência de exigência de controle de fornecimento e uso de EPI em período anterior a essa data, conforme se observa da IN INSS 77/2015 -Art. 279, § 6º:

'§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual - EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância: (...)'

b) Pela reconhecida ineficácia do EPI:

b.1) Enquadramento por categoria profissional: devido a presunção da nocividade (ex. TRF/4 5004577-85.2014.4.04.7116/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, em 13/09/2017)

b.2) Ruído: Repercussão Geral 555 (ARE 664335 / SC)

b.3) Agentes Biológicos: Item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.

b.4) Agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos: Memorando-Circular Conjunto n° 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS/2015:

Exemplos: Asbesto (amianto): Item 1.9.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017; Benzeno: Item 1.9.3 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS, 2017.

b.5) Periculosidade: Tratando-se de periculosidade, tal qual a eletricidade e vigilante, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI. (ex. APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017)

Resumidamente, a tese fixada por esta Corte no IRDR 15:

- quando o LTCAT e o PPP informam a ineficácia do EPI, há a especialidade do período de atividade;

- quando a empresa informa no PPP a existência de EPI eficaz, há possibilidade de questionar judicialmente sua eficácia;

- a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor: i) em períodos anteriores a 3.12.1998; ii) quando há enquadramento legal pela categoria profissional; iii) em relação aos agentes nocivos: ruído, biológicos, cancerígenos (como asbestos, benzeno, hidrocarbonetos aromáticos, etc.) e periculosos (como eletricidade, etc.).

Nos demais casos, ainda que o PPP informe a eficácia do EPI, fica assegurada a possibilidade de discutir e produzir provas no sentido de demonstrar a ineficácia do EPI e, consequentemente, a especialidade do labor.

Deve ser consignado que os riscos à saúde ou a exposição ao perigo não podem ser gerados pelo próprio trabalhador, ou que se tenha na conduta do trabalhador o fator fundamental de agravamento de tais riscos. Tal entendimento, aplica-se, especialmente, aos profissionais autônomos que negligenciam com seus ambientes de trabalho, não curando com seus próprios interesses, e, posteriormente, imputam ao Estado os ônus de tal negligência.

Caso concreto

No caso, a controvérsia cinge-se à especialidade - ou não - dos períodos períodos de 06/03/1997 a 09/02/1998; 11/06/1999 a 30/09/2001; 26/11/2001 a 18/11/2003; 01/10/2005 a 25/04/2006; 14/02/2007 a 20/02/2007; 03/12/2007 até a DER (21/09/2016), laborados na Empresa Tramontina S.A. Cutelaria.

A sentença examinou as provas e decidiu a questão nos seguintes termos:

"II.3.1. Da atividade especial no caso dos autos

Busca o autor o reconhecimento como tempo de atividade especial do interstício de 09/03/1992 a 21/09/2016, laborado na Tramontina S/A Cutelaria.

O PPP juntado pelo autor informa vários setores e funções ao longo do vínculo, referindo a exposição a agentes nocivos (evento 26, procadm2, pp. 2-4).

Os laudos fornecidos pela empresa (evento 26, procadm2 a procadm4) corroboram integralmente os dados lançados no PPP, ficando clara a anotação dos agentes especificamente aplicáveis à atividade do autor.

Ressalvo, contudo, que os laudos não demonstram a suficiência dos EPIs fornecidos para a eliminação da nocividade dos agentes químicos álcalis cáusticos (nitrito de sódio) e óleos minerais (óleos e graxas) constatados em parte dos períodos e anotados no PPP.

Quanto ao restante das informações, fielmente reproduzidas no PPP, cumpre referir que o autor não trouxe elementos capazes de afastar as conclusões técnicas, alcançadas por profissionais habilitados, e que se referem especificamente ao posto de trabalho do autor.

Não foi lançada a mínima dúvida técnica sobre os levantamentos de riscos da empresa, elaborados na época da atividade, sequer se justificando a realização de perícia judicial.

Com base no exposto, reconheço apenas o enquadramento dos períodos de 09/03/1992 a 05/03/1997, 10/02/1998 a 10/06/1999, 01/10/2001 a 25/11/2001, 19/11/2003 a 30/09/2005, 26/04/2006 a 13/02/2007 e 21/02/2007 a 02/12/2007."

No caso em análise, verifico que as informações constantes do PPP (evento 26, PROCADM2, evento 26, PROCADM3, evento 26, PROCADM4) se mostram em descompasso com a respectiva cronologia das funções exercidas e os setores em que se deram. Explico.

Como se pode ver na petição inicial, o autor alega ter laborado exposto a diversos agentes insalubres, tais como ruído elevado, hidrocarbonetos (óleos e graxas), ondas não ionizantes (solda), álcalis cáusticos entre outros.

Quanto ao agente físico ruído, por exemplo, os PPPs e laudos técnicos (PPRA’s) fornecidos pela empresa informam a exposição ao ruído mediante a técnica da LEITURA INSTANTÂNEA, o qual não contempla o nível médio de ruído que o autor ficou exposto durante sua jornada de trabalho, a qual deve ser aferida por DOSIMETRIA, nos moldes estabelecidos pela Norma de Higiene Ocupacional - NHO 01, da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (FUNDACENTRO).

Nos termos do art. 370 do Código de Processo Civil (CPC), caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar a produção das provas necessárias ao julgamento do mérito, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

Para a verificação da especialidade das atividades exercidas com exposição a agentes nocivos, leva-se em consideração, em regra, o conteúdo da documentação técnica lavrada pela empresa (formulários padrão, tais como PPP e Laudos Técnicos, LTCAT, PPRA por exemplo). Havendo dúvida sobre a fidedignidade ou suficiência da documentação, abre-se a possibilidade de produção de prova pericial por ordem judicial.

Nesse sentido, o precedente da 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Regiāo, que viabiliza a produção da prova pericial, mesmo quando houver nos autos PPP e/ou Laudos, fornecidos pela ex-empregadora, acaso a higidez das informações nele(s) contida(s) seja questionada pelo trabalhador. O aresto a seguir reproduzido reflete a síntese da tese resultante da apreciação do IRDR nº 15 desta Corte:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA. 1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. 3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. 5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. 5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. 7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s. (TRF4 5054341-77.2016.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/12/2017).

Tecidas tais considerações e, diante dessa situação excepcional, em que a documentação fornecida pela empresa se mostra omissa, imprecisa ou contraditória, concluo pela ocorrência de cerceamento de defesa no caso em concreto, uma vez que a prova pericial individualizada é imprescindível para a comprovação das reais condições de trabalho da parte autora.

Nesse sentido, cito trecho de recente precedente desta Corte:

'Com efeito, a responsabilidade pela confecção e guarda da documentação tradicionalmente adotada para a comprovação do exercício de atividade especial pelos segurados da Previdência Social é do empregador, de modo que, na ausência desses formulários, ou no caso do descompasso entre as informações ali constantes e a realidade laboral efetivamente vivenciada, o trabalhador não possui outros meios para provar seu direito, além da perícia judicial. Não se deve perder de vista que, embora os empregadores não sejam parte integrante da relação jurídica previdenciária, mantida entre o segurado e o INSS, o reconhecimento da existência de insalubridade na atividade prestada implica ônus para as empresas, que se veem obrigadas a recolher o adicional sobre as contribuições previdenciárias para custeio da aposentadoria especial, motivo pelo qual os laudos por elas produzidos não podem ser tomados como prova plena da inexistência de agentes nocivos. Ademais, também não se deve desconsiderar o dever de fiscalização da própria Autarquia Previdenciária.' (Excerto do voto do Rel. , Des. João Batista, na AC 50062309620214047110/RS, 6ª T., sessão de 26/10/2022).

Nessa linha, impõe-se a anulação da sentença com o retorno dos autos à origem, para que seja reaberta a instrução processual e realizada perícia judicial de forma individualizada quanto aos períodos de 06/03/1997 a 09/02/1998; 11/06/1999 a 30/09/2001; 26/11/2001 a 18/11/2003; 01/10/2005 a 25/04/2006; 14/02/2007 a 20/02/2007; 03/12/2007 até a DER (21/09/2016), laborados na Empresa Tramontina S.A. Cutelaria.

Conclusão

- apelação provida para acolher a preliminar de cerceamento de defesa, anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual e realização de perícia judicial, restando prejudicada a análise das demais questões.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, nos termos da fundamentação.



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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000712-24.2018.4.04.7113/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

APELANTE: SILVANO FONTANIVE (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. PPP E LAUDO OMISSOS. NULIDADE.

1. Nos termos do art. 370 do Código de Processo Civil (CPC), caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar a produção das provas necessárias ao julgamento do mérito, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

2. Evidenciado prejuízo na falta de produção de prova pericial, que se faz imprescindível para o deslinde da controvérsia, acolhe-se alegação de cerceamento de defesa, determinando-se a anulação da sentença e a reabertura da instrução processual.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 28 de fevereiro de 2023.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003655379v6 e do código CRC 1f258f4e.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/02/2023 A 28/02/2023

Apelação Cível Nº 5000712-24.2018.4.04.7113/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PROCURADOR(A): VITOR HUGO GOMES DA CUNHA

APELANTE: SILVANO FONTANIVE (AUTOR)

ADVOGADO(A): RODRIGO PEDRONI (OAB RS070049)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/02/2023, às 00:00, a 28/02/2023, às 16:00, na sequência 316, disponibilizada no DE de 08/02/2023.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



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