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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO. TRABALHADOR RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. TRF4. 5009420-62.2023.4.04.9999

Data da publicação: 26/04/2024, 07:02:05

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO. TRABALHADOR RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito. 2. A qualidade de segurado especial do de cujus deve ser comprovada por início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar. 3. O conjunto probatório dos autos não permite concluir que o instituidor foi trabalhador rural até o momento do óbito, não fazendo jus a parte autora ao benefício de pensão por morte postulado. (TRF4, AC 5009420-62.2023.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 18/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal Penteado - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90019-395 - Fone: (51)3213-3282 - www.trf4.jus.br - Email: gpenteado@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5009420-62.2023.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

APELANTE: MIKAEL SOUSA DOS SANTOS ALBUQUERQUE

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de ação previdenciária ajuizada por MIKAEL SOUSA DOS SANTOS ALBUQUERQUE, representado por sua genitora, visando à concessão de pensão por morte de seu pai, Elisaldo José de Sousa Albuquerque, ocorrida em 01/05/2020, sob o fundamento de que o falecido detinha a qualidade de segurado especial.

Sentenciando, o juízo a quo julgou extinto o feito, sem julgamento de mérito, tendo em vista a ausência de elementos probatórios para o reconhecimento da qualidade de segurado especial do instituidor. Condenou ainda a parte autora a pagar honorários advocatícios, no montante de 10% sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade, nos termos do artigo 98, §3º, do CPC.

A parte autora apresentou recurso requerendo a reforma da sentença, alegando a comprovação, por meio de prova documental e testemunhal, da qualidade de segurado especial do instituidor, o que justifica a concessão do benefício de pensão ora em pleito

Oportunizadas contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.

O Ministério Público Federal apresentou parecer pelo desprovimento da apelação.

É o relatório.

VOTO

DA PENSÃO POR MORTE

A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.

Além disso, conforme o disposto no art. 26, I, da Lei nº 8.213/1991, referido benefício independe de carência, regendo-se pela legislação vigente à época do falecimento.

Sobre a condição de dependência para fins previdenciário, o art. 16 da Lei 8.213/91 assim dispõe:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave (redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015);

II - os pais;

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave (redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015);

§1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.

§2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.

§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o §3º do art. 226 da Constituição Federal.

§4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

§ 5º As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

§ 6º Na hipótese da alínea c do inciso V do § 2º do art. 77 desta Lei, a par da exigência do § 5º deste artigo, deverá ser apresentado, ainda, início de prova material que comprove união estável por pelo menos 2 (dois) anos antes do óbito do segurado. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

§ 7º Será excluído definitivamente da condição de dependente quem tiver sido condenado criminalmente por sentença com trânsito em julgado, como autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso, ou de tentativa desse crime, cometido contra a pessoa do segurado, ressalvados os absolutamente incapazes e os inimputáveis. (Incluído pela Lei nº 13.846, de 2019)

Qualidade de Segurado Especial - Trabalhador rural/boia-fria

O segurado especial, condição prevista no art. 11, VII, da Lei n° 8.213/91, inclui-se entre os segurados obrigatórios da Previdência Social, sendo-lhe dispensado o recolhimento das contribuições para fazer jus ao benefício previdenciário.

Saliente-se que, embora o trabalhador rural denominado boia-fria, volante ou diarista não esteja enquadrado no rol de segurados especiais referidos no inc. VII do art. 11 da Lei de Benefícios, a estes se equipara para fins de concessão de aposentadoria rural por idade ou instituição de pensão, consoante pacífica jurisprudência. Neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REDUÇÃO DA SENTENÇA AOS LIMITES DO PEDIDO. SALÁRIO-MATERNIDADE. SEGURADA ESPECIAL. BOIA-FRIA. CONTRIBUIÇÕES. 1. A sentença deve ser reduzida aos limites da exordial, tendo em vista não constar dela pedido de condenação da Autarquia ao pagamento de abono anual, nem decorrer este, por força de lei, do benefício postulado, tendo em vista que, em que pese o art. 120 do Dec. n. 3.048/99, em sua redação atual, preveja o abono no caso em tela, o Regulamento extrapolou a Lei de Benefícios, que não contém dita previsão (vide art. 40, que lista expressamente os casos em que há abono anual). 2. O trabalhador rural boia-fria deve ser equiparado ao segurado especial de que trata o art. 11, VII, da Lei de Benefícios, sendo-lhe dispensado, portanto, o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário. (TRF4, AC 0016869-16.2010.404.9999, Sexta Turma, Relatora Eliana Paggiarin Marinho, D.E. 03/02/2011)

O exercício de atividade rural ou de pescador artesanal deve ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e da Súmula 149 do Eg. STJ, à exceção dos trabalhadores rurais boias-frias. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas.

Não se exige prova plena da atividade rural ou pesqueira de toda a vida do de cujus, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro de que o labor fosse exercido contemporaneamente à época do óbito ou que essa atividade tenha cessado em decorrência do acometimento de alguma enfermidade.

Importa, ainda, salientar os seguintes aspectos: (a) o rol de documentos constantes no art. 106 da Lei de Benefícios, os quais seriam aptos à comprovação do exercício da atividade rural, é apenas exemplificativo; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido (AREsp 327.119/PB, j. em 02/06/2015, DJe 18/06/2015); (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos); (d) É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório (Súmula 577/STJ (DJe 27/06/2016); (e) a prova material juntada aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento, desde que corroborado por prova testemunhal (AgRg no AREsp 320558/MT, j. em 21/03/2017, DJe 30/03/2017); e (f) é admitido, como início de prova material, nos termos da Súmula 73 deste Tribunal, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

CASO CONCRETO

O óbito de Elisaldo José de Sousa Albuquerque ocorreu em 01/05/2020, conforme certidão de óbito juntada com a inicial.

A sentença julgou extinto o feito sem julgamento de mérito, ante a insuficiência de prova para reconhecimento da qualidade de segurado especial do instituidor.

A fim de evitar tautologia transcrevo parte da sentença, adotando os seus fundamentos como razões de decidir:

"...

Pois bem, para comprovar a qualidade de segurado especial do “de cujus” a requerente juntou aos autos os respectivos documentos:

CNIS do “de cujus” em que laborou na USINA SÃO TOME S/A, entre o ano de 09/03 /2009 a 18/12/2009 (mov. 1.5); CNIS do “de cujus” em que laborou na SABARALCOOL S A ACUCAR E ALCOOL, entre o ano de 10/05/2010 a 09/12/2010 (mov. 1.5); CNIS do “de cujus” em que laborou na SABARALCOOL S A ACUCAR E ALCOOL, entre o ano de 11/07/2011 a 16/12/2011 (mov. 1.5); CNIS do “de cujus” em que laborou na SABARALCOOL S A ACUCAR E ALCOOL, entre o ano de 06/05/2014 a 05/06/2014 (mov. 1.5);

Com efeito, depoimento a genitora do autor disse que “quando o pai de seu filho faleceu não estávamos mais juntos. Até 2018 ele trabalhava em um frigorífico e depois disso não conseguiu mais trabalho e trabalhava na roça. Ele trabalhava com várias pessoas no arrancadão de mandioca. Ele trabalhava para gato, mas não lembro o nome porque não tinha muito conhecimento com esse pessoal. Eu presenciava ele ir trabalhar porque convivíamos bastante. Ele saia as 04h00min ou até mais cedo. Quando era para corte de rama ele levava facão e no arrancadão sempre tinha o cesto lá e arrancavam com a mão. Ele voltava as 18h00min. Ele pegava o ônibus na casa do gato. Toda semana recebia pagamento nos sábados por dinheiro. Não tinha recebido. Ele não pagava pensão porque eu trabalhava e não procurava. Não sei quanto ganhava. Ele trabalhou até 01 ou 02 dias antes de falecer. Ele foi assassinado. Desde 2010 ele já trabalhou em corte de cana em outras cidades. Ele faleceu com 30 anos. Não sei onde estão os outros documentos dele. Em Santa Isabel via os gatos que levavam. No frigorífico trabalhávamos juntos. Quando começou na roça não tinha intimidade com os gatos, nossos conhecidos sim. A Eliane trabalhava com ele na roça, o Valdir e outras pessoas que vão testemunhar. Não conheço Maria de Lurdes Rodrigues, Diolino Barbosa da Silva trabalhou com ele na roça. Não sabia as fazendas que iam. A primeira vez que trabalharam junto foi em Santa Mônica. Tinha um rapa conhecido como corujo que levava eles”.

Por sua vez a informante Cicera Eliane Oliveira Santos disse que “trabalho na roça desde meus 12 anos. Conheci ele logo que chegou do Maranhão, não me recordo o ano. Foi em 2017 /2018. Já trabalhei com ele na arranca de mandioca como Sr. Chico e nas outras era carpindo. O pagamento é semanal. O gato ia até na casa e pagava em dinheiro. Não tinha recibo nem anotação em carteira. Quando faleceu estava trabalhando na roça. Trabalhamos em uma roça antes de ele falecer para a frente de Loanda. Eu não sei o nome da fazenda, quem sabia era o Sr. Chico. Ele ainda é gato. Chegou em 2017/2018. Ele já trabalhou em um frigorífico em Loanda. Logo ele começou. Meu ex marido trabalhava com ele. Em 2019/2020 começamos a trabalhar junto porque é empreita. Nos só recebíamos dinheiro. Já trabalhamos com Zé Herreria, Lenga, mas não sei se eles falariam. Saiamos 05h00min para trabalhar no carro do Sr.Chico. Ele fazia duas viagens e voltávamos 16h00min. Lá usávamos enxadão e balaio. As vezes o pagamento saia na sexta de tardinha ou no sábado. Era por empreita, ele ganhava muito bem era um dos melhores. É por sacolão. Eles pagavam por R$ 25,00 o sacolão ou R$ 27,00. O sacolão é grande."

A testemunha Ildes Aparecido Cardoso disse que “conheceu o falecido a uns 03 anos atrás. Conheci no arrancadão de mandioca. Trabalhei no Paulo perto de Loanda, em Santa Mônica. O gato pegava e nós íamos trabalhar arrancando mandioca. Não me recordo a data que ele faleceu. Dias antes ele trabalhou na roça. O pagamento era semanal. As vezes na sexta e as vezes no sábado. Nós trabalhamos com o chico que ia com carro baixo. Ele já trabalhou com o coruja e o Zé Herreira. A diária lá era pelo sacolão. Trabalhávamos com o Chico, coruja, Zé Herreira. Fazíamos de tudo. O chico levava para arrancar mandioca. O Chico mora em Santa Isabel. O coruja mora em Santa Isabel também o nome dele é Cesar. Saímos para trabalhar conforme a roça entre 4h30min e 05h30min. Voltávamos entre as 16h0min e 17h00min. Eles pagavam por sacolão e variava entre R$ 25,00 e R$23,00 conforme a produção da mandioca. Usávamos balaio, enxadão e facão. Arrancávamos com a mão também. O pagamento era feito em dinheiro. As vezes ele levava o pagamento em casa ou íamos na casa dele buscar. Acho que o gato assinava recibo para o patrão. ”

Sendo assim, observa-se que o autor laborou por alguns períodos como trabalhador rural nas usinas de cana-de-açúcar, porém, no ano de 2020 em que ocorreu os fatos o “de cujus” não possui anotações em CTPS, bem como, não trouxe qualquer documento a fim de provar a materialidade dos fatos alegados.

Posto isto, após análise atenta dos autos, contudo, verifico que tais instrumentos de prova não se mostram capazes de embasar a pretensão do autor. É que não obstante os documentos acima mencionados, não possibilitaram saber se o “de cujus” realmente laborou como bóiafria, bem como, não serviram para comprovar o desempenho de labor rural à época do óbito, tendo em vista, que o efetivo exercício da atividade rural não pode ser livremente comprovado através do meio de prova exclusivamente testemunhal.

Assim, considerando o quadro fático-probatório ora delineado, entendo que restou ausente elemento essencial para o deslinde do feito, qual seja, a existência de início de prova documental acerca do efetivo labor rural ao tempo do falecimento do de cujus, motivo pelo qual a ação deve ser extinta sem resolução de mérito.

..."

Entendo que não assiste razão à parte autora, visto que os documentos apresentados para a comprovação da qualidade de segurado especial do de cujus não suprem a exigência de razoável início de prova material contida no artigo 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991.

Percebe-se que o falecido foi trabalhador rural durante um período de sua vida. Contudo, não há nos autos qualquer prova material no sentido de que o instituidor estivesse desenvolvendo atividade rural em momento anterior ao óbito.

Verifico que o último vínculo empregatício do instituidor registrado em sua CTPS e CNIS é de natureza urbana (auxiliar de produção), não havendo como presumir que o falecido tenha retornado à atividade agrícola e se mantido nela até o momento do óbito, sem haver ao menos um documento apto a comprová-la.

Mesmo conhecendo a dificuldade em obter documentos comprobatórios da condição de boia-fria, a apresentação de qualquer documento relativo à condição de lavrador do falecido à época do óbito (título de eleitor, cadastro de lojas, fichas de atendimento de saúde, etc...) serviria como início de prova material do desempenho do labor rural.

Anoto que a declaração trazida no evento 70, OUT5, assinada pelo agenciador do finado, e não homologada pelo INSS, equivale à prova testemunhal reduzida a termo, pois produzida sem observar o princípio do devido processo legal, visto que não garantida à parte contrária a ampla defesa e o contraditório, e por isso não serve como início de prova material.

A qualificação do falecido como trabalhador rural, nos autos da reclamatória trabalhista, além de ser unilateral, não tem o condão de comprovar que ele estava desenvolvendo trabalho agrícola naquela época, mas tão somente aponta a profissão predominantemente exercida pelo finado ao longo da vida.

Assim, o que se verifica nos autos é que a parte autora não trouxe prova documental satisfatória que comprove o exercício do labor rurícola do instituidor, no período imediatamente anterior ao óbito, não se admitindo a prova exclusivamente testemunhal para comprovação da atividade rural, para efeitos de obtenção de benefício previdenciário (Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça).

Nesse contexto, não é possível reconhecer a alegada condição de segurado especial do de cujus, somente baseada na prova oral e declaração de terceiros acerca do exercício rural do falecido. Ressalte-se, ainda, que na certidão de nascimento do autor, não há qualificação do genitor como agricultor.

Em casos como o da presente demanda, de impossibilidade da concessão do benefício rural em face da ausência de conteúdo probatório válido, notadamente pela insuficiência da prova material acostada com a inicial, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.352.721/SP, em sede de recurso representativo de controvérsia, assim entendeu:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO. 1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários. 2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. 3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas. 4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social. 5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido.

(REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016)

Em suma, o STJ estabeleceu o entendimento de que na hipótese de ajuizamento de ação que demande a comprovação de atividade rural, a ausência/insuficiência de prova material não é causa de improcedência do pedido, mas sim de extinção sem resolução de mérito. Assegura-se, com isso, caso o segurado especial venha a obter outros documentos que possam ser considerados prova material do trabalho rural, a oportunidade de ajuizamento de nova ação sem o risco de ser extinta em razão da coisa julgada.

Tal entendimento é aplicável aos casos em que se postula pensão por morte de trabalhador rural, como demonstra o seguinte precedente desta Turma:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO DO FALECIDO. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. PROVA ORAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito 2. A qualidade de segurado especial do de cujus deve ser comprovada por início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar. 3. Não se admite a prova exclusivamente testemunhal para comprovação da atividade rural, para efeitos de obtenção de benefício previdenciário (Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça). 4. Verificada a ausência de conteúdo probatório válido para instruir a inicial, conforme estabelece o artigo 320 do Código de Processo Civil, resta configurada a hipótese de carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, o que implica decidir a causa sem resolução do mérito, consoante os termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil. (TRF4, AC 5002068-87.2022.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Federal Márcio Antonio Rocha, 29/06/2022).

A hipótese em exame se amolda ao entendimento mencionado, pois ausente início de prova material do labor rural, devendo ser extinto o feito sem o julgamento do mérito, possibilitando que se postule a concessão de benefício em outro momento, caso obtenha prova material hábil à comprovação da alegada atividade rurícola.

Portanto, verificada a ausência de conteúdo probatório válido para instruir a inicial, conforme estabelece o artigo 320 do Código de Processo Civil, resta configurada a hipótese de carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, o que implica decidir a causa sem resolução do mérito, consoante os termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil.

Em conclusão, não merece provimento o recurso da parte autora, devendo-se ser mantida, integralmente, a sentença de primeiro grau.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.

Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa em face da concessão de gratuidade da justiça.

PREQUESTIONAMENTO

Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.

CONCLUSÃO

Apelação desprovida e honorários advocatícios majorados, nos termos da fundamentação.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004401084v6 e do código CRC ca410f10.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 18/4/2024, às 12:8:19


5009420-62.2023.4.04.9999
40004401084.V6


Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2024 04:02:05.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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Apelação Cível Nº 5009420-62.2023.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

APELANTE: MIKAEL SOUSA DOS SANTOS ALBUQUERQUE

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO Do FALECIDo. TRABALHADOR RURAL. ausência de PROVA MATERIAL.

1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito.

2. A qualidade de segurado especial do de cujus deve ser comprovada por início de prova material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar.

3. O conjunto probatório dos autos não permite concluir que o instituidor foi trabalhador rural até o momento do óbito, não fazendo jus a parte autora ao benefício de pensão por morte postulado.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 16 de abril de 2024.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004401085v4 e do código CRC 1929e198.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 18/4/2024, às 12:8:19


5009420-62.2023.4.04.9999
40004401085 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 26/04/2024 04:02:05.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 09/04/2024 A 16/04/2024

Apelação Cível Nº 5009420-62.2023.4.04.9999/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES

APELANTE: MIKAEL SOUSA DOS SANTOS ALBUQUERQUE

ADVOGADO(A): IBRAM FELIPE ROCHA DA SILVA (OAB PR074225)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 09/04/2024, às 00:00, a 16/04/2024, às 16:00, na sequência 304, disponibilizada no DE de 26/03/2024.

Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

SUZANA ROESSING

Secretária



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