Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. INSUFICIENTE. JULGAMENTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. TRF4. 5000294-86.2019.4.04.7134

Data da publicação: 27/04/2024, 07:01:00

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. INSUFICIENTE. JULGAMENTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. 1. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação (art. 267 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa. 2. Solução aplicável às ações para concessão de aposentadoria rural por idade, em que a parte autora não reúne documentação mínima a configurar início de prova material do labor campesino, embora tenha produzido prova testemunhal indicativa da veracidade dos fatos que alega. (TRF4, AC 5000294-86.2019.4.04.7134, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 19/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000294-86.2019.4.04.7134/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: CLENIRA PEDROSO DOS SANTOS (AUTOR)

ADVOGADO(A): HENRIQUE OLTRAMARI (OAB RS060442)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta de sentença em que foram julgados parcialmente procedentes os pedidos, com dispositivo de seguinte teor:

Ante o exposto:

a) JULGO EXTINTO o processo, sem resolução do mérito, em relação ao período de 1999 a 2011, com fulcro nos artigos 485, I, c/c art. 330, IV, e art. 285, I, todos do Código de Processo Civil;

b) JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para reconhecer e determinar que o INSS averbe o período em que a parte autora trabalhou, na qualidade de segurado especial, compreendido de 01/01/2012 a 19/08/2016, nos termos da fundamentação;

c) JULGO IMPROCEDENTE o pedido de indenização por danos morais, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Considerando a sucumbência mínima da parte ré, condeno a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios da ex adversa, estes no percentual de dez por cento sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do Código de Processo Civil. A atualização deverá ser realizada com base no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor na data da liquidação do julgado. Entretanto, as obrigações decorrentes da sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade, em razão da gratuidade de justiça concedida à parte autora (art. 98, § 3º do CPC).

Interposto recurso de apelação, intime-se a parte adversa para apresentar contrarrazões no prazo legal (art. 183, caput, e/ou 1.010, § 1º, do CPC). Após, deve ser dada vista ao recorrente caso sejam suscitadas pelo recorrido as matérias referidas no § 1º do art. 1.009, nos termos do § 2º do mesmo dispositivo. Por fim, remetam-se os autos ao Egrégio TRF da 4ª Região, nos termos do 1.010, § 3º, do Código de Processo Civil.

Apelou a autora sustentando que apresentou prova material, corroborada pela prova testemunhal, suficiente e capaz de comprovar o seu labor rural pelo período necessário à concessão do benefício.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

Da aposentadoria por idade rural: considerações gerais

A apreciação de pedido de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei 8.213/91), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei 8.213/91. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondente à carência exigida nas aposentadorias em geral, sendo, porém, dispensável o recolhimento de contribuições.

Quanto ao ano a ser considerado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei 8.213/91, será aquele em que o segurado completa a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, nesse caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).

Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício seguirá a tabela progressiva do mencionado artigo.

Nos termos do tema 642 do STJ, “o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.”

Nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994, data da publicação da Medida Provisória 598 (posteriormente convertida na Lei 9.063/95), que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei 8.213/91, e sim a redação original do art. 143, II, da mesma lei, em respeito ao direito adquirido (STF, RE 168.191, Segunda Turma, Rel. Ministro Marco Aurélio, julgado em 01/04/1997).

Quanto aos segurados especiais que implementarem os requisitos para concessão do benefício após 31 de dezembro de 2010, não deve ser aplicado o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I, sem limite de data.

O trabalhador rural que atua como boia-fria, diarista ou volante, deve ser equiparado, para os fins da aposentadoria rural por idade, ao segurado especial, a ele se aplicando, em consequência, o disposto no art. 39, I, da Lei 8.213/91, sem as limitações temporais previstas no art. 143 da mesma lei. Não há o que justifique tratamento diferenciado, especialmente se considerada a maior vulnerabilidade social a que está sujeito o trabalhador rural sem vínculo empregatício e desprovido dos meios para, por conta própria, retirar seu sustento e de sua família do trabalho na terra.

Desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente esse, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STF, RE 631.240, com repercussão geral, Plenário, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).

Da comprovação do tempo de atividade rural

Com relação à prova do exercício da atividade rural, na condição de segurado especial, como regra geral, exige-se, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (STJ - REsp 1.348.633/SP, Primeira Seção, Rel.Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 28/08/2013).

O Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive o informal (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).

Além disso, o início de prova material não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.

Aliás, a relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012).

No entanto, segundo precedente do Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo, embora possível para fins de comprovação da atividade rural, a extensão de prova material em nome de um dos membros do núcleo familiar a outro, a extensibilidade da prova fica prejudicada no caso de o cônjuge em nome do qual o documento foi emitido passar a exercer labor incompatível com o trabalho rural, como no meio urbano (STJ, RESP 1.304.479/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).

Por outro lado, comprovado o desempenho de atividade rural por meio de documentos em nome do segurado ou de ente familiar que permaneça na lida rural, corroborado por prova testemunhal, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais. Assim, o fato por si só do cônjuge ter exercido labor urbano e hoje perceber aposentadoria de origem urbana ou permanecer trabalhando em atividade que não a rural, não afasta a condição de segurado especial, da parte interessada, desde que esta disponha de início de prova material independente do cônjuge.

Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.

Ressalte-se que não constituem início de prova material as declarações emitidas por sindicato de trabalhadores rurais quando não tiverem a homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), pois equivalem a meros testemunhos reduzidos a termo (STJ- EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.010.725/MS, Quinta Turma, Rel.Ministro Marco Aurélio Bellize, julgado em 06/11/2012; STJ, AgRg no REsp 1.291.466/MG, Quinta Turma, Rel. Ministro Newton Trisotto, julgado em 18/11/2014; STJ, AR 3.202/CE, Terceira Seção, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 23/04/2008).

Da prova da atividade em regime de economia familiar

O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".

A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR também não tem o condão de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não).

A circunstância de a propriedade ser superior a quatro módulos rurais ou de haver a utilização de maquinário agrícola, não retiram, isoladamente, a condição de segurado especial, nem descaracterizam o regime de economia familiar. Não há lei, inclusive, que exija que o segurado desenvolva a atividade manualmente (STJ, REsp 1.403.506/MG, Segunda Turma, Rel. Ministra Eliana Calmon, julgado em 03/12/2013, e TRF4-APELREEX 0005826-82.2010.404.9999/PR, 6º Turma, Rel. Des. Celso Kipper, julgado em 06/04/2011).

É de se ressaltar ainda que o exercício de pequenos períodos de labor urbano, não retira do interessado a condição de trabalhador rural. O exercício da atividade rural pode ser descontínuo (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 297.322/PB, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 13/08/2013).

Quanto à classificação da atividade como urbana ou rural é questão de apreciação da prova material produzida pelo interessado, não decorrendo de prévia definição ou categorização legal. Conforme a prova que foi produzida, pode-se reconhecer trabalho rural na cidade, bem como trabalho urbano no meio rural. (Trf-4 - apelreex 2005.71.00.044110-9, 5º Turma, Rel. Juiz Artur César de Souza, julgado em 10/02/2009).

Do caso concreto

A parte autora preencheu o requisito etário (55 anos) em 24/03/2014, pois nascida em 24/03/1959 (ev.1-PROCADM7, fl. 3). O requerimento administrativo foi apresentado em 19/08/2016 (ev.1-PROCADM7, fl. 4). Dessa forma, deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 180 meses ainda que de forma descontínua, devendo estar em atividade no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário/requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.

No caso concreto, foi reconhecido em sentença o período de atividade rural, como segurada especial da autora, de 01/01/2012 a 19/08/2016, e administrativamente o período de 01/01/2009 a 19/08/2016 (ev.19-PROCADM5, fl.20); restringindo-se então, a controversia nos autos ao reconhecimento do período, laborado em regime de economia familiar, de 01/01/1999 a 31/12/2008.

Para fazer prova do exercício de atividade rural, foram acostados os seguintes documentos:

- certidão de casamento da autora, qualificando seu marido como trabalhador rural, datada de 1982 (ev.1-OUT4, fl. 3);

- matrícula de imóvel rural (8.236) com área de 14ha,21,50, em nome dos pais da autora, qualificados como agricultor/trabalhadora rural, datada de 1988; transmitidos à autora em herança - 2ha no ano de 2009 e como doação - 59a.9ca6ma no ano de 2011 (ev.1-PROCADM7, fls. 9-14);

- matrícula de imóvel rural (3.379) em nome do pai da autora, qualificado como agricultor, com área de 4ha, datado de 1985 (ev.1-PROCADM7, fls. 15-18);

- matrícula de imóvel rural (13.182) com área de 20ha, em nome do pai da autora, (ev.1-PROCADM7, fls. 19-20);

- matrícula de imóvel rural (2.255) com área de 8ha,12a,59ca e 6ma, em nome do pai da autora, datada de 1977 (ev.PROCADM7, fls. 22-24);

- Ficha de cadastro junto a sindicato dos trabalhadores rurais, em nome dos pais da autora, com registros nos anos de 1976 a 1992, onde constam como dependentes a autora e seus irmãos: Sueli, Dirce, Manoel, José Pedro, Ciro, Walter, Cleonice e Marisa (ev.1-PROCADM7, fl.25);

- notas de produtor rural, em nome do pai da autora, datadas de 1992, 1995 a 1999 e 2000 (ev.1-PROCADM7, fls. 61-75);

- notas de produtora rural, em nome da autora e de seu marido, datadas de 2012 a 2016, (ev.1-PROCADM7, fls. 76-85);

- recibos de declaração de imposto sobre propriedade territorial rural - ITR, em nome da mãe da autora, para propriedade com área de 42,7 ha, datados de 2009 a 2015 (ev. 1-PROCADM7, fls. 86-113);

- recibos de declaração do ITR, em nome do pai da autora, para propriedade com área de 52ha, referentes aos exercícios de 1997 e 1998 (ev.1-PROCADM7, fls. 114-117);

A partir da Medida Provisória 871/2019, convertida na Lei 13.846/2019, que deu nova redação a dispositivos da Lei de Benefícios da Previdência Social, permitiu-se a comprovação do tempo de atividade rural por meio de autodeclaração, ratificada por outros elementos e consulta às bases governamentais.

A parte autora jutou a referida autodeclaração. Contudo verifica-se que o período informado foi de 01/01/2009 a 19/08/2016. Do mesmo modo na declaração de próprio punho juntada, a autora informa que trabalhava juntamente com seus pais e irmãos e após o casamento juntamente com seu marido, fazendo referência apenas ao período de 01/01/2009 a 19/08/2016 (ev.56-ANEXO2-3).

A autora apresentou CTPS onde consta vínculo no cargo de "serviços gerais" em estabelecimento agropecuário, no período de 1982 a 1985, não havendo registros posteriores de atividade laborativa (ev.19-PROCADM2, fls. 22-39). Verifico ainda que foi juntado processo administrativo do marido da autora, referente à sua aposentação por idade, no qual foram reconhecidos vínculos na condição de empregado, anteriores a 1991 e de 01/01/2012 a 19/06/2016, na propriedade da familía (ev.1-PROCADM8-9).

Sendo assim, para o período controverso verifica-se que, além da propriedade da terra dos pais, há apenas notas de produtor rural em nome do pai da autora, datadas de 1999 e 2000, não tendo restado comprovado que a autora permaneceu exercendo atividade rural, em regime de economia familiar, com seus pais e irmãos, mesmo após o casamento.

Os documentos trazidos aos autos são insuficiente para configurar início de prova material, para a comprovação do labor rural da autora período de 01/01/1999 a 31/12/2008.

Não é possível desconsiderar a dificuldade encontrada, notadamente pelos trabalhadores rurais, para a comprovação do tempo de serviço prestado nas lides campesinas, uma vez que o trabalho, no mais das vezes, é exercido informalmente.

Em razão dessa dificuldade de obter registros documentais acerca das atividades exercidas pelo trabalhador rural, evidenciada através dos inúmeros feitos que demandam a análise de tempo rural, alguns julgados vêm autorizando, excepcionalmente, a extinção do processo sem resolução de mérito. Essa alternativa de resolução do processo, reservada às hipóteses em que evidenciada a insuficiência ou mesmo a ausência de prova material do período que se pretende comprovar como de labor rural, já foi adotada nas Turmas especializadas em Direito Previdenciário desta Corte (AC 2001.04.01.075054-3- Rel. Des. Federal Antonio Albino Ramos de Oliveira - DJ 18.09.2002; AC 2001.70.01.002343-0, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz - DJ 21.05.2003).

Considerando o interesse social que envolve as demandas previdenciárias, deve-se priorizar a busca da verdade real, notadamente em relação àqueles trabalhadores cuja dificuldade de obter documentos hábeis a demonstrar seu trabalho é notória, como é o caso dos trabalhadores rurais que postulam a aposentadoria por idade.

Neste sentido, e em sendo consistente a prova testemunhal, não se mostra adequado inviabilizar ao demandante o eventual direito à proteção social, com um decreto de improcedência do pedido e consequente formação da coisa julgada material.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.352.721/SP, em sede de recurso representativo de controvérsia, decidiu nessa linha:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.

1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.

2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.

3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas.

4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social.

5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.

6. Recurso Especial do INSS desprovido.

(REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016)

Em suma, o STJ estabeleceu o entendimento de que na hipótese de ajuizamento de ação com pedido de concessão de aposentadoria rural por idade, a ausência/insuficiência de prova material não é causa de improcedência do pedido, mas sim de extinção sem resolução de mérito. Assegura-se, como isso, caso o segurado especial venha a obter outros documentos que possam ser considerados prova material do trabalho rural, a oportunidade de ajuizamento de nova ação sem o risco de ser extinta em razão da coisa julgada.

Creio que o caso em tela se amolda à orientação traçada no julgamento do Recurso Especial acima citado, pois insuficiente início de prova material do labor rural correspondente ao período de carência necessário à concessão da aposentadoria rural por idade postulada.

Logo, à míngua de conteúdo probatório material válido a instruir a inicial, conforme disposto no art. 320 do CPC, por implicar carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, autorizada a extinção do feito sem o julgamento do mérito. Dessa forma, possibilita-se que a parte autora postule em outro momento, caso obtenha prova material hábil a demonstrar o exercício do labor rural pelo período de carência necessária, a concessão da aposentadoria rural por idade, conforme orientação traçada no recurso representativo de controvérsia, REsp 1.352.721/SP.

Dessa forma, considerando a insuficiência de prova material apta a comprovar o efetivo exercício do labor rural e os períodos reconhecidos administrativamente, o processo deve ser extinto sem resolução do mérito, em relação ao período de 01/01/1999 a 31/12/2008, nos termos do art. 485, IV e art. 320 do Código de Processo Civil.

Honorários advocatícios

Negado provimento ao recurso da autora, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC. Observada gratuidade judiciária concedida à parte autora.

Conclusão

Honorários advocatícios majorados nos termos do §11 do artigo 85 do CPC. Nos demais pontos, mantida a sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004392768v24 e do código CRC 2e59b73f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 19/4/2024, às 18:39:24


5000294-86.2019.4.04.7134
40004392768.V24


Conferência de autenticidade emitida em 27/04/2024 04:00:59.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000294-86.2019.4.04.7134/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: CLENIRA PEDROSO DOS SANTOS (AUTOR)

ADVOGADO(A): HENRIQUE OLTRAMARI (OAB RS060442)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. INSUFICIENTE. JULGAMENTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.

1. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação (art. 267 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa.

2. Solução aplicável às ações para concessão de aposentadoria rural por idade, em que a parte autora não reúne documentação mínima a configurar início de prova material do labor campesino, embora tenha produzido prova testemunhal indicativa da veracidade dos fatos que alega.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 17 de abril de 2024.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004392769v5 e do código CRC 4b622402.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 19/4/2024, às 18:39:24


5000294-86.2019.4.04.7134
40004392769 .V5


Conferência de autenticidade emitida em 27/04/2024 04:00:59.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/04/2024 A 17/04/2024

Apelação Cível Nº 5000294-86.2019.4.04.7134/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE

APELANTE: CLENIRA PEDROSO DOS SANTOS (AUTOR)

ADVOGADO(A): HENRIQUE OLTRAMARI (OAB RS060442)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/04/2024, às 00:00, a 17/04/2024, às 16:00, na sequência 467, disponibilizada no DE de 01/04/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juíza Federal ADRIANE BATTISTI

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 27/04/2024 04:00:59.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora