Apelação Cível Nº 5003953-59.2020.4.04.7202/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
APELANTE: MARCIA ELISA MOSSI HAIDUK (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
MARCIA ELISA MOSSI HAIDUK ajuizou ação ordinária, em 14/05/2020, objetivando o restabelecimento da concessão de benefício por incapacidade desde a cessação administrativa, em 09/09/2016 (NB 611.000.378-0). Asseverou que a sua incapacidade decorre de moléstias ortopédicas.
Sobreveio sentença de parcial procedência que concedeu à parte autora o benefício por incapacidade temporária (auxílio-doença), nos seguintes termos (
, na origem):[...]
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido contido na inicial, extinguindo o feito com resolução de mérito (art. 487, I, do CPC), para condenar o INSS a:
(a) Conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença, com DIB em 09/07/2020 (DER), RMI e RMA a ser calculada pelo INSS, e DIP em 09/2020, com DCB em 31/07/2021, cabendo à segurada, em caso de manutenção da incapacidade, pleitear administrativamente, com antecedência, a prorrogação do benefício;
(b) DEFIRO, com fundamento no art. 300 do CPC, a tutela provisória, a fim de determinar que o INSS, no prazo de 20 (vinte) dias a contar de sua intimação em relação a esta sentença, cumpra obrigação de fazer, consistente em imediata implantação do benefício de auxílio-doença, com DIB em 09/07/2020.
[...]
Recorreu a parte autora e, nas razões de seu apelo, sustentou, em síntese, que a data de início do benefício (DIB) deve corresponder à cessação administrativa (09/09/2016) - ou, subsidiariamente, à data fixada na perícia como provável início da incapacidade (09/01/2020) - e não à data em que realizada a perícia (09/07/2020), conforme definiu a sentença (
, na origem).Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
1. Admissibilidade
Juízo de admissibilidade
O(s) apelo(s) preenche(m) os requisitos legais de admissibilidade.
2. Mérito
Na situação versada nos autos, a controvérsia recursal cinge-se à verificação da Data de Início do Benefício - DIB.
A sentença, quanto ao ponto, após reconhecer a incapacidade laboral da parte autora, de modo total e temporário, delimitou que DIB deveria corresponder à data em que realizada a perícia médica (09/07/2020) -
, no feito originário:Do início do benefício
Quanto ao termo inicial do benefício, cumpre assinalar que recentemente a Turma Nacional de Uniformização firmou entendimento no sentido de que a DIB deve corresponder à data do ajuizamento da ação quando a perícia judicial concluir que a incapacidade iniciou após o requerimento administrativo e antes da propositura da ação (PEDILEF 200971670022131, JUIZ FEDERAL ADEL AMÉRICO DE OLIVEIRA, DOU 11.05.2012). Assim, em resumo, (1) quando o perito judicial logra aferir o quadro incapacitante desde a data do requerimento administrativo, este é o termo inicial do benefício. Sendo (2) a incapacidade posterior à DER, mas anterior ao ajuizamento da ação, a data da propositura deve figurar como termo inicial da benesse. Por fim, (3) caso a incapacidade seja posterior ao pleito judicial, deve-se fixar o início do benefício na data de citação da autarquia ou na própria data da perícia, quando esta não é concomitante ao ato que chama a Juízo o réu para se defender.
Assim, o benefício de auxílio-doença deve ser concedido à parte autora desde 09/07/2020 - data da perícia judicial, diante da conclusão que consta no laudo pericial de que a incapacidade teria iniciado em 09/01/2020.
A parte autora, nas razões de seu apelo, sustentou que a DIB deveria corresponder à DCB (
, na origem):Assim, no entendimento do STJ e do TRF-4, o termo inicial do benefício é a data da cessação administrativa, quando comprovada a incapacidade naquela data, como é o caso dos autos.
Segundo a parte autora, a incapacidade laboral estaria evidenciada desde a DCB (09/09/2016 - NB 611.000.378-0,
, na origem) e houve expresso requerimento para a concessão do benefício a contar dessa data ( , p. 9).O laudo pericial, por sua vez, delimitou em sua anamnese que a parte autora "Em 2014 começou sentir cansaço e dor generalizada. Acordo sem conseguir se mexer. Consultou com reumatologista, que fez diagnóstico de artrite reumatóide. Iniciou o uso de Metotrexato, mas apresentou muitos efeitos colaterais. Refere que as articulações que mais incomodam é o punho direito, e cotovelo esquerdo, atualmente começou com dor em joelho.Relata rigidez matinal" (
).Apesar dessa indicação de data (2014), o perito concluiu que se trata de quadro de incapacidade temporária (o que foi acatado pela sentença recorrida), mas delimitou a DII em 09/01/2020, que foi "fixada com base na data do atestado do médico assistente". Além disso, fixou a DCB em 06/07/2021, por se tratar de uma data possível para a estabilização dos sintomas.
Em relação à DIB - e como critério geral - pode-se afirmar que ela será fixada a partir dos seguintes parâmetros:
- quando o perito judicial logra aferir o quadro incapacitante desde a data do requerimento administrativo, este é o termo inicial do benefício;
- sendo a incapacidade posterior à DER, mas anterior ao ajuizamento da ação, a data da citação deve figurar como termo inicial do benefício e, por fim,
- caso a incapacidade seja posterior ao pleito judicial, deve-se fixar o início do benefício na DII.
Na situação posta nos autos, como visto, a perícia, realizada em 09/07/2020, fixou que a incapacidade laboral já existia em 09/01/2020 (a DCB ocorreu em 09/09/2016 e o novo requerimento administrativo - NB 616.678.458-2 - foi apresentado e indeferido em 28/11/2016). Houve, assim, a fixação de uma data específica de início da incapacidade no laudo pericial, anterior ao ajuizamento da ação (14/05/2020).
A sentença, contudo, adotou data diversa para a DIB: 09/07/2020, correspondente à data em que realizada a perícia.
O benefício controvertido nos autos (NB 611.000.378-0) foi concedido entre 29/05/2015 e 09/09/2016 a partir do quadro clínico de "outras artrites reumatóides especificadas" (CID M068), que se trata da mesma moléstia examinada em outras averiguações periciais do INSS (entre julho de 2015 e dezembro de 2016) -
.O INSS considerou, em 09/09/2016 (
, p. 3), que a patologia estava "estabilizada com uso das medicações". A parte autora, por sua vez, juntou aos autos do processo os seguintes documentos, como forma de demonstrar que a incapacidade persistia desde então (o que indicaria a indevida cessação do benefício): (1) atestados médicos, vinculados ao CID M068, de 26/10/2015, 25/04/2016, 05/09/2016, 19/12/2016, 09/01/2020 e 05/12/2019 ( ); (2) comprovantes de fornecimento de medicamentos e receituários médicos também vinculados ao mesmo quadro clínico (CID M068), de 30/06/2015 ( ) e referentes aos anos de 2014 a 2020 ( ); (3) hemograma, de 01/11/2019 ( ) e (4) atestado médico referindo tratamento contínuo da doença (CID M068) desde junho de 2014 e datado de 05/08/2020 ( ).À exceção do hemograma juntado aos autos, todos os demais documentos apresentados pela parte autora fazem referência, direta ou indiretamente, à doença catalogada no código CID M068. Há referência à doença nos anos compreendidos entre 2014 e 2020. Essa perspectiva, aliás, foi observada pelo perito judicial (
), ao fixar o início da doença em 2014.Isso é evidenciado a partir dos sucessivos laudos médicos, citados pelo expert, que referem contínuos afastamentos do trabalho entre 2015 e 2020 (
):Atestados:
a) 09/01/2020. Atestado de 180 dias de afastamento, CID M068. Emitido por Dr Felix José Trentin Filho CRMSC 7642.
b) 05/12/2019. Atestado de 60 dias de afastamento, CID F34.9. Emitido por Dra Lilian Kaempf CRMSC 8603.
c) 19/12/2016. Atestado de 180 dias de afastamento, CID M068. Emitido por Dr Felix José Trentin Filho CRMSC 7642.
d) 05/09/2016. Atestado de 180 dias de afastamento, CID M068. Emitido por Dr Felix José Trentin Filho CRMSC 7642.
e) 25/04/2016. Atestado de 180 dias de afastamento, CID M068. Emitido por Dr Felix José Trentin Filho CRMSC 7642.
f) 26/10/2015. Atestado de 180 dias de afastamento, CID M068. Emitido por Dr Felix José Trentin Filho CRMSC 7642.
Os documentos apresentados pela parte autora delimitam, entretanto, a existência da doença de ordem ortopédica referida na petição inicial (CID M068) mas não indicam, sob qualquer aspecto, o quadro de incapacidade dela decorrente em data anterior àquela fixada na perícia.
Entre a DCB do benefício anterior (09/09/2016) e a DII fixada no laudo pericial (09/01/2020) decorreram aproximadamente 3 anos e 3 meses. Trata-se de um período considerável em que, em tese, poderia ter ocorrido o agravamento da doença.
Contudo, os atestados médicos indicados acima referem, após a DCB (09/09/2016), dois afastamentos de 180 dias (em dezembro de 2019 e em janeiro de 2020) pelo CID M068. Os demais atestados estão abrangidos pelo período correspondente ao benefício que foi cessado em 09/09/2016 ou contemplam CID diverso.
A análise do CNIS revela, ainda, que após a DCB (09/09/2016) a parte autora gozou de auxílio por incapacidade temporária entre 09/07/2020 e 10/12/2021 (NB 632.624.910-8 -
), mas, antes disso, e desde 03/2017 (como segurada obrigatória), de 02/2018 (como segurada facultativa) e de 02/2019 (como contribuinte individual), seguiu vertendo contribuições previdenciárias. Mesmo após a DCB do NB 632.624.910-8 (10/12/2021) a parte autora prosseguiu com os recolhimentos previdenciários como segurada facultativa e, após, como contribuinte individual ( ).Não há, portanto, como retroagir ou modificar, in casu, a DIB fixada na sentença.
A retroação da DIB implicaria considerar um quadro de incapacidade existente na DCB do NB 611.000.378-0 o que, como visto, não ocorre.
A modificação, para fins de adaptação da DIB à DII é igualmente descabida, pois como a DII fixada na perícia (09/01/2020) é anterior à data de ajuizamento da ação (14/05/2020), a solução consistiria em fixar a nova DIB na data da citação (26/07/2020 - evento 32) e não na data da perícia (09/07/2020). Essa providência, contudo, geraria inequívoco prejuízo à parte autora, pois a sentença considerou DIB mais vantajosa (09/07/2020), em evidente caso, se adotada essa providência, de “reformatio in pejus”.
Em conclusão, deve ser mantida a DIB fixada na sentença (data da perícia - 09/07/2020).
Ônus da sucumbência
Sendo desacolhida a pretensão, a parte autora deverá arcar com o pagamento dos ônus sucumbenciais.
Uma vez que a sentença foi proferida após 18/3/2016 (data da vigência do CPC/2015), aplica-se a majoração prevista no artigo 85, §11, desse diploma, observando-se os ditames dos §§ 2º a 6º quanto aos critérios e limites estabelecidos. Assim, majoro a verba honorária em 50% sobre o percentual mínimo da primeira faixa (art. 85, §3º, inciso I, do CPC), tendo em conta a pretensão máxima deduzida na petição inicial.
No entanto, resta suspensa a exigibilidade da referida verba, por força da gratuidade de justiça, cumprindo ao credor, no prazo assinalado no § 3º do artigo 98 do CPC/2015, comprovar eventual alteração da situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da benesse.
Honorários periciais
Honorários periciais a cargo da parte vencida. Caso a referida despesa processual tenha sido antecipada pela administração da Justiça Federal, seu pagamento deverá ser realizado mediante reembolso, nos termos do art. 32 da Resolução 305/2014, do Conselho da Justiça Federal.
Custas processuais
Sucumbente, a parte autora responde pelas custas e despesas processuais.
No entanto, resta suspensa a exigibilidade das referidas verbas, por força da gratuidade de justiça, cumprindo ao credor, no prazo assinalado no §3º do artigo 98 do CPC/2015, comprovar eventual alteração da situação de insuficiência de recursos justificadora da concessão da benesse.
Prequestionamento
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pela parte autora cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Conclusão
Mantida a sentença de que fixou a DIB na data da perícia.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004364802v33 e do código CRC 905740ae.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5003953-59.2020.4.04.7202/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
APELANTE: MARCIA ELISA MOSSI HAIDUK (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. incapacidade demonstrada. DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO. DATA DA PERÍCIA.
1. Em relação à DIB - e como critério geral - pode-se afirmar que ela será fixada a partir dos seguintes parâmetros: quando o perito judicial logra aferir o quadro incapacitante desde a data do requerimento administrativo, este é o termo inicial do benefício; sendo a incapacidade posterior à DER, mas anterior ao ajuizamento da ação, a data da citação deve figurar como termo inicial do benefício e, por fim, caso a incapacidade seja posterior ao pleito judicial, deve-se fixar o início do benefício na DII.
2. Sentença adotou com data de início do benefício (DIB) a data em que realizada a prova pericial.
3. Os documentos apresentados pela parte autora delimitam a existência da doença de ordem ortopédica referida na petição inicial, mas não indicam, sob qualquer aspecto, o quadro de incapacidade dela decorrente em data anterior àquela fixada na perícia.
4. A retroação da DIB implicaria considerar um quadro de incapacidade existente na data de cessação do benefício anterior, o que, no caso dos autos, não ocorre.
5. A DIB fixada na sentença (data da perícia) é mais vantajosa, in casu, à parte autora do que a DIB eventualmente fixada na data da citação, o que afasta a possibilidade de modificação da sentença no ponto, sob pena de "reformatio in pejus”.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 10 de abril de 2024.
Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA FERRO BLASI, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004364803v8 e do código CRC d85896cc.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/04/2024 A 10/04/2024
Apelação Cível Nº 5003953-59.2020.4.04.7202/SC
RELATORA: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO
APELANTE: MARCIA ELISA MOSSI HAIDUK (AUTOR)
ADVOGADO(A): LISANDRÉIA TONIN THOMÉ (OAB SC024032)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/04/2024, às 00:00, a 10/04/2024, às 16:00, na sequência 414, disponibilizada no DE de 20/03/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 23/04/2024 12:01:12.