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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. TRF4. 5013671-65.2019.4.04.9999

Data da publicação: 25/04/2024, 07:34:05

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. 1. Os pronunciamentos judiciais podem ser confrontados por embargos de declaração quando se alegar a presença de obscuridade, contradição, omissão ou erro material (art. 1.022, CPC). 2. Ausente o vício alegado, o recurso é acolhido exclusivamente para fins de prequestionamento (art. 1.025, CPC) (TRF4, AC 5013671-65.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR, juntado aos autos em 17/04/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5013671-65.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

EMBARGANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de embargos declaratórios opostos pelo INSS em face de acórdão que rejeitou o pedido de devolução de valores com base no Tema 692/STJ.

O embargante requer previamente, com base nos arts. 313, V, e 1.030, do CPC, a suspensão do processo até que sejam julgados os embargos de declaração opostos na decisão que resolveu o Tema 692/STJ.

Alega omissão quanto à possibilidade de cobrança, por meio de cumprimento de sentença, de valores pagos em decorrência de tutela provisória finalmente revertida pela improcedência do pedido deduzido na demanda originária, tendo em vista a combinação dos arts. 297, 302, I e II; e 520, I e II; e §5º, todos do CPC, mais o julgamento do Tema 692/STJ (Pet 12482/DF). Pede prequestionamento.

É o relatório.

VOTO

Suspensão do julgamento

Não se verifica nenhuma hipótese para a aplicação da previsão contida no inc. V do art. 313 do CPC, na medida em que o julgamento dos embargos de declaração opostos pelo INSS nos autos da Petição 12.482/DF não tem ressonância prejudicial direta sobre o desate do presente recurso, que limites estritos e específicos, consistentes em sanar eventuais vícios intrínsicos da decisão, sem relação com fatos externos que poderão ser objeto de deliberação em momento posterior segundo a legislação processual civil. Não é outra a conclusão relativamente ao inc. III do art. 1.030 do CPC, porquanto já houve pronunciamento do STJ acerca da questão central objeto do Tema 692.

Vícios justificadores de embargos de declaração

Os pronunciamentos judiciais podem ser confrontados por embargos de declaração quando se alegar a presença de obscuridade, contradição, omissão ou erro material (art. 1.022, CPC).

Trata-se, portanto, de recurso que exige fundamentação vinculada e que não objetiva o rejulgamento da causa, menos ainda o reexame das provas ou de fundamentos jurídicos já apreciados anteriormente (assim: STJ, EDcl no MI n. 193/DF, Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Corte Especial, julgado em 4/10/2006, DJ de 30/10/2006, p. 209; EDcl no AgInt no AREsp n. 1.572.904/PR, Relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 24/10/2022, DJe de 27/10/2022; TRF4 5031835-34.2021.4.04.0000, Corte Especial, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, juntado aos autos em 31/03/2022).

Por outro lado, configura-se omissão quando a decisão não trata de algum dos pedidos ou não trata de questão que influenciaria no resultado do julgamento, seja pelo acolhimento, seja pela rejeição do pedido. Em especial, há omissão quando ausente algum dos deveres relacionados à fundamentação ou quando o órgão judicial deixar de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso (art. 1.022, parágrafo único, CPC).

Adiciona-se que a contradição se faz presente quando surgem afirmações antagônicas ou que, internamente, conduzem a resultados incompatíveis entre si. Frisa-se que "não é contraditória a decisão que aplica o ordenamento jurídico da forma contrária aos interesses do recorrente" (TRF4 5000864-03.2020.4.04.0000, Corte Especial, Relator João Batista Pinto Silveira, juntado aos autos em 31/05/2021).

A obscuridade, por seu turno, se implementa com a falta de clareza no pronunciamento atacado, enquanto o erro material exige inexatidões numéricas ou redacionais.

In casu, o voto condutor do aresto embargado enfatiza o seguinte:

A respeito da devolução dos valores recebidos por beneficiário do Regime Geral da Previdência Social em virtude de tutela provisória posteriormente revertida, o Superior Tribunal de Justiça firmou, na proposta de revisão do Tema 692, a seguinte tese:

Tema 692 - A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.

A despeito, tenho que é inviável processualmente a devolução dos valores recebidos se a questão não foi solvida por meio de decisão condenatória da parte autora.

Prevalecente em tal caso a presença da boa-fé objetiva, em que a parte demandante, diante do trânsito em julgado, passa a ter legítima expectativa acerca da definitividade dos valores que recebeu.

Acerca do tópico, o próprio Superior Tribunal de Justiça, nos debates travados por ocasião do julgamento do Tema 692, fez referência expressa à boa-fé objetiva como elemento distintivo. A propósito, por pertinente, transcrevo excerto do voto proferido pelo Min Herman Benjamin no julgamento do REsp 1.401.560:

"Não é suficiente, pois, que a verba seja alimentar, mas que o titular do direito o tenha recebido com boa-fé objetiva, que consiste na presunção da definitividade do pagamento.

Esses são, portanto, os parâmetros para a resolução da presente controvérsia, os quais foram confirmados no já citado precedente por mim relatado aqui mesmo na Primeira Seção (REsp 1.384.418/SC, DJe 30/08/2013).

Diante de tais premissas, não há dúvida, com todas as vênias aos entendimentos em contrário, de que os provimentos oriundos de antecipação de tutela relativos a benefícios previdenciários têm caráter alimentar e são recebidos legitimamente pelo segurado enquanto em vigor o título judicial precário.

O ponto nodal, por sua vez, consiste no requisito objetivo relativo à percepção, pelo segurado, da definitividade do pagamento recebido via tutela antecipatória.

De acordo com os parâmetros acima delineados, a decisão que antecipa liminarmente a tutela, na forma do art. 273 do CPC, não enseja a presunção, pelo segurado, de que os valores recebidos integram, em definitivo, o seu patrimônio.

Não há legitimidade jurídica para que o segurado presuma o contrário, até porque invariavelmente está o jurisdicionado assistido por advogado, e, por força do disposto no art. 3º da LINDB ("ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece"), deve estar ciente da precariedade do provimento judicial que lhe é favorável e da contraposição da autarquia previdenciária quanto ao mérito.

Não se pode, contudo, atrelar ao conceito de boa-fé objetiva o fato de o segurado receber legitimamente (decisão judicial) o benefício previdenciário. Essa hipótese está ligada ao caráter subjetivo da boa-fé, que é inquestionavelmente presente.

(...)

Trago, além da crítica relativa à distinção entre boa-fé objetiva e subjetiva, fundamento pragmático e axiológico à baila.

Evidencia-se a desproporcionalidade entre duas situações: nas hipóteses em que o Poder Judiciário desautoriza a reposição ao Erário em casos como o dos autos, e naqueles em que o próprio segurado pode tomar empréstimos e consignar descontos em folha. Isto é, o Erário "empresta" (via antecipação de tutela posteriormente cassada) ao segurado e não pode cobrar nem sequer o principal. Já as instituições financeiras emprestam e recebem, mediante desconto em folha, não somente o principal como também os juros remuneratórios.

É devida, portanto, a devolução dos valores de benefícios previdenciários recebidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada.

Não obstante tal entendimento, o princípio da dignidade da pessoa humana deve incidir in casu como diretriz da forma de ressarcimento, conforme passarei a fundamentar abaixo."

Não se desconhece que o acórdão do REsp 1.401.560, onde firmada a tese original do Tema 692, foi substituído pelo acórdão da Pet 12.482/DF quando da revisão da tese, reafirmada com suporte na ideia de que a decisão que concede tutela provisória não possui caráter de definitividade, sendo, portanto, reversível, afastando a boa-fé objetiva.

Contudo, tal não se aplica em relação à decisão que, embora desfavorável à parte autora, transita em julgado sem qualquer determinação de devolução dos valores, situação definitiva que afirma a presença da boa-fé objetiva, tornando descabida nesta sede o cumprimento de sentença quanto ao crédito reclamado pelo INSS."

Outrossim, à guisa de complementação, é oportuno salientar que na Questão de Ordem suscitada com o propósito de revisar a decisão resolutória do Tema 692/STJ, foram submetidos os seguintes tópicos à apreciação, relevantes ao detalhamento da tese vertida no tema 692:

a) tutela de urgência concedida de ofício e não recorrida;

b) tutela de urgência concedida a pedido e não recorrida;

c) tutela de urgência concedida na sentença e não recorrida, seja por agravo de instrumento, na sistemática processual anterior do CPC/1973, seja por pedido de suspensão, conforme o CPC/2015; d) tutela de urgência concedida initio litis e não recorrida;

e) tutela de urgência concedida initio litis, cujo recurso não foi provido pela segunda instância;

f) tutela de urgência concedida em agravo de instrumento pela segunda instância;

g) tutela de urgência concedida em primeiro e segundo graus, cuja revogação se dá em razão de mudança superveniente da jurisprudência então existente;

h) tutela de urgência concedida e cassada, a seguir, seja em juízo de reconsideração pelo próprio juízo de primeiro grau, ou pela segunda instância em agravo de instrumento ou mediante pedido de suspensão;

i) tutela de urgência cassada, mesmo nas situações retratadas anteriormente, mas com fundamento expresso na decisão de que houve má-fé da parte ou afronta clara a texto de lei, como no caso das vedações expressas de concessão de medida liminar ou tutela antecipada.

A revisão da tese considerou, ainda, a alteração legislativa levada a efeito pela Lei 13.846/19 - que modificou a redação do art. 115, II, da Lei 8.213/91 - a dissipar qualquer dúvida sobre a base legal para o decidido pelo STJ. Segundo o Relator da revisão, a mudança do diploma legal sufragou o entendimento vinculante anterior, consubstanciado no julgamento original do Tema 692/STJ.

Cediço, portanto, que a extensão da aplicação do tema é abrangente, devendo incidir nos diversos casos previstos tanto em seu julgamento original quanto naqueles que ensejaram a revisão da jurisprudência, suuprarreferidos. Portanto, aplica-se o Tema 692 ao caso ora em análise.

Em acréscimo, tenho que, mesmo havendo aplicação do julgado vinculante, seus efeitos não incidem sobre todo o valor percebido a título de benefício previdenciário, uma vez que a autorização para devolução não deve se constituir em autorização prévia para invasão das esferas dos direitos fundamentais dos segurados, garantidos pelo texto constitucional e pela legislação previdenciária de modo amplo.

Nesse sentido, trago os fundamentos muito bem lançados pelo eminente Desembargador Roger Raupp Rios, nos autos da Ação 50074628820124047101, julgada por unanimidade na 5ª Turma deste Tribunal:

"Interpretação conforme a Constituição do artigo 115, III, da Lei n.º 8.213/1991: repetibilidade e natureza alimentar

É diante de todo o ordenamento jurídico, em suas disposições materiais e processuais, a começar dos ditames constitucionais, que deve se orientar a aplicação do Tema n.º 692, contexto adequado e mais amplo em que se insere a responsabilidade pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa e o regime de ressarcimento de dano processual, quadro em que se ler o parágrafo único do artigo 302 do CPC (“a indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível.”).

A tutela de urgência, em especial nos litígios previdenciários e assistenciais, além de resguardar a utilidade do processo, configura antecipação da satisfação do direito material perseguido. Como se sabe, benefícios previdenciários e assistenciais, percebidos antecipadamente ou ao final do processo, são prestações positivas derivadas da legislação securitária, direitos subjetivos da legislação de desenvolvimento dos direitos fundamentais sociais, visando à cobertura de riscos sociais e, por conseguinte, à garantia das condições materiais de vida dos segurados; eles correspondem àquilo que o cidadão tem direito, cuja percepção, por circunstâncias de vulnerabilidade social, não alcança condições de aferir no mercado de trabalho, cujo fundamento radica, em última instância, no mínimo existencial, como desdobramento do direito à vida, à dignidade, no Estado Social e na igualdade matéria (nesse sentido, SARLET, Ingo Wolfgang; ZOCKUN, Carolina Zancaner. “Notas sobre o mínimo existencial e sua interpretação pelo STF no âmbito do controle judicial das políticas públicas com base nos direitos sociais”. Revista de Investigações Constitucionais, v. 3, n. 2, p. 115-141, maio/ago. 2016).

Com efeito, saliente-se que eventual reforma de provimento provisório que antecipe o direito material requerido não altera a natureza (no caso, alimentar) daquilo que se percebeu temporariamente (nesse sentido, por todos, Ovídio Araújo Baptista da Silva, cujo rigor e precisão sempre deixaram claro que o provisório e o definitivo gozam da mesma natureza, e que o temporário, ainda que com efeitos limitados no tempo, tem a mesma natureza do definitivo, Do Processo Cautelar, 3 ed. Rio de janeiro: Forense, 2006. p. 86; no mesmo sentido, NERY JÚNIOR, Nelson. Atualidades sobre o Processo Civil: A Reforma do Código de Processo Civil Brasileiro de dezembro de 1994. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1995, p. 52;).

Nessa linha, não se revela logicamente correta objeção que conclua que o recebido por força de liminar reformada não se trataria de alimentos, porquanto a decisão final assim não os considerou. Isso porque, não obstante a conclusão expresse afirmação correta (a decisão final afastou o direito à percepção do requerido), ela se vale de uma premissa incorreta (que o percebido, ainda que provisoriamente, não tivesse natureza alimentar). Raciocínio assim estruturado pode ser qualificado como silogismo erístico, ou seja, baseado em premissas falsas.

O conteúdo do provimento provisório não perde, por eventual reforma posterior, a legitimidade e a juridicidade que dimanam da jurisdição prestada, cujo regular exercício lhe conferiu, enquanto vigente, os atributos de validez, da vigência e da eficácia, inerentes à jurisdição exercida na forma da Constituição e das leis. A norma legal que prevê eventual reforma como causa autorizadora da contraparte ao ressarcimento de prejuízos decorrentes da efetivação da tutela de urgência, como qualquer norma jurídica, não pode ser lida isoladamente, mas somente considerando todo o ordenamento jurídico, nem como norma desqualificadora da juridicidade do provimento reformado. Acaso se entendesse que a reforma de determinado ato judicial, por instância revisora, retirasse do ato recorrido sua juridicidade, sobraçariam o devido processo legal e a própria jurisdição, uma vez que a prevalência da decisão da instância recursal sobre a decisão recorrida resulta da relação de coordenação entre os órgãos judiciais encarregados de aplicar o direito, e não de subordinação.

Postas essas premissas - (1) a nomodinâmica das regras jurídicas que não existem isoladamente, senão no ordenamento jurídico como um todo; (2) a natureza alimentar de benefícios previdenciários e assistenciais recebidos em virtude de provimentos provisórios, ainda que posteriormente reformados e (3) a hierarquia das normas constitucionais, em especial as de direitos fundamentais -, passa-se à definição quanto ao modo de aplicação, em concreto, do artigo 115, III, da Lei n.º 8.213/1991.

De fato, trata-se de tarefa que se coloca no julgamento de cada caso concreto, por diversas razões: (1) seja porque a competência constitucional atribuída ao STJ não adentra em matéria fática; (2) seja porque, consequentemente, as razões e o debate desenvolvidos no julgamento donde extraída a diretriz jurisprudencial em aplicação (REsp n.º 1.401.560/MT) não se ocuparam deste tópico (vale dizer, sobre os limites materiais e processuais a serem observados na execução, em concreto, do dever de ressarcir); (3) seja porque o tematizado centrou-se na afirmação da incidência do artigo 115, sem descompasso com o regime do código de processo civil e as hipóteses explicitadas nos respectivos embargos de declaração; (4) sem, consequentemente, avançar na interpretação sistemática do conteúdo do artigo 115 em si mesmo considerado e, por fim, (5) seja porque é imperiosa a consideração dos ditames constitucionais no “mecanismo legal de devolução de valores” (conforme desenvolvido no voto do Ministro Herman Benjamin, ponto que acabou não sendo cogitado pelos demais votos, nem sendo objeto do decidido).

Diante deste quadro, há que se fixar, no mecanismo de devolução de valores desencadeado pela aplicação do aludido artigo 115, inciso III, interpretação conforme a Constituição que, ao mesmo tempo que afirma sua harmonia com o direito processual codificado, concretiza os limites de tal mecanismo em concordância prática com os direitos fundamentais do mínimo existencial, do direito à vida, à dignidade, à igualdade material e à previdência e assistência social, bem como atento ao princípio do Estado Social.

Daí a necessidade de dispor sobre interpretação do texto legal que conduza à sua aplicação em conformidade com a Constituição, afastando-se outras interpretações conflitantes (Paulo Bonavides, Curso de direito constitucional, 6. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 474; Virgílio Afonso da Silva “Interpretação conforme a constituição: entre a trivialidade e a centralização judicial.”, Revista Direito GV, v. 2, n. 01 – 2010, jan-jun. 2006, p. 201); este trabalho hermenêutico, que se faz incidir conteúdos constitucionais na determinação do modo de aplicação da norma infraconstitucional, restringe a aplicação da norma vigente a determinados casos e a mantem em relação a outros, não se identificando com declaração de inconstitucionalidade, fazendo impertinente invocação de reserva de plenário (nesse sentido, RE 184093, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Primeira Turma, julgado em 29/04/1997, DJ 05-09-1997 PP-41894 EMENT VOL-01881-05 PP-00862; RE 460.971, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 13-2-2007, Primeira Turma, DJ de 30-3-2007; MENDES, G.; BRANCO, P. G. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 1411 a 1413).

Neste diapasão, e com direto desdobramento na devolução dos valores discutidos, o Supremo Tribunal Federal decidiu que "...a dignidade da pessoa humana e a proteção à família exigem que se ponham ao abrigo da constrição e da alienação forçada determinados bens..." (diretriz repetida em outros julgados do Supremo Tribunal Federal - por exemplo, AgReg no RE. 1.304.844/SP; RE 605709/SP; ARE 1.038.507/PR), com incidência direta e explícita quando da aplicação do artigo 115:

'EMENTA. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RECEBIDO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. DEVOLUÇÃO. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ E CARÁTER ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 97 DA CF. RESERVA DE PLENÁRIO: INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 19.12.2008. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado em virtude de decisão judicial não está sujeito a repetição de indébito, dado o seu caráter alimentar. Na hipótese, não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, o reconhecimento, pelo Tribunal de origem, da impossibilidade de desconto dos valores indevidamente percebidos. Agravo regimental conhecido e não provido. (ARE 729.449 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 06/08/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-223 DIVULG 11-11-2013 PUBLIC 12-11-2013, grifei)'

Esta diretriz, fundada em interpretação conforme a Constituição na aplicação da norma discutida, ademais, vai ao encontro da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que, mesmo relativizando a regra geral de impenhorabilidade de verbas alimentares para satisfação de crédito não-alimentar, nunca deixa de observar que é de rigor preservar-se montante capaz de guarnecer a dignidade do devedor e sua família (nesse sentido: AREsp 2.086.603, EDCl no AEResp 2.06.804, julgados em 2022; AgInt no AREsp n. 1.77.483, julgado em 2021).

Com efeito, conforme a jurisprudência sedimentada do STJ, "a regra geral da impenhorabilidade dos vencimentos, dos subsídios, dos soldos, dos salários, das remunerações, dos proventos de aposentadoria, das pensões, dos pecúlios e dos montepios, bem como das quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, dos ganhos de trabalhador autônomo e dos honorários de profissional liberal poderá ser excepcionada, nos termos do art. 833, IV, c/c o § 2° do CPC/2015, quando se voltar: I) para o pagamento de prestação alimentícia, de qualquer origem, independentemente do valor da verba remuneratória recebida; e II) para o pagamento de qualquer outra dívida não alimentar, quando os valores recebidos pelo executado forem superiores a 50 salários mínimos mensais, ressalvadas eventuais particularidades do caso concreto. Em qualquer circunstância, deverá ser preservado percentual capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família" (AgInt no REsp 1407062/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 26/02/2019, DJe 08/04/2019).

No mesmo sentido, exemplificativamente: AgInt no REsp 1892698/PR, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/03/2021, DJe 10/03/2021; AgInt no REsp 1888552/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 07/12/2020, DJe 01/02/2021; AgInt no AgInt no AREsp 1645585/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/11/2020, DJe 24/11/2020; AgInt no AgInt no AREsp 1640504/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/10/2020, DJe 21/10/2020).

Nesse contexto, considerando que o teto dos benefícios previdenciários é pouco menos de R$ 7.090,00 mensais, montante pouco acima do valor apurado como expressão monetária real daquilo para o que é destinado o salário mínimo (para tanto, toma-se como referência a edição, mensal, da “Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos – Salário mínimo nominal e necessário” do DIEESE - https://www.dieese.org.br/analisecestabasica/salarioMinimo.html - que alcançou em junho de 2022 o patamar de R$ 6.527,67), pode-se concluir que o desconto, nos próprios autos, de qualquer parcela do benefício, a título de reparação por dano processual (CPC, art. 302), além da inaplicabilidade expressa no julgamento dos embargos de declaração (tutela de urgência cuja revogação se dá em razão de mudança superveniente da jurisprudência então dominante), não pode divorciar-se de interpretação conforme a Constituição, coerente com a interpretação sistemática do direito vigente e harmônica às diretrizes jurisprudenciais consagradas.

Em suma, por (1) fundamentos constitucionais, relativos aos direitos à vida, à dignidade, à igualdade material e ao direito fundamental à previdência e à assistência social, cuja (2) repercussão nas normas processuais infraconstitucionais requer observância ao se definir o modo de sua aplicação, (3) em interpretação conforme a Constituição e interpretação sistemática do direito vigente, em harmonia com as diretrizes jurisprudenciais sedimentadas, (4) conclui-se que a correta aplicação do Tema n.º 692 do STJ, quanto ao modo de se exigir o cumprimento do dever de ressarcir valores percebidos a título de antecipação de tutela posteriormente revogada, nos próprios autos da ação julgada improcedente ou, ainda, em cumprimento de sentença a ela associada, requer que se preservem montantes capazes de guarnecer a dignidade do devedor e sua família, a serem demonstrados concretamente em cada litígio concreto; para tanto, o juízo processante há de proceder como entender de direito (por exemplo, oportunizando manifestação prévia do devedor à decisão sobre eventual pedido de desconto ou, acaso dispuser de elementos, desde o início afastando a pretensão, por constatada a imprescindibilidade dos valores para a subsistência digna do devedor e sua família).

Desde já, portanto, conclui-se pela impossibilidade de desconto quando se tratar de benefício de valor mínimo; na hipótese em que forem constatados recursos disponíveis além do mínimo existencial, a definição do percentual a ser descontado quando houver recursos disponíveis além do mínimo existencial, não deverá restringir desproporcionalmente o padrão de vida do segurado e sua família.

Caso se trate de cumprimento de sentença de pagar quantia certa, na hipótese em que não houver benefício ativo, devem ser observadas as regras gerais de impenhorabilidade previstas na legislação processual.

Convém referir, por oportuno, o julgamento nos autos da Ação Rescisória 50202323220194040000/PR, em juízo de retratação da 3ª Seção deste Tribunal, que em 26 de abril de 2023 decidiu por maioria a confirmar a tese de interpretação conforme a constituição acima exposta:

"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO CITRA PETITA. TUTELA PROVISÓRIA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. TEMA 692 STJ. POSSIBILIDADE. MANUTENÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. 1. Sendo citra petita a decisão no feito originário, cabe a procedência da ação rescisória, em juízo rescindendo, e a análise do apelo em questão, tal como já fora feito no acórdão objeto de retratação. 2. Caso em que cabe efetivamente a aplicação do tema 692 do STJ, o que permite a retratação, porque, no juízo rescisório, está-se analisando o apelo interposto contra sentença que, no processo de conhecimento originário, obrigara a segurada, ora autora, a devolver os valores recebidos. 3. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 11/05/2022, acolheu questão de ordem para reafirmar a tese jurídica contida no Tema Repetitivo nº 692, com acréscimo redacional, nos seguintes termos: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago". 4. Delimitado o âmbito de incidência do tema, resta examinar sua incidência e fundamentação. O que se decidiu no Tema n.º 692 diz respeito à obrigação do exequente, nos termos da legislação processual, de ressarcir prejuízos sofridos pelo executado decorrente de reforma de tutela provisória, dever que subsiste em virtude do artigo 15, III, da Lei n.º 8.213/1991, seja na sua redação original, seja na redação da Lei n.º 13.846/2019. 5. É diante de todo o ordenamento jurídico, em suas disposições materiais e processuais, a começar dos ditames constitucionais, que deve se orientar a aplicação do Tema n.º 692, contexto adequado e mais amplo em que se insere a responsabilidade pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa e o regime de ressarcimento de dano processual, quadro em que se ler o parágrafo único do artigo 302 do CPC (“a indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível.”). 6. Em suma, por (1) fundamentos constitucionais, relativos aos direitos à vida, à dignidade, à igualdade material e ao direito fundamental à previdência e à assistência social, cuja (2) repercussão nas normas processuais infraconstitucionais requer observância ao se definir o modo de sua aplicação, (3) em interpretação conforme a Constituição e interpretação sistemática do direito vigente, em harmonia com as diretrizes jurisprudenciais sedimentadas, (4) conclui-se que a correta aplicação do Tema n.º 692 do STJ, quanto ao modo de se exigir o cumprimento do dever de ressarcir valores percebidos a título de antecipação de tutela posteriormente revogada, nos próprios autos da ação julgada improcedente ou, ainda, em cumprimento de sentença a ela associada, requer que se preservem montantes capazes de guarnecer a dignidade do devedor e sua família, a serem demonstrados concretamente em cada litígio concreto; para tanto, o juízo processante há de proceder como entender de direito (por exemplo, oportunizando manifestação prévia do devedor à decisão sobre eventual pedido de desconto ou, acaso dispuser de elementos, desde o início afastando a pretensão, por constatada a imprescindibilidade dos valores para a subsistência digna do devedor e sua família). 7. Desde já, portanto, conclui-se pela impossibilidade de desconto quando se tratar de benefício de valor mínimo; na hipótese em que forem constatados recursos disponíveis além do mínimo existencial, a definição do percentual a ser descontado quando houver recursos disponíveis além do mínimo existencial, não deverá restringir desproporcionalmente o padrão de vida do segurado e sua família. Caso se trate de cumprimento de sentença de pagar quantia certa, na hipótese em que não houver benefício ativo, devem ser observadas as regras gerais de impenhorabilidade previstas na legislação processual. 8. Em juízo de retratação, a ação rescisória é parcialmente procedente para, em juízo rescindendo, rescindir o julgado por citra petita. E, em juízo rescisório, apelação da parte autora parcialmente provida nos autos originários, para reconhecer a repetibilidade dos valores recebidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, observada a necessidade de garantia do mínimo existencial. (TRF4, AÇÃO RESCISÓRIA (SEÇÃO) Nº 5020232-32.2019.4.04.0000, 3ª Seção, Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS, POR MAIORIA, VENCIDOS A RELATORA, JUNTADO AOS AUTOS EM 27/04/2023)"

Repisa-se, outrossim, que a mais escorreita aplicação do Tema 692 deve observar o respeito ao valor integral, líquido, do salário-mínimo em cada competência a ser descontada, em interpretação conforme a constituição do art. 115, III, da Lei 8.213/91, nos exatos termos dos textos supracitados, os quais adoto como razões de decidir, na íntegra, quanto aos limites da devolução. Em outras palavras, não pode haver desconto com base na resolução do Tema 692 que reduza a renda mensal do benefício abaixo do valor do salário-mínimo vigente na respectiva competência.

Critérios processuais para devolução

Definido o limite para os descontos, devem ser fixados também os critérios processuais para efetivação da devolução dos valores. Nesse sentido, a Lei 8.213/91 assim trata a questão, em sua redação atual:

"Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:

(...)

II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento;

(...)

§ 1º Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé.

§ 2º Na hipótese dos incisos II e VI, haverá prevalência do desconto do inciso II.

§ 3º Serão inscritos em dívida ativa pela Procuradoria-Geral Federal os créditos constituídos pelo INSS em decorrência de benefício previdenciário ou assistencial pago indevidamente ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, nos termos da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, para a execução judicial.

§ 4º Será objeto de inscrição em dívida ativa, para os fins do disposto no § 3º deste artigo, em conjunto ou separadamente, o terceiro beneficiado que sabia ou deveria saber da origem do benefício pago indevidamente em razão de fraude, de dolo ou de coação, desde que devidamente identificado em procedimento administrativo de responsabilização." (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

A seu turno, o Código de Processo Civil, em seu art. 302, assim dispõe:

"Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se:

(...)

Parágrafo único. A indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível."

O que se depreende, do cotejo entre as normas citadas, é que a norma especial, no caso a Lei 8.213/91, dever ser aplicada em detrimento do CPC; ainda, é possível afirmar que a possibilidade referida no diploma processual esbarra na determinação clara do art. 115 da Lei de Benefícios, ao retirar expressamente a habilitação dada pela lei processual para liquidação da dívida nos próprios autos. É de relevo notar que a legislação previdenciária efetua um comando, ao afirmar que serão inscritos em dívida ativa os débitos formados.

Não é outra a conclusão do ilustre Desembargador Alexandre Lippel, em voto de sua relatoria, apresentado em 27/04/2023, que colaciono, por oportuno (5011954-68.2013.4.04.7108/RS):

"Entrementes, à vista do aparente conflito entre as leis, deve prevalecer o disposto na Lei 8.213/91, seja em razão do princípio da especialidade, seja em razão da expressão sempre que possível constante do diploma processual, uma vez que o cumprimento, na hipótese, encontraria óbice no parágrafo 3º do art. 115 da Lei de Benefícios, que dispõe que os valores Serão inscritos em dívida ativa pela Procuradoria-Geral Federal os créditos constituídos pelo INSS em decorrência de benefício previdenciário ou assistencial pago indevidamente ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, nos termos da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, para a execução judicial. (grifei)

Dessa forma, cabe ao INSS veicular a cobrança dos valores que entende devidos na forma do artigo 115, II e parágrafo 3º, da Lei nº 8.213/91, ou seja: i) através de descontos, nos casos de benefício em manutenção (artigo 115, II, da Lei 8.213/91); ou ii) inexistindo benefício em manutenção, deverá proceder à inscrição do crédito em dívida ativa (artigo 115, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91).

Entendimento diverso importaria no afastamento do art. 115, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91, sem a devida declaração de inconstitucionalidade, como bem ressaltou o STJ na ementa acima transcrita, em relação ao inciso II do mesmo artigo, também alterado pela Lei 13.846/2019: (12. Ademais, a postura de afastar, a pretexto de interpretar, sem a devida declaração de inconstitucionalidade, a aplicação do art. 115, inc. II, da Lei n. 8.213/1991 pode ensejar questionamentos acerca de eventual inobservância do art. 97 da CF/1988 e, ainda, de afronta ao verbete vinculante n. 10 da Súmula do STF.)"

Sob a perspectiva exposta, portanto, deve ser respeitada a legislação previdenciária quanto ao modo de recuperação dos valores nos casos em que a devolução é autorizada, nestes termos:

a) quando o benefício estiver ativo, deverá ocorrer o desconto dos valores na via administrativa, de forma direta, respeitado o limite constitucional do salário-mínimo (art. 115, II, da Lei 8.213/91);

b) não havendo benefício percebido pelo segurado, o INSS deverá proceder à inscrição do crédito em dívida ativa (art. 115, § 3º, da Lei 8.213/91).

Necessidade de formação de título - contraditório e ampla defesa

Em acréscimo, nos casos em que o INSS promove cumprimento de sentença nos próprios autos buscando a devolução de valores com fulcro na resolução do Tema 692/STJ, entendo que, além do óbice acima colacionado, dentro dos limites do art. 115 da Lei 8.213/91, é necessário constar expressamente do título judicial a determinação de devolução dos valores, porquanto já transitada em julgado a demanda. Deveras, "A mera revogação da tutela provisória não equivale ao reconhecimento da obrigação de devolução das parcelas recebidas, razão pela qual o pedido de cumprimento de sentença feito nesses termos excede os limites da coisa julgada e, por isso, não é possível." (TRF4, AG 5022337-79.2019.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 27/09/2019)

Nesta linha são os seguintes julgados desta Casa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. RESSARCIMENTO DE VALORES. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA PARCIALMENTE REVOGADA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO PRÓPRIA. Não prevendo o título judicial a condenação do segurado ao ressarcimento, ao INSS, dos valores pagos a título de antecipação da tutela posteriormente revogada, mesmo que em parte, resta à Autarquia Previdenciária buscar, em ação própria, a restituição que alega devida, na qual será discutido, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, o cabimento da devolução postulada. (TRF4, AG 5050426-15.2019.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 26/04/2021)

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO NOS PRÓPRIOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte não admite a cobrança dos valores pagos por força de medida antecipatória nos próprios autos da ação de concessão do benefício ou o desconto dos valores devidos em cumprimento de sentença, mormente quando o título judicial transitou em julgado sem nada estabelecer acerca da necessidade de devolução. 2. Deve o INSS buscar em ação própria, com as garantias inerentes ao contraditório e à ampla defesa, a restituição dos valores que entende devidos. (TRF4, AC 5014930-61.2020.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 25/03/2022)

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PELO INSS. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO PRÓPRIA. 1. Em que pese a parte autora ter recebido valores em razão de tutela antecipada, posteriormente revogada, o título executivo não previu o respectivo ressarcimento ao INSS, razão pela qual não é possível que a autarquia dê início ao cumprimento de sentença. 2. Agravo de instrumento desprovido. (TRF4, AG 5015817-35.2021.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 22/06/2022)

ADMINISTRATIVO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. SERVIDOR PÚBLICO. PAGAMENTO DE DIFERENÇAS REMUNERATÓRIAS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. AUSÊNCIA DE MENÇÃO NO TÍTULO EXECUTIVO. INEXISTÊNCIA DE TÍTULO. 1. Não havendo menção no título executivo judicial transitado em julgado no sentido da devolução dos valores percebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada, inexistente título executivo apto a fundamentar sua execução nos próprios autos, porquanto a revogação da tutela provisória não corresponde ao reconhecimento automático de obrigação de restituição das quantias recebidas. (TRF4, AC 5065567-27.2013.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 07/07/2022)

Com efeito, não se divisando nenhuma determinação expressa de devolução dos valores pelo segurado no título judicial, sequer existe respaldo para a execução promovida, dada a evidente ausência de título executivo.

Concluindo, em síntese, existem as seguintes situações passíveis de análise quanto à aplicação do Tema 692:

I) Há título para cobrança das diferenças, devendo ser observado pelo INSS em sua aplicação o limite do salário-mínimo, nos termos acima expostos;

II) No caso I, e quando o segurado perceber benefício previdenciário, existindo título para desconto dos valores, o INSS poderá efetuar diretamente na via administrativa, respeitado o limite legal de 30% e o limite do salário-mínimo;

III) No caso I, em sendo o caso de segurado que não percebe benefício, e existindo título judicial, deverá a autarquia efetuar a inscrição na dívida ativa do crédito que pretende obter;

IV) Não há título executivo judicial, caso em que deve ser formado em ação própria, com respeito e observância do contraditório e da ampla defesa, viabilizando assim a execução.

Então, considerada a fundamentação apresentada no julgamento anterior, não se verifica a ocorrência das hipóteses ensejadoras do recurso em apreço. Os pontos controvertidos foram apreciados na extensão necessária ao exame daquilo que foi pedido. Além disso, a conclusão está em harmonia com a fundamentação. Tampouco há inexatidões materiais, já que a decisão contemplou a questão de fato posta e a exteriorizou de forma adequada, estando clara.

Na prática, a intenção do recorrente é de rediscutir os fundamentos de fato e ou de direito que justificaram o resultado. Contudo, salvo situações excepcionalíssimas, relacionadas com a presença dos vícios típicos, a eventual discordância quanto à apreciação dos fatos e do direito não pode ser objeto de (re)discussão via embargos de declaração.

Prequestionamento

A jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região vem aceitando o manejo de aclaratórios para deixar explícito que os pontos ventilados pelo recorrente foram incluídos no debate. Trata-se de viabilizar o questionamento prévio dos fundamentos jurídicos com vista a proporcionar a admissão de eventuais recursos excepcionais.

E embora o art. 1.025, do CPC, estabeleça que estariam incluídos no acórdão os elementos suscitados a título de prequestionamento, o Superior Tribunal de Justiça ainda exige juízo de valor sobre os preceitos indicados como violados (vide, p. ex.: STJ, AgInt no REsp n. 1.954.856/SP, Relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 22/11/2022, DJe de 24/11/2022).

Considero, portanto, que existindo pedido para prequestionar a matéria, ainda que reputados ausentes os alegados vícios, impõe-se o acolhimento parcial do pleito recursal. Assim, fica prequestionada a matéria versada nos dispositivos legais e constitucionais apontados pelo embargante, nos termos das razões de decidir já externadas, deixando-se de aplicar aqueles não mencionados no acórdão e/ou tidos como aptos a fundamentar o pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento aos embargos de declaração, exclusivamente para fins de prequestionamento, inalterado o resultado do julgamento.



Documento eletrônico assinado por HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004299857v2 e do código CRC 4213f36a.Informações adicionais da assinatura:
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Conferência de autenticidade emitida em 25/04/2024 04:34:04.

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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gab. Des. Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3118 - Email: gabhermes@trf4.jus.br

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5013671-65.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

EMBARGANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO.

1. Os pronunciamentos judiciais podem ser confrontados por embargos de declaração quando se alegar a presença de obscuridade, contradição, omissão ou erro material (art. 1.022, CPC).

2. Ausente o vício alegado, o recurso é acolhido exclusivamente para fins de prequestionamento (art. 1.025, CPC)

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, em julgamento realizado na forma do art. 942 do CPC, dar parcial provimento aos embargos de declaração, exclusivamente para fins de prequestionamento, inalterado o resultado do julgamento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 26 de março de 2024.



Documento eletrônico assinado por HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004299858v2 e do código CRC 17c9547a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR
Data e Hora: 17/4/2024, às 14:2:26

5013671-65.2019.4.04.9999
40004299858 .V2


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 19/03/2024 A 26/03/2024

Apelação Cível Nº 5013671-65.2019.4.04.9999/RS

INCIDENTE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO

RELATOR: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PROCURADOR(A): JOÃO GUALBERTO GARCEZ RAMOS

APELANTE: ANA MARIA VIEIRA

ADVOGADO(A): ALDA CRISTINA DE SOUZA FREITAS (OAB RS058272)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 19/03/2024, às 00:00, a 26/03/2024, às 16:00, na sequência 184, disponibilizada no DE de 08/03/2024.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, EM JULGAMENTO REALIZADO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC, DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, EXCLUSIVAMENTE PARA FINS DE PREQUESTIONAMENTO, INALTERADO O RESULTADO DO JULGAMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 25/04/2024 04:34:04.

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