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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR AOS DOZE ANOS DE IDADE. PROVA PERICIAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. TRF4. 5001451-78.2019.4.04.7107

Data da publicação: 02/04/2024, 07:01:08

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE DA SENTENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR AOS DOZE ANOS DE IDADE. PROVA PERICIAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. 1. A partir das alterações introduzidas no art. 106 da Lei nº 8.213 pela Medida Provisória nº 871, de 18 de janeiro de 2019, convertida na Lei nº 13.846, a comprovação do exercício de atividade rural passou a ser feita mediante autodeclaração, complementada por outras provas documentais. 2. Depreende-se que a realização de justificação administrativa ou produção de prova testemunhal em juízo tornou-se legalmente dispensável, inclusive em relação ao período anterior a 1º de janeiro de 2023, conforme dispõe o art. 38-B, §2º, na Lei nº 8.213, incluído pela Medida Provisória nº 871. 3. Diante das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, é necessário determinar a realização de prova testemunhal com a finalidade de corroborar o início de prova material na hipótese em que há manifesto prejuízo ao direito do autor. 4. A questão atinente ao exercício de atividade rural pelo segurado especial antes dos doze anos de idade não é essencialmente de direito, já que exige esclarecimento a respeito da indispensabilidade da colaboração da parte autora à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar, bem como da idade específica em que se deu o início do trabalho na agricultura. 5. É desnecessária a realização de perícia técnica, no caso em que as provas necessárias para o julgamento da questão atinente ao exercício de atividade especial encontram-se juntadas aos autos. 6. A eventual omissão ou inexatidão nos formulários emitidos pelos empregadores pode ser analisada por meio do cotejo com as demonstrações ambientais das próprias empresas. (TRF4, AC 5001451-78.2019.4.04.7107, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 25/03/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001451-78.2019.4.04.7107/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: ANTONIO IRONEI NOSTRANE ALMEIDA (AUTOR)

ADVOGADO(A): HENRIQUE OLTRAMARI (OAB RS060442)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

A sentença proferida na ação ajuizada por Antônio Ironei Nostrane Almeida contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS julgou o feito extinto sem resolução do mérito, quanto ao pedido de reconhecimento do tempo de serviço especial no período de 01/04/1986 a 31/07/1986, com fundamento do no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. No mérito, julgou os pedidos parcialmente procedentes, para condenar o réu a: a) reconhecer o exercício de atividade rural nos períodos de 12/06/1982 a 26/07/1984 e de 27/04/1985 a 31/03/1986 e proceder à averbação do tempo de serviço; b) reconhecer o exercício de atividade especial nos períodos de 27/07/1984 a 26/04/1985, de 16/11/1988 a 18/08/1989, de 02/10/1989 a 26/08/1992, de 17/02/1993 a 02/11/1994, de 01/02/1995 a 24/07/1995, de 18/10/1995 a 05/03/1997, de 13/01/2003 a 10/05/2004, de 01/06/2009 a 31/05/2010 e de 01/06/2011 a 09/04/2018 e proceder à averbação, mediante conversão em tempo comum pelo fator 1,4; c) conceder aposentadoria integral por tempo de contribuição desde a data do requerimento administrativo (28/06/2018) e pagar as prestações vencidas com atualização monetária pelo INPC e juros de mora, contados a partir da citação, de acordo com a taxa de juros da caderneta de poupança, devendo incidir, a partir de 9 de dezembro de 2021, apenas a taxa SELIC. O INSS foi condenado ao pagamento de honorários advocatícios sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, no percentual mínimo de cada faixa de valor estabelecida no art. 85, §3º, do Código de Processo Civil.

Ambas as partes interpuseram apelação.

O autor arguiu a nulidade da sentença por cerceamento do direito de defesa. Alegou que é necessário produzir prova testemunhal a fim de corroborar o início de prova material em relação ao desenvolvimento de labor rurícola desde os 8 anos de idade, e prova pericial para comprovar o exercício de atividade especial nos períodos de 06/03/1997 a 25/03/1998, de 02/06/1999 a 13/10/2000, de 19/02/2001 a 14/11/2001 e de 24/01/2006 a 19/11/2007, pois os formulários expedidos pelas empresas apresentam omissão ou informações equivocadas. No mérito, postulou o reconhecimento do tempo de serviço rural no período de 12/06/1978 a 11/06/1982, sustentando que a jurisprudência dos tribunais superiores e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região admite a possibilidade de cômputo do período trabalhado na condição de segurado especial entre os 8 e os 12 anos de idade. Afirmou que as provas juntadas ao processo administrativo demonstram o exercício do labor rural e a indispensabilidade para a manutenção do grupo familiar, mesmo desde tenra idade. Aduziu que, nos períodos de 06/03/1997 a 25/03/1998, de 02/06/1999 a 13/10/2000, de 19/02/2001 a 14/11/2001, de 24/01/2006 a 19/11/2007, de 03/12/2007 a 09/05/2008, de 19/05/2008 a 31/05/2009 e de 01/06/2010 a 31/05/2011, exerceu atividade em condições especiais, exposto de modo habitual e permanente a ruído excessivo, agentes químicos (hidrocarbonetos aromáticos, óleos e graxas de origem mineral), radiações não ionizantes, gases e fumos. Deduziu que é inerente o contato com óleos e graxas minerais em atividades como ferramenteiro, retificador, torneiro, fresador e montador em indústrias metalúrgicas. Ponderou que o Superior Tribunal de Justiça, no Tema 1.083, definiu que, havendo diferentes níveis de ruído, deve ser considerado o nível de exposição normalizado (NEN), e, caso não haja essa informação, o critério a ser adotado é o nível máximo de ruído (pico de ruído). Defendeu a possibilidade de utilização de laudos periciais elaborados em outras ações previdenciárias, que avaliaram as condições ambientais na própria empresa em que desenvolveu as atividades. Observou que, além de não existir prova do uso permanente de equipamentos de proteção individual ou perícia técnica que comprove a sua eficácia, a exposição a óleo mineral e hidrocarbonetos aromáticos enseja o reconhecimento da especialidade, haja ou não utilização dos equipamentos. Preconizou a reafirmação da data de entrada do requerimento (DER), para que seja considerado o tempo de atividade especial posterior e concedida aposentadoria especial ou, sucessivamente, aposentadoria por tempo de contribuição sem a incidência do fator previdenciário.

O INSS insurgiu-se contra o reconhecimento da especialidade nos períodos de 01/06/2009 a 31/05/2010 e de 01/06/2011 a 09/04/2018. Aduziu que, para a avaliação dos níveis de ruído, devem ser respeitadas as normas e metodologias vigentes à época da realização da avaliação técnica. Sustentou que, a partir de 18 de novembro de 2003, a metodologia adotada no Decreto nº 4.882/2003 é a estabelecida na NHO 01 da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho - FUNDACENTRO, com nível de exposição normalizado superior a 85 dB(A). Apontou que os formulários indicam utilização da técnica de dosimetria, desrespeitando o Decreto nº 8.123/2013, que incluiu os §§12 e 13 no art. 68 do Decreto nº 3.048/1999, e determinou que as avaliações ambientais devem considerar a metodologia e os procedimentos de avaliação da FUNDACENTRO. Alegou que, a partir da vigência do Decreto nº 2.172/1997, a atividade é especial apenas se for comprovada a exposição aos agentes químicos em concentração acima dos limites de tolerância estabelecidos no Anexo 12 da NR 15, com base em laudo pericial, não sendo suficiente a alusão genérica a adesivos ou hidrocarbonetos. Destacou que, à exceção do benzeno e dos agentes químicos listados, também, no Anexo 13 da NR-15, é necessário comprovar que o nível de concentração está acima dos limites de tolerância. Ponderou ainda que nem todo óleo mineral é nocivo à saúde e reconhecidamente cancerígeno.

Ambas as partes apresentaram contrarrazões. O autor preconizou o não conhecimento da apelação do INSS, pois não impugnou de forma específica a sentença.

A sentença foi publicada em 12 de julho de 2022.

VOTO

Nulidade da sentença

A parte autora requereu a produção de prova oral, a fim de comprovar o exercício de atividade rural nos períodos de 12/06/1978 (quando tinha oito anos de idade) a 26/07/1984 e de 27/04/1985 a 31/03/1986.

O juízo indeferiu o pedido, já que a prova do exercício de atividade como segurado especial pode ser feita por meio de autodeclaração, corroborada por início de prova material (evento 29, DESPADEC1).

A partir das alterações introduzidas no art. 106 da Lei nº 8.213 pela Medida Provisória nº 871, de 18 de janeiro de 2019, convertida na Lei nº 13.846, a comprovação do exercício de atividade rural passou a ser feita mediante autodeclaração, complementada por outras provas documentais.

A autodeclaração de segurado especial foi instituída pela Medida Provisória nº 871, de 18 de janeiro de 2019, convertida na Lei nº 13.846, que incluiu o art. 38-B, §2º, na Lei nº 8.213. Eis o teor do dispositivo:

Art. 38-B. O INSS utilizará as informações constantes do cadastro de que trata o art. 38-A para fins de comprovação do exercício da atividade e da condição do segurado especial e do respectivo grupo familiar. (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015)

(...)

§ 2º Para o período anterior a 1º de janeiro de 2023, o segurado especial comprovará o tempo de exercício da atividade rural por meio de autodeclaração ratificada por entidades públicas credenciadas, nos termos do art. 13 da Lei nº 12.188, de 11 de janeiro de 2010, e por outros órgãos públicos, na forma prevista no regulamento.

Logo, tornou-se legalmente dispensável a realização de justificação administrativa ou produção de prova testemunhal em juízo com a finalidade de corroborar o início de prova material, inclusive em relação ao período anterior a 1º de janeiro de 2023.

No entanto, as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa asseguram às partes a participação nos atos processuais e a possibilidade de suscitar e discutir as questões controvertidas e de provar o direito alegado, com o objetivo de influenciar a decisão do magistrado.

Em conformidade com os princípios norteadores da Constituição Federal, o art. 369 do Código de Processo Civil estabelece que as partes têm direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados no Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.

As provas necessárias são aquelas que podem influir no convencimento do juiz e no conteúdo da decisão de mérito, porque se referem a fatos pertinentes ao deslinde da causa e geram consequências jurídicas importantes para o processo. Somente as diligências inúteis ou meramente protelatórias devem ser indeferidas pelo juiz, em decisão fundamentada, nos termos do art. 370 do CPC.

Mesmo que o juiz entenda que os subsídios probatórios existentes nos autos são suficientes para formar a sua convicção e embasar a sentença, deve levar em conta que a prova não se destina apenas ao primeiro grau, mas também às partes e ao tribunal que examinar eventual apelação.

Em ações previdenciárias que visam ao reconhecimento de tempo de serviço rural, principalmente quando o segurado possuía menos de doze anos de idade, é fundamental que os fatos evidenciados pelo início de prova material sejam confirmados mediante a oitiva de testemunhas.

A questão não é essencialmente de direito, já que exige esclarecimento a respeito da caracterização do trabalho em regime de economia familiar - a indispensabilidade da colaboração do autor à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar. Também é necessário investigar a idade específica em que a parte autora começou a trabalhar na agricultura.

A não realização de prova testemunhal acarretou prejuízo efetivo ao direito de defesa da parte autora, visto que impediu a elucidação das suas alegações sobre ponto substancial para a apreciação da causa.

A corroborar esse entendimento, a tese fixada no julgamento do incidente de resolução de demandas repetitivas:

Tema 17 - Não é possível dispensar a produção de prova testemunhal em juízo, para comprovação de labor rural, quando houver prova oral colhida em justificação realizada no processo administrativo e o conjunto probatório não permitir o reconhecimento do período e/ou o deferimento do benefício previdenciário.

(TRF4 5045418-62.2016.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 13/12/2018)

Portanto, a sentença deve ser anulada, para que seja realizada a prova testemunhal.

No que diz respeito à prova pericial, o juízo indeferiu o pedido nos seguintes termos (evento 13, DESPADEC1):

1. Do pedido de produção de prova pericial.

Com o intuito de comprovar a sujeição a fatores de risco capazes de ensejar o enquadramento dos períodos requeridos como tempo de serviço especial, o autor requereu a produção de prova pericial.

Indefiro, contudo, o pedido.

De início, cabe destacar que a prova do exercício das atividades especiais deve respeitar a legislação da época da atividade, conforme posição uníssona da jurisprudência atual.

Nesta linha, prescreve atualmente o § 1º do artigo 58 da LBS que “a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista”.

Portanto, o formulário – atualmente o PPP –, elaborado com base em laudo técnico contemporâneo à atividade, é o documento escolhido pelo legislador para retratar as efetivas condições da atividade laboral desenvolvida pelo segurado. É, portanto, por intermédio dele que o segurado deve comprovar as características de suas atividades junto ao INSS, ficando a empresa sujeita a penalidades em caso de não cumprimento das previsões normativas (§§ 8º e 9º do artigo 68 do RPS). Mais que isso, o § 10º do mesmo dispositivo esclarece que o trabalhador terá acesso às informações prestadas pela empresa sobre o seu PPP, “podendo inclusive solicitar a retificação de informações quando em desacordo com a realidade do ambiente de trabalho”.

Veja-se, ainda, que a elaboração de laudo pericial nos dias atuais não tem o condão de refutar as informações colhidas pela empresa em momento contemporâneo ao labor desenvolvido. Ainda, a simples alegação das partes de que o PPP não aponta determinado agente prejudicial à saúde (pelo segurado) ou que informa a exigência de agente inexistente no ambiente laboral (pelo INSS), sem qualquer mínima base empírica a sustentá-la, não serve para colocar em dúvida as informações lançadas no referido formulário.

Em suma, somente se justifica a realização de prova pericial, em hipótese em que foi apresentada pelo empregador a documentação pertinente, quando houver elementos que sugiram má-fé na respectiva elaboração. Ora, a legislação envolvendo a matéria, como visto, é cristalina em descrever a responsabilidade do empregador e a importância atribuída ao formulário elaborado – permitindo inclusive a impugnação do segurado perante o empregador –, não havendo nenhuma razão para que se questione, por perícia judicial, todo e qualquer documento elaborado por toda e qualquer empresa (firmados por médicos ou engenheiros do trabalho) para todo e qualquer cidadão, pelo simples fato de serem contrários aos interesses de alguma das partes.

Relativamente às empresas extintas e que não forneceram formulário ao trabalhador, ou que forneceram formulários irregulares ou incompletos, cumpre esclarecer a prova do labor especial a partir da análise das condições laborais em empresa similar cabe para aqueles casos em que restou demonstrado pelo interessado que realizou diligências em busca de formulários e laudos da empregadora, seja junto a Sindicatos, ex-sócios ou atuais detentores da documentação da empresa.

Saliento, contudo, que em casos como estes a solução mais razoável, rápida e menos dispendiosa para as partes, não é a realização de perícia em empresas similares, mas sim a comprovação do labor sujeito à fatores de riscos mediante a apresentação de laudos de empresas similares, os quais podem ser obtidos pelos interessados até mesmo no Banco de Laudos disponibilizado na Internet (http://www.jfrs.jus.br/ex/cax/jusprev/index.php), sem custo algum. Vale referir que, para isso, basta que a parte ou seu procurador efetue um simples cadastro no site indicado, cabendo aqui salientar que é de inteira responsabilidade do interessado a escolha do laudo adequado à comprovação do labor especial, nos termos em que requerido na ação, bem como a anexação do documento ao processo. Além disso, os laudos por similitude deverão avaliar o ambiente de trabalho relativo às funções específicas que o requerente exerceu no período a ser comprovado.

No caso em tela, vale referir que o feito deverá ser instruído com documentos aptos à análise do labor especial de todos os períodos requeridos na presente ação, de modo que será plenamente oportunizada ao requerente a prova dos fatos constitutivos do seu direito (art. 373, inciso I, do CPC/2015).

Assim sendo, e diante de todo o até aqui exposto, INDEFIRO, por ora, o pedido de produção de prova pericial, sem prejuízo de nova análise quando da conclusão para sentença.

Conforme o art. 370 do Código de Processo Civil, cabe ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, indeferindo as que julgar desnecessárias ou inúteis ao deslinde da questão.

Para a verificação da especialidade das atividades exercidas com exposição a agentes nocivos, leva-se em consideração, via de regra, o conteúdo da documentação técnica fornecida pela empresa. Contudo, a presunção de veracidade das informações constantes nos formulários, laudos técnicos e perfil profissiográfico previdenciário (PPP) não é absoluta.

Caso o segurado questione, de forma fundamentada, a exatidão, a suficiência ou a fidedignidade dos dados contidos nesses documentos, trazendo aos autos elementos indiciários do cometimento de imprecisão, omissão ou equívoco, é plausível a produção de prova pericial em juízo.

É necessário, igualmente, avaliar a utilidade da prova que se pretende produzir e a possibilidade material de sua produção. Afinal, a referida prova objetiva conferir segurança ao julgamento, propiciando ao seu destinatário suficientes elementos para avaliar os argumentos que respaldam a pretensão articulada na petição inicial.

Para amparar o pedido de produção de prova pericial, o autor sustentou que os formulários expedidos pelas empresas Marcopolo S/A, San Marino Ônibus Ltda., Agrale S/A e RGB do Brasil Ltda. estão incorretos, já que os níveis de ruído são muito inferiores aos realmente existentes e a exposição a agentes químicos foi omitida.

Durante a instrução do feito, foram produzidas as seguintes provas:

a) período de 06/03/1997 a 25/03/1998 (Marcopolo S/A) - PPP (evento 1, procadm4, p. 6/7), demonstração ambiental de 1992 (evento 21, laudo2), laudos periciais realizados em ações previdenciárias na própria empresa (evento 1, laudo10 a laudo14);

b) período de 02/06/1999 a 13/10/2000 (San Marino Ônibus Ltda.) - PPP (evento 1, procadm4, p. 8/9), demonstrações ambientais de 1999 (evento 23, laudo3), de 2000 (evento 23, laudo2), de 2003 (evento 1, laudo15) e de 2010 (evento 1, laudo19), laudos periciais realizados em ações previdenciárias em empresa do mesmo ramo de atividade (evento 1, laudo10 a laudo14);

c) período de 19/02/2001 a 14/11/2001 (Agrale S/A) - PPP (evento 1, procadm4, p. 10/11), demonstrações ambientais de 1995 (evento 26, laudo12) e de 2003 (evento 26, laudo13), laudos periciais realizados em ações previdenciárias na própria empresa (evento 1, laudo9);

d) período de 24/01/2006 a 19/11/2007 (RGB do Brasil Ltda.) - PPP (evento 1, procadm4, p. 12/13), demonstração ambiental da empresa de 1990 (evento 1, laudo18), demonstração ambiental de empresa do mesmo ramo de atividade (evento 1, laudo19).

Os perfis profissiográficos previdenciários fornecidos pelos empregadores atendem às normas legais e não contêm irregularidade formal ou material que afaste de plano a sua aptidão probatória. A eventual omissão ou inexatidão nos formulários pode ser analisada por meio do cotejo com as demonstrações ambientais das próprias empresas.

O fato de o laudo técnico apresentar resultado diverso do constatado em outras empresas não demonstra que as avaliações ambientais estão incorretas, principalmente no que diz respeito ao ruído, visto que diversos fatores influenciam a coleta de dados para aferição desse agente, os quais variam conforme o ambiente de trabalho em determinado momento.

Tendo em conta que os elementos de prova são suficientes para o exame da questão, não procede a alegação de cerceamento de defesa.

Nesse sentido, já decidiu este Tribunal:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TORNEIRO MECÂNICO E OPERADOR DE MÁQUINA. TEMA 1.083/STJ. OBSERVÂNCIA DA TESE FIXADA NO PARADIGMA. PROVA TÉCNICA CONCLUSIVA SOBRE A SUJEIÇÃO A RUÍDO ACIMA DO LIMITE DE TOLERÂNCIA. BENEFÍCIO CONCEDIDO. 1. Conquanto se reconheça a validade da prova emprestada como meio de prova do exercício de atividades em condições nocivas, não há motivo para se privilegiar perícia judicial produzida em feito similar, se foram juntados aos autos formulários padrão. 2. O Superior Tribunal de Justiça, em Recurso Especial Repetitivo (Tema 1.083), firmou a seguinte tese: O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço (Relator Ministro Gurgel de Faria, REsp 1.886.795/RS, Primeira Seção, unânime, trânsito em julgado em 12/08/2022). 3. Restou assentado no representativo de controvérsia que somente a partir do início da vigência do Decreto nº 4.882/03, que acrescentou o § 11 ao art. 68 do Decreto nº 3.048/99, é que se tornou exigível, no LTCAT e no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), a referência ao critério Nível de Exposição Normalizado - NEN (também chamado de média ponderada) em nível superior à pressão sonora de 85 dB, a fim de permitir que a atividade seja computada como especial. Para os períodos de tempo de serviço especial anteriores à edição do referido Decreto, que alterou o Regulamento da Previdência Social, não há que se requerer a demonstração do NEN, visto que a comprovação do tempo de serviço especial deve observar o regramento legal em vigor por ocasião do desempenho das atividades. Em se tratando de tempo de serviço anterior a 19/11/2003, deve prevalecer a adoção do critério de pico de ruído, ainda que a pressão sonora não tenha sido aferida de acordo com a dosimetria NEN. Para a atividade prestada após 19/11/2003, ausente referência sobre a metodologia empregada ou utilizada técnica diversa da determinada na NHO 01 da FUNDACENTRO, o enquadramento deve ser feito com base na aferição do ruído constante do formulário PPP, pois se trata de documento preenchido com anotação do responsável pelos registros ambientais nele inseridos, produzido com amparo em laudo técnico elaborado por profissional habilitado. Precedentes. 4. A permanência a que se refere o art. 57, § 3º, da Lei nº 8.213/91 para fins de concessão da aposentadoria especial não requer que a exposição às condições insalubres ocorra durante todos os momentos da prática laboral. Basta que o obreiro, no desempenho de suas atividades, diuturna e continuamente, sujeite-se ao agente nocivo, em período razoável da sua prestação laboral. Se o formulário e o laudo pericial atestam a habitualidade e a permanência da atividade insalubre - muito embora sem o tempo exato de exposição, mas exercida diuturnamente - é de ser reconhecida a especialidade do labor do segurado. 5. Tendo em conta o recente julgamento do Tema nº 709 pelo STF, reconhecendo a constitucionalidade da regra inserta no § 8º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, o beneficiário da aposentadoria especial não pode continuar no exercício da atividade nociva ou a ela retornar, seja esta atividade aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. Implantado o benefício, seja na via administrativa, seja na judicial, o retorno voluntário ao trabalho nocivo ou a sua continuidade implicará na imediata cessação de seu pagamento. (TRF4, AC 5003832-44.2019.4.04.7209, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 22/02/2024)

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. TEMPO DE SERVIÇO MILITAR. AVERBAÇÃO. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO INFERIOR. ENQUADRAMENTO AFASTADO. PROVA EMPRESTADA. NÃO SE APLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. 1. Havendo nos autos documentos suficientes para o convencimento do juízo acerca das condições de trabalho vivenciadas pela parte autora, não há falar em cerceamento de defesa decorrente do indeferimento da produção de prova pericial. 2. A jurisprudência federal é pacífica no sentido de que o tempo de serviço militar conta para todos os fins previdenciários, inclusive carência. 3. Constando dos autos formulário PPP associado a laudo técnico da própria empresa, contemporâneo ao trabalho prestado pelo requerente, descabe a utilização de prova pericial a título de prova emprestada, ou mesmo perícia realizada nos autos anos após a prestação do labor, porquanto não se referem às reais condições ambientais vividas pelo segurado, salvo em caso de omissão. 4. O código 1.1.6 do Decreto 53.831/1964 previa que a especialidade deveria ser considerada para exposição a níveis de ruído superiores a 80 dB(A). Com a edição do Decreto 2.172, de 06 de março de 1997, esse índice foi alterado para 90 dB(A) - código 2.0.1. Ainda, após 18/11/2003, o limite foi fixado em 85 dB(A), conforme dispõe o Decreto 4.882/2003. 5. A circunstância de eventualmente ter sido concedido benefício diverso do pleiteado na petição inicial não acarreta sucumbência recíproca da parte autora, já que amplamente aceita pela jurisprudência a fungibilidade entre os benefícios previdenciários, hipótese em que não se verifica decisão citra, ultra ou extra petita. O mesmo se diga em relação a períodos alegados e não reconhecidos, quando tiver sido concedido o benefício. (TRF4, AC 5013241-15.2017.4.04.7112, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 19/12/2023)

Dispositivo

Dou parcial provimento à apelação da parte autora, para anular a sentença e determinar a produção de prova testemunhal para a comprovação do exercício de atividade rural.

Julgo prejudicado o exame do mérito da apelação da parte autora e da apelação do INSS.

Em face do que foi dito, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação da parte autora e julgar prejudicado o exame de mérito da apelação da parte autora e do INSS.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004366882v31 e do código CRC 038fe5c2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 25/3/2024, às 0:0:5


5001451-78.2019.4.04.7107
40004366882.V31


Conferência de autenticidade emitida em 02/04/2024 04:01:08.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001451-78.2019.4.04.7107/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: ANTONIO IRONEI NOSTRANE ALMEIDA (AUTOR)

ADVOGADO(A): HENRIQUE OLTRAMARI (OAB RS060442)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

previdenciário. processual civil. nulidade da sentença. cerceamento de defesa. prova testemunhal. reconhecimento de tempo de serviço rural anterior aos doze anos de idade. prova pericial. exercício de atividade especial.

1. A partir das alterações introduzidas no art. 106 da Lei nº 8.213 pela Medida Provisória nº 871, de 18 de janeiro de 2019, convertida na Lei nº 13.846, a comprovação do exercício de atividade rural passou a ser feita mediante autodeclaração, complementada por outras provas documentais.

2. Depreende-se que a realização de justificação administrativa ou produção de prova testemunhal em juízo tornou-se legalmente dispensável, inclusive em relação ao período anterior a 1º de janeiro de 2023, conforme dispõe o art. 38-B, §2º, na Lei nº 8.213, incluído pela Medida Provisória nº 871.

3. Diante das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, é necessário determinar a realização de prova testemunhal com a finalidade de corroborar o início de prova material na hipótese em que há manifesto prejuízo ao direito do autor.

4. A questão atinente ao exercício de atividade rural pelo segurado especial antes dos doze anos de idade não é essencialmente de direito, já que exige esclarecimento a respeito da indispensabilidade da colaboração da parte autora à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar, bem como da idade específica em que se deu o início do trabalho na agricultura.

5. É desnecessária a realização de perícia técnica, no caso em que as provas necessárias para o julgamento da questão atinente ao exercício de atividade especial encontram-se juntadas aos autos.

6. A eventual omissão ou inexatidão nos formulários emitidos pelos empregadores pode ser analisada por meio do cotejo com as demonstrações ambientais das próprias empresas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora e julgar prejudicado o exame de mérito da apelação da parte autora e do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 19 de março de 2024.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004366883v4 e do código CRC f19c84d0.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 25/3/2024, às 0:0:5


5001451-78.2019.4.04.7107
40004366883 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 02/04/2024 04:01:08.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 12/03/2024 A 19/03/2024

Apelação Cível Nº 5001451-78.2019.4.04.7107/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PROCURADOR(A): ELTON VENTURI

APELANTE: ANTONIO IRONEI NOSTRANE ALMEIDA (AUTOR)

ADVOGADO(A): HENRIQUE OLTRAMARI (OAB RS060442)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/03/2024, às 00:00, a 19/03/2024, às 16:00, na sequência 21, disponibilizada no DE de 01/03/2024.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E JULGAR PREJUDICADO O EXAME DE MÉRITO DA APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DO INSS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 02/04/2024 04:01:08.

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