Apelação Cível Nº 5000597-51.2020.4.04.7139/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: DAVENIR RODRIGUES SCHUTTS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto em face de sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito, por ausência de interesse de agir, sob o fundamento de que a parte autora teria dado causa ao indeferimento administrativo, ao não cumprir as exigências da Autarquia (
).A parte autora recorre (
), sustentando que houve uma falha na tentativa de juntada dos documentos requeridos pelo INSS, tanto que interpôs recurso administrativo instruído com todos os documentos solicitados na carta de exigências e informando os problemas que ocorreram no sistema da Autarquia. Requer a anulação da sentença e a procedência dos pedidos de reconhecimento de tempo rural e especial.Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de Admissibilidade
O apelo preenche os pressupostos de admissibilidade.
Interesse Processual
O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito, a teor do que dispõem os arts. 17, 330, III, e 485, VI, todos do Código de Processo Civil.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, em sede de repercussão geral, firmou a seguinte tese quanto ao Tema 350 (prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário):
I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas;
II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado;
III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;
IV – Nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240/MG (03/09/2014) que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (a) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (b) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; e (c) as demais ações que não se enquadrem nos itens (a) e (b) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau, que deverá intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse em agir. Comprovada a postulação administrativa, o juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 dias. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir;
V – Em todos os casos acima – itens (a), (b) e (c) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
(RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014) - grifado
Assim, está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera.
No caso em apreço, está claro que, em relação aos períodos em que o autor pretende ver reconhecida a especialidade, existe interesse de agir pela negativa administrativa (
, p. 26/7 e 45/6).Quanto ao período rural, o INSS notificou o segurado para cumprir as seguintes exigências (
, p. 28):- Apresentar declaração de Trabalhador Rural preenchida com os periodos requeridos conforme modelo em anexo;
- Apresentar Declaração de Sindicato dos Trabalhadores Rurais para homologação dos periodos requeridos em substituição a Justificação Administrativa;
- Apresentar guia de complementação do recolhimento de setembro 2018 para computo nesta aposentadoria por tempo de contribuição.
Posteriormente, o pedido de reconhecimento de labor rural em regime de economia familiar foi indeferido, especialmente pela falta de apresentação dos referidos documentos (
, p. 45/6). AA extinção do processo, por ausência de interesse processual, também foi fundada no fato de que o autor deu causa ao indeferimento, pois não cumpriu a exigência administrativa (
).Contudo, os documentos juntados aos autos pela parte autora evidenciam ter havido a tentativa de cumprimento e uma falha no momento de transmissão dos arquivos contendo os documentos.
Não há dúvida de que todos os documentos foram emitidos antes da tentativa de transmissão, sendo que as declarações contam inclusive com reconhecimento de firma realizado em cartório no dia 19/12/2018 (
, p. 11 a 23). Além disso, o autor comprovou que, dentro do prazo estipulado na carta de exigência, enviou um e-mail para a agência do INSS relatando o problema na transmissão dos documentos e solicitando auxílio para possibilitar o cumprimento da exigência ( , p. 24/5).Neste cenário, não se pode concluir que houve inércia da parte autora, a configurar a ausência de interesse processual. Ademais, mesmo que assim não fosse, de qualquer forma persistiria a necessidade de análise do tempo de serviço especial, igualmente objeto da ação.
Dito isso, tenho que a causa não está madura para que se prossiga na análise do mérito dos pedidos formulados na inicial.
Com efeito, o autor alega que, no período de 01/03/1967 a 28/02/1975, trabalhava na agricultura com os pais em regime de economia familiar, enquanto que, nos períodos de 01/05/1985 a 31/12/1985 e de 01/01/1990 a 30/04/1990, trabalhava em terras próprias.
Quanto ao período que o autor alega ter laborado em regime de economia familiar, sobretudo naquele efetuado em terras dos pais e de vizinhos (01/03/1967 a 28/02/1975), os documentos são insuficientes, por si só, para comprovar o exercício de atividade rural. No entanto, podem configurar início de prova material do labor rural alegado, devendo ser oportunizada a produção de prova testemunhal idônea.
Desse modo, necessária a anulação da sentença, determinando-se o retorno dos autos à origem para regular prosseguimento.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso da parte autora
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Apelação Cível Nº 5000597-51.2020.4.04.7139/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
APELANTE: DAVENIR RODRIGUES SCHUTTS (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. cumprimento de carta de exigência.
1. O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito. Está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera.
2. Hipótese em que não se pode concluir pela inércia da parte autora, pois comprovou tanto a posse como a realização de diligências com a finalidade de juntar no processo administrativo os documentos mencionados na carta de exigência.
3. Configurada a necessidade de complementação da prova, impõe-se a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução processual.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 10 de abril de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/04/2024 A 10/04/2024
Apelação Cível Nº 5000597-51.2020.4.04.7139/RS
RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO
APELANTE: DAVENIR RODRIGUES SCHUTTS (AUTOR)
ADVOGADO(A): JONAS SCHEFFER ROLIM (OAB RS051113)
ADVOGADO(A): ANDREA OLIVEIRA WEBBER (OAB RS100120)
ADVOGADO(A): LUMA LEFFA ROLIM (OAB RS124274)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/04/2024, às 00:00, a 10/04/2024, às 16:00, na sequência 775, disponibilizada no DE de 20/03/2024.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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