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EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. INTERESSE PROCESSUAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TRABALHADOR DE INDÚSTRIA CALÇADISTA. EXPOSIÇÃO A HIDROCARBONETOS. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. FONTE DE CUSTEIO. EMPRESÁRIO. LAUDO TÉCNICO ASSINADO PELO SÓCIO DO SEGURADO. PROVA TESTEMUNHAL. FUNCIONÁRIOS DA EMPRESA. ADMISSIBILIDADE. AFASTAMENTO DAS ATIVIDADES NOCIVAS. DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO. OPÇÃO A CRITÉRIO DO SEGURADO. TRF4. 5000308-86.2018.4.04.7140

Data da publicação: 27/03/2024, 07:01:00

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. INTERESSE PROCESSUAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TRABALHADOR DE INDÚSTRIA CALÇADISTA. EXPOSIÇÃO A HIDROCARBONETOS. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. FONTE DE CUSTEIO. EMPRESÁRIO. LAUDO TÉCNICO ASSINADO PELO SÓCIO DO SEGURADO. PROVA TESTEMUNHAL. FUNCIONÁRIOS DA EMPRESA. ADMISSIBILIDADE. AFASTAMENTO DAS ATIVIDADES NOCIVAS. DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO. OPÇÃO A CRITÉRIO DO SEGURADO. 1. O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito. Está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera. Não se tratando de categoria profissional prevista na legislação, a ausência dos formulários comprobatórios da exposição a agentes nocivos enseja o reconhecimento da falta de interesse de agir. 2. Na linha dos precedentes deste Tribunal, formados a partir do que foi constatado em inúmeras demandas similares, tem-se que a regra é a indústria calçadista utilizar cola para a industrialização dos seus produtos, sendo que a cola utilizada em época remota era composta por derivados de hidrocarbonetos, cujos vapores acarretavam graves efeitos na saúde do trabalhador. Considera-se, ainda, que os operários são contratados como serviços gerais, ajudante, auxiliar, atendente, entre outros, mas a atividade efetiva consiste no trabalho manual do calçado, em suas várias etapas industriais. 3. A circunstância de a Lei 8.212/1991 não trazer norma específica sobre o custeio da aposentadoria especial do contribuinte individual não afasta o direito ao benefício, que decorre de expressa disposição da lei de benefícios. Entretanto, em se tratando de contribuinte individual, ao qual incumbe tomar as medidas necessárias à proteção de sua saúde e integridade física, não se pode admitir a ausência do uso de EPI para a caracterização da especialidade a partir de quando era devido, exceto em relação aos agentes nocivos previstos no IRDR 15 desta Corte. 4. Tendo o segurado, proprietário da empresa, arrolado como testemunhas seus funcionários, a fim de demonstrar que atuava na área de produção, acerca dos quais não houve contradita ou impugnação do INSS, bem como juntado laudo técnico assinado pelo sócio, comprovando a exposição a ruídos acima do limite de tolerância, deve o período ser reconhecido como tempo especial, não sendo exigíveis outras provas. 5. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral no RE 788.092/SC (Tema 709), firmando a tese de que é constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. 6. Cabe à autarquia, na fase de cumprimento de sentença, verificar o preenchimento dos requisitos para a concessão tanto da aposentadoria especial como para aposentadoria por tempo de contribuição e apurar o melhor benefício, possibilitando à parte autora a escolha pelo que lhe for mais conveniente, considerando a necessidade de afastamento da atividade em caso de concessão de aposentadoria especial. (TRF4, AC 5000308-86.2018.4.04.7140, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 19/03/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000308-86.2018.4.04.7140/RS

RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

APELANTE: DANIEL KNACK (AUTOR)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente em parte o pedido (evento 46, SENT1), nos seguintes termos:

Face ao exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO para condenar o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a:

- AVERBAR o(s) período(s) especia(is) reconhecido(s) nesta sentença;

- IMPLANTAR o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição requerido na inicial, nos termos da fundamentação;

- PAGAR à parte autora as parcelas vencidas desde o ajuizamento até o cumprimento da determinação anterior, observando-se a prescrição qüinqüenal, se houver, e, quanto ao cálculo, as determinações supra.

Antecipação de Tutela: presentes os seus pressupostos legais, ANTECIPO A TUTELA DE MÉRITO e determino a intimação do INSS para, no prazo de 45 dias, sob pena de multa diária de R$ 50,00, juntar aos autos comprovante de implantação e/ou restabelecimento do benefício ora concedido.

Custas e Honorários Advocatícios: condeno o INSS ao ressarcimento das custas do processo, se houver, e ao pagamento de honorários advocatícios no montante de 10% (dez por cento) do valor da condenação ou, se não houver, sobre o valor atualizado da causa (IPCA-E). Tratando-se de demanda previdenciária, aplicam-se as Súmulas nºs 76 do TRF/4ª e 111 do STJ.

A parte autora recorre (evento 55, APELAÇÃO1), postulando o reconhecimento como tempo especial do período de 01/06/2014 a 21/03/2017, para o fim de ser concedido o benefício de aposentadoria especial desde a DER. Requer, ainda, a fixação dos efeitos financeiros a contar da DER, e não do ajuizamento como estabelecido na sentença.

Por sua vez, o INSS recorre (evento 56, APELAÇÃO1), alegando, em preliminar, a falta de interesse de agir em relação ao reconhecimento de tempo especial nos períodos de 25/01/1989 a 11/07/1991 (Calçados Ortopé S/A) e 18/09/2000 a 22/04/2005 (Salto Sandense Ltda.), vez que não foram apresentados formulários na via administrativa. No mérito, insurge-se contra o reconhecimento da especialidade quanto aos intervalos de: a) 24/07/1991 a 17/01/1993 (Calçados Guireni Ltda.), porquanto o formulário não foi exarado com base em LTCAT, a referência a agentes nocivos é genérica, desprovida de elementos quantitativos; b) 10/08/1993 a 26/10/1998 e 01/05/1999 a 04/08/2000 (Navalhas Wagner Ltda.), os cargos de “serviços gerais” ou de “auxiliar” não permite saber quais atribuições desempenhava, e a execução de diversas funções acarreta a intermitência da exposição. Ademais, a perícia realizada por similaridade com base em declarações unilaterais do autor se mostra inviável. c) 02/05/2005 a 01/07/2014 (Maria D. Sironi – EPP), o PPP não indica a exposição a agentes nocivos. Na eventualidade, concedido o benefício com base em documentos novos, requer que os efeitos financeiros tenham início a partir da citação. No que diz respeito aos consectários legais, pretende a aplicação do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009.

Oportunizada a apresentação de contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de Admissibilidade

Os apelos preenchem os requisitos de admissibilidade.

Preliminar

Do Interesse Processual

O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito, a teor do que dispõem os arts. 17, 330, III, e 485, VI, todos do Código de Processo Civil.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, em sede de repercussão geral, firmou a seguinte tese quanto ao Tema 350 (prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário):

I - A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas;

II – A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado;

III – Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão;

IV – Nas ações ajuizadas antes da conclusão do julgamento do RE 631.240/MG (03/09/2014) que não tenham sido instruídas por prova do prévio requerimento administrativo, nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (a) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (b) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; e (c) as demais ações que não se enquadrem nos itens (a) e (b) serão sobrestadas e baixadas ao juiz de primeiro grau, que deverá intimar o autor a dar entrada no pedido administrativo em até 30 dias, sob pena de extinção do processo por falta de interesse em agir. Comprovada a postulação administrativa, o juiz intimará o INSS para se manifestar acerca do pedido em até 90 dias. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir;

V – Em todos os casos acima – itens (a), (b) e (c) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.

(RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014) - grifado

Assim, está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera.

Exceção à regra os casos de reiterado entendimento contrário da Administração. Entretanto, desconheço alguma atividade que, demandada a análise na via administrativa com prova hábil para reconhecimento da especialidade apresentada, seja de plano indeferida, sem a competente verificação da prova.

Contudo, considerando que o processo serve de instrumento à consecução do direito material e que as partes têm direito assegurado à tutela de mérito tempestiva, bem como à aplicação da lei com vista aos fins sociais e às exigências do bem comum (CPC, arts. 4º e 8º), descabida a extinção do processo sem resolução do mérito, nesta fase processual, após o contraditório, ampla instrução probatória e prolação de sentença.

Mérito

Tempo de Serviço Especial

O reconhecimento da especialidade da atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Dito isso, tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei 3.807/1960 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991, em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto quanto à exposição a ruído e calor, além do frio, em que necessária a mensuração de seus níveis, por meio de parecer técnico trazido aos autos ou simplesmente referido no formulário padrão emitido pela empresa;

b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído, calor e frio, em relação aos quais é imprescindível a perícia técnica, conforme visto acima;

c) após 06/03/1997, quando vigente o Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei 9.528/1997, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

d) a partir de 01/01/2004, passou a ser necessária a apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, que substituiu os formulários SB-40, DSS 8030 e DIRBEN 8030, sendo este suficiente para a comprovação do tempo especial desde que devidamente preenchido com base em laudo técnico e contendo a indicação dos responsáveis técnicos legalmente habilitados, por período, pelos registros ambientais e resultados de monitoração biológica, eximindo a parte da apresentação do laudo técnico em juízo. Nesse sentido, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que, em regra, trazido aos autos o PPP, dispensável a juntada do respectivo laudo técnico ambiental, inclusive em se tratando de ruído, na medida em que o documento já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT. Ressalva-se, todavia, a necessidade da apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP (STJ, Petição 10.262/RS, Primeira Seção, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe de 16/02/2017).

Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 05/03/1997, e, a partir de 06/03/1997, os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível, também, a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n. 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/06/2003).

Ainda, o STJ firmou a seguinte tese no Tema 534: As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).

Acerca da conversão do tempo especial em comum, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial Repetitivo 1.151.363, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, pacificou o entendimento de que é possível a conversão mesmo após 28/05/1998.

Assim, considerando que o § 5.º do art. 57 da Lei 8.213/1991 não foi revogado nem expressa, nem tacitamente pela Lei 9.711/1998 e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional 20, de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998.

Do Contribuinte Individual

Com relação ao reconhecimento de tempo especial ao contribuinte individual, não há falar-se em ausência de fonte de custeio ou necessidade de o contribuinte estar vinculado a cooperativa de trabalho.

O art. 259 da Instrução Normativa 77/2015 dispõe, in verbis:

Art. 259. Para fins de caracterização de atividade exercida como segurado contribuinte individual em condições especiais a comprovação será realizada mediante a apresentação de original ou cópia autenticada dos seguintes documentos:

I - por categoria profissional até 28 de abril de 1995, véspera da data da publicação da Lei nº 9.032, de 1995, documentos que comprovem, ano a ano, a habitualidade e permanência na atividade exercida arrolada para enquadramento, estando dispensado de apresentar o formulário legalmente previsto no art. 258 desta IN para reconhecimento de períodos alegados como especiais;

II - por exposição a agentes nocivos, somente ao contribuinte individual cooperado filiado à cooperativa de trabalho ou de produção, mediante apresentação dos formulários de reconhecimento de períodos laborados em condições especiais, emitidos pela cooperativa, observados a alínea "b" do § 2º do art. 260 e o art. 295.

A Instrução Normativa 128/2022 repetiu a limitação ao enquadramento citado no art. 263:

Art. 263. A aposentadoria especial será devida somente aos segurados:

I - empregado;

II - trabalhador avulso;

III - contribuinte individual por categoria profissional até 28 de abril de 1995; e

IV - contribuinte individual cooperado filiado à cooperativa de trabalho ou de produção, para períodos trabalhados a partir de 13 de dezembro de 2002, data da publicação da Medida Provisória nº 83, por exposição a agentes prejudiciais à saúde.

A lei, entretanto, não nega ao contribuinte individual a possibilidade de obter aposentadoria especial, não se podendo fazer distinção onde a lei não o fez.

Ao prever o direito à aposentadoria especial, a Lei 8.213/1991 é clara ao estabelecer que será devida, uma vez cumprida a carência, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. Como é sabido, a categoria segurado contempla não apenas o empregado, mas também, entre outros, o contribuinte individual.

A circunstância de a Lei 8.212/1991 não trazer norma específica sobre o custeio da aposentadoria especial do contribuinte individual não afasta o direito ao benefício, que decorre, como visto, de expressa disposição da lei de benefícios.

Não se está a instituir benefício novo, sem a correspondente fonte de custeio. Trata-se de benefício já existente passível de ser auferido por segurado que implementa as condições previstas na lei de benefícios.

O fato de a lei indicar como fonte do financiamento da Aposentadoria Especial e da conversão de tempo especial em comum as contribuições a cargo da empresa não é óbice ao reconhecimento da especialidade ao contribuinte individual, pois o art. 195, caput e incisos, da Constituição Federal/1988, dispõem que a Seguridade Social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.

A Seguridade Social, ademais, como dispõe a Constituição, será financiada com recursos que não provêm especificamente de contribuições sobre as remunerações, mas também e em larga medida, de toda a sociedade e de contribuições das empresas sobre outras bases imponíveis. Trata-se da aplicação do princípio da solidariedade.

Agente Nocivo Fumos Metálicos

Os fumos metálicos eram previstos como agentes nocivos até 05/03/1997 pelo Decreto 53.831/1964 (Anexo, item 1.2.9 - "poeiras, gases, vapores, neblinas e fumos de outros metais") e no Decreto 80.030/1979 [Anexo, item 1.2.11 - (solda elétrica e a oxiacetilênico)].

Registro que os Decretos 2.172/1997 e 3.048/1999 não preveem o agente agressivo derivado fumos metálicos. Não obstante, a jurisprudência deste Tribunal tem entendimento pacificado acerca da possibilidade de enquadramento pela exposição a fumos metálicos sem limite temporal.

Assim, a exposição aos fumos metálicos sem a utilização de proteção adequada enseja o reconhecimento da especialidade do tempo de serviço, conforme a jurisprudência desta Corte, na medida em que os gases e vapores dos agentes químicos desprendidos no processo de soldagem são causadores em potencial de diversas doenças profissionais nos trabalhadores, podendo penetrar no organismo tanto pela via respiratória quanto pelo contato com a pele, ou ainda podem ser absorvidos pelo organismo por ingestão.

Já se decidiu nesta Corte que a exposição do trabalhador aos agentes tóxicos advindos da exposição a fumos de metais e gases de solda, bem como a radiações não ionizantes, caracteriza o exercício de atividade especial:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. TEMPO DE SERVIÇO MILITAR. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS RUÍDO, FUMOS METÁLICOS E RADIAÇÕES NÃO-IONIZANTES. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. LAUDO POR SIMILARIDADE. PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO CONCEDIDO ADMINISTRATIVAMENTE NO CURSO DA AÇÃO, MAIS VANTAJOSO, E EXECUÇÃO DAS PARCELAS ATRASADAS DO BENEFÍCIO DEFERIDO EM JUÍZO. POSSIBILIDADE. (...) A exposição a fumos metálicos (ferro, manganês, cádmio, zinco, chumbo e alumínio) e a radiações não-ionizantes do arco elétrico de soldagem enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. Súmula 198 do extinto TFR. 9. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades. 10. Admite-se a prova técnica por similaridade (aferição indireta das circunstâncias de labor) quando impossível a realização de perícia no próprio ambiente de trabalho do segurado. Precedentes da Terceira Seção desta Corte. 11. Comprovado o tempo de serviço/contribuição suficiente e implementada a carência mínima, é devida a aposentadoria por tempo de contribuição integral, computado o tempo de serviço até a DER, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do art. 54 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91.12. Se, no curso da ação previdenciária, o INSS vem a conceder, administrativamente, a aposentadoria à parte autora, esta pode optar, ou não, pela sua manutenção, sem prejuízo da execução dos valores devidos em razão do benefício deferido judicialmente, no tocante às parcelas anteriores à concessão administrativa. (TRF4, APELREEX 5001757-62.2010.404.7107, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27/09/2013)

PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. DESCABIMENTO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. RADIAÇÕES NÃO IONIZANTES. RECONHECIDAMENTE CANCERÍGENOS. UTILIZAÇÃO DE LAUDO SIMILAR. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS. CONCESSÃO. CONSECTÁRIOS. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. [...] 3. É possível o reconhecimento da especialidade em decorrência exposição aos agentes agressivos radiações não ionizantes e a fumos metálicos provenientes do processo de soldagem (Códigos 1.2.9 e 2.5.3 do Decreto 53.831/64 e 1.2.11 e 2.5.3 do Decreto 83.080/79). 4. Comprovada a exposição do segurado a um dos agentes nocivos elencados como reconhecidamente cancerígenos no Anexo da Portaria Interministerial nº 09, de 07/10/2014, deve ser reconhecida a especialidade do respectivo período, sendo irrelevante o uso de EPI ou EPC. Nesse sentido: Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) nº 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, Relator para o acórdão Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, maioria, juntado aos autos em 11/12/2017). [...] (TRF4, AC 5004557-53.2016.4.04.7107, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 28/06/2019)

Agente Nocivo Hidrocarbonetos

O código 1.2.11 do Decreto 53.831/1964 reconhecia o direito ao cômputo como tempo especial das operações executadas com derivados tóxicos do carbono, como hidrocarbonetos (ano, eno, ino), referindo o enquadramento dos trabalhos permanentes expostos às poeiras, gases, vapores, neblinas e fumos de derivados do carbono constantes da Relação Internacional das Substâncias Nocivas publicada no Regulamento Tipo de Segurança da O.I.T. - tais como: cloreto de metila, tetracloreto de carbono, tricloroetileno, clorofórmio, bromureto de metila, nitro benzeno, gasolina, alcoóis, acetona, acetatos, pentano, metano, hexano, sulfureto de carbono, etc.

O Decreto 83.080/1979, por sua vez, incluiu no código 1.2.10 – Hidrocarbonetos e outros compostos de carbono – as seguintes atividades:

Fabricação de benzol, toluol, xilol (benzeno, tolueno, xileno).

Fabricação e aplicação de inseticidas clorados derivados de hidrocarbonetos.

Fabricação e aplicação de inseticidas e fungicidas derivados do ácido carbônico.

Fabricação de derivados halogenados de hidrocarbonetos alifáticos: cloreto de metila, brometo de metila, clorofórmio, tetracloreto de carbono, tricloroetileno e bromofórmio.

Fabricação e aplicação de inseticida à base de sulfeto de carbono.

Fabricação de seda artificial (viscose).

Fabricação de sulfeto de carbono.

Fabricação de carbonilida.

Fabricação de gás de iluminação.

Fabricação de solventes para tintas, lacas e vernizes, contendo benzol, toluol e xilol

Registro que, conquanto o Decreto 2.172/1997 e o Decreto 3.048/1999 não prevejam este agente em seus anexos, este Tribunal possui entendimento pacificado no sentido de ser possível, mesmo após 06/03/1997, o reconhecimento da especialidade do labor exercido com exposição a hidrocarbonetos aromáticos. Embora o Decreto 2.172/1997 não preveja os hidrocarbonetos como agentes agressivos, contempla no item 1.0.19 a possibilidade de reconhecimento da especialidade pela exposição a "Outras Substâncias Químicas".

De outro norte, a aplicação da NR 15, aprovada pela Portaria 3.214/1978 do Ministério do Trabalho e Emprego, para além do campo do direito do trabalho, alcançando as causas previdenciárias, ocorreu a partir da Medida Provisória 1.729, de 02/12/1998, convertida na Lei 9.732/1998, quando a redação do art. 58, § 1º, da Lei 8.213/1991 passou a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista":

Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.

§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista." (grifei)

A partir de 03/12/1998, portanto, as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividades ou operações insalubres (NR 15), com os respectivos conceitos de "limites de tolerância", "concentração", "natureza" e "tempo de exposição ao agente" passam a influir na caracterização da natureza de uma dada atividade (se especial ou comum).

De acordo com o Anexo 13 da NR 15, os óleos minerais se enquadram como agentes químicos nocivos à saúde dentro da subespécie Hidrocarbonetos e Outros Compostos de Carbono, bastando análise qualitativa.

De outro lado, havendo a especificação dos tipos de agentes químicos presentes no ambiente laboral, deve-se observar a análise quantitativa prevista no Anexo 11 da NR 15 para os ali previstos, somente sendo enquadrado como tempo especial quando excedidos os limites de tolerância estabelecidos na referida norma, à exceção daqueles com absorção cutânea, pois para esse tipo de contato não há limites seguros de exposição.

Ressalto que a menção na LINACH - Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos - a óleos minerais como reconhecidamente cancerígenos restringe-se àqueles não tratados ou pouco tratados. Considerando que os óleos refinados, presentes no mercado brasileiro, garantem que os percentuais dos hidrocarbonetos aromáticos se encontrem em níveis seguramente baixos, não há como ser reconhecida a simples referência a óleos minerais como agentes cancerígenos para fins de exclusão do afastamento da especialidade pelo uso de EPI.

Em resumo:

a) até 02/12/1998, a atividade pode ser enquadrada como especial pela simples avaliação qualitativa da exposição aos agentes químicos;

b) a partir de 03/12/1998, devem ser observados os limites de tolerância constantes da NR 15, no caso dos agentes químicos previstos no Anexo 11, mantendo-se a análise qualitativa apenas para aqueles constantes do Anexo 13 da Norma;

c) o fornecimento de EPI, comprovado por meio de laudo técnico que confirme a neutralização da nocividade, afasta o enquadramento da atividade, exceto se comprovado o uso de óleos minerais não tratados ou pouco tratados, bem como no caso da presença de benzeno no ambiente laboral.

Agente Nocivo Ruído

Em se tratando de agente nocivo ruído, indispensável a existência de laudo técnico pericial para comprovar a exposição permanente e habitual ao agente agressivo, acima do limite permitido, a fim de caracterizar a atividade como especial.

O código 1.1.6 do Decreto 53.831/1964 previa que a especialidade deveria ser considerada para exposição a níveis de ruído superiores a 80 dB(A). Com a edição do Decreto 2.172, de 06 de março de 1997, esse índice foi alterado para 90 dB(A) - código 2.0.1. Ainda, após 18/11/2003, o limite foi fixado em 85 dB(A), conforme dispõe o Decreto 4.882/2003.

De outro lado, ainda que a partir da Lei 9.732/1998 seja obrigatória a informação pelo empregador acerca da utilização de tecnologia de proteção individual ou coletiva para diminuição/eliminação dos agentes nocivos presentes no ambiente de trabalho, com base em laudo técnico (art. 58, §2º, da LBPS), quanto ao agente agressivo ruído o uso de EPI, ainda que elimine a insalubridade, não descaracteriza o tempo de serviço especial.

Registro que o Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida nos autos do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 664.335, em que foi relator o Min. Luiz Fux, cuja ata de julgamento foi publicada no DJE de 17/12/2014, definiu que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.

O Tribunal assentou, ainda, a tese de que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

Com relação à variação do nível de ruído a que foi submetido o segurado, houve julgamento do acórdão paradigma do Tema 1.083 do STJ em 18/11/2021, com publicação em 25/11/2021, em que restou fixada a seguinte tese:

O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.

Portanto, não é mais aplicável a média ponderada ou aritmética. Necessária apresentação de laudo técnico com indicação do nível equivalente de ruído e, em caso de ausência, há possibilidade de utilização do pico.

Quanto ao método de aferição do agente nocivo ruído, esta Corte Regional tem posicionamento segundo o qual a utilização de metodologia diversa da prevista na NHO-01 da FUNDACENTRO não inviabiliza o reconhecimento da especialidade, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto (AC 5015224-47.2015.4.04.7200, Turma Regional Suplementar de SC, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, em 19/09/2019; AC 5001695-25.2019.4.04.7101, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, em 06/08/2020; AC 5003527-77.2017.4.04.7129, Quinta Turma, Relatora Gisele Lemke, em 08/07/2020).

Da Prova por Similaridade

Inicialmente, destaco que o INSS não refuta as conclusões dos laudos técnicos, que confirmam a exposição a agentes nocivos, mas sim a adequação de sua utilização para o caso concreto, visto que realizada em pessoa jurídica diversa daquela em que o segurado laborou.

Observo que, muitas vezes, a solução para a busca da melhor resposta às condições ambientais de trabalho, com a presença ou não de agentes nocivos, é a avaliação destas em estabelecimento semelhante àquele em que laborou originariamente o segurado, no qual poderão estar presentes os mesmos agentes nocivos, o que pode vir a ensejar um juízo conclusivo a respeito.

Logo, em tese, não há óbice à utilização de laudo técnico elaborado em uma empresa para comprovar a especialidade do labor em outra do mesmo ramo e no exercício de idêntica função.

Ademais, a Súmula 106 deste Tribunal assim estabelece: Quando não é possível a realização de perícia técnica no local de trabalho do segurado, admite-se a produção desta prova em empresa similar, a fim de aferir a exposição aos agentes nocivos e comprovar a especialidade do labor.

Contudo, importante mencionar que, em se tratando de empresa ativa, não cabe, em princípio, a utilização de laudo técnico similar.

De outro lado, a demonstração da similaridade de empresa congênere é ônus da parte requerente, a quem compete comprovar o ramo de atividade, o porte das empresas, as condições ambientais e em que haja idêntica função à desempenhada pelo segurado.

Do Uso de Equipamento de Proteção Individual

No que tange ao uso de EPI, defendia o entendimento de que a atividade é descaracterizada como tempo especial quando há informação no PPP indicando a resposta "S" no campo próprio e registrando o respectivo CA - Certificado de Aprovação - pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social.

Entendia que se o PPP é prova hábil à comprovação da exposição aos agentes agressivos especificados na legislação que trata da matéria, também deve ser considerado bastante à comprovação do uso de EPI eficaz, não havendo que ser exigida, na esfera previdenciária, a prova do fornecimento pela empresa, visto se tratar de obrigação de natureza trabalhista, alheia ao objeto da causa.

Apenas nos casos previstos no IRDR 15 deste Tribunal, haveria o reconhecimento do tempo especial a despeito do uso de EPI.

Relembrando, de acordo com a tese fixada por esta Corte no repetitivo, a utilização de EPI não afasta a especialidade do labor: a) em períodos anteriores a 03/12/1998; b) quando há enquadramento da categoria profissional; c) em relação aos seguintes agentes nocivos: ruído, agentes biológicos, agentes cancerígenos previstos no Quadro 1 da LINACH (v.g. asbesto/amianto, poeira de sílica, benzeno) e periculosos. Em sede de embargos de declaração, nos autos do IRDR em questão, o rol taxativo foi ampliado para acrescentar calor, radiações ionizantes e trabalhos sob condições hiperbáricas.

Conquanto interposto recurso contra a decisão no citado IRDR 15 (Tema 1090, STJ), não havendo determinação de suspensão dos processos nas instâncias inferiores, seguem mantidos os entendimentos ali inseridos.

Não obstante os entendimentos acima delimitados, no âmbito dessa 11ª Turma fiquei vencida em diversos julgamentos tratando da matéria, o que recomenda que, neste e nos próximos, ressalve minha posição, evitando assim divergências desnecessárias e atraso na entrega da prestação jurisdicional.

Dito isso, acolho o entendimento consolidado desta Corte no sentido de que, via de regra, a menção ao fornecimento do EPI no PPP não é suficiente, de modo que apenas para os casos em que o laudo técnico informe (i) o fornecimento pela empresa e (ii) a eficácia na neutralização da nocividade, caberá o afastamento do direito ao reconhecimento do tempo especial.

Noutras palavras, restou fixada presunção de ineficácia do EPI, sob a qual foi invertido o ônus da prova, ressalvando-se que a prova da existência do agente nocivo persiste necessária, cabendo ao segurado sua demonstração (AC 5002118-49.2019.4.04.7015, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 08/02/2023).

Observo, ainda, que o uso de EPI, para os demais agentes nocivos - excetuados os acima citados -, somente será considerado para o labor desempenhado a partir de 03/12/1998, em virtude da alteração efetuada no § 2º do art. 58 da Lei 8.213/1991 pela Medida Provisória 1.729, de 02/12/1998, convertida na Lei 9.732, de 11/12/1998. A própria autarquia previdenciária adota esse entendimento, conforme se verifica na Instrução Normativa 128/2022.

Desta forma, com a ressalva do entendimento pessoal, passo a adotar os seguintes critérios:

a) se o LTCAT e o PPP informam ser eficaz o EPI, não se reconhece a especialidade do labor;

b) nos casos de empresas inativas e não sendo obtidos os registros de fornecimento de EPI por meio de laudo técnico contemporâneo ao trabalho prestado, presume-se a ausência de seu fornecimento, sendo do INSS o ônus de comprovar o uso de EPI eficaz;

c) a utilização do EPI não afasta a especialidade do labor, ainda que eficaz na atenuação ou neutralização da nocividade, nas seguintes hipóteses:

c.1) no período anterior a 03/12/1998;

c.2) no caso de enquadramento por categoria profissional;

c.3) em se tratando dos agentes nocivos ruído, calor, radiações ionizantes e trabalhos sob condições hiperbáricas, bem como de agentes biológicos;

c.4) em se tratando de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos previstos na LINACH;

c.5) em se tratando de atividades exercidas sob condições de periculosidade (como, por exemplo, no caso do agente nocivo eletricidade).

Quanto aos demais agentes nocivos, deve-se observar a via de exposição do trabalhador (dérmica, inalatória, oral) a fim de verificar a efetividade dos EPIs fornecidos na neutralização da nocividade.

Do Caso Concreto

O ponto controvertido nos presentes autos diz respeito ao reconhecimento da especialidade nos intervalos de:

a) ​25/01/1989 a 11/07/1991

Empresa: Calçados Ortopé S/A

Cargo: auxiliar de costura​

Documento: ​evento 1, PROCADM10, p. 30 - laudo técnico da empresa de vínculo, sem data, segundo o qual, no setor de costura, havia ruído de 82 dB(A), ​sendo o limite de tolerância de 84 dB(A) para a jornada, bem como exposição a agentes químicos (tolueno) na função de aplicação de cola.

É fato notório que, nas empresas do ramo calçadista, os operários são contratados como serviços gerais, ajudante, auxiliar, atendente, entre outros, mas que a atividade efetiva consiste no trabalho manual do calçado, em suas várias etapas industriais. É notório ainda, que a indústria calçadista sempre depende da cola para a industrialização dos seus produtos e que a cola utilizada em época remota era composta por derivados de hidrocarbonetos, cujos vapores acarretavam graves efeitos na saúde do trabalhador.

Ainda que o uso de adesivos permaneça até hoje, pode-se ver nos diversos processos em que realizada perícia judicial ou apresentados laudos técnicos mais recentes que a composição dos adesivos não é mais tóxica a ponto de justificar o enquadramento especial, sendo, via de regra, compostos por agentes químicos em concentração inferior ao limite de exposição permitida.

Não se desconhece a inexistência de previsão legal da categoria de trabalhador na indústria calçadista ou algo equivalente nos decretos regulamentares. Entretanto, é importante esclarecer que o reconhecimento da especialidade aqui efetuado não equivale a um enquadramento por categoria profissional, visto que decorre de pacificada construção jurisprudencial, fruto de reiteradas ações judiciais propostas ao longo do tempo, nas quais a prova técnica evidencia a execução do labor em um único pavilhão, o qual, via de regra, não possui separação entre os setores e, invariavelmente, aponta a execução de atividades que demandam o contato diuturno com agentes químicos.

Observo, ainda, que o uso de EPI somente é considerado para o labor desempenhado a partir de 03/12/1998, em virtude da alteração efetuada no § 2º do art. 58 da Lei 8.213/1991 pela Medida Provisória 1.729, de 02/12/1998, convertida na Lei 9.732, de 11/12/1998.

Assim, considero possível o enquadramento como tempo especial dos períodos em que exercidas atividades em empresas do ramo calçadista até 02/12/1998, ainda que não apresentados formulários comprobatórios das condições ambientais, porquanto é dever do INSS, de posse da CTPS da parte autora, analisar os períodos, ainda que para abrir exigência para apresentação da competente documentação.

Sempre tendo em vista os princípios da razoabilidade e da eficiência da Administração Pública, bem como o caráter social da atividade prestada, é dever legal do INSS orientar e informar o segurado acerca das condições e exigências necessárias ao implemento dos requisitos para a obtenção do benefício.

Assim julga esta Corte em casos análogos:

PREVIDENCIÁRIO. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS EXIGIDOS À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DIREITO A EXECUTAR AS PARCELAS VENCIDAS. OBRIGAÇÃO DO INSS DE ORIENTAR O SEGURADO. CARÁTER SOCIAL DA PREVIDÊNCIA. OPÇÃO PELA MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. POSSIBILIDADE. 1. Implementados os requisitos exigidos para a concessão do benefício postulado, tem a parte autora direito ao pagamento das parcelas vencidas desde a data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal. 2. Decorre do próprio caráter social da atividade prestada pelo INSS a obrigação de orientar de forma efetiva os segurados no sentido de que, uma vez formulado pedido de concessão de benefício, quais documentos devem trazer para demonstrar que possuem direito ao que estão postulando, bem como que informações devem constar de tais documentos. 3. Ao verificar que a documentação apresentada se encontra incompleta ou com equívocos no que diz respeito ao preenchimento, tem o INSS também o dever de orientar o segurado a respeito de como sanar tais vícios. 4. Ao apreciar o pedido formulado, deve a autarquia verificar não apenas se ele possui direito ao benefício postulado, mas também se, a partir dos documentos apresentados, evidencia-se que possui direito a concessão de outro benefício previdenciário, ainda que não requerido expressamente. 5. É possível a manutenção do benefício concedido administrativamente no curso da ação e, concomitantemente, a execução das parcelas do benefício postulado na via judicial até a data da implantação administrativa. Precedentes desta Corte. 6. O fato de o segurado já estar percebendo um benefício deferido administrativamente quando do ingresso na via judicial postulando aquele que foi primeiramente postulado, e indeferido pelo INSS, não pode, por si só, representar uma opção do requerente naquele momento por um ou outro benefício, na medida em que, à toda evidência, não reunia condições de saber, de antemão, que prestação lhe resultaria mais vantajosa. Precedente deste Regional. (TRF4, APELREEX 0019151-90.2011.4.04.9999, Quinta Turma, Relator Roger Raupp Rios, D.E. 05/07/2016, grifo nosso)

Desta forma, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade.

b) 24/07/1991 a 17/01/1993

Empresa: Calçados Guireni Ltda.

Cargo: auxiliar geral / montagem

Documento: evento 1, PROCADM10, p. 34 - Realizava atividade de aplicar cola nas partes e componentes do calçado.Utilizava solvente para remover excesso de cola ou sujeira. Exposição a ruído (não quantificado) e hidrocarbonetos aromáticos. Empresa não possui laudo e está desativada. Formulário DSS8030 firmado por ex-sócio da empresa.

Não há reparo a ser feito na sentença recorrida, vez que os hidrocarbonetos aromáticos estão previstos no Anexo 13 da NR 15, de análise qualitativa, devendo ser rejeitado o recurso do INSS.

c) 10/08/1993 a 26/10/1998 e 01/05/1999 a 04/08/2000

Empresa: Navalhas Wagner Ltda.

​​​Cargo: serviços gerais / montagem

Documento: evento 1, PROCADM11, p. 8 - Realizava a atividade de dobrar fios de aço para realizar navalhas para corte. Soldava reforço na navalha. Operava esmeril para retirar as rebarbas. Para dar acabamento nas matrizes aplicava verniz para dar maior durabilidade. Exposição a ruído (não quantificado) e hidrocarbonetos aromáticos (óleo, graxas, verniz e solvente).​​​​​​ Empresa não possui laudo e está desativada. Formulário DSS8030 firmado por ex-sócio da empresa.

A sentença reconheceu a especialidade com base em laudo pericial elaborado nos autos 164/1140000066-9, em que analisada atividade prestada por aquele autor também na empresa Navalhas Wagner Ltda., sendo comprovada a exposição aos fumos metálicos presentes na solda como cádmio, chumbo e cromo, bem como a ruído de 97,2 dB(A).

A alegação de se tratar de atividade genérica não é bastante para afastar a especialidade, porquanto o formulário apresentado descreve com exatidão as atribuições desempenhadas pelo segurado, não se tratando de prova unilateral.

Desta forma, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade, rejeitando-se o recurso do INSS.

d) 18/09/2000 a 22/04/2005

Empresa: Salto Sandense Ltda.

Cargos: auxiliar de matrizaria, matrizeiro e frezador

O autor comprova o encerramento das atividades da empresa de vínculo (evento 1, PROCADM11, p. 25).

A sentença reconheceu a especialidade com base em laudo pericial elaborado nos autos 2009.71.08.005810-0, realizado na empregadora do autor, segundo o qual foi constatado ruído de 82 a 87 dB(A), bem como o manuseio de óleos e graxas de base mineral, não sintética, além de ter contato com óleos lubrificantes e óleos queimados. Refere, ainda, que eram realizados serviços de solda, havendo exposição a fumos metálicos e radiação não ionizante.

Desta forma, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade, rejeitando-se o recurso do INSS.

e) 02/05/2005 a 01/07/2014

Empresa: Maria D. Sironi – EPP

Cargo: acabador / produção

Documento: ​evento 1, PROCADM11​, p. 39 - Realizava a função de dobrar o fio de metal para ser formada a navalha. Soldava os reforços na navalha. Operava esmeril e aplicava verniz, assim dando um acabamento na navalha. PPP informa exposição a ruído (não quantificado), solvente, verniz e óleos e graxas. Contudo, não há responsável técnico pelos registros ambientais.

A sentença procede ao enquadramento com base no laudo similar utilizado para a análise dos vínculos com a empresa Navalhas Wagner Ltda. que comprova a exposição aos fumos metálicos presentes na solda como cádmio, chumbo e cromo, bem como a ruído de 97,2 dB(A).

Portanto, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade, rejeitando-se o recurso do INSS.

f) 01/06/2014 a 21/03/2017

Empresa: Navalhas Serrano Ltda.

Cargo: soldador / produção

Documento: evento 1, PROCADM11, p. 41 - Supervisiona os setores, ensinando, orientando e cobrando a produção. Também realiza a atividade de dobrar fios de aço, para confecção de navalhas para balancins de corte. Soldava reforço, opera esmeril para retirar as rebarbas. Para dar acabamento nas matrizes aplica verniz. O PPP informa a exposição a ruído de 92 dB(A) por 1 h diária e a pó de ferro.

O laudo técnico (evento 1, PROCADM12, p. 1), elaborado em 07/2016, refere que a área de produção é composta pelos setores de dobra, montagem/acabamento, esmeril e expedição.

No setor administrativo, em que fica consignada a atuação do proprietário, em que são feitos os atendimentos aos clientes e demais serviços administrativos, é informada a presença de ruído de 55 dB(A).

No setor de dobra, constam medições de 65 dB(A) a 98 dB(A), sendo que esta última medição é considerada eventual, apenas quando da utilização do disco de corte, que ocorre aproximadamente 1h por dia. Ademais, informa ruído de 88 dB(A) na operação da solda de oxigênio, por cerca de 3h por dia; 92 dB(A) na operação de esmeril, por cerca de 1h ao dia.

No setor de acabamento, os ruídos foram aferidos entre 78 dB(A) e 91 dB(A). No setor de esmeril, há ruído de 90 dB(A) a 100 dB(A), enquanto no setor de expedição o ruído é de 66 dB(A). O laudo ainda conclui que os empregados trabalham em forma de rodízio cada operação é feita de acordo com a necessidade do trabalho.

A sentença assim analisou o período:

- Conclusão: não caracterizada a especialidade. Conforme o CNIS juntado aos autos, o vínculo da parte autora com a Previdência Social ocorreu na condição de contribuinte individual. O autor é sócio proprietário da empresa em questão.

Segundo os depoimentos colhidos em audiência, o autor tem apenas um sócio e a empresa produz navalhas para indústrias de calçados.

Quanto ao contribuinte individual, é preciso (a) prova documental do exercício da atividade declarada, tais como alvarás e inscrições municipais, guias de recolhimento, etc; (b) prova testemunhal acerca das atividades efetivamente exercidas e (c) prova técnica que ateste exposição a agentes nocivos em caráter de habitualidade e/ou permanência.

No caso, as testemunhas ouvidas são empregados da empresa, e todos os documentos juntados aos autos foram confeccionados pelo próprio autor e seu sócio, na condição de proprietários e sócios da empresa, o que não garante a necessária isenção.

Ademais, em relação ao prestador autônomo de serviços (contribuinte individuais), cabe ao próprio segurado - e a ninguém mais - assumir os riscos da atividade econômica explorada, inclusive no que respeita à própria saúde. E sendo certo que o tipo de atividade exercida pelo autor comporta neutralização da nocividade pelo uso adequado de EPIs, a eventual falta de tais equipamentos não pode ser invocada para caracterizar a atividade como especial. Entender de modo diverso implicaria premiar o segurado pela própria desídia, o que não pode ser admitido.

Não obstante, considero que o segurado produziu todas as provas que estavam ao seu alcance e que são exigidas pela legislação previdenciária para a demonstração de seu direito.

As testemunhas ouvidas, funcionários da empresa, são as mais habilitadas a informar o tipo de atividade desenvolvida pelo patrão, visto que outras que pudessem ser arroladas, como clientes, por exemplo, não seriam capazes de assegurar sua atuação na área de produção. Ressalto que não houve, por parte do INSS qualquer manifestação contrária à sua oitiva, antes, durante ou após o ato, tampouco ao conteúdo dos depoimentos, de modo que não há como ser atribuída suspeição onde não houve alegação.

Ademais, o argumento de que o laudo técnico foi assinado pelo sócio do autor não pode servir de fundamento para a rejeição do enquadramento, porquanto a legislação assim o exige. Em assim não sendo, de que outra forma poderia o segurado demonstrar as condições de seu labor?

Portanto, entendo que merece acolhimento o recurso da parte autora, devendo ser reconhecida a especialidade em razão da exposição a ruídos acima dos limites de tolerância, para o que mostra-se irrelevante a utilização de EPI, conforme fundamentação.

Requisitos para Aposentadoria

O INSS apurou, na DER, 27 anos, 1 meses e 15 dias de tempo de contribuição.

Na sentença recorrida, foram reconhecidos 24 anos, 02 meses e 08 dias de tempo especial, bem como 36 anos, 09 meses e 19 dias de tempo de contribuição, sendo determinada a implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER.

Considerando o tempo especial ora reconhecido, tem-se que o autor implementa 26 anos, 11 meses e 29 dias de tempo especial, fazendo jus ao benefício de aposentadoria especial.

Com a conversão do tempo especial em comum, totaliza 37 anos, 11 meses e 4 dias de contribuição, fazendo jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER (21/03/2017).

O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/1999, com a incidência do fator previdenciário, uma vez que a pontuação totalizada (80.82 pontos) é inferior a 95 pontos (Lei 8.213/1991, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).

Do Afastamento da Atividade Especial

A Lei 8.213/1991 prevê, em seu art. 46, que o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno.

Por outro lado, o § 8º do art. 57 (que trata da aposentadoria especial) da Lei 8.213/1991, incluído pela Lei 9.732, de 11/12/1998, dispõe:

§ 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral no RE 788.092/SC (Tema 709), firmando a seguinte tese:

I - É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não; II - Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.

E do corpo do acórdão se extrai:

Na aposentadoria especial, a presunção de incapacidade é absoluta – tanto que, para obtenção do benefício, não se faz necessária a realização de perícia ou a demonstração efetiva de incapacidade laboral, bastando apenas e tão somente a comprovação do tempo de serviço e da exposição aos agentes danosos. Nessa hipótese, a aposentação se dá de forma precoce porque o legislador presume que, em virtude da nocividade das atividades desempenhadas, o trabalhador sofrerá um desgaste maior do que o normal de sua saúde. Dito em outras palavras, o tempo para aposentadoria é reduzido em relação às outras categorias porque, ante a natureza demasiado desgastante e/ou extenuante do serviço executado, entendeu-se por bem que o exercente de atividade especial deva laborar por menos tempo – seria essa uma forma de compensá-lo e, sobretudo, de protegê-lo.

Ora, se a presunção de incapacidade é, consoante dito, absoluta; se a finalidade da instituição do benefício em questão é, em essência, resguardar a saúde e o bem-estar do trabalhador que desempenha atividade especial; se o intuito da norma, ao possibilitar a ele a aposentadoria antecipada, é justamente retirá-lo do ambiente insalubre e prejudicial a sua incolumidade física, a fim de que não tenha sua integridade severa e irremediavelmente afetada, qual seria o sentido de se permitir que o indivíduo perceba a aposentadoria especial mas continue a desempenhar atividade nociva? Como se nota, sob essa óptica, a previsão do art. 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, é absolutamente razoável e consentânea com a vontade do legislador.

Desarrazoado, ilógico e flagrantemente contrário à ideia que guiou a instituição do benefício é, justamente, permitir o retorno ao labor especial ou sua continuidade após a obtenção da aposentadoria – prática que contraria em tudo o propósito do benefício e que significa ferir de morte sua razão de ser.

Desta forma, uma vez implantado o benefício – desde quando preenchidos os requisitos – deve haver o afastamento da atividade tida por especial, inexistindo inconstitucionalidade no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, não sendo justificável o condicionamento de sua implantação ao prévio distanciamento da atividade nociva.

Não obstante, constatada a continuidade do exercício de atividade nociva, eventual suspensão do benefício não pode dispensar o devido processo legal, cabendo ao INSS, na via administrativa, proceder à notificação do segurado para defesa, oportunizando prazo para que comprove o afastamento da atividade nociva ou, então, para que regularize a situação.

Por fim, nada impede que o autor opte, em fase de cumprimento de sentença, pela implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde que igualmente atendidos os requisitos para tal com a conversão do tempo especial em comum, mantendo-se a possibilidade da continuidade do labor, inclusive na atividade nociva, vez que a vedação é aplicável apenas no caso da aposentadoria especial com tempo reduzido.

Da Data de Início do Benefício

A sentença recorrida assim dispôs:

Assim, impõe-se a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição a(o) autor(a), devendo o INSS proceder às seguintes determinações:

1) à averbação do(s) período(s) especial(is) ora reconhecido(s), com a respectiva conversão em comum;

2) à concessão de aposentadoria por tempo de serviço e/ou contribuição;

3) ao pagamento das diferenças devidas desde o ajuizamento, uma vez que os períodos requeridos referem-se a atividades genéricas, e a especialidade restou comprovada somente em Juízo, conforme entendimento registrado no corpo desta sentença.

A questão atinente ao termo inicial dos efeitos financeiros de benefício em casos como o ora analisado encontra-se em debate no Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 1124), sendo submetida a julgamento a seguinte questão:

Definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS: se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária.

Em havendo determinação de suspensão nacional dos feitos em que discutida essa questão, e com o objetivo de evitar prejuízo à razoável duração do processo, bem como a interposição de recurso especial especificamente quanto à matéria, a melhor alternativa é diferir, para momento posterior ao julgamento do tema, o respectivo exame. Mitiga-se, assim, o impacto de controvérsia secundária sobre a prestação jurisdicional, já que o resultado do julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça não afetará o direito ao benefício em si, mas apenas o termo inicial dos efeitos financeiros dele decorrente.

Assim, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.

Dá-se, portanto, parcial provimento à apelação do INSS e do autor.

Correção Monetária e Juros

A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período compreendido entre 11/08/2006 e 08/12/2021, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02/03/2018), inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.

Quanto aos juros de mora, entre 29/06/2009 e 08/12/2021, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, por força da Lei 11.960/2009, que alterou o art. 1º-F da Lei 9.494/97, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE 870.947 (Tema STF 810).

A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, impõe-se a observância do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, segundo o qual, "nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente".

Honorários Advocatícios

Tendo em vista o parcial acolhimento do recurso do INSS, no que diz respeito à postergação da definição dos efeitos financeiros para a fase de cumprimento de sentença, não há majoração dos honorários (§ 11 do art. 85 do CPC), pois ela só ocorre se o recurso for integralmente desprovido (Tema STJ 1.059).

Da Tutela Específica

A tutela de urgência foi deferida na instância ordinária, tendo o benefício sido implantando em cumprimento provisório de sentença (evento 49, EXECUMPR1).

Prequestionamento

No que concerne ao prequestionamento, tendo sido a matéria analisada, não há qualquer óbice, ao menos por esse ângulo, à interposição de recursos aos tribunais superiores.

Conclusão

- Dar parcial provimento ao recurso do autor para reconhecer como tempo especial o período de 01/06/2014 a 21/03/2017, bem como o direito ao benefício de aposentadoria especial, assim como de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER.

- Diferir para após o julgamento do Tema 1124 a definição da data de início dos efeitos financeiros.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso da parte autora e dar parcial provimento ao recurso do INSS.



    Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004320187v18 e do código CRC 797bb9f9.Informações adicionais da assinatura:
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    5000308-86.2018.4.04.7140
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    Poder Judiciário
    TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

    Apelação Cível Nº 5000308-86.2018.4.04.7140/RS

    RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    APELANTE: DANIEL KNACK (AUTOR)

    APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

    APELADO: OS MESMOS

    EMENTA

    previdenciário. tempo especial. interesse processual. prévio requerimento administrativo. trabalhador de indústria calçadista. exposição a hidrocarbonetos. contribuinte individual. fonte de custeio. empresário. laudo técnico assinado pelo sócio do segurado. prova testemunhal. funcionários da empresa. admissibilidade. afastamento das atividades nocivas. direito ao melhor benefício. opção a critério do segurado.

    1. O interesse de agir afigura-se como uma das condições da ação e a sua ausência enseja o indeferimento da inicial com a consequente extinção do feito sem resolução do mérito. Está assentado o entendimento da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto jurídico para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, o que não se confunde com o exaurimento daquela esfera. Não se tratando de categoria profissional prevista na legislação, a ausência dos formulários comprobatórios da exposição a agentes nocivos enseja o reconhecimento da falta de interesse de agir.

    2. Na linha dos precedentes deste Tribunal, formados a partir do que foi constatado em inúmeras demandas similares, tem-se que a regra é a indústria calçadista utilizar cola para a industrialização dos seus produtos, sendo que a cola utilizada em época remota era composta por derivados de hidrocarbonetos, cujos vapores acarretavam graves efeitos na saúde do trabalhador. Considera-se, ainda, que os operários são contratados como serviços gerais, ajudante, auxiliar, atendente, entre outros, mas a atividade efetiva consiste no trabalho manual do calçado, em suas várias etapas industriais.

    3. A circunstância de a Lei 8.212/1991 não trazer norma específica sobre o custeio da aposentadoria especial do contribuinte individual não afasta o direito ao benefício, que decorre de expressa disposição da lei de benefícios. Entretanto, em se tratando de contribuinte individual, ao qual incumbe tomar as medidas necessárias à proteção de sua saúde e integridade física, não se pode admitir a ausência do uso de EPI para a caracterização da especialidade a partir de quando era devido, exceto em relação aos agentes nocivos previstos no IRDR 15 desta Corte.

    4. Tendo o segurado, proprietário da empresa, arrolado como testemunhas seus funcionários, a fim de demonstrar que atuava na área de produção, acerca dos quais não houve contradita ou impugnação do INSS, bem como juntado laudo técnico assinado pelo sócio, comprovando a exposição a ruídos acima do limite de tolerância, deve o período ser reconhecido como tempo especial, não sendo exigíveis outras provas.

    5. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral no RE 788.092/SC (Tema 709), firmando a tese de que é constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.

    6. Cabe à autarquia, na fase de cumprimento de sentença, verificar o preenchimento dos requisitos para a concessão tanto da aposentadoria especial como para aposentadoria por tempo de contribuição e apurar o melhor benefício, possibilitando à parte autora a escolha pelo que lhe for mais conveniente, considerando a necessidade de afastamento da atividade em caso de concessão de aposentadoria especial.

    ACÓRDÃO

    Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso da parte autora e dar parcial provimento ao recurso do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

    Florianópolis, 19 de março de 2024.



    Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004328527v4 e do código CRC 826be5c5.Informações adicionais da assinatura:
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    Poder Judiciário
    Tribunal Regional Federal da 4ª Região

    EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 19/03/2024

    Apelação Cível Nº 5000308-86.2018.4.04.7140/RS

    RELATORA: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    PRESIDENTE: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

    PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES

    SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: DIEGO HENRIQUE SCHUSTER por DANIEL KNACK

    APELANTE: DANIEL KNACK (AUTOR)

    ADVOGADO(A): DIEGO HENRIQUE SCHUSTER (OAB RS080210)

    ADVOGADO(A): VILMAR LOURENÇO (OAB RS033559)

    APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

    APELADO: OS MESMOS

    Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 19/03/2024, na sequência 128, disponibilizada no DE de 08/03/2024.

    Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

    A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS. ADVOGADO DECLINOU DA SUSTENTAÇÃO ORAL TENDO EM VISTA O RESULTADO FAVORÁVEL.

    RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    Votante: Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

    Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

    Votante: Desembargadora Federal ANA CRISTINA FERRO BLASI

    LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA

    Secretária

    MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

    Esclarecimento - GAB. 112 (Des. Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO) - Desembargadora Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO.

    Prejudicada a SO



    Conferência de autenticidade emitida em 27/03/2024 04:00:59.

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