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EMENTA: TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI 11. 451/2021. RESPONSABILIDADE PELO SALÁRIO. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA, AO SAT/RAT E A TERCEIROS. NÃO INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. ATUALIZAÇÃO PELA SELIC. TRF4. 5005939-67.2023.4.04.7000

Data da publicação: 20/03/2024, 11:01:03

EMENTA: TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI 11.451/2021. RESPONSABILIDADE PELO SALÁRIO. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA, AO SAT/RAT E A TERCEIROS. NÃO INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. ATUALIZAÇÃO PELA SELIC. 1. É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às empregadas afastadas durante o período de emergência, motivo pelo qual não deve incidir contribuição previdenciária, inclusive ao SAT/RAT e a Terceiros, sobre tal verba, nos termos da Tese de Repercussão Geral do STF nº 72, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991,devidamente corrigidas pela Taxa SELIC. 2. A solução dada ao caso se dá no sentido de enquadrar os pagamentos realizados pelas empresas como salário-maternidade, implicando na redução da contribuição previdenciária patronal, sem a efetiva implantação do referido benefício previdenciário. (TRF4, AC 5005939-67.2023.4.04.7000, SEGUNDA TURMA, Relatora MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, juntado aos autos em 12/03/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, 6º andar - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51) 3213-3161 - Email: gmfatima@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5005939-67.2023.4.04.7000/PR

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

APELANTE: KOMPLETA CALCADOS LTDA. (IMPETRANTE)

ADVOGADO(A): GABRIEL PLACHA (OAB PR030255)

ADVOGADO(A): CARLOS ARAUZ FILHO (OAB PR027171)

APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

INTERESSADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - CURITIBA (IMPETRADO)

RELATÓRIO

O presente feito foi assim relatado na origem:

Trata-se de mandado de segurança por meio do qual pretende a impetrante "seja declarado o direito líquido e certo da impetrante, em sua matriz e em todas as suas filiais, de: d.1) enquadrar como salário maternidade os valores pagos para suas empregadas gestantes, que tenham sido afastadas na forma da Lei nº 14.151/2021 e impossibilitadas de exercer suas atividades remotamente, com a compensação nos termos do artigo 72, da Lei nº 8.213/91 e do artigo 394-A, §3º da CLT, devidamente atualizados pela Taxa SELIC, e; d.2) não recolher a contribuição previdenciária patronal, RAT/SAT e terceiros sobre os valores enquadrados como salário maternidade, com a compensar dos valores recolhidos a maior com débitos próprios, vencidos ou vincendos, devidamente corrigidos pela Taxa Selic a partir do recolhimento até o aproveitamento, com quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, inclusive, com contribuição previdenciária sobre a folha e de terceiros".

Relata que, devido a disseminação da pandemia do coronavírus, foi promulgada a Lei n.º 14.151/2021 que assegura às empregadas gestantes o afastamento das atividades presenciais enquanto vigorar o estado de calamidade pública, possibilitando o trabalho à distância mediante teletrabalho. Todavia, a legislação é omissa em informar a quem compete arcar com o custo decorrente do afastamento da empregada gestante naqueles casos em que o trabalho seja imprescindivelmente presencial, como na prestação de serviços da empresa autora. Requer aplicação conjugada da lei n.º 14.151/2021 com o disposto no artigo 394-A, § 3º, da CLT. Assim sendo, diante do afastamento compulsório das empregadas gestantes, requer que o ônus do pagamento correspectivo seja suportado pela coletividade por meio do auxílio-maternidade, o qual deve, inclusive, ser excluído da base de cálculo da Contribuição Previdenciária Patronal e de terceiros.

Custas pagas no evento 5.

A União manifestou interesse em ingressar no feito, nos termos do disposto no art. 7º, inciso II da lei 12.016/2009 (evento 11).

Notificada, a autoridade impetrada prestou informações no evento 12, nas quais defendeu, em preliminar, a inadequação da via eleita, uma vez que a distribuição do presente mandamus ocorreu em 08/02/2023, ou seja, quando já decorridos mais de 120 (cento e vinte) dias da publicação da Lei nº 14.311/2022. No mérito, alegou que já houve o encerramento da emergência em saúde pública de importância nacional (ESPIN) em abril de 2022. Também afirmou que a Constituição Federal traz a proteção à maternidade no rol de serviços a serem atendidos pela Previdência Social, ao mesmo tempo em que estabelece, entre os direitos do trabalhador, o direito à licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias, não sendo possível equipara a remuneração da empregada gestante ao salário-maternidade. Diz que não há autorização legal para que o afastamento da gestante seja equiparado ao salário-maternidade, não cabendo ao Poder Judiciário suprir eventual lacuna legal. Pugnou pela denegação da segurança.

Réplica (evento 17).

O Ministério Público Federal deixou de se manifestar sobre o mérito, alegando que a natureza do feito não justificava sua intervenção (evento 20).

Relatado, decido.

Instruído, sobreveio sentença denegando a segurança, com dispositivo assim redigido:

Ante o exposto, denego a segurança, declarando extinto o processo, com resolução do mérito (art. 487, I, CPC).

Custas pela parte impetrante. Sem honorários (artigo 25 da Lei n.º 12.016/2009).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, arquive-se.

A parte impetrante apela, requerendo a reforma da sentença para garantir o direito ao enquadramento dos afastamentos de gestantes de que trata a Lei nº 14.151/21 como salário maternidade, permitindo assim a dedução de tais pagamentos nos termos do que dispõe o art. 72 da Lei nº 8.213/91, bem como se determine e declare a não incidência de contribuições destinadas à Previdência Social ou a terceiros (Sistema S) sobre os valores pagos às suas trabalhadoras gestantes enquanto perdurar o afastamento sem contraprestação de serviço.

Defende a apelante, assim, que deve ser reconhecido seu direito de compensar os valores pagos para as gestantes afastadas pela Lei nº 14.151/2021, devidamente corrigidos pela Taxa SELIC, desde os pagamentos, até a efetiva utilização, com quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, inclusive contribuições previdenciárias e de terceiros, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial nº 1.603.575/SC.

Com contrarrazões. vieram os autos para julgamento.

O Ministário Público Federal propugnou pelo seguimento do feito.

É o relatório.

VOTO

Legitimidade passiva

A pretensão da demandante envolve o enquadramento como salário-maternidade, para fins de ressarcimento dos valores pagos às empregadas gestantes afastadas por força da lei nº 14.151/21, bem como para compensação das referidas verbas da base de cálculo das contribuições previdenciárias.

De acordo com as disposições do artigo 72 da Lei nº 8.213/91, cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação quando do recolhimento das contribuições previdenciárias, de modo que os valores constituem encargo da União, ficando os documentos comprobatórios sujeitos à fiscalização, a qual é exercida pela Receita Federal do Brasil (artigo 2º da Lei nº 11.457/07).

Outrossim, a matéria já foi objeto de decisão provisória proferida em conflito de competência, na esteira dos precedentes da Corte Especial. Cito:

PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LEI Nº 14.151/2021. ENQUADRAMENTO DA REMUNERAÇÃO PAGA ÀS GESTANTES COMO SALÁRIO MATERNIDADE. PRETENSÃO DE DEDUÇÃO DOS VALORES PAGOS DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DEVIDAS. NATUREZA TRIBUTÁRIA. 1. A definição da competência há de levar em consideração, prioritariamente, o pedido principal. 2. Pretendendo a litigante, como pedido principal, deduzir da base de cálculo das contribuições sociais devidas sobre os valores pagos às empregadas gestantes por força da Lei n.º 14.151/2021, o qual depende do exame da possibilidade de enquadramento da remuneração a que alude a mencionada legislação como salário maternidade, tem-se como prevalente a índole tributária da causa. 3. A questão está inserida globalmente na competência tributária, já que relacionada ao pagamento de contribuições sociais previdenciárias. Precedentes da Corte Especial. (TRF4 5046295-26.2021.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, juntado aos autos em 25/02/2022)

De fato, o ônus financeiro imposto pela Lei 14.151/2021 diz respeito à relação jurídica tributária estabelecida entre a empregadora e o Fisco.

Isto porque a solução dada aos casos como o dos autos, no sentido de enquadrar os pagamentos realizados pelas empresas como salário-maternidade, implica na redução da contribuição previdenciária patronal, sem a efetiva implantação do referido benefício previdenciário.

Assim, no caso em apreço, a legitimidade passiva é somente da União.

Do mérito

Não se discute que, pela letra da Lei nº 14.151/2021, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo da remuneração, devendo exercer "as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância."

No entanto, como é sabido, nem todas as atividades da empregada são passíveis de trabalho remoto, muitas delas só podem ser prestadas presencialmente, sem condições de afastamento físico.

Não parece, todavia, razoável imputar o custo decorrente da determinação do referido afastamento previsto na Lei nº 14.151/21 (alterada pela Lei 14.311/22) ao empregador.

O art. 201, II da Constituição Federal estabelece a proteção à maternidade pela seguridade social, de modo que eventuais ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador.

A legislação, todavia, é omissa no tocante à responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada das atividades presenciais, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota.

Em recente decisão da Primeira Turma deste Tribunal, da relatoria do Des. Leandro Paulsen (TRF4, AG 5012750-28.2022.4.04.0000, juntado aos autos em 20/06/2022) questão idêntica a dos presentes autos foi decidida de acordo com a analogia (art. 4º da LINDB), como se pode verificar, a seguir:

A ordem constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela seguridade social (art. 201, II). Neste contexto, eventuais ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador.

Aliás, o ordenamento jurídico já cuida de hipóteses assemelhadas, sendo legítimo que nos valhamos da analogia, no caso, porquanto é instrumento de integração normativa, nos termos do art. 4º da LINDB: "Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito".

A propósito, vale atentar para a previsão trazida no art. 394-A, § 3º, da Consolidação das Leis Trabalhistas:

Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de:

Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de: (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

I - atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

II - atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vide ADIN 5938)

III - atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vide ADIN 5938)

§ 1o (VETADO)

§ 2o Cabe à empresa pagar o adicional de insalubridade à gestante ou à lactante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, por ocasião do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

§ 3o Quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada nos termos do caput deste artigo exerça suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, durante todo o período de afastamento. (destaquei)

Portanto, tenho que a solução para o caso passa pelo pagamento de salário maternidade para as gestantes durante o período de afastamento. Consequentemente, há que permitir que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991, in verbis:

Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral.

§ 1º Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço.

Com efeito, "é compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/91".

Nesse sentido, esta Turma firmou entendimento, em julgamento submetido ao rito do art. 942 do CPC, segundo o qual "É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991" (TRF4, AC 5019817-94.2021.4.04.7205, SEGUNDA TURMA, Relatora para Acórdão MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, juntado aos autos em 08/08/2022).

Na mesma linha, já decidiu a Primeira Turma deste Tribunal:

TRIBUTÁRIO. CORONAVÍRUS. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI 11.451/2021. RESPONSABILIDADE PELO SALÁRIO. PROTEÇÃO DA MATERNIDADE PELA SEGURIDADE SOCIAL. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. 1. A Lei 11.451/2021 é omissa quanto à responsabilidade pelo pagamento da remuneração da gestante que, afastada de suas atividades presenciais, esteja impossibilitada de exercer suas tarefas de forma remota. 2. A ordem constitucional estabelece expressamente a proteção da maternidade pela seguridade social (art. 201, II), razão pela qual os ônus financeiros decorrentes do afastamento em questão devem ser suportados pela coletividade, e não pelo empregador. 3. É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas durante o período de emergência, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991. (TRF4, AC 5028485-84.2021.4.04.7001, PRIMEIRA TURMA, Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 21/06/2022).

Sendo assim, merece provimento o apelo da impetrante.

A União - FN deverá ressarcir as custas pagas pela parte impetrante. Sem honorários (artigo 25 da Lei n.º 12.016/2009).

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da impetrante.



Documento eletrônico assinado por MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004255655v2 e do código CRC 85278864.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5005939-67.2023.4.04.7000/PR

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

APELANTE: KOMPLETA CALCADOS LTDA. (IMPETRANTE)

ADVOGADO(A): GABRIEL PLACHA (OAB PR030255)

ADVOGADO(A): CARLOS ARAUZ FILHO (OAB PR027171)

APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

INTERESSADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - CURITIBA (IMPETRADO)

VOTO DIVERGENTE

A Lei n° 14.151, de 2021, que dispõe sobre o afastamento de empregadas gestantes das atividades laborais presenciais durante a emergência de saúde pública do novo coronavírus, assim previa em seu art. 1º (redação original):

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.

O dispositivo foi alterado pela Lei 14.311, de 2022, passando a contar com a seguinte redação:

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o referido agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI), deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial.

Como se vê, a Lei 14.151, de 2021, estabelece que a empregada gestante afastada deve perceber remuneração, não fazendo menção ao pagamento de salário-maternidade.

De salientar que o texto inicial do Projeto de Lei n° 2.058, de 2021, que deu origem à Lei n° 14.311, de 2022, previa o pagamento de salário-maternidade, em substituição à remuneração, à empregada gestante sem imunização completa que fosse afastada de suas atividades. Confira-se:

Art. 2º O art. 1º da Lei nº 14.151, de 12 de maio de 2021, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o referido agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI), deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial.

(...)

§ 4º Na hipótese de a natureza do trabalho ser incompatível com a sua realização em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, a empregada gestante de que trata o caput deste artigo terá sua situação considerada como gravidez de risco até completar a imunização e receberá, em substituição à sua remuneração, o salário-maternidade, nos termos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde o início do afastamento até 120 (cento e vinte) dias após o parto ou por período maior, nos casos de prorrogação na forma do inciso I do caput do art. 1º da Lei nº 11.770, de 9 de setembro de 2008

Todavia, o trecho do Projeto de Lei que previa o pagamento de salário-maternidade às empregadas gestantes afastadas foi vetado, de modo que a Lei n° 14.311, de 2022, não traz previsão alguma quanto à concessão do benefício.

Logo, além de restar claro que o legislador, ao criar a Lei n° 14.151, de 2021, não teve por objetivo a concessão de salário-maternidade às empregadas afastadas, tampouco a norma correlata posterior (Lei n° 14.311, de 2022) trouxe qualquer previsão neste sentido.

Ademais, o salário-maternidade está previsto no art. 71 da Lei n° 8.213, de 1991, como sendo devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, e no art. 392 da CLT, o qual estipula que "A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário", de modo que não é dado ao judiciário reconhecer extensão de benefício não prevista em lei, sob pena de atuar como legislador positivo, o que é vedado pela Constituição, que só lhe concede o atuar como legislador negativo. Quanto a isso, é pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), de que o seguinte julgado é exemplo:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. LEGISLAÇÃO QUE ESTABELECE LIMITES À DEDUÇÃO DE GASTOS COM EDUCAÇÃO. CONSTITUCIONALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁRIO ATUAR COMO LEGISLADOR POSITIVO. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do STF é no sentido de que não pode o Poder Judiciário estabelecer isenções tributárias, redução de impostos ou deduções não previstas em lei, ante a impossibilidade de atuar como legislador positivo. 2. Assim, não é possível ampliar os limites estabelecidos em lei para a dedução, da base de cálculo do IRPF, de gastos com educação (AI 724.817-AgR, rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe de 09-03-2012; e RE 603.060-AgR, rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJe de 03-03-2011). 3. Agravo regimental a que se nega provimento (RE nº 606.179 AgR, 2ª T., rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 03-06-2013).

Ainda, cumpre ressaltar que o parágrafo único do art. 1°, da Lei n° 14.151, de 2021, disciplina que A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância. Desta forma, não há como reconhecer o direito à fruição do benefício ao salário-maternidade à empregada considerada à disposição do empregador.

Por outro lado, o § 1º do referido art. 1º da Lei nº 14.151, de 2021, tanto na redação original como na que foi dada pela Lei nº 14.311, de 2022, estabelece que a empregada gestante afastada de suas atividades deve perceber remuneração.

Enfim, os efeitos da pandemia devem ser assumidos por todos, valendo observar que, além de precisar atender às necessidades básicas de toda população e principalmente da parte mais necessitada da população (saúde, auxílio emergencial etc.), o Estado procurou estabelecer compensações e alívios fiscais para as próprias empresas, as quais foram beneficiadas principalmente com a Lei nº 14.020, de 2020 (Programa Emergencial de Manutenção de Emprego e Renda), sendo razoável que arcassem com os efeitos da pandemia em relação a essa situação de menor abrangência (afastamento das empregadas gestantes), como entendeu o legislador.

Assim, divirjo da relatora para manter a sentença, que denegou o mandado de segurança.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por RÔMULO PIZZOLATTI, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004289558v2 e do código CRC 95cb858b.Informações adicionais da assinatura:
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5005939-67.2023.4.04.7000
40004289558.V2


Conferência de autenticidade emitida em 20/03/2024 08:01:02.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, 6º andar - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51) 3213-3161 - Email: gmfatima@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5005939-67.2023.4.04.7000/PR

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

APELANTE: KOMPLETA CALCADOS LTDA. (IMPETRANTE)

ADVOGADO(A): GABRIEL PLACHA (OAB PR030255)

ADVOGADO(A): CARLOS ARAUZ FILHO (OAB PR027171)

APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

INTERESSADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - CURITIBA (IMPETRADO)

EMENTA

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS POR FORÇA DA LEI 11.451/2021. RESPONSABILIDADE PELO SALÁRIO. ENQUADRAMENTO COMO SALÁRIO-MATERNIDADE. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA, AO SAT/RAT E A TERCEIROS. NÃO INCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO. ATUALIZAÇÃO PELA SELIC.

1. É compatível com o ordenamento jurídico o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às empregadas afastadas durante o período de emergência, motivo pelo qual não deve incidir contribuição previdenciária, inclusive ao SAT/RAT e a Terceiros, sobre tal verba, nos termos da Tese de Repercussão Geral do STF nº 72, sendo possível que as respectivas remunerações sejam compensadas, forte no art. 72, § 1º, da Lei 8.213/1991,devidamente corrigidas pela Taxa SELIC.

2. A solução dada ao caso se dá no sentido de enquadrar os pagamentos realizados pelas empresas como salário-maternidade, implicando na redução da contribuição previdenciária patronal, sem a efetiva implantação do referido benefício previdenciário.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencido o Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI, dar provimento à apelação da impetrante, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 07 de março de 2024.



Documento eletrônico assinado por MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004255656v3 e do código CRC d3e59aa9.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE
Data e Hora: 12/3/2024, às 18:45:45


5005939-67.2023.4.04.7000
40004255656 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 20/03/2024 08:01:02.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 07/12/2023 A 15/12/2023

Apelação Cível Nº 5005939-67.2023.4.04.7000/PR

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

PRESIDENTE: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI

APELANTE: KOMPLETA CALCADOS LTDA. (IMPETRANTE)

ADVOGADO(A): GABRIEL PLACHA (OAB PR030255)

ADVOGADO(A): CARLOS ARAUZ FILHO (OAB PR027171)

APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/12/2023, às 00:00, a 15/12/2023, às 16:00, na sequência 170, disponibilizada no DE de 28/11/2023.

Certifico que a 2ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO DA DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA IMPETRANTE, NO QUE FOI ACOMPANHADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA E A DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL RÔMULO PIZZOLATTI NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015.

Votante: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

Votante: Desembargador Federal RÔMULO PIZZOLATTI

Votante: Desembargador Federal EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA

MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 20/03/2024 08:01:02.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 29/02/2024 A 07/03/2024

Apelação Cível Nº 5005939-67.2023.4.04.7000/PR

RELATORA: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

PRESIDENTE: Desembargador Federal EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA

PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO

APELANTE: KOMPLETA CALCADOS LTDA. (IMPETRANTE)

ADVOGADO(A): GABRIEL PLACHA (OAB PR030255)

ADVOGADO(A): CARLOS ARAUZ FILHO (OAB PR027171)

APELADO: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 29/02/2024, às 00:00, a 07/03/2024, às 16:00, na sequência 33, disponibilizada no DE de 20/02/2024.

Certifico que a 2ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS OS VOTOS DA DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH E DO JUIZ FEDERAL ANDREI PITTEN VELLOSO ACOMPANHANDO A RELATORA, A 2ª TURMA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDO O DESEMBARGADOR FEDERAL RÔMULO PIZZOLATTI, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA IMPETRANTE, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE

Votante: Desembargadora Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH

Votante: Juiz Federal ANDREI PITTEN VELLOSO

MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 20/03/2024 08:01:02.

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