A aposentadoria especial é o benefício concedido a trabalhadores expostos a agentes nocivos, a qual permite condições especiais de benefício, justamente a fim de evitar que a nocividade desses agentes cause danos à saúde e à integridade dos segurados.
Desse modo, considerando o caráter especial de tal benefício, pode o segurado, após a implantação de tal aposentadoria, permanecer trabalhando exposto a condições insalubres ou perigosas? Se não, quando e como deve se dar o afastamento da atividade especial? É possível o exercício de outras atividades laborativas?
Conheça as regras.
O que é e porque existe a aposentadoria especial?
A aposentadoria especial é uma modalidade de aposentadoria concedida aos segurados que comprovem o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, nos termos do disposto nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
Sendo assim, tem direito à aposentadoria especial o segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual cooperado que comprove o exercício de atividade laboral nociva durante, no mínimo,15, 20 ou 25 anos, conforme disposto no Art. 57 da Lei 8.213/99 e caput do Art. 64 do Decreto 3.048/99.
Além disso, a partir da EC 103/19, conhecida como Reforma da Previdência, também passou a ser exigida uma idade mínima para a aposentadoria especial, sendo de 55 anos, 58 anos ou 65 anos, para atividades especiais de 15, 20 e 25 anos, respectivamente, nos termos dos incisos I a III do Art. 64 do Decreto 3.048/99, com redação trazida pelo Decreto 10.410/20:
Art. 64. A aposentadoria especial, uma vez cumprido o período de carência exigido, será devida ao segurado empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual, este último somente quando cooperado filiado a cooperativa de trabalho ou de produção, que comprove o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou a associação desses agentes, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, durante, no mínimo, quinze, vinte ou vinte e cinco anos, e que cumprir os seguintes requisitos:
I – cinquenta e cinco anos de idade, quando se tratar de atividade especial de quinze anos de contribuição;
II – cinquenta e oito anos de idade, quando se tratar de atividade especial de vinte anos de contribuição; ou
III – sessenta anos de idade, quando se tratar de atividade especial de vinte e cinco anos de contribuição.
Nesse aspecto, tem-se que a aposentadoria especial foi criada com um caráter preventivo. Isso porque, ao oferecer a redução do requisito de tempo de contribuição ao trabalhador em condições especiais, tal benefício tem o intuito de prevenir o trabalhador dos malefícios causados pela exposição prolongada a condições inadequadas de labor.
Tema 709 do STF – Da necessidade de afastamento de atividade nociva
Uma vez que a finalidade da aposentadoria especial é justamente a de proteger a saúde e a integridade física do trabalhador, nada mais natural do que se exija seu afastamento de toda e qualquer atividade em condições nocivas a partir da percepção de tal benefício, conforme previsto no § 8º do Art. 57 da Lei 8.213/91.
Nesse sentido, inclusive, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal – STF, em julgamento do Tema 709, no qual entendeu pela constitucionalidade do inciso supracitado, firmando a seguinte tese:
Tema 709 – Possibilidade de percepção do benefício da aposentadoria especial na hipótese em que o segurado permanece no exercício de atividades laborais nocivas à saúde.
- I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.
- II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros.
III) Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.
Portanto, resta claro que, em caso de concessão de benefício de Aposentadoria Especial, deve o segurado ser afastado permanentemente de toda e qualquer atividade com exposição a agentes nocivos, sob pena de ter o pagamento de seu benefício suspenso.
Importa esclarecer que a vedação existe somente para o trabalho com exposição a agentes nocivos.
Ou seja, mesmo recebendo aposentadoria especial, o trabalhador pode continuar exercendo atividades remuneradas, desde que essas não sejam consideradas nocivas à saúde e/ou à integridade física.
Quando o trabalhador deve efetivamente se afastar da atividade especial?
Quanto ao momento em que é exigido o efetivo afastamento do trabalhador de seu labor especial, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento do Resp 1.764.559 – SP. Na ocasião, foi fixado o entendimento de que o afastamento do labor nocivo ocorre somente após o início dos pagamentos do benefício, conforme trecho da ementa, a seguir:
[…] 4. No entender do Relator, apenas se pode impor a vedação ao exercício de atividades em condições especiais a partir da concessão do benefício, uma vez que, antes desta, o segurado não está em gozo de um benefício substitutivo de sua renda a justificar tal proibição.
Interpretação contrária obrigaria, para que o segurado recebesse todas as prestações a partir da data na qual preenche todos os respectivos requisitos, que ele deixasse de exercer sua atividade habitual, aguardando, sem fonte de renda normal que lhe garanta a subsistência, o desfecho do processo administrativo ou judicial.
Ou seja, é permitido ao segurado, durante o curso do processo administrativo e/ou judicial de concessão de benefício, permanecer trabalhando em atividades especiais, a fim de manter a sua subsistência e de sua família.
Aliás, cabe registrar que o próprio INSS possui normativa sobre a questão, em artigo 267 da IN 128/2022:
[…] § 3º Não serão considerados como permanência ou retorno à atividade os períodos:
I – entre a data do requerimento e a data da ciência da concessão do benefício; e
II – de cumprimento de aviso prévio consequente do pedido de demissão do segurado após a ciência da concessão do benefício.
Portanto, o afastamento de atividades laborais nocivas deve ocorrer somente após a efetiva implantação do benefício. Isto é, quando o segurado passar a receber a aposentadoria especial em substituição ao seu salário habitual.
Qual o procedimento a ser adotado quando do afastamento de atividade nociva?
Uma vez que não é permitida a permanência no labor insalubre/periculoso a partir do recebimento de aposentadoria especial, cabe ao segurado, no momento da implantação do benefício optar por:
- continuar laborando na condição insalubre/periculosa e, assim, comunicar o INSS para suspensão do benefício, ou,
- perceber o benefício e comunicar seu empregador acerca do recebimento do benefício, para fins de:
- a) solicitar a realocação para atividade não nociva, havendo interesse mútuo nesse sentido, ou,
- b) rescindir o contrato de trabalho, via demissão voluntária do empregador, demissão sem justa causa por parte do empregador ou acordo entre as partes.
Manutenção da atividade especial e suspensão do benefício até o afastamento definitivo de agentes nocivos
Na primeira hipótese, caso queira continuar na sua profissão em condições especiais, o segurado tem o direito ao recebimento dos atrasados devidos à título de Aposentadoria Especial, bem como o dever de comunicação a situação ao INSS, com pedido de suspensão temporária do benefício, até que se afaste definitivamente das condições insalubres/periculosas.
Troca de função para atividade não nociva
Caso o trabalhador deseje perceber integral e mensalmente seu benefício, bem como permanecer exercendo atividade remunerada, há que se verificar se há também o interesse por parte da empresa em manter esse funcionário, em atividade diversa.
Em existindo o interesse mútuo na manutenção do vínculo empregatício, deve a empresa realocar o trabalhador para atividade que não o exponha a condições nocivas, uma vez que, conforme já citado, não há vedação quanto ao exercício de atividade não nociva.
Vale destacar que o empregador não é obrigado a realocar o funcionário aposentado e nem criar para ele uma nova função, de modo que tal situação somente ocorrerá se houver o interesse e a possibilidade da empresa em efetuar a troca de função ao trabalhador.
Havendo a realocação, o trabalhador deve comunicar o INSS sobre a mudança da atividade laborativa, encaminhando Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP atualizado, produzido pela empresa, a fim demonstrar a ausência de exposição a agentes nocivos na nova função a ser exercida.
Nesse sentido, o setor de perícias do INSS dará seu parecer sobre a atividade laboral – se a considera uma atividade especial ou não. Sobre o procedimento do INSS para avaliação de eventual permanência em atividade nociva pelos beneficiários de Aposentadoria Especial, por favor, leia nosso artigo: Aposentadoria Especial – Entenda o procedimento do INSS para verificar continuidade no trabalho.
Rescisão de contrato de trabalho – demissão voluntária, sem justa causa ou acordo entre as partes?
Em não havendo o interesse, por uma ou por ambas as partes – empregado e empregador – na manutenção do labor, deverá ser rescindido o contrato de trabalho.
Eis que surge a polêmica: o empregado deve pedir demissão e abrir mão de direitos trabalhistas, como o valor do aviso prévio e os 40% sobre o FGTS a título de multa rescisória? Ou a empresa é obrigada a demitir e pagar todos os direitos trabalhistas ao empregado que, voluntariamente, solicitou a aposentadoria especial?
Ainda não há uma resposta definitiva para as questões acima, visto que a decisão do Tema 709 do STF não explicita o procedimento a ser adotado, de modo que esse deverá vir a partir do amadurecimento da jurisprudência trabalhista, já que cabe à Justiça do Trabalho a regulamentação das relações entre empregado e empregador.
De todo modo, é certo que o empregador não possui qualquer relação com pedido de aposentadoria especial do segurado perante o INSS, não sendo, conforme já citado, obrigado a efetuar a adequação do trabalhador para atividade não insalubre e não periculosa.
Também não há, até o momento, qualquer sanção fixada na legislação previdenciária para empresa que mantenha aposentados especiais em atividade nociva.
Logo, em não havendo interesse por parte da empresa em efetuar a dispensa sem justa causa, com pagamento integral das verbas rescisórias ao trabalhador, não há, até o momento, como obrigá-la a fazê-lo.
Assim, uma alternativa, ou, “meio termo”, seria a demissão por acordo, modalidade prevista no Art. 484-A da CLT, em que o empregado recebe 50% do valor aviso prévio, se indenizado, e 20% da multa do FGTS, além da integralidade das demais verbas trabalhistas.
Porém, de outro lado, o segurado é diretamente prejudicado caso não abandone o exercício de atividade especial, pois, além de ter seu benefício suspenso, ainda poderá ser responsabilizado por apropriação indevida, caso receba o benefício especial concomitantemente ao trabalho insalubre/periculoso.
Portanto, em não sendo possível pactuar com a empresa pela dispensa sem justa causa ou uma demissão por acordo, caberá ao segurado aposentado especial o pedido de demissão, sob pena de suspensão de benefício, bem como eventual ressarcimento de valores recebidos indevidamente.
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