Embora ambos exerçam atividade rural, a Lei 8.213/1991 prevê no § 1º do art. 48 a redução de idade para dois trabalhadores muito diferentes um do outro, os segurados especiais e os empregados rurais.

É importante entender a diferença entre estes trabalhadores rurais para uma atuação dedicada, já que o Direito Previdenciário, com sua complexidade e constantes atualizações, exige cuidado e atenção. 

Trabalhar apenas com “trabalhador” rural sem diferenciar aquele que é empregado daquele que trabalha em regime de economia familiar pode prejudicar o segurado, já que a atuação administrativa e judicial é bem diferente para cada um deles.

Neste artigo, vamos destrinchar as características de cada modalidade, à luz da Lei nº 8.213/1991, auxiliando na correta identificação e no manejo processual.

Quais são os conceitos básicos?

Começando pelo empregado rural, ele é, essencialmente, um trabalhador com vínculo empregatício formal, com todas as exigências regulares da caracterização de emprego decorrentes do Direito Trabalhista (exercido por pessoa física e com pessoalidade, subordinação, onerosidade e não eventualidade). Contudo e logicamente, trata-se do trabalho afeito à atividade rural.

Para identificá-lo na Lei 8.213/1991, basta conjugar os artigos 48 e 11:

Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:  

I – como empregado:

  1. a) aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado;

Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.

  • 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.

Trata-se, portanto, de um empregado como qualquer empregado urbano, geralmente regido por contrato pela CLT, com todos os direitos trabalhistas. E especialmente, com contribuições previdenciárias sobre seu salário-de-contribuição. 

O segurado especial, por sua vez, está no inciso VII do artigo 11 da Lei de Benefícios:

VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:         

  1. a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: 
  2. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
  3. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
  4. b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e 
  5. c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.   

O segurado especial é um conceito bem específico, e tão complexo que é objeto de vários parágrafos do aludido artigo 11 (§§ 1º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10, 11 e 12), nos quais são feitas várias considerações sobre elementos que descaracterizam ou não o segurado a condição de especial. Engloba, ainda, quem trabalha em regime de economia familiar (e consequentemente todos os integrantes da família, aqui incluídos cônjuges e filhos), mas também seringueiros e pescadores artesanais.

Do conceito de cada um destes segurados já se nota que as diferenças não são pequenas: um é um empregado, e o outro precisa passar por vários critérios objetivos da lei (e, infelizmente, outros subjetivos perante o INSS e a Justiça) para ser enquadrado como segurado especial.

Prova da atividade

A primeira grande diferença, já parte da complexidade do conceito, é a comprovação das atividades rurais.

Para o empregado rural, é necessário comprovar, tão somente, que exerce atividades rurais em seu emprego, o que pode ser comprovado com a própria Carteira de Trabalho e Formulários como o Perfil Profissiográfico Previdenciário.

O segurado especial, por outro lado, precisa comprovar sua atividade com “início de prova material” com provas concretas de que preencha os requisitos previstos na legislação, como indica o art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991. Um rol de provas é elencado na Lei 8.213/1991 em seu artigo 106. Cabe ao segurado especial demonstrar que trabalha na atividade rural, em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, e que a atividade rural é indispensável ao sustento e ao desenvolvimento da família.

O caminho probatório do trabalhador rural, quando há registro na CTPS e empregadores ativos, é mais direto, e pode muito bem ser satisfeito com provas documentais, sem a necessidade de corroboração de prova testemunhal. No entanto, essa prova pode ser bem vinda se a documentação tiver lacunas que não permitam atestar o caráter rural da atividade.

O segurado especial, por sua vez, tende a ter mais dificuldades nessa prova, precisando comprovar vinculação às terras, comprovar a própria atividade, buscar instrumentos ratificadores nas bases governamentais que ratifiquem a famosa Autodeclaração rural, além de precisar, por vezes, fazer “provas negativas” como a prova de que não possui qualquer outra fonte de sustento que não a atividade rural. Documentos como notas fiscais de venda de produtos rurais, contratos de parceria ou arrendamento, comprovantes de recebimento de programas governamentais para a agricultura familiar, certidões de casamento ou nascimento com a profissão de lavrador/agricultor, entre outros, são fundamentais para demonstrar a atividade rural em regime familiar. 

Contribuições diferentes

O empregado rural, por ser um segurado obrigatório, contribui mensalmente com a retenção da respectiva alíquota correspondente ao seu salário-de-contribuição.

O segurado especial, por sua vez, não é obrigado a contribuir mensalmente com um valor fixo. Sua contribuição é feita de forma indireta, por meio de alíquotas incidentes sobre o produto da comercialização de sua produção rural, conforme o art. 25 da Lei nº 8.212/1991. Além disso, ele pode, se desejar, contribuir facultativamente como, como previsto no § 1º do mencionado art. 25. 

Valor do benefício

Embora ambos se aposentem com a mesma idade, o valor dos benefícios pode ser diferente. Os empregados rurais, por serem empregados e contribuintes obrigatórios, têm direito ao cálculo normal de Renda Mensal Inicial, embora tenha sido mantida a regra da Lei 8.213/91 (70% da média + 1% a cada ano de contribuição) e não a regra da Emenda Constitucional 103/19 (60% + 2% a cada ano além dos 20 anos para os homens e a cada 15 anos para as mulheres).

Já o segurado especial tem o seu benefício limitado pela lei a um salário-mínimo mensal, exceto se contribuir como segurado facultativo, como indica o § 6º do artigo 29 da Lei 8.213/1991:

Art. 29, § 6º  O salário-de-benefício do segurado especial consiste no valor equivalente ao salário-mínimo, ressalvado o disposto no inciso II do art. 39 e nos §§ 3o e 4o do art. 48 desta Lei.

Portanto, é imprescindível compreender as particularidades do empregado rural e do segurado especial para direcionar melhor a atuação administrativa e judicial de cada um, compreender as diferentes realidades de quem possui emprego e contribuições formais, o empregado rural, e as agruras de quem precisa passar por fortes exigências probatórias, como o segurado especial. 

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