Em recente decisão, proferida no dia 11 de março de 2022, a Turma Regional de Uniformização da 4ª Região decidiu que o cálculo da Renda Mensal Inicial da aposentadoria por incapacidade permanente é inconstitucional.
A seguir explico em detalhes este julgamento.
O cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente
A EC 103/2019 alterou significativamente a forma de cálculo da antes chamada aposentadoria por invalidez.
Anteriormente, o cálculo consistia em 100% da média dos 80% maiores salários de contribuição desde 07/1994.
No entanto, a partir da Reforma (EC 103/2019), além da nomenclatura, o cálculo do benefício também foi alterado. Agora a chamada aposentadoria por incapacidade permanente é calculada da seguinte forma:
- 60% +2% a cada ano que exceder 15 e 20 anos de tempo de contribuição para mulher e homem, respectivamente
- Dessa forma, o coeficiente acima é multiplicado pela média de 100% dos salários de contribuição desde 07/1994.
Por outro lado, caso o benefício seja ACIDENTÁRIO, o coeficiente do primeiro item acima fica em 100%.
Sem dúvida, para a modalidade NÃO ACIDENTÁRIA, o cálculo ficou extremamente desvantajoso, especialmente se comparado com o auxílio por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença), que não teve mudanças no seu coeficiente inicial de 91%.
Agora imagine a seguinte situação: Segurado vinha recebendo auxílio por incapacidade temporária com valor calculado em 91% de sua média contributiva. Contudo, em perícia para prorrogação do benefício constata-se sua incapacidade permanente.
Dessa forma, consequentemente, seu benefício é convertido em aposentadoria e o valor passa a ser de 60% de sua média contributiva.
Assim, perceba o quanto a norma não faz qualquer sentido na ótica da proteção social, pois justamente após a constatação da incapacidade permanente o segurado terá uma redução de mais de 30% no valor do seu benefício.
TRU4 e a inconstitucionalidade do cálculo da Art. 26, § 2º, III, da EC 103/2019
A decisão da TRU4 fundamentou-se na violação aos princípios da isonomia, da razoabilidade, da irredutibilidade do valor dos benefícios e da proibição da proteção deficiente.
Dessa forma, o seguinte trecho da ementa exprime o ponto central da fundamentação:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. DISCRIMINAÇÃO ENTRE OS COEFICIENTES DA ACIDENTÁRIA E DA NÃO ACIDENTÁRIA. CÁLCULO DA RENDA MENSAL INICIAL. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 26, § 2º, III, DA EC N.º 103/2019. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA ISONOMIA, DA RAZOABILIDADE E DA IRREDUTIBILIDADE DO VALOR DOS BENEFÍCIOS E DA PROIBIÇÃO DA PROTEÇÃO DEFICIENTE.
[…] 2. O art. 194, parágrafo único, IV, da CF/88, garante a irredutibilidade do valor dos benefícios. Como a EC 103/19 não tratou do auxílio-doença (agora auxílio por incapacidade temporária) criou uma situação paradoxal. De fato, continua sendo aplicável o art. 61 da LBPS, cuja renda mensal inicial corresponde a 91% do salário de benefício. Desta forma, se um segurado estiver recebendo auxílio doença que for convertido em aposentadoria por incapacidade permanente, terá uma redução substancial, não fazendo sentido, do ponto de vista da proteção social, que um benefício por incapacidade temporária tenha um valor superior a um benefício por incapacidade permanente. 3. Ademais, não há motivo objetivo plausível para haver discriminação entre os coeficientes aplicáveis à aposentadoria por incapacidade permanente acidentária e não acidentária. […]
( 5003241-81.2021.4.04.7122, TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO, Relator DANIEL MACHADO DA ROCHA, juntado aos autos em 12/03/2022)
Assim, baseada nesses fundamentos, a TRU4 decidiu pela inconstitucionalidade do inciso III do §2º do art. 26 da EC 103/2019 e fixou a seguinte tese:
“O valor da renda mensal inicial (RMI) da aposentadoria por incapacidade permanente não acidentária continua sendo de 100% (cem por cento) da média aritmética simples dos salários de contribuição contidos no período básico de cálculo (PBC). Tratando-se de benefício com DIB posterior a EC 103/19, o período de apuração será de 100% do período contributivo desde a competência julho de 1994, ou desde o início da contribuição, se posterior àquela competência.”
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