Na minha coluna anterior (Quando o filho inválido é considerado dependente para receber pensão por morte?), tratei sobre a pensão por morte ao filho maior inválido. Hoje, proponho ampliar a discussão e analisar o direito à pensão ao filho que apresenta “deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave”, de acordo com o disposto na parte final do artigo 16, I da Lei nº 8.213/91:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;

Antes de tudo, entendo por bem esclarecer que utilizarei os termos literais “invalidez” e “deficiência”, pois assim expressamente previstos na lei previdenciária, e que não possuem qualquer conotação pejorativa ou desrespeitosa.

Pois bem!

Evolução legislativa do artigo 16, I da Lei nº 8.213/91

A redação original do artigo 16, inciso I da Lei nº 8.213/91 exigia a invalidez do filho (ou irmão) maior de 21 anos para acesso ao benefício de pensão por morte, na condição de dependente do segurado:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

A posterior Lei nº 9.032/1995 apenas acrescentou a expressão “não emancipado” à redação original:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

Até aqui, a legislação previdenciária trazia como requisito a comprovação da incapacidade total e permanente do filho maior para atividades remuneradas (invalidez).

Todavia, a partir da Lei nº 12.470/2011 não mais se exigiu a invalidez como critério absoluto e indispensável à condição de dependente. A nova lei trouxe a possibilidade de concessão do benefício também ao dependente com “deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente”:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;

Ainda, a Lei nº 12.470/2011 inclusive estabeleceu a possibilidade de o filho maior, enquanto beneficiário de pensão por morte, exercer atividade remunerada, com desconto de 30% da sua parte individual:

Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos em parte iguais.         (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 4º  A parte individual da pensão do dependente com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente, que exerça atividade remunerada, será reduzida em 30% (trinta por cento), devendo ser integralmente restabelecida em face da extinção da relação de trabalho ou da atividade empreendedora.           (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)

Tal alteração promovida pela Lei nº 12.470/2011 foi de grande relevo, com louvável inclusão social das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, permitindo a estas o desempenho de atividade laborativa, cumulativamente ao recebimento da pensão.

Com o advento da Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), foi ampliado o acesso ao benefício ao dependente com deficiência grave, sendo dispensada a necessidade de interdição judicial (incapacidade parcial/absoluta):

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;

De maneira a tornar mais clara esta importante evolução legislativa, percebam o quadro abaixo:

Evolução legislativaArtigo 16, inciso I da Lei nº 8.213/91
Redação originalo cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
A partir da Lei nº 9.032/1995o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
 

A partir da Lei nº 12.470/2011

o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.
 

A partir da Lei nº 13.146/2015

o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave.

Qual a gravidade da deficiência intelectual ou mental para fins de concessão do benefício?

Vejam que a redação atual do inciso I do artigo 16 não estipula o grau (gravidade) da deficiência intelectual ou mental. Podemos concluir, então, que a deficiência intelectual ou mental do dependente pretendente ao benefício de pensão por morte pode ser LEVE. Isto, pois, se a própria legislação não conferiu interpretação restritiva, não cabe a nós intérpretes assim o fazê-lo.

A esse respeito, trago aos prezados recente julgado desta matéria, lavrado o acórdão pelo ilustre jurista Dr. José Antonio Savaris:

A redação do artigo 16 da Lei n. 8.213/91 é clara:

Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;       

(…) 

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

A lei não estabelece qualquer grau de deficiência intelectual ou mental para que a dependência esteja caracterizada, desse modo, restando comprovado nos autos que a parte autora possui “retardo mental leve”, sua dependência econômica em relação à segurada falecida é presumida, autorizando a concessão do benefício. (5002204-51.2018.4.04.7016, TERCEIRA TURMA RECURSAL DO PR, Relator JOSÉ ANTONIO SAVARIS, julgado em 23/08/2019)

Assim, temos que a deficiência intelectual ou mental de grau LEVE do filho maior é suficiente ao enquadramento como dependente do segurado, de acordo com o artigo 16, I da Lei nº 8.213/91.

E em qual situação é exigível “deficiência grave”?

O Estatuto da Pessoa com Deficiência conceitua a deficiência da seguinte forma:

Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Percebam, colegas, que o supracitado artigo 2º do EPD estabelece que a deficiência pode ser natureza física, mental, intelectual ou sensorial.

Conjugando este dispositivo com a atual redação do artigo 16, I da LBPS, podemos concluir que a “deficiência grave”, assim prevista no artigo 16, I da Lei nº 8.213/91, deve ser de natureza física ou sensorial, tendo em vista que para as deficiências mental e intelectual a lei já concedeu tratamento distinto ao não exigir grau, conforme tratado no tópico anterior.

A distinção entre invalidez e deficiência

Neste sentido, cumpre salientar que a deficiência não pode ser confundida com invalidez. Com o advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência, a deficiência não mais remete à incapacidade para a vida independente e para o trabalho.

A pessoa com deficiência, de acordo com estatuto, é aquela que possui algum tipo de impedimento, que, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas. Quanto ao tema, sugiro a leitura da importantíssima coluna elaborada pela Dra. Fernanda Rodrigues, onde a questão é analisada com brilhantismo.

Portanto, o artigo 16, I da LBPS, ao estabelecer que a pessoa com deficiência é considerada dependente do segurado para fins de pensão por morte, não impõe a comprovação de sua incapacidade de trabalhar ou incapacidade civil.

Cumulação de rendimentos: pensão por morte e atividade remunerada

Por fim, a Lei nº 13.183/2015 revogou o dispositivo que determinava o desconto de 30% da parte individual do beneficiário que exercia atividade remunerada (§ 4º do artigo 77 da Lei nº 8.213/91). A nova regra prevê a manutenção da quota-parte no valor integral, mesmo na hipótese de o beneficiário desempenhar atividade laborativa:

Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos em parte iguais.         (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

[…]

§ 6º O exercício de atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor individual, não impede a concessão ou manutenção da parte individual da pensão do dependente com deficiência intelectual ou mental ou com deficiência grave.       (Incluído pela Lei nº 13.183, de 2015)

Em suma, poderá o filho maior com deficiência, beneficiário da pensão, ingressar no mercado de trabalho sem sofrer prejuízo na manutenção ou no valor de seu benefício, podendo cumular ambos os rendimentos (pensão e remuneração pelo trabalho), perfeitamente.

Invalidez e deficiência são, portanto, institutos alheios, e ambos conferem ao filho maior de 21 anos a condição de dependente para fins previdenciários.

Observo, ainda, que a condição de pessoa com deficiência deverá ser anterior ao óbito do instituidor, independentemente da idade do postulante. Aqui, sugiro a leitura da coluna Quando o filho inválido é considerado dependente para receber pensão por morte?, onde tratei desta questão.

Quanto ao tema, disponibilizo aos colegas alguns modelos de petição:

Requerimento administrativo de concessão de pensão por morte ao filho com deficiência intelectual ou mental

Petição inicial de concessão de pensão por morte ao filho com deficiência intelectual ou mental

Recurso inominado

Bom trabalho a todos!

Forte abraço!

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