PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 500142396.2017.4.04.7102/RS
AUTOR: XXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL INSS
SENTENÇA
I FUNDAMENTAÇÃO
Tratase de ação na qual a parte autora objetiva a concessão do benefício de
auxílioacidente (NB 177.432.9961, DER 07/07/2016). Requer, também, a concessão de
tutela provisória.
Em contestação (evento 26), o INSS sustenta que a parte autora está capaz para
suas atividades laborativas habituais, uma vez que não se pode confundir existência de
doença com incapacidade laborativa. Requer a improcedência do pedido.
AUXÍLIOACIDENTE
A concessão de auxílioacidente está regulada no art. 86 da Lei nº 8.213/91, in
verbis:
“Art. 86. O auxílioacidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas
que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.” (grifei)
Da leitura do dispositivo legal supra depreendese que para a percepção do
benefício em questão fazse necessário o preenchimento simultâneo de dois requisitos, a
saber: ocorrência de acidente de qualquer natureza, e que após a consolidação das lesões
resultem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que exercia o
segurado.
Outrossim, para a concessão do benefício de auxílioacidente não se faz
necessário o cumprimento de período de carência, conforme estabelece o art. 26 da Lei
8.213/91. Contudo, imprescindível que a parte possua qualidade de segurado à época do
infortúnio que causar a redução da capacidade laborativa.
COMPROVAÇÃO DA INCAPACIDADE
É essencial, para a correta elucidação do caso em apreço, a análise da perícia
acostada aos autos (evento 21).
Em resposta aos quesitos formulados, o profissional nomeado pelo juízo assim
se manifestou inicialmente:
“Histórico da doença atual: Autora refere que começou a apresentar cefaléia e notou baixa
visual em olho esquerdo, quando procurou atendimento foi detectado toxoplasmose ocular
com perda da visão do olho esquerdo. Realizado tratamento clínico para toxoplasmose mas
sem recuperação da visão. Atualmente apresenta visão monocular à direita e faz uso de
colírio lubrificante se necessário.
Exames físicos e complementares: acuidade visual OD 20/20 ; OE 00, somente visão
periférica biomicroscopia sem alterações fundoscopia OD sem alterações; OE cicatriz de
coriorretinite macular.”
A autora informou ao perito que exerce a atividade habitual de “auxiliar
administrativo” e encontrase em atividade no momento.
De acordo com o expert, a autora é portadora de “Cegueira em um olho
(H54.4)”, pois apresenta visão monocular de forma permanente e irreversível decorrente de
toxoplasmose ocular, havendo incapacidade para atividades que exijam visão binocular.
Indubitavelmente, uma pessoa com visão monocular terá restrições e sequelas,
mesmo que mínimas, em qualquer profissão que exerça.
No caso, nos termos do laudo pericial, há limitação funcional, apesar de não
decorrer de acidente de qualquer natureza.
Como se vê, há uma lacuna na legislação previdenciária, que não prevê
especificamente os casos de redução da capacidade que não sejam decorrentes de lesão de
acidente de qualquer natureza.
Assim sendo, em que pese não se tratar de redução da capacidade laborativa
decorrente de acidente, a situação específica dos autos permite a aplicação do art. 86 da Lei nº
8.213/91, por analogia.
Entendo que, na espécie, devese considerar o disposto no art. 4º da Lei de
Introdução às normas do Direito Brasileiro (DecretoLei nº 4.567/42), in verbis:
Art. 4º. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes
e os princípios gerais de direito.
A própria Lei nº 9.099/95 ampara a aplicação deste dispositivo, em razão do seu
art. 6º (regra de equidade), especialmente considerando as razões singulares acima expostas.
Nesse sentido, cito parte do Acórdão proferido no Recurso Cível nº 5004370
18.2016.4.04.7213/SC, que amoldase perfeitamente ao caso concreto:
“(…)
O auxílioacidente é benefício destinado àqueles trabalhadores comprovadamente limitados
em sua funcionalidade, nos termos do art. 86 da Lei 8.2131991:
Art. 86. O auxílioacidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após a
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas
que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
No caso, nos termos do laudo pericial, o autor não apresenta lesão ou sequela decorrente de
acidente de qualquer natureza, porém, atestou o expert que há incapacidade parcial e
permanente para a atividade que era a habitual, qual seja, motorista de caminhão, desde 14
072016, mas que não há incapacidade para a atividade atual, para a qual está reabilitado.
Logo, extraise da conclusão do laudo pericial a existência de limitação funcional, apesar de
esta não decorrer de acidente/doença do trabalho ou de qualquer natureza.
Como se vê, há uma lacuna na legislação previdenciária, que não prevê especificamente esta
hipótese, pois trabalha apenas com a lógica binária da incapacidade total (ou das atividades
habituais, ou de qualquer atividade), restringindo a concessão nos casos de redução da
capacidade que não seja decorrente de lesão de acidente.
Assim sendo, em que pese não se tratar de redução da capacidade laborativa decorrente de
acidente, a situação específica dos autos permite a aplicação do art. 86 da Lei 8.2131991,
por analogia.
Entendo que, na espécie, devese considerar o disposto no art. 4º da Lei de introdução ao
direito (DecretoLei nº 4.5671942) , in verbis:
Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes
e os princípios gerais de direito.
Ora, este dispositivo é aplicável também em razão do disposto no art. 6º da Lei nº 9.0991995
(regra de equidade), especialmente considerando as razões singulares acima expostas.
Doutra parte, esta Turma Recursal adota o entendimento de que não é exigível a alteração da
atividade desempenhada. As sequelas podem ser de menor gravidade, implicando apenas um
maior esforço para a profissão exercida. Também desnecessário enquadramento no rol de que
trata o anexo III do Decreto nº 3.04899, tido como meramente exemplificativo.
Assim, havendo a dificuldade na realização das atividades laborativas habituais, poderá o
autor continuar a trabalhar de forma reduzida, compatível com sua limitação, compensandose via benefício de auxílioacidente a redução da sua capacidade.
(…)”
Considerando que os atestados médicos carreados aos autos indicam a presença
de lesão por toxoplasmose em 05/2015 (evento 1, Proc2), e considerando que a autora
manteve vínculo empregatício no período de 22/07/2013 a 30/09/2016 (evento 3, Cnis1),
resta demonstrada a qualidade de segurada na época do infortúnio.
Em vista disso, cabível a concessão de auxílioacidente.
TERMO INICIAL DA CONDENAÇÃO
Tendo em vista que a data de início da redução da capacidade laboral é anterior
à data do requerimento administrativo (07/07/2016), a parte autora faz jus ao benefício de
auxílioacidente a partir da DER.
DO IMEDIATO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER
Conforme a disposição do artigo 43, da Lei 9.099/95, os recursos, no rito dos
Juizados Especiais, devem ser recebidos apenas em seu efeito devolutivo, somente se
admitindo a atribuição do efeito suspensivo em situações excepcionais. Ressalvo que a mera
possibilidade de reforma da sentença pela Turma Recursal não está inserida na expressão
“situações excepcionais”, sob pena de se transformar a sentença de primeira instância em
requisito formal para o conhecimento de recurso.
Quanto à obrigação de fazer, ou seja, concessão do benefício, o art. 43, da Lei
9.099/95 deve ser aplicado, para recebimento dos recursos apenas em seu efeito devolutivo,
somente se admitindo a atribuição do efeito suspensivo em situações excepcionais. Assim, o
INSS deverá implantar a renda mensal em favor da parte autora imediatamente,
independentemente do preenchimento dos requisitos para a antecipação dos efeitos da
tutela, por expressa disposição legal, nos termos do acima fundamentado.
DO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE PAGAR AS PARCELAS
VENCIDAS
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será
calculada conforme segue:
ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
OTN (03/86 a 01/89, DecretoLei nº 2.284/86);
BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
IPCr (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
IGPDI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art.
20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
INPC (a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado
com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41A
à Lei n.º 8.213/91).
No que tange à correção monetária, devem ser observados os critérios acima
definidos, na medida em que o Supremo Tribunal Federal nas ADIs 4.357 e 4.425 (efeito erga
omnes e eficácia vinculante), declarou a inconstitucionalidade, em parte, por arrastamento, do
art. 1ºF da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/09.
Quanto aos juros moratórios, devem ser aplicados conforme segue:
Até 29/06/2009 devem ser fixados em 1% ao mês, a contar da citação, nos
termos da Súmula nº 75 do Egrégio TRF da 4ª Região e do DecretoLei n° 2.322/87;
De 30/06/2009 a 30/04/2012 à taxa de 0,5% ao mês, conforme art. 1ºF da Lei
n. 9.494/97, modificada pela Lei n. 11.960/09, c/c a Lei n. 8.177/91;
A partir de maio/2012, aplicarseá o mesmo percentual de juros incidentes
sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples, correspondentes a: a) 0,5% ao
mês, caso a taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5%; b) 70% da taxa SELIC ao ano,
mensalizada, nos demais casos (art. 1ºF da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pela Lei n.
11.960/2009, combinado com a Lei n. 8.177/1991, com alterações da MP n. 567/2012,
convertida na Lei n. 12.703/2012).
Observo que as decisões tomadas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no
julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não interferiram com a taxa de juros aplicável às
condenações da Fazenda Pública, consoante entendimento firmado no Superior Tribunal de
Justiça a partir do julgamento do RESP 1.270.439. Com efeito, como consignado pela
Ministra Eliana Calmon no julgamento do MS 18.217, “No julgamento do Resp
1.270.439/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, esta Corte, diante da declaração de
inconstitucionalidade parcial do art. 1ºF da Lei 9.494/99 no que concerne à correção
monetária, ratificou o entendimento de que nas condenações impostas à Fazenda Pública
após 29.06.2009, de natureza não tributária, os juros moratórios devem ser calculados com
base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança“.
Quanto à atualização monetária de precatórios/RPV, a partir da data da
conta de liquidação, deve ser observado o IPCAE, conforme entendimento sufragado pelo
STF, ao modular os efeitos no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, não interferindo no
cálculo das parcelas vencidas até a data da liquidação, que deverá obedecer a cadeia de
índices acima transcrita (TRF4, AG 000678368.2014.404.0000, Quinta Turma, Relator
Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 06/04/2015).
Tais valores fazem parte da obrigação de pagar quantia certa e, por conseguinte,
sujeitamse à requisição de pagamento (RPV ou precatório), após o trânsito em julgado da
decisão, na forma do artigo 17 da Lei nº 10.259/01.
Para esse fim, a conta a ser elaborada pelo Setor de Contadoria desta Vara
Federal, abrangerá as parcelas vencidas e exigíveis anteriores ao cumprimento do julgado
pelo ente previdenciário, atualizadas e acrescidas de juros de mora, conforme a decisão
transitada em julgado.
Dada a natureza mandamental das sentenças proferidas no âmbito dos Juizados
Especiais, tudo aquilo que se vencer a partir da sentença deverá ser satisfeito
administrativamente, consoante sistemática de execução de obrigações de fazer.
DO IMEDIATO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER
Nos Juizados Especiais Federais, em regra, o recurso inominado não possui
efeito suspensivo, nos termos do art. 43, da Lei 9.099/95 c/c o art. 1º da Lei 10.259/01. Em
razão disso, o cumprimento da obrigação de fazer, qual seja, implantação/revisão do
benefício, deve se dar de forma imediata, sendo desnecessária a análise de concessão de tutela
provisória de urgência.
Destarte, deverá o INSS implantar a renda mensal do benefício ora concedido,
em favor da parte autora, por força do cumprimento imediato da obrigação de fazer.
II DISPOSITIVO
Ante o exposto, julgo PROCEDENTE a pretensão formulada na inicial
condenando o INSS a:
a) Conceder à parte autora, Sra. XXXXXXXXXXXXX, o benefício de
AuxílioAcidente (NB 177.432.9961), com uma Renda Mensal Inicial correspondente a 50%
do saláriodebenefício, a ser apurado conforme a redação do art. 29 da Lei 8.213/91 em
vigor na DIB, devendo constar o termo inicial do benefício em 07/07/2016 (DIB);
b) Pagar as parcelas vencidas a contar da DIB (07/07/2016) até a DIP
(01/08/2017), corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, conforme os critérios
fixados na fundamentação.
Intimese o INSS para que, no prazo de 12 dias, com DIP 01/08/2017,
implante o benefício em favor da parte autora, em razão do disposto no art. 43 da Lei
9099/95 c/c art. 1º da Lei 10.259/01, que determina o cumprimento imediato da
obrigação de fazer no rito dos Juizados Especiais. Deverá comprovar o cumprimento da
medida em tal lapso.
No tocante ao cumprimento da obrigação de pagar as parcelas/diferenças
vencidas, aguardese o trânsito em julgado, por força do disposto no art. 17, da Lei 10.259/01.
Sem condenação em custas e honorários advocatícios (arts. 54 e 55 da Lei
9.099/95).
Condeno o INSS ao ressarcimento dos honorários periciais à Seção Judiciária
do Rio Grande do Sul (evento 24), pois sucumbente em maior monta.
Espécie não sujeita ao reexame necessário (art. 13 da Lei 10.259/01).
Apresentado recurso, verifiquese a necessidade de preparo (art. 42, §2º da Lei
9.099/95). Após, intimese a outra parte para, querendo, apresentar contrarrazões.
Apresentadas ou não as contrarrazões, remetamse os autos à Turma Recursal.
2017823 :: 710004739161 eProc ::
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Com o trânsito em julgado, procedase na forma da Portaria desta 1ª Vara
Federal de Santa Maria.
Publicação automática.
Sem necessidade de registro.
Intimemse.
Documento eletrônico assinado por EZIO TEIXEIRA, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de
19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do
documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o
preenchimento do código verificador 710004739161v11 e do código CRC 54a1fd21.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): EZIO TEIXEIRA
Data e Hora: 22/08/2017 21:21:15
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