PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5001423­96.2017.4.04.7102/RS

AUTOR: XXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL ­ INSS

SENTENÇA

I ­ FUNDAMENTAÇÃO

Trata­se de ação na qual a parte autora objetiva a concessão do benefício de

auxílio­acidente (NB 177.432.996­1, DER 07/07/2016). Requer, também, a concessão de

tutela provisória.

Em contestação (evento 26), o INSS sustenta que a parte autora está capaz para

suas atividades laborativas habituais, uma vez que não se pode confundir existência de

doença com incapacidade laborativa. Requer a improcedência do pedido.

AUXÍLIO­ACIDENTE

A concessão de auxílio­acidente está regulada no art. 86 da Lei nº 8.213/91, in

verbis:

“Art. 86. O auxílio­acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após

consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas

que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.” (grifei)

Da leitura do dispositivo legal supra depreende­se que para a percepção do

benefício em questão faz­se necessário o preenchimento simultâneo de dois requisitos, a

saber: ocorrência de acidente de qualquer natureza, e que após a consolidação das lesões

resultem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que exercia o

segurado.

Outrossim, para a concessão do benefício de auxílio­acidente não se faz

necessário o cumprimento de período de carência, conforme estabelece o art. 26 da Lei

8.213/91. Contudo, imprescindível que a parte possua qualidade de segurado à época do

infortúnio que causar a redução da capacidade laborativa.

COMPROVAÇÃO DA INCAPACIDADE

É essencial, para a correta elucidação do caso em apreço, a análise da perícia

acostada aos autos (evento 21).

Em resposta aos quesitos formulados, o profissional nomeado pelo juízo assim

se manifestou inicialmente:

“Histórico da doença atual: Autora refere que começou a apresentar cefaléia e notou baixa

visual em olho esquerdo, quando procurou atendimento foi detectado toxoplasmose ocular

com perda da visão do olho esquerdo. Realizado tratamento clínico para toxoplasmose mas

sem recuperação da visão. Atualmente apresenta visão monocular à direita e faz uso de

colírio lubrificante se necessário.

Exames físicos e complementares: acuidade visual OD 20/20 ; OE 00, somente visão

periférica biomicroscopia sem alterações fundoscopia OD sem alterações; OE cicatriz de

coriorretinite macular.”

A autora informou ao perito que exerce a atividade habitual de “auxiliar

administrativo” e encontra­se em atividade no momento.

De acordo com o expert, a autora é portadora de “Cegueira em um olho

(H54.4)”, pois apresenta visão monocular de forma permanente e irreversível decorrente de

toxoplasmose ocular, havendo incapacidade para atividades que exijam visão binocular.

Indubitavelmente, uma pessoa com visão monocular terá restrições e sequelas,

mesmo que mínimas, em qualquer profissão que exerça.

No caso, nos termos do laudo pericial, há limitação funcional, apesar de não

decorrer de acidente de qualquer natureza.

Como se vê, há uma lacuna na legislação previdenciária, que não prevê

especificamente os casos de redução da capacidade que não sejam decorrentes de lesão de

acidente de qualquer natureza.

Assim sendo, em que pese não se tratar de redução da capacidade laborativa

decorrente de acidente, a situação específica dos autos permite a aplicação do art. 86 da Lei nº

8.213/91, por analogia.

Entendo que, na espécie, deve­se considerar o disposto no art. 4º da Lei de

Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto­Lei nº 4.567/42), in verbis:

Art. 4º. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes

e os princípios gerais de direito.

A própria Lei nº 9.099/95 ampara a aplicação deste dispositivo, em razão do seu

art. 6º (regra de equidade), especialmente considerando as razões singulares acima expostas.

Nesse sentido, cito parte do Acórdão proferido no Recurso Cível nº 5004370­

18.2016.4.04.7213/SC, que amolda­se perfeitamente ao caso concreto:

“(…)

O auxílio­acidente é benefício destinado àqueles trabalhadores comprovadamente limitados

em sua funcionalidade, nos termos do art. 86 da Lei 8.213­1991:

Art. 86. O auxílio­acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após a

consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas

que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.

No caso, nos termos do laudo pericial, o autor não apresenta lesão ou sequela decorrente de

acidente de qualquer natureza, porém, atestou o expert que há incapacidade parcial e

permanente para a atividade que era a habitual, qual seja, motorista de caminhão, desde 14­

07­2016, mas que não há incapacidade para a atividade atual, para a qual está reabilitado.

Logo, extrai­se da conclusão do laudo pericial a existência de limitação funcional, apesar de

esta não decorrer de acidente/doença do trabalho ou de qualquer natureza.

Como se vê, há uma lacuna na legislação previdenciária, que não prevê especificamente esta

hipótese, pois trabalha apenas com a lógica binária da incapacidade total (ou das atividades

habituais, ou de qualquer atividade), restringindo a concessão nos casos de redução da

capacidade que não seja decorrente de lesão de acidente.

Assim sendo, em que pese não se tratar de redução da capacidade laborativa decorrente de

acidente, a situação específica dos autos permite a aplicação do art. 86 da Lei 8.213­1991,

por analogia.

Entendo que, na espécie, deve­se considerar o disposto no art. 4º da Lei de introdução ao

direito (Decreto­Lei nº 4.567­1942) , in verbis:

Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes

e os princípios gerais de direito.

Ora, este dispositivo é aplicável também em razão do disposto no art. 6º da Lei nº 9.099­1995

(regra de equidade), especialmente considerando as razões singulares acima expostas.

Doutra parte, esta Turma Recursal adota o entendimento de que não é exigível a alteração da

atividade desempenhada. As sequelas podem ser de menor gravidade, implicando apenas um

maior esforço para a profissão exercida. Também desnecessário enquadramento no rol de que

trata o anexo III do Decreto nº 3.048­99, tido como meramente exemplificativo.

Assim, havendo a dificuldade na realização das atividades laborativas habituais, poderá o

autor continuar a trabalhar de forma reduzida, compatível com sua limitação, compensandose via benefício de auxílio­acidente a redução da sua capacidade.

(…)”

Considerando que os atestados médicos carreados aos autos indicam a presença

de lesão por toxoplasmose em 05/2015 (evento 1, Proc2), e considerando que a autora

manteve vínculo empregatício no período de 22/07/2013 a 30/09/2016 (evento 3, Cnis1),

resta demonstrada a qualidade de segurada na época do infortúnio.

Em vista disso, cabível a concessão de auxílio­acidente.

TERMO INICIAL DA CONDENAÇÃO

Tendo em vista que a data de início da redução da capacidade laboral é anterior

à data do requerimento administrativo (07/07/2016), a parte autora faz jus ao benefício de

auxílio­acidente a partir da DER.

DO IMEDIATO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER

Conforme a disposição do artigo 43, da Lei 9.099/95, os recursos, no rito dos

Juizados Especiais, devem ser recebidos apenas em seu efeito devolutivo, somente se

admitindo a atribuição do efeito suspensivo em situações excepcionais. Ressalvo que a mera

possibilidade de reforma da sentença pela Turma Recursal não está inserida na expressão

“situações excepcionais”, sob pena de se transformar a sentença de primeira instância em

requisito formal para o conhecimento de recurso.

Quanto à obrigação de fazer, ou seja, concessão do benefício, o art. 43, da Lei

9.099/95 deve ser aplicado, para recebimento dos recursos apenas em seu efeito devolutivo,

somente se admitindo a atribuição do efeito suspensivo em situações excepcionais. Assim, o

INSS deverá implantar a renda mensal em favor da parte autora imediatamente,

independentemente do preenchimento dos requisitos para a antecipação dos efeitos da

tutela, por expressa disposição legal, nos termos do acima fundamentado.

DO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE PAGAR AS PARCELAS

VENCIDAS

A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será

calculada conforme segue:

­ ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);

­ OTN (03/86 a 01/89, Decreto­Lei nº 2.284/86);

­ BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);

­ INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);

­ IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);

­ URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);

­ IPC­r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);

­ INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);

­ IGP­DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art.

20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);

­ INPC (a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado

com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41­A

à Lei n.º 8.213/91).

No que tange à correção monetária, devem ser observados os critérios acima

definidos, na medida em que o Supremo Tribunal Federal nas ADIs 4.357 e 4.425 (efeito erga

omnes e eficácia vinculante), declarou a inconstitucionalidade, em parte, por arrastamento, do

art. 1º­F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/09.

Quanto aos juros moratórios, devem ser aplicados conforme segue:

­ Até 29/06/2009 devem ser fixados em 1% ao mês, a contar da citação, nos

termos da Súmula nº 75 do Egrégio TRF da 4ª Região e do Decreto­Lei n° 2.322/87;

­ De 30/06/2009 a 30/04/2012 à taxa de 0,5% ao mês, conforme art. 1º­F da Lei

n. 9.494/97, modificada pela Lei n. 11.960/09, c/c a Lei n. 8.177/91;

­ A partir de maio/2012, aplicar­se­á o mesmo percentual de juros incidentes

sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples, correspondentes a: a) 0,5% ao

mês, caso a taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5%; b) 70% da taxa SELIC ao ano,

mensalizada, nos demais casos (art. 1º­F da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pela Lei n.

11.960/2009, combinado com a Lei n. 8.177/1991, com alterações da MP n. 567/2012,

convertida na Lei n. 12.703/2012).

Observo que as decisões tomadas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no

julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não interferiram com a taxa de juros aplicável às

condenações da Fazenda Pública, consoante entendimento firmado no Superior Tribunal de

Justiça a partir do julgamento do RESP 1.270.439. Com efeito, como consignado pela

Ministra Eliana Calmon no julgamento do MS 18.217, “No julgamento do Resp

1.270.439/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, esta Corte, diante da declaração de

inconstitucionalidade parcial do art. 1º­F da Lei 9.494/99 no que concerne à correção

monetária, ratificou o entendimento de que nas condenações impostas à Fazenda Pública

após 29.06.2009, de natureza não tributária, os juros moratórios devem ser calculados com

base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança“.

Quanto à atualização monetária de precatórios/RPV, a partir da data da

conta de liquidação, deve ser observado o IPCA­E, conforme entendimento sufragado pelo

STF, ao modular os efeitos no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, não interferindo no

cálculo das parcelas vencidas até a data da liquidação, que deverá obedecer a cadeia de

índices acima transcrita (TRF4, AG 0006783­68.2014.404.0000, Quinta Turma, Relator

Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 06/04/2015).

Tais valores fazem parte da obrigação de pagar quantia certa e, por conseguinte,

sujeitam­se à requisição de pagamento (RPV ou precatório), após o trânsito em julgado da

decisão, na forma do artigo 17 da Lei nº 10.259/01.

Para esse fim, a conta a ser elaborada pelo Setor de Contadoria desta Vara

Federal, abrangerá as parcelas vencidas e exigíveis anteriores ao cumprimento do julgado

pelo ente previdenciário, atualizadas e acrescidas de juros de mora, conforme a decisão

transitada em julgado.

Dada a natureza mandamental das sentenças proferidas no âmbito dos Juizados

Especiais, tudo aquilo que se vencer a partir da sentença deverá ser satisfeito

administrativamente, consoante sistemática de execução de obrigações de fazer.

DO IMEDIATO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER

Nos Juizados Especiais Federais, em regra, o recurso inominado não possui

efeito suspensivo, nos termos do art. 43, da Lei 9.099/95 c/c o art. 1º da Lei 10.259/01. Em

razão disso, o cumprimento da obrigação de fazer, qual seja, implantação/revisão do

benefício, deve se dar de forma imediata, sendo desnecessária a análise de concessão de tutela

provisória de urgência.

Destarte, deverá o INSS implantar a renda mensal do benefício ora concedido,

em favor da parte autora, por força do cumprimento imediato da obrigação de fazer.

II ­ DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo PROCEDENTE a pretensão formulada na inicial

condenando o INSS a:

a) Conceder à parte autora, Sra. XXXXXXXXXXXXX, o benefício de

Auxílio­Acidente (NB 177.432.996­1), com uma Renda Mensal Inicial correspondente a 50%

do salário­de­benefício, a ser apurado conforme a redação do art. 29 da Lei 8.213/91 em

vigor na DIB, devendo constar o termo inicial do benefício em 07/07/2016 (DIB);

b) Pagar as parcelas vencidas a contar da DIB (07/07/2016) até a DIP

(01/08/2017), corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, conforme os critérios

fixados na fundamentação.

Intime­se o INSS para que, no prazo de 12 dias, com DIP 01/08/2017,

implante o benefício em favor da parte autora, em razão do disposto no art. 43 da Lei

9099/95 c/c art. 1º da Lei 10.259/01, que determina o cumprimento imediato da

obrigação de fazer no rito dos Juizados Especiais. Deverá comprovar o cumprimento da

medida em tal lapso.

No tocante ao cumprimento da obrigação de pagar as parcelas/diferenças

vencidas, aguarde­se o trânsito em julgado, por força do disposto no art. 17, da Lei 10.259/01.

Sem condenação em custas e honorários advocatícios (arts. 54 e 55 da Lei

9.099/95).

Condeno o INSS ao ressarcimento dos honorários periciais à Seção Judiciária

do Rio Grande do Sul (evento 24), pois sucumbente em maior monta.

Espécie não sujeita ao reexame necessário (art. 13 da Lei 10.259/01).

Apresentado recurso, verifique­se a necessidade de preparo (art. 42, §2º da Lei

9.099/95). Após, intime­se a outra parte para, querendo, apresentar contrarrazões.

Apresentadas ou não as contrarrazões, remetam­se os autos à Turma Recursal.

2017­8­23 :: 710004739161 ­ e­Proc ::

https://eproc.jfrs.jus.br/eprocV2/controlador.php?acao=minuta_imprimir&acao_origem=acessar_documento&hash=08dede5a4076504411ab6fa752519a9e 6/6

5001423­96.2017.4.04.7102 710004739161 .V11 DRK© DRK

Com o trânsito em julgado, proceda­se na forma da Portaria desta 1ª Vara

Federal de Santa Maria.

Publicação automática.

Sem necessidade de registro.

Intimem­se.

Documento eletrônico assinado por EZIO TEIXEIRA, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de

19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do

documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o

preenchimento do código verificador 710004739161v11 e do código CRC 54a1fd21.

Informações adicionais da assinatura:

Signatário (a): EZIO TEIXEIRA

Data e Hora: 22/08/2017 21:21:15

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