Ementa para citação:

EMENTA: administrativo. servidor público. aposentadoria. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO COMO BOLSISTA/ESTAGIÁRIO. impossibilidade. 

1. Pedido de incidente de uniformização de jurisprudência rejeitado.

2. O acórdão que julgou ilegal a aposentadoria da autora não importou a anulação do ato de averbação do tempo de serviço prestado à Prefeitura de São Paulo/SP. Cabia ao TCU verificar se estavam presentes os requisitos para a concessão da aposentadoria, exercendo o controle externo a ele atribuído pelo art. 71, inciso III, da CF/88. A decisão do TCU, portanto, não anulou o ato do Município de São Paulo/SP, motivo pelo qual a decadência do art. 54 da Lei n. 9.784/99 não fere a sua legalidade.

3. Considerando que o estágio não importa o reconhecimento de vínculo empregatício, não era mesmo possível a contagem do serviço prestado nessa condição para fins de aposentadoria quando não comprovado o recolhimento previdenciário.

4. Desse modo, correta a decisão do Tribunal de Contas da União que negou o registro da aposentadoria da autora, com base na Súmula nº 251 do TCU.

5. Manutenção da sentença de improcedência.

(TRF4, AC 5003311-39.2013.404.7200, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 12/12/2014)


INTEIRO TEOR

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003311-39.2013.404.7200/SC

RELATOR:MARGA INGE BARTH TESSLER
APELANTE:SUELY BALSI RAMOS
ADVOGADO:VINÍCIUS LOSS
APELADO:UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

EMENTA

administrativo. servidor público. aposentadoria. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO COMO BOLSISTA/ESTAGIÁRIO. impossibilidade. 

1. Pedido de incidente de uniformização de jurisprudência rejeitado.

2. O acórdão que julgou ilegal a aposentadoria da autora não importou a anulação do ato de averbação do tempo de serviço prestado à Prefeitura de São Paulo/SP. Cabia ao TCU verificar se estavam presentes os requisitos para a concessão da aposentadoria, exercendo o controle externo a ele atribuído pelo art. 71, inciso III, da CF/88. A decisão do TCU, portanto, não anulou o ato do Município de São Paulo/SP, motivo pelo qual a decadência do art. 54 da Lei n. 9.784/99 não fere a sua legalidade.

3. Considerando que o estágio não importa o reconhecimento de vínculo empregatício, não era mesmo possível a contagem do serviço prestado nessa condição para fins de aposentadoria quando não comprovado o recolhimento previdenciário.

4. Desse modo, correta a decisão do Tribunal de Contas da União que negou o registro da aposentadoria da autora, com base na Súmula nº 251 do TCU.

5. Manutenção da sentença de improcedência.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 10 de dezembro de 2014.

SALISE MONTEIRO SANCHOTENE

Relatora



Documento eletrônico assinado por SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7212124v6 e, se solicitado, do código CRC 8D34C8F4.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Salise Monteiro Sanchotene
Data e Hora: 11/12/2014 13:59


APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003311-39.2013.404.7200/SC

RELATOR:MARGA INGE BARTH TESSLER
APELANTE:SUELY BALSI RAMOS
ADVOGADO:VINÍCIUS LOSS
APELADO:UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra sentença que, em ação ordinária objetivando a declaração: a) de legalidade do ato de averbação do tempo de serviço prestado à Prefeitura de São Paulo/SP; b) de ilegalidade das decisões proferidas pelo TCU que lhe foram desfavoráveis, bem como do Ato 437 praticado pelo TRF4; c) de legalidade do ato de concessão de aposentadoria da autora praticado em março/1999; d) de que não são passíveis de repetição os valores recebidos a título de proventos no período de fevereiro/2008 a julho/2009; bem como a condenação da ré a restabelecer sua aposentadoria anterior, computando o período trabalhado de agosto/2009 a março/2013, e a restituir os valores já descontados de sua folha de pagamento desde julho/2010, revogou a antecipação de tutela e julgou improcedentes os pedidos. A autora foi condenada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais).

Suscita a apelante, primeiramente, incidente de uniformização de jurisprudência, tendo em vista que a 3ª e da 4ª Turmas deste Regional já se posicionaram, reiteradamente, em todas as oportunidades, de forma favorável à tese da autora. Quanto ao mérito, reitera as alegações da inicial e réplica, requerendo a reforma da sentença para que seu pedido seja julgado procedente.  Requer, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela.

Com contrarrazões, vieram os autos.

É o relatório.

Peço dia.

VOTO

Do incidente de uniformização de jurisprudência

Passo a analisar o suscitado incidente de uniformização de jurisprudência, frente ao que dispõem o artigo 476 do CPC e o Regimento Interno deste Regional.

Suscita a apelante que tanto a 3ª quanto a 4ª Turma deste Tribunal  já se posicionaram, em todas as oportunidades, de forma favorável à sua tese, no sentido de que já decaiu o direito de a Administração rever o ato que averbou o tempo de serviço em sua ficha funcional – ato este que precede o ato de aposentadoria.

Verifico que não merece ser acolhido o pedido.

Primeiro, o acolhimento de pedido de instauração de incidente de uniformização, nos termos do art. 476 do CPC, é decisão discricionária e facultativa, consoante já decidiu esta Turma:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. PREQUESTIONAMENTO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Acolhidos os embargos de declaração para acrescer fundamentação em relação ao pedido de suscitação de incidente de uniformização expressamente articulado nas razões do agravo de instrumento e não abordado no acórdão impugnado. 2. A instauração do incidente de uniformização de jurisprudência, nos termos do artigo 476 do CPC, não é vinculativa, mas sim discricionária e facultativa, destituída do caráter da obrigatoriedade. 3. De qualquer sorte, tendo em vista o disposto nas Súmulas 282 e 356 do STF e 98 do STJ, restam acolhidos os declaratórios para fins de prequestionamento. (TRF4, EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AI Nº 2009.04.00.023630-8, 4ª Turma, Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, POR UNANIMIDADE, D.E. 07/01/2010)

Ademais, conforme narrado pela própria apelante em seu pedido de uniformização de jurisprudência, não há qualquer divergência a ser dirimida, pois. segundo o seu ponto de vista, esta Corte sempre se manifesta no sentido favorável ao seu pleito.

 

Portanto, considerando que não foi apontada qualquer divergência jurisprudencial, bem como a natureza discricionária e facultativa da decisão acerca do incidente suscitado, deve ser rejeitado o pedido de uniformização de jurisprudência, por se revelar desnecessário.

Destarte, rejeito o incidente suscitado.

Mérito

Não merece reforma a sentença prolatada pelo magistrado a quo, exarada em conformidade com o entendimento desta Corte. A fim de evitar tautologia, transcrevo a fundamentação, que adoto como razões de decidir:

(…)

O Supremo Tribunal Federal somente possui competência para processar e julgar ações contra atos do Tribunal de Contas da União quando se tratar de mandado de segurança, conforme art. 102, I, ‘d’, da Constituição Federal. Tendo em vista que o presente feito é regido pelo procedimento ordinário, a competência para julgá-lo é da Justiça Federal, segundo art. 109, I, da Carta Magna. Nesse sentido:

 

Trata-se de ação, sob o rito ordinário, ajuizada por Cícero Nogueira Fontenelle, contra ato do Tribunal de Contas da União. É o relato do necessário. Decido. Examinados os autos, não identifico situação que atraia a competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar a causa nos termos do art. 102, I, da Constituição Federal, especialmente porque cabe à Justiça Federal o julgamento das ações propostas por particulares contra a União, como preconiza o art. 109, I, da Carta Política. Isso posto, nego seguimento ao pedido. Com o trânsito em julgado, remetam-se os autos à Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais, em razão da incompetência absoluta desta Corte para apreciar a demanda. Publique-se. Brasília, 25 de janeiro de 2013. Ministro Ricardo Lewandowski Presidente em exercício.

(ACO 2093/DF, Rel. Min. Luiz Fux, Dec. Mon., julg. em 6.2.2013, publ. em 7.2.2013 – destacou-se).

Assim também decidiu o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, in verbis:

 

ADMINISTRATIVO. COTA DE REPASSE DO FPM. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CÁLCULO POPULACIONAL. ESTIMATIVA DO IBGE. REVISÃO. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO.

1. Competência da Justiça Federal para o julgamento e processamento do feito por não se tratar de mandado de segurança contra decisão do presidente do Tribunal de Contas da União, cuja competência seria do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, d, CF/88), mas sim de ação ordinária proposta contra a União para discutir o coeficiente de repasse do Fundo de Participação dos Municípios – FPM.

2. Impossibilidade de revisão, pelo Poder Judiciário, dos critérios pré-fixados utilizados pela Administração para o cálculo de estimativa populacional quando não comprovada ilegalidade, desvio de poder ou de finalidade.

3. Apelação a que se nega provimento.

(AC 379799/CE, Rel. Des. Marcelo Navarro, 4ª T., unân., julg. em. 29.7.2008 – grifou-se).

Afasto, portanto, a alegação da União de que a competência para julgar e processar a presente ação seria do Supremo Tribunal Federal.

Registre-se que à Administração, no caso de constatação de vício no pagamento de verbas de qualquer natureza a servidor público ou dependente, é concedida a faculdade de proceder à sua revisão, sem com isso importar violação de direito adquirido ou de ato jurídico perfeito, mormente quanto à irredutibilidade de vencimentos, porquanto a existência destes depende da regular observância das normas jurídicas vigentes à época de sua produção.

É o que deve ser compreendido, quando se trata do princípio da autotutela administrativa, presente na jurisprudência consolidada pelo Supremo Tribunal Federal, na Súmula 473:

Súmula 473. A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a aposentadoria do servidor público constitui ato complexo, cuja formação depende da manifestação de mais de um órgão, somente se aperfeiçoando com o registro pelo Tribunal de Contas da União.

Sendo assim, entre o deferimento da inativação pelo órgão a que estava vinculado o servidor e o registro pelo Tribunal de Contas da União, não corre o prazo decadencial estabelecido na Lei n. 9.784/99 para a revisão do ato que, em verdade, ainda não se perfectibilizou.

Nesse sentido:

MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. APOSENTADORIA DE MAGISTRADO. NÃO-PREENCHIMENTO DA TOTALIDADE DOS REQUISITOS PARA A OBTENÇÃO DA VANTAGEM PREVISTA NO ART. 184, INC. II, DA LEI N. 1.711/1952. INAPLICABILIDADE DO ART. 250 DA LEI N. 8.112/1990. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA E OFENSA AO PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE DE SALÁRIOS NÃO CONFIGURADAS.

(…)

3. O Supremo Tribunal Federal pacificou entendimento de que, sendo a aposentadoria ato complexo, que só se aperfeiçoa com o registro no Tribunal de Contas da União, o prazo decadencial da Lei n. 9.784/99 tem início a partir de sua publicação. Aposentadoria do Impetrante não registrada: inocorrência da decadência administrativa.

4. A redução de proventos de aposentadoria, quando concedida em desacordo com a lei, não ofende o princípio da irredutibilidade de vencimentos. Precedentes.

5. Segurança denegada.

(MS 25552/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, unân., julg. em 7.4.2008, publ. em 29.5.2008).

 

EMENTA Embargos de declaração em mandado de segurança. Decisão monocrática. Conversão em agravo regimental. Negativa de registro de aposentadoria julgada ilegal pelo Tribunal de Contas da União. Inaplicabilidade ao caso da decadência prevista no art. 54 da Lei 9.784/99. Assegurado o direito ao contraditório e à ampla defesa.

1. Esta Suprema Corte possui jurisprudência pacífica no sentido de que o Tribunal de Contas da União, no exercício da competência de controle externo da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadorias, reformas e pensões (art. 71, inciso III, CF/88), não se submete ao prazo decadencial da Lei nº 9.784/99, iniciando-se o prazo quinquenal somente após a publicação do registro na imprensa oficial.

2. O TCU, em 2008, negou o registro da aposentadoria do ora recorrente, concedida em 1998, por considerar ilegal ‘a incorporação de vantagem de natureza trabalhista que não pode subsistir após a passagem do servidor para o regime estatutário’. Como o ato de aposentação do recorrente ainda não havia sido registrado pelo Tribunal de Contas da União, não há que se falar em decadência administrativa, tendo em vista a inexistência do registro do ato de aposentação em questão.

3. Sequer há que se falar em ofensa aos princípios da segurança jurídica, da boa-fé e da confiança, pois foi assegurado o ao recorrente o direito ao contraditório e à ampla defesa, fato apresentado na própria inicial, uma vez que ele apresentou embargos de declaração e também pedido de reexame da decisão do TCU.

4. Agravo regimental não provido.

(MS 27746 ED, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., por maioria, julg. em 12.6.2012, publ. em 6.9.2012).

Como foi dito, constituindo a aposentadoria ato administrativo complexo, que somente se aperfeiçoa com o registro perante o órgão de controle externo, sem que este haja convalidado a concessão da prestação, não se inicia o prazo decadencial previsto na Lei n. 9.784/99.

Entretanto, na revisão de seus atos, deve a Administração Pública assegurar o devido processo legal, com garantia ao contraditório e à ampla defesa, previstos no artigo 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(…)

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

 

Na doutrina de Hely Lopes Meirelles (in Direito administrativo brasileiro, 24ª ed., São Paulo: Malheiros, 1999, pp. 615/616 e 618), a garantia de defesa figura dentre os princípios do processo administrativo: por garantia de defesa deve-se entender não só a observância do rito adequado como a cientificação do processo ao interessado, a oportunidade para contestar a acusação, produzir prova de seu direito, acompanhar os atos da instrução e utilizar-se dos recursos cabíveis. Segue adiante reportando-se à seguinte advertência de Frederico Marques: Se o poder administrativo, no exercício de suas atividades, vai criar limitações patrimoniais imediatas ao administrado, inadmissível seria que assim atuasse fora das fronteiras do due process of law. Se o contrário fosse permitido, ter-se-ia de concluir que será lícito atingir alguém em sua fazenda ou bens, sem o devido processo legal. (…) Isto posto, evidente se torna que a Administração Pública, ainda que exercendo seus poderes de autotutela, não tem o direito de impor aos administrados gravames e sanções que atinjam, direta ou indiretamente, seu patrimônio sem ouvi-los adequadamente, preservando-lhes o direito de defesa.

Ao tratar dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, ensina Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso de direito administrativo. 14. ed., São Paulo: Malheiros, 2002, p. 97):

Estão aí consagrados, pois, a exigência de um processo formal regular para que sejam atingidas a liberdade e a propriedade de quem quer que seja e a necessidade de que a Administração Pública, antes de tomar decisões gravosas a um dado sujeito, ofereça-lhe a oportunidade de contraditório e de defesa ampla, no que se inclui o direito de recorrer das decisões tomadas. Ou seja: a Administração Pública não poderá proceder contra alguém passando diretamente à decisão que repute cabível, pois terá, desde logo, o dever jurídico de atender ao contido nos mencionados versículos constitucionais.

A teor da Súmula Vinculante n. 3 do Supremo Tribunal Federal, o contraditório e a ampla defesa devem ser assegurados também nos processos perante o Tribunal de Contas da União, […] quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão.

É que, ao apreciar a legalidade das concessões de aposentadorias, reformas e pensões, o Tribunal de Contas da União apenas exerce o controle externo sobre esses atos (art. 71, III, da Constituição Federal), que, presumidamente, já foram precedidos do devido processo administrativo.

Consoante recente orientação do Pleno do Supremo Tribunal Federal, quando o exame da legalidade de concessões de aposentadorias, reformas e pensões ocorrer após 5 (cinco) anos contados da data do recebimento do processo administrativo no TCU, antes de considerar ilegais os atos, a Corte de Contas deve ouvir os beneficiários, sob pena de ofensa aos princípios da segurança jurídica e da lealdade (v.g., MS 26053 ED-segundos, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, unân., julg. em 14.4.2011, publ. em 23.5.2011; MS 24781, Rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, julg. em 2.3.2011, publ. em 9.6.2011).

Esses princípios, contudo, não são absolutos. Não é razoável se exigir a irrestrita observância do contraditório em hipóteses que envolvem matérias exclusivamente de direito, como naquelas em que se questiona tão-somente a licitude da percepção de certas vantagens pelo servidor público. Ademais, como ressalvado na Súmula 473, retro mencionada, em todos os casos é assegurada a integral apreciação da legalidade da medida da Administração no âmbito judicial – conforme também se resguarda no art. 5º, XXXV, da Constituição da República -, sem que se evidenciem quaisquer prejuízos ao interessado.

O Supremo Tribunal Federal já se manifestou especificamente sobre a excepcional dispensabilidade do contraditório na esfera administrativa, no Recurso Extraordinário nº 158.543-9/RS, relatado pelo Ministro Marco Aurélio. Naquele julgado, o Ministro Carlos Velloso, ao proferir seu voto, consignou:

Nos casos que tenho apreciado, em que o tema é ventilado, procuro verificar se o ato administrativo praticado é puramente jurídico ou se envolve ele questões de fato, em que se exige o fazimento de prova. Porque, se o ato é puramente jurídico, envolvendo, simplesmente, a aplicação de normas objetivas, mesmo não tendo sido assegurado o direito de defesa na área administrativa, pode a questão ser examinada, em toda a sua extensão, no Judiciário, na medida judicial contra o ato apresentado. Neste caso, portanto, não há falar em prejuízo para o administrado, ou não resulta, do fato de não lhe ter sido assegurada a defesa, na área administrativa, qualquer prejuízo, dado que a questão, repito, pode ser examinada e discutida, em toda a sua extensão, judicialmente. É que o processo tem caráter instrumental, é tão-só instrumento de realização da justiça. Nessa linha, quando o administrado vem a Juízo, diretamente, pleitear algo contra a administração pública, sem que nada tivesse requerido administrativamente, tenho como atendido o requisito do interesse de agir, se a administração contesta, em Juízo, o mérito da pretensão. Neste caso, não teria sentido dar pela inexistência do interesse de agir, se é possível ao Judiciário examinar as razões e as contra-razões de um e de outro. Neste caso tem-se uma pretensão contestada. Isso se faz, evidentemente, tendo em vista o caráter instrumental do processo.

Na situação sob análise, o processo administrativo de concessão do benefício da autora foi recebido no Tribunal de Contas da União em 1999, conforme relatório do acórdão que julgou o pedido de reexame (evento 1, ACOR6, fl. 5). Assim, a decisão que negou o registro da aposentadoria da autora foi proferida há mais de 5 (cinco) anos, razão pela qual havia, em tese, a necessidade de reabertura do contraditório, conforme entendimento do STF acima exposto.

Contudo, o ato administrativo praticado pelo Tribunal de Contas da União, na parte que desfavoreceu a autora, envolveu questão exclusivamente jurídica, que não exigia a produção de provas, qual seja a legalidade da contagem do tempo de serviço prestado à Prefeitura de São Paulo/SP na condição de estagiária para fins de aposentadoria. Assim, a falta de ciência da instauração do processo administrativo não gerou prejuízo à autora, pois a controvérsia pode ser examinada, integralmente, em juízo.

Demais, verifica-se que a autora foi notificada da decisão do TCU, conforme documento que instruiu a inicial, ocasião em que foi informada sobre a possibilidade de adotar as medidas que entendesse cabíveis, bem como sobre a intenção do TRF4 em interpor pedido de reexame (evento 1, INT5, fl. 1), o que de fato ocorreu.

Por outro lado, o acórdão que julgou ilegal a aposentadoria da autora não importou a anulação do ato de averbação do tempo de serviço prestado à Prefeitura de São Paulo/SP.

Cabia ao Tribunal de Contas da União verificar se estavam presentes os requisitos para a concessão da aposentadoria, exercendo o controle externo a ele atribuído pelo art. 71, inciso III, da Constituição Federal. Não houve outra oportunidade para a Corte de Contas analisar se o período de serviços prestados perante aquele município na condição de estagiária poderia ser levado em consideração para efeitos de aposentadoria.

Convém transcrever o trecho do acórdão do TCU (evento 1, ACOR6) que tratou dessa questão:

A Sra. Sueli Balsi Ramos também se aposentou com fundamento na alínea ‘c’ do inciso III do art. 40 da CF 1988, em sua redação original. O Município de São Paulo, em processo administrativo, reconheceu esse tempo para todos os efeitos. Contudo, tal decisão carece de amparo legal por equiparar indevidamente o estagiário-bolsista – que não possui vínculo estatutário ou de emprego com a Administração Pública – a servidor público e não pode ser oposta à União.

É de ver que as certidões emitidas pelos órgãos públicos possuem presunção relativa de veracidade, que pode ser afastada mediante prova em contrário. No caso concreto, não se questiona a informação de que a Sra. Sueli Balsi Ramos tenha estagiado junto ao Município de São Paulo, mas afasta-se esse tempo como apto a comprovar a condição de servidor público.

A decisão do TCU, portanto, não anulou o ato do Município de São Paulo/SP, motivo pelo qual a decadência do art. 54 da Lei n. 9.784/99 não fere a sua legalidade.

Com relação ao mérito do acórdão proferido pela Corte de Contas, é pacífico o entendimento de que o direito à aposentadoria rege-se de acordo com a lei em vigor na data em que foram satisfeitas as condições necessárias à sua concessão.

No caso sob exame, a aposentadoria foi concedida em 1999, quando vigente a Lei nº 8.112/90, Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, sendo indevida a aplicação da Lei n. 1.711/52 realizada pelo Núcleo de Recursos Humanos (evento 1, PROCADM3, fl. 7).

Considerando que o estágio não importa o reconhecimento de vínculo empregatício, não era mesmo possível a contagem do serviço prestado nessa condição para fins de aposentadoria quando não comprovado o recolhimento previdenciário. Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVOREGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. AVERBAÇÃO DE TEMPODE SERVIÇO PRESTADO COMO BOLSISTA/ESTAGIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO A REGIME JURÍDICO. OMISSÃO. OCORRÊNCIA. CONCESSÃO DE EFEITOS INFRINGENTES. POSSIBILIDADE.

1. O vínculo contratual estabelecido para fins de estágio, cujo interesse é o aprendizado do bolsista, não se confunde com a atividade empregatícia, cuja finalidade é a exploração da mão de obra. Impossibilidade de averbação do tempo de serviço prestado como bolsista/estagiário para fins de aposentadoria. Diversidade de natureza dos vínculos contratuais estabelecidos no estágio e na atividade empregatícia.

2. Este Tribunal Superior possui jurisprudência firmada no sentido de não possuir o servidor público direito adquirido a regime jurídico, tampouco a regime de vencimentos ou de proventos.

3. Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes.

(EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1055442/CE, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª T., unân., julg. em 2.4.2013, publ. em 15.4.2013).

 

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO COMUM. CONVERSAO DE TEMPO NO EXERCÍCIO DO MAGISTÉRIO EM ESPECIAL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. EMENDA CONSTITUCIONAL 18/81. VERBETE SUMULAR 126/STJ. ESTAGIÁRIO BOLSISTA. FINALIDADE. APRENDIZADO. LEI 5.890/73. INSCRIÇAO PREVIDENCIÁRIO. NAO COMPROVAÇAO. AGRAVO IMPROVIDO. […]

2. O vínculo contratual estabelecido para fins de estágio, cujo interesse é o aprendizado do bolsista, não se confunde com a atividade empregatícia, cuja finalidade é a exploração da mão de obra.

3. Não tendo restado demonstrado o recolhimento previdenciário do período, nem tendo restado configurado vínculo empregatício, não há falar, nos termos do art. 4º da Lei 6.494/77, em reconhecimento do tempo de serviço, para fins de aposentação, do período em que o agravante aduz ter atuado como estagiário da empresa COPEL – Companhia Paranaense de Energia Elétrica.

4. Agravo improvido.

(AgRg no REsp n. 929894/PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., unân., julg. em 1.3.2011, publ. em 16.3.2011).

 

Desse modo, correta a decisão do Tribunal de Contas da União que negou o registro da aposentadoria da autora, com base na Súmula n. 251 do TCU, cuja redação é a seguinte: ‘É indevida a averbação de período como aluno monitor, estagiário e residente médico para fins de aposentadoria, eis que tais atividades são retribuídas mediante bolsa de estudos, sem relação empregatícia.’

De outro tanto, no que diz respeito à restituição das importâncias recebidas a maior, a requerente se sujeita a regime próprio, ou seja, aos termos do Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais – Lei n. 8.112, de 11 de dezembro de 1990.

O art. 46, do referido texto legal, assim estabelece:

 Art. 46. As reposições e indenizações ao erário, atualizadas até 30 de junho de 1994, serão previamente comunicadas ao servidor ativo, aposentado ou ao pensionista, para pagamento, no prazo máximo de trinta dias, podendo ser parceladas, a pedido do interessado.

 § 1o O valor de cada parcela não poderá ser inferior ao correspondente a dez por cento da remuneração, provento ou pensão.

 § 2o Quando o pagamento indevido houver ocorrido no mês anterior ao do processamento da folha, a reposição será feita imediatamente, em uma única parcela.

 § 3o Na hipótese de valores recebidos em decorrência de cumprimento a decisão liminar, a tutela antecipada ou a sentença que venha a ser revogada ou rescindida, serão eles atualizados até a data da reposição.

O dispositivo transcrito demonstra que o desconto, em tese, seria legítimo. Não se afigura razoável, no entanto, onerar o servidor público com a repetição de proventos de natureza alimentar percebidos de boa-fé, quando concedidos por equívoco da Administração Pública, ou seja, em decorrência de interpretação errônea ou da má aplicação da lei.

Contudo, no caso em tela, a autora tomou ciência da decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União que julgou ilegal o ato concessório de sua aposentadoria em 28 de fevereiro de 2008 (evento 1, INT5, fl. 3).

Conforme súmula n. 106 do TCU:

O julgamento, pela ilegalidade, das concessões de reforma, aposentadoria e pensão, não implica por si só a obrigatoriedade da reposição das importâncias já recebidas de boa-fé, até a data do conhecimento da decisão pelo órgão competente.

Segundo informação prestada pela Direção do Foro da Justiça Federal de Santa Catarina (evento 22, INF2), a reposição ao erário refere-se ao período entre a data da notificação da decisão do TCU, em 29 de fevereiro de 2008, e a do retorno da autora ao quadro de servidores ativos, em 5 de agosto de 2009.

Percebe-se, desse modo, que a restituição determinada pela ré diz respeito a valores que foram recebidos após a autora haver tido ciência da decisão proferida pelo TCU.

Há, aliás, expressa declaração firmada pela autora nesse sentido:

Declaro, ainda, estar ciente de que o efeito suspensivo proveniente de eventual interposição de pedido de reexame não me eximirá da devolução dos valores indevidamente percebidos após a respectiva notificação, em caso de não provimento do recurso. (evento 1, INT5, fl. 3).

Tal circunstância não permite afirmar que a autora estivesse recebendo de má-fé os valores subsequentes à sua notificação, mas impede que ela seja eximida de restituí-los com base na boa-fé. Isso porque possuía pleno conhecimento da existência de decisão que julgou ilegal o ato concessório de sua aposentadoria, ainda que estivesse pendente de pedido de reexame.

Desse modo, a antecipação de tutela deve ser revogada, com base no art. 273, § 4º, do CPC, para que sejam retomados os descontos destinados à reposição do erário referentes aos valores recebidos pela autora no período de 29 de fevereiro de 2008 a 5 de agosto de 2009 a título de proventos de aposentadoria.

Tendo em vista a improcedência do pedido de declaração de legalidade do ato que concedeu a aposentadoria em março de 1999, restou prejudicado o pedido de majoração dos proventos com base no cômputo do período trabalhado entre agosto de 2009 a março de 2013.

Em face do que foi dito, revogo a antecipação dos efeitos da tutela e julgo improcedentes os pedidos.

As razões vertidas na apelação não foram suficientes para modificar o entendimento acima. Mantida a sentença.

Quanto ao prequestionamento, não há necessidade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamenta sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp nº 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13-09-99).

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.

SALISE MONTEIRO SANCHOTENE

Relatora



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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10/12/2014

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003311-39.2013.404.7200/SC

ORIGEM: SC 50033113920134047200

RELATOR:Juiza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
PRESIDENTE:Desembargador Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ
PROCURADOR:Dr(a)Fábio Bento Alves
SUSTENTAÇÃO ORAL:VIDEOCONFERÊNCIA (Florianópolis) Adv. Vinícius Loss pela apelante
APELANTE:SUELY BALSI RAMOS
ADVOGADO:VINÍCIUS LOSS
APELADO:UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 10/12/2014, na seqüência 595, disponibilizada no DE de 01/12/2014, da qual foi intimado(a) UNIÃO – ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 3ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR ACÓRDÃO:Juiza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
VOTANTE(S):Juiza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
:Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ
:Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

Letícia Pereira Carello

Diretora de Secretaria



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