Ementa para citação:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À DEFICIENTE. INCAPACIDADE E RISCO SOCIAL COMPROVADOS. CONCESSÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS. TUTELA ESPECÍFICA.

1. Comprovada a deficiência e o risco social, correta a sentença que concedeu o benefício assistencial a contar do requerimento administrativo.

2. Correção monetária pelo INPC e aplicação da Lei 11.960/09 somente quanto aos juros após 30-06-09.

3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).

(TRF4, AC 0014487-11.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 03/12/2014)


INTEIRO TEOR

D.E.


Publicado em 04/12/2014

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014487-11.2014.404.9999/PR

RELATOR:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:LUIZ CARLOS DOS SANTOS
ADVOGADO:Marcelo Martins de Souza

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À DEFICIENTE. INCAPACIDADE E RISCO SOCIAL COMPROVADOS. CONCESSÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS. TUTELA ESPECÍFICA.

1. Comprovada a deficiência e o risco social, correta a sentença que concedeu o benefício assistencial a contar do requerimento administrativo.

2. Correção monetária pelo INPC e aplicação da Lei 11.960/09 somente quanto aos juros após 30-06-09.

3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, dar parcial provimento ao recurso adesivo da autora e determinar a implantação do benefício, mantida a sentença quanto ao reconhecimento da prescrição qüinqüenal, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 19 de novembro de 2014.

Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Relator



Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7105587v4 e, se solicitado, do código CRC BBB39525.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): João Batista Pinto Silveira
Data e Hora: 21/11/2014 16:04


APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014487-11.2014.404.9999/PR

RELATOR:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:LUIZ CARLOS DOS SANTOS
ADVOGADO:Marcelo Martins de Souza

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra a sentença que julgou procedente o pedido para condenar o INSS a:

a) conceder o BENEFÍCIO ASSISTENCIAL A PORTADOR DE DEFICIÊNCIA, a contar do requerimento administrativo, observada a prescrição qüinqüenal;

b) pagar as parcelas devidas acrescidas de custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.

Da sentença apelou o INSS sustentando que não restaram preenchidos os requisitos da miserabilidade e da deficiência, devendo a sentença ser reformada. Alternativamente postulou a alteração do termo inicial do benefício para a data da sentença.

A parte autora, adesivamente, requer seja declarada a inconstitucionalidade do texto do art. 1º F da Lei nº 9.494/97 na redação dada pela Lei nº 11.960/2009 e aplicado o INPC para correção monetária e juros de 1% ao mês.

Com contrarrazões, subiram os autos a este Regional.

O Ministério Público Federal, com assento nesta Corte, opinou pelo desprovimento do apelo.

É o relatório.

VOTO

É caso de reexame necessário, porque não há condenação em valor certo, de modo que não incide a exceção do art. 475, §2º do CPC. Aplica-se a Súmula nº 490 do STJ. Assim, conheço da remessa oficial.

Controverte-se, na espécie, acerca da sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício assistencial a portador de deficiência.

A Constituição Federal instituiu o benefício assistencial ao deficiente e ao idoso nos seguintes termos:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

(…)

V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

A Lei n.º 8.742, de 7 de dezembro de 1993, veio a regular a matéria, merecendo transcrição o caput e os parágrafos 1º a 3º do art. 20, verbis:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei n. 9.720, de 30.11.1998)

§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.

(…)

A redação do art. 20 da LOAS, acima mencionado, foi alterada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011 e nº 12.470, de 31-08-2011, passando a apresentar, a partir desta última, o seguinte teor:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.(Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.(Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.(Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.(Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.(Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social – INSS.(Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)

(…)

§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.(Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)

(…)

§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)

No tocante ao idoso, o art. 38 da mesma Lei, com a redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30 de novembro de 1998, dispunha (antes de ser revogado pela Lei 12.435/2011) que a idade prevista no art. 20 reduz-se para 67 anos a partir de 1º de janeiro de 1998. Esta idade sofreu nova redução, desta feita para 65 anos, pelo art. 34, caput, da Lei n.º 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), idade esta que deve ser considerada a partir de 1º de janeiro de 2004, data de início da vigência do Estatuto, nos termos do seu art. 118.

Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20 da LOAS, ou aquela pessoa que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) do autor e de sua família.

Com referência à condição de deficiente, transcrevo excerto do Voto proferido no julgamento da AC nº 0006201-83.2010.404.9999, pela 6ª Turma deste Tribunal, em que foi Relator o Des. Federal Celso Kipper (D.E. 01/02/11):

A Constituição Federal, ao instituir o benefício, remete sua regulação à lei (conforme dispuser a lei, parte final do inciso V do art. 203). No entanto, conquanto seja atribuída à lei regular, concretizar, conformar, configurar ou organizar o direito à percepção do benefício da pessoa portadora de deficiência que não tenha condições de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, não pode, nesse desiderato, estabelecer um conceito restritivo de deficiência, por várias razões.

Em primeiro lugar, da análise da norma constitucional, verifico que consta o comando de que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, o que demonstra inequivocamente a intenção constitucional de ampliação do conjunto de beneficiários da assistência social. Em linha de conseqüência, tal dispositivo (caput do art. 203) serve como princípio hermenêutico ou, se se preferir, como linha orientadora na interpretação dos demais dispositivos relativos à assistência social, entre os quais o do inciso V do mesmo artigo. Daí podemos inferir uma primeira conclusão, a de que se deve interpretar a locução pessoa portadora de deficiência (inciso V do art. 203) em um sentido amplo, jamais restritivo.

Em segundo, em sua importante missão de integrar a norma constitucional, não dispõe o legislador de liberdade plena. Ao revés, está limitado pelos preceitos da própria norma constitucional, sob pena de, a não ser assim, esvaziá-la de conteúdo. Nesse sentido, o ensinamento de JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO:

“Em alguns casos, as remissões constitucionais para as leis significa abertamente a concretização da constituição segundo as leis. Todavia, este reenvio aberto não implica arbítrio legislativo de conformação, pois sempre se terá de admitir que o cerne da regulamentação legal é determinado materialmente, de forma expressa ou implícita, por princípios recebidos na lei constitucional”. (Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra Editora, 1994, reimpressão, p. 485).

Nesse sentido, a Constituição limita o legislador, “as suas leis devem ater-se a esse norte, sobretudo ao dos direitos fundamentais e das normas restantes fixadas na Constituição” (KLAUS STERN, O Juiz e a Aplicação do Direito, in Direito Constitucional – Estudos em Homenagem a Paulo Bonavides, Eros Roberto Grau e Willis Santiago Guerra Filho (Org.), Malheiros Editores, São Paulo, 2001, p. 515).

Em terceiro, trata-se aqui de um direito fundamental, não só porque o art. 6º da Constituição Federal inclui entre os direitos sociais a assistência aos desamparados, mas principalmente porque o art. 203, inciso V, consagra expressa e cristalinamente a garantia (rectius: o direito) de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que se encontrem em situação de desamparo. Pois bem, no âmbito das normas constitucionais definidoras de direitos fundamentais, pode-se afirmar a existência de uma eficácia vinculante reforçada para todos os poderes públicos, inclusive o legislador (INGO WOLFGANG SARLET, A Eficácia dos Direitos Fundamentais, Livraria do Advogado, Porto Alegre, 1998). O citado autor, a respeito, assim ensina:

“Neste contexto, cumpre referir a paradigmática e multicitada formulação de Krüger, no sentido de que hoje não há mais falar em direitos fundamentais na medida da lei, mas, sim, em leis apenas na medida dos direitos fundamentais, o que – de acordo com Gomes Canotilho – traduz de forma plástica a mutação operada nas relações entre a lei e os direitos fundamentais. De pronto, verifica-se que a vinculação aos direitos fundamentais significa para o legislador uma limitação material de sua liberdade de conformação no âmbito de sua atividade regulamentadora e concretizadora. Para além disso, a norma contida no art. 5º, § 1º, da CF gera, a toda evidência, uma limitação das possibilidades de intervenção restritiva do legislador no âmbito de proteção dos direitos fundamentais. Se, por um lado, apenas o legislador se encontra autorizado a estabelecer restrições aos direitos fundamentais, por outro, ele próprio encontra-se vinculado a eles, podendo mesmo afirmar-se que o art. 5º, § 1º, da CF traz em seu bojo uma inequívoca proibição de leis contrárias aos direitos fundamentais, gerando a sindicabilidade não apenas do ato de edição normativa, mas também de seu resultado, atividade, por sua vez, atribuída à Jurisdição Constitucional. Isto significa, em última ratio, que a lei não pode mais definir autonomamente (isto é, de forma independente da Constituição) o conteúdo dos direitos fundamentais, o qual, pelo contrário, deverá ser extraído exclusivamente das próprias normas constitucionais que os consagram.”

A necessidade de o legislador definir o conteúdo dos direitos fundamentais de forma vinculada com o sentido objetivo da norma constitucional é ressaltada pela doutrina mesmo nos casos, como o presente, em que a Constituição remete à lei a regulamentação ou concretização do direito fundamental. Nesse sentido, o ensinamento de JORGE MIRANDA:

“Mesmo quando a Constituição parece devolver para a lei a regulamentação de certos direitos ou institutos (…), o legislador não é livre de lhe emprestar qualquer conteúdo; a norma legislativa (insistimos) tem, na perspectiva global da Constituição, de possuir um sentido que seja compatível ou conforme com o sentido objectivo da norma constitucional. Fórmulas como “nos termos da lei” (…) ou equivalentes apenas podem indiciar que se trata de normas constitucionais não exeqüíveis por si mesmas” (Manual de Direito Constitucional, Tomo IV – Direitos Fundamentais, Coimbra Editora, Coimbra, 1993, pp. 280-1).

A doutrina constitucional, nacional ou estrangeira, é torrencial no sentido de que o legislador, em sua tarefa de concretização, está obrigatoriamente vinculado, antes de mais nada, ao texto constitucional, ou, em outras palavras, o texto constitucional limita a interpretação feita pelo legislador ao concretizar a norma constitucional (nesse sentido, KONRAD HESSE, El Texto Constitucional como Limite de la Interpretación, in Division de Poderes e Interpretación, ANTONIO LÓPEZ PINA (Org.), Tecnos, Madrid, 1987). Em conseqüência, o legislador encontra-se vinculado ao conteúdo constitucionalmente declarado dos direitos fundamentais, e se se aparta deste, cabe ao juiz protegê-lo, com o que é o juiz e não a lei a garantia última dos direitos (FRANCISCO RUBIO LLORENTE, La Forma del Poder, Centro de Estudios Constitucionales, Madrid, 1997, pp. 339-340).

Por fim, a impossibilidade de a lei estabelecer um conceito restritivo de deficiência é reforçada em razão de um dos objetivos constitucionais que devem servir de base à organização da seguridade social, o de universalidade da cobertura e do atendimento (Constituição Federal, art. 194, parágrafo único, inciso I). Ora, se se exigisse que para perceber o benefício assistencial deveria a pessoa ser portadora de deficiência que a incapacitasse não só para o exercício de atividade laboral, como para todos os atos da vida, a pessoa que se subsumisse na primeira hipótese (deficiência incapacitante para o trabalho) mas não na segunda (deficiência incapacitante para todos os atos da vida) ficaria completamente desprotegida da seguridade social – pois, evidentemente, não teria condições de ser segurado da previdência social -, em afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), ao objetivo da seguridade social de universalidade da cobertura e do atendimento (CF, art. 194, parágrafo único, I) e à ampla garantia de prestação da assistência social (CF, art. 203, caput).

Por todo o exposto, a exigência, para a percepção do benefício, de ser a pessoa incapaz para a vida independente, se entendida como incapacidade para todos os atos da vida, não se encontra na Constituição. Ao contrário, tal exigência contraria o sentido da norma constitucional, seja considerada em si, seja em sintonia com os demais princípios e objetivos constitucionais acima analisados.

Se aquela fosse a interpretação para a locução incapacitada para a vida independente, constante do art. 20, § 2º, da Lei n.º 8.742/93, o legislador teria esvaziado indevidamente o conteúdo material do direito fundamental da pessoa portadora de deficiência, deixando fora do seu âmbito uma ampla gama de pessoas portadoras de deficiência incapacitante para o trabalho, e, em conseqüência, incorreria em inconstitucionalidade.

Assim, a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93 deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas portadoras de deficiência.

Nesse sentido, a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.”

Acresça-se, ainda, que a incapacidade para a vida independente deve, principalmente, ser examinada da perspectiva financeira: se a parte autora não tiver condições de prover a própria subsistência através do trabalho, é indiscutível que sua manutenção esta a depender de outros.

A nova redação do art. 20 da LOAS (dada pela Lei nº 12.435, de 2011) estabelece que “o benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência” e o seu parágrafo segundo (com a redação da Lei nº 12.470, de 2011), define“considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”

Assim, ainda que temporária a incapacidade, o requerente faz jus ao benefício assistencial enquanto não recuperar sua capacidade laborativa.

Nesse sentido decidiu a Turma Regional de Uniformização deste Tribunal no Incidente de Uniformização JEF nº 0001444-53.2007.404.7056/PR:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL DE JURISPRUDÊNCIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. POSSIBILIDADE DE REVERSÃO DO QUADRO INCAPACITANTE. DIREITO À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

1. Conforme precedentes desta Turma Regional e da Turma Nacional de Uniformização, “A transitoriedade da incapacidade não é óbice à concessão do benefício assistencial, visto que o critério de definitividade da incapacidade não está previsto no aludido diploma legal. Ao revés, o artigo 21 da referida lei corrobora o caráter temporário do benefício em questão, ao estatuir que o benefício ‘deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.'”(TNU, proc. 2007.70.50.01.0865-9, Relator Juiz Federal Otávio Henrique Martins Port, julgado na sessão de 16.11.2009)

2. Em se encontrando o requerente incapacitado para atividades que garantam a sua subsistência, tem direito à concessão do benefício assistencial.

3. Incidente de uniformização conhecido e não provido.

Acerca dos critérios para aferição da pobreza, vinha justificando a consideração do § 3º do art. 20 da LOAS, nos seguintes termos:

“O Tribunal parece caminhar no sentido de se admitir que o critério de 1/4 do salário mínimo pode ser conjugado com outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivíduo e de sua família para concessão do benefício assistencial de que trata o art. 203, inciso V, da Constituição.

Entendimento contrário, ou seja, no sentido da manutenção da decisão proferida na Rcl 2.303/RS, ressaltaria ao menos a inconstitucionalidade por omissão do § 3 do art. 20 da Lei n° 8.742/93, diante da insuficiência de critérios para se aferir se o deficiente ou o idoso não possuem meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, como exige o art. 203, inciso V, da Constituição.

A meu ver, toda essa reinterpretação do art. 203 da Constituição, que vem sendo realizada tanto pelo legislador como por esta Corte, pode ser reveladora de um processo de inconstitucionalização do § 3o do art. 20 da Lei n° 8.742/93.

Diante de todas essas perplexidades sobre o tema, é certo que o plenário do Tribunal terá que enfrentá-lo novamente.

Ademais, o próprio caráter alimentar do benefício em referência torna injustificada a alegada urgência da pretensão cautelar em casos como este.

(STF, Rcl 4374 MC/PE, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJ 06-02-07)

Nesse sentido, é a orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS LEGÍTIMOS. VIABILIDADE. PRECEDENTES. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.° 7/STJ.INCIDÊNCIA. REPERCUSSÃOGERAL. RECONHECIMENTO. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SOBRESTAMENTO. NÃO APLICAÇÃO.

1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3.° do art. 20 da Lei n.° 8.742/93 deverá ser observado como um mínimo, não excluindo a possibilidade de o julgador, ao analisar o caso concreto, lançar mão de outros elementos probatórios que afirmem a condição de miserabilidade da parte e de sua família.

2. “A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.” (REsp 1.112.557/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009).

3. Assentando a Corte Regional estarem demonstrados os requisitos à concessão do benefício assistencial, verificar se a renda mensal da família supera ou não um quarto de um salário-mínimo encontra óbice no Enunciado n.° 7 da Súmula da Jurisprudência deste Tribunal.

4. O reconhecimento de repercussão geral pelo colendo Supremo Tribunal Federal, com fulcro no art. 543-B do CPC, não tem o condão de sobrestar o julgamento dos recursos especiais em tramitação nesta Corte.

5. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1267161/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 28/09/2011)

Mais do que isso, recentemente (18-04-13), o Egrégio Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 567985/MT, com repercussão geral reconhecida, revendo o seu posicionamento anterior (ADI nº 1.232/DF e Reclamações nº 2303/RS e 2298/SP), reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, que estabelece a renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo para a concessão de benefício assistencial a idosos ou deficientes, em razão da defasagem do critério caracterizador da miserabilidade.

No julgamento da Reclamação n. 4.374, apontou o Relator, Min. Gilmar Mendes, que “os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor de meio salário mínimo como referencial econômico para a concessão dos respectivos benefícios”, tendo referido o Programa Nacional de Acesso à Alimentação – PNAA (Lei 10.689 de 2003), dentre outros.

Portanto, inexistindo critério numérico atual tido por constitucional pelo STF como referencial econômico para aferição da pobreza, e tendo sido indicado a razoabilidade de considerar o valor de ½ salário mínimo per capita, utilizado pelos programas de assistência social no Brasil, tal parâmetro também deve ser utilizado como balizador para aferição da miserabilidade para efeitos de concessão de benefício assistencial, sugerido pelo próprio STF.

Por outro lado, para fins de cálculo da renda mensal familiar, entendo que não pode ser computado o valor proveniente de benefício assistencial recebido por idoso ou incapaz, considerado necessário a sua sobrevivência digna, por aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei n°10.741/2003.

No julgamento do RE 580963/PR (Sessão de 18-04-13), o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do idoso), tendo prevalecido o voto do Min. Gilmar Mendes, que reputou violado o princípio da isonomia, uma vez que o legislador abrira exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais de idoso, mas não permitira a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário.

Aponto apenas que a inconstitucionalidade do § único do art. 34 da Lei 10.741/2003 se deu por omissão parcial, permitindo sua interpretação de forma extensiva. Assim, o critério da exclusão do benefício assistencial do idoso continua sendo aplicado, mas não apenas ele, admite-se, extensivamente, em razão da omissão declarada, que também sejam excluídos benefício assistencial decorrente de incapacidade e benefícios previdenciários de valor mínimo, independente da sua origem.

Do caso concreto

O autor requereu administrativamente em 21-12-2005 a concessão de benefício assistencial a portador de deficiência, tendo sido indeferido, porque não constatada a incapacidade para os atos da vida independente e para o trabalho.

A sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido de concessão do benefício assistencial, cujos fundamentos e argumentos a seguir transcrevo (fls. 162/166):

O benefício assistencial de prestação continuada tem previsão constitucional:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. (g.n.)

A Lei 8.742/93 – Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS e suas alterações posteriores regulamentam, atualmente, este direito, considerado direito fundamental da pessoa humana.

Trata-se de prestação assistencial, que independe de prévia filiação ao regime de previdência ou contribuições sociais.

A Lei 8.742/93 no seu artigo 20 regulamenta o direito fundamental ao referido benefício exigindo o preenchimento dos seguintes requisitos, simultaneamente: a) tratar-se de pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais e b) comprovar não possuir meios para prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

No caso em tela, o autor conta, atualmente, com 57 anos de idade. Não se enquadra no conceito de pessoa idosa.

Portanto, é necessário verificar se o autor preenche os demais requisitos: deficiência e desamparo.

Com relação à deficiência, o parágrafo 2° do artigo 20 da citada legislação providenciaria, esclarece que: “(…) considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.

E o parágrafo 10 desse artigo, em complementação, aduz que impedimento a longo prazo é aquele que produz efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.

A deficiência exigida pela legislação para a concessão do benefício deve ser diagnosticada por intermédio de perícia médica.

Na primeira perícia de fls. 100, o médico perito constatou que o autor possui incapacidade parcial e permanente e tem incapacidade para o trabalho.

Na segunda e última perícia, de fls. 131/150, o médico perito constatou: “podemos inferir que existe redução da capacidade de trabalho em 25% da capacidade genérica do corpo devido à cegueira de um olho. Entretanto, não impede o autor para as atividades habituais de trabalho. Não há incapacidade para as atividades do cotidiano. Não há invalidez”, (f1.183).

Ao responder os quesitos do juízo, afirmou o segundo perito que o autor possui incapacidade parcial e permanente (fl. 146).

Apesar de discordarem acerca da capacidade para o trabalho, ambos foram unânimes em confirmar que a incapacidade do autor é parcial e permanente.

De acordo com o mais recente entendimento jurisprudencial, para a concessão do benefício assistencial não se exige do requerente que a sua invalidez seja total e permanente, mas que seja preenchido o requisito da incapacidade, ainda que parcial e temporária.

(…)

A Turma Recursal do Tribunal Regional Federal da 4a Região sumulou o seguinte posicionamento:

Súmula 18. A incapacidade temporária, ainda que parcial, é suficiente para o reconhecimento do direito ao benefício assistencial.

Segundo consta do laudo pericial, o autor é portador das seguintes enfermidades: cegueira de um olho – CID H 54.4; diabetes mellitus tipo II – CID E 11; hipertensão arterial sistêmica – CID l 10; trombose venosa profunda, tratada – CID l 82.9 e espondilose cervical incipiente – CID M 47.

Considerando os dois laudos periciais que concluíram pela incapacidade parcial e permanente e o entendimento jurisprudencial atualizado, restou preenchido o requisito da deficiência.

Quanto ao requisito de desamparo ou de miserabilidade, foi realizado o estudo social do autor, com a finalidade de avaliar a sua condição socioeconômica.

Em síntese, a Assistente Social verificou que o autor mora com sua esposa, a Sra. Jacira Clemente dos Santos. Que a renda familiar é proveniente das diárias que o autor realiza em uma fazenda, sendo de aproximadamente R$350,00 (trezentos e cinquenta reais) mensais. Que o autor possui vários problemas de saúde e sua esposa também e que ambos tomam medicamentos fornecidos pelo SUS. Que a despesa com alimentação é de aproximadamente R$300,00 (trezentos reais) mensais. Que vivem em uma casa de 50 metros quadrados, de alvenaria, coberta de Eternit, sem forro e piso de cimento rústico. Que a mobília é precária. Que as condições de higiene são péssimas. Que segundo informação do autor, este não consegue trabalho fixo em virtude de sua cegueira. Que o autor tem um casal de filhos, que são casados e moram na mesma cidade.

As fotos ilustram bem a situação de hipossuficiência do autor e sua esposa.

Depreende-se dos autos, que o autor em virtude de suas enfermidades e da idade avançada, encontra dificuldade na execução de tarefas simples do dia a dia, o que acaba também por impedi-lo de conseguir uma posição melhor no mercado de trabalho, com possibilidade de salários superiores.

Hipótese que se amolda perfeitamente ao disposto no §2° do art.20 da Lei 8.742/93 e autoriza a concessão do benefício pleiteado.

As necessidades básicas e vitais para a sobrevivência do ser humano, somadas às necessidades especiais decorrentes da situação de incapacidade do autor, com certeza, extrapolam a renda mensal atualmente auferida pela família, no valor de R$350,00 (trezentos e cinquenta reais) mensais!

Neste sentido, o amparo social do benefício de prestação continuada vem em socorro a essa parcela sofrida da população e tem por finalidade a promoção da dignidade da pessoa humana. O que se impõe, no presente caso.

A jurisprudência, há tempos vem reconhecendo esse direito aos cidadãos hipossuficientes, independentemente de comprovação do limite econômico legal, conforme seguinte precedente:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (…) 4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável. 5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo. 6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar. 7. Recurso Especial provido. (REsp 1112557/MG, Rei. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009). (g.n).

Comprovado, portanto, o preenchimento dos requisitos legais de deficiência e miserabilidade, faz jus o autor à concessão do benefício de prestação continuada pleiteado, para que ele e sua família possam viver com dignidade.

No tocante à deficiência, a fim de avaliar a incapacidade para o trabalho e para a vida independente, foram realizadas duas perícias médicas (fls. 100 e 131/150). Conforme laudos periciais, o autor é portador das seguintes enfermidades: cegueira de um olho – CID H 54.4; diabetes mellitus tipo II – CID E 11; hipertensão arterial sistêmica – CID l 10; trombose venosa profunda, tratada – CID l 82.9 e espondilose cervical incipiente – CID M 47. Em ambas as perícias realizadas, restou certo que a incapacidade é parcial e permanente. Assim, e de acordo com o entendimento de que para a concessão do benefício assistencial não se exige que a incapacidade seja total e permanente, conforme acima já explanado, tenho que preenchido restou o requisito da deficiência.

Para avaliar a situação socioeconômica do grupo familiar, foi realizada perícia social (fls. 56/57), a qual certifica que o autor reside com sua esposa, em residência cujo estado de conservação é ruim, sendo que a renda da família é proveniente do trabalho realizado pelo autor, esporadicamente, recebendo por dia a importância de R$ 16,00, sendo que gastam cerca de R$ 300,00 com alimentação e despesas de supermercado. Às fls. 180/181 verifica-se que a esposa do requerente aufere renda, no valor de um salário mínimo, proveniente de benefício assistencial.

Afastado do cálculo da renda mensal familiar o valor percebido em razão do benefício acima referido, e considerando os gastos mensais básicos que a família possui, tenho que comprovado restou o estado de miserabilidade.

Presentes os requisitos da deficiência e o estado de miserabilidade, correta a sentença que concedeu o benefício assistencial a contar do requerimento administrativo.

Dos consectários

Cuidando-se de questão de ordem pública, segundo orientação do STJ, devem ser adequados de ofício (AgRg no AREsp: 144069 SP 2012/0026285-1, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, DJe 19-10-12).

Assim, conforme entendimento das Turmas Previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

a) CORREÇÃO MONETÁRIA:

A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e jurisprudencialmente aceitos, quais sejam:

– ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);

– OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);

– BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);

– INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);

– IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);

– URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);

– IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);

– INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);

– IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei nº 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei nº 8.880/94);

– INPC (a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei nº 10.741/03, combinado com a Lei nº 11.430/06, precedida da MP nº 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei nº 8.213/91, e REsp nº 1.103.122/PR).

Entendia a 3.ª Seção deste Tribunal que a contar de 30.06.2009, data em que passou a viger a Lei nº 11.960/09, de 29.06.2009, publicada em 30.06.2009 (a qual alterou o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97), deveria haver, para fins de atualização monetária e juros, a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.

Não são aplicáveis, todavia, no que toca à correção monetária, os critérios previstos na Lei nº 11.960/2009, que modificou a redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, por conta de decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, que apreciou a constitucionalidade do artigo 100 da CF, com a redação que lhe foi dada pela EC 62/2006. Essa decisão proferida pela Corte Constitucional, além de declarar a inconstitucionalidade da expressão “na data de expedição do precatório”, do §2º; dos §§ 9º e 10º; e das expressões “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança” e “independente de sua natureza”, do §12, todos do art. 100 da Constituição Federal de 1988, com a redação da Emenda Constitucional nº 62/2009, por arrastamento, também declarou inconstitucional o art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960, de 29.07.2009 (atualização monetária pelo índice de remuneração da poupança).

Impõe-se, pois, a observância do que decidido com efeito erga omnes e eficácia vinculante pelo STF nas ADIs 4.357 e 4.425, restabelecendo-se, no que toca a juros e correção monetária, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/09, ou seja, apuração de correção monetária pelo INPC.

A correção monetária deve ser adequada aos critérios acima definidos. De fato, em razão do que decidido pelo Supremo Tribunal Federal, as disposições do art. 1.º-F da Lei n.º 9.494, com a redação dada pelo art. 5.º da Lei nº 11.960/09, foram expungidas do ordenamento jurídico no que toca à correção monetária, a qual, como sabido, constitui acessório, sobre o qual pode e deve o órgão julgador deliberar. Eliminada do mundo jurídico uma norma legal em razão de manifestação do Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade, não pode subsistir decisão que a aplique, pois está em confronto com a Constituição Federal.

Assim, nesse ponto, merece ser provido o recurso adesivo interposto pela parte autora.

b) JUROS DE MORA

Até 30.06.2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n.º 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de 30.06.2009, por força da Lei n.º 11.960, de 29.06.2009(publicada em 30.06.2009), que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos juros aplicados à caderneta de poupança. Registre-se que a Lei 11.960/09, segundo o entendimento do STJ, tem natureza instrumental, devendo ser aplicada aos processos em tramitação (EREsp 1207197/RS. Relator Min. Castro Meira. Julgado em 18.05.2011).

Observo que as decisões tomadas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não interferiram com a taxa de juros aplicável às condenações da Fazenda Pública, consoante entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça a partir do julgamento do RESP 1.270.439. Com efeito, como consignado pela Ministra Eliana Calmon no julgamento do MS 18.217, “No julgamento do REsp 1.270.439/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, esta Corte, diante da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 1º-F da Lei 9.494/99 no que concerne à correção monetária, ratificou o entendimento de que nas condenações impostas à Fazenda Pública após 29.06.2009, de natureza não tributária, os juros moratórios devem ser calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança“.

c) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS: devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: “Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência”.

d) CUSTAS PROCESSUAIS: o INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.

DA TUTELA ESPECÍFICA DO ART. 461 DO CPC

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3.ª Seção, Questão de Ordem na AC n.º 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício assistencial a contar do requerimento administrativo, a ser efetivada em 45 dias, com DIP na data do presente julgamento.

Frente ao exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, dar parcial provimento ao recurso adesivo da autora e determinar a implantação do benefício, mantida a sentença quanto ao reconhecimento da prescrição qüinqüenal.

Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Relator



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Signatário (a): João Batista Pinto Silveira
Data e Hora: 21/11/2014 16:04


EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/11/2014

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014487-11.2014.404.9999/PR

ORIGEM: PR 00001431420068160145

RELATOR:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE:Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR:Procurador Regional da República Paulo Gilberto Cogo Leivas
APELANTE:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
ADVOGADO:Procuradoria Regional da PFE-INSS
APELADO:LUIZ CARLOS DOS SANTOS
ADVOGADO:Marcelo Martins de Souza

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/11/2014, na seqüência 132, disponibilizada no DE de 05/11/2014, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DA AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, MANTIDA A SENTENÇA QUANTO AO RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL.

RELATOR ACÓRDÃO:Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
VOTANTE(S):Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
:Des. Federal CELSO KIPPER
:Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA

Gilberto Flores do Nascimento

Diretor de Secretaria



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Signatário (a): Gilberto Flores do Nascimento
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